Acórdão nº 70083483495 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sétima Câmara Criminal, 26-04-2022
Data de Julgamento | 26 Abril 2022 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 70083483495 |
Tipo de documento | Acórdão |
Órgão | Sétima Câmara Criminal |
PODER JUDICIÁRIO
VFM
Nº 70083483495 (Nº CNJ: 0320258-84.2019.8.21.7000)
2019/Crime
JUÍZO DE RETRATAÇÃO. RECURSO ESPECIAL. APELAÇÃO CRIME. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. RELATIVIZAÇÃO DA VULNERABILIDADE.
Em que pese a existência de entendimento do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que ?Para a caracterização do crime de estupro de vulnerável previsto no art. 217-A, caput, do Código Penal, basta que o agente tenha conjunção carnal ou pratique qualquer ato libidinoso com pessoa menor de 14 anos. O consentimento da vítima, sua eventual experiência sexual anterior ou a existência de relacionamento amoroso entre o agente e a vítima não afastam a ocorrência do crime? (Tema 918/STJ, Rel. Min. Rogerio Schietti Cruz, DJe 10/09/2015), é cabível, no caso concreto, a relativização da vulnerabilidade. Impossibilidade de tratar todos os casos de forma idêntica com base em um marco etário imutável, uma vez que o Direito Penal lida com fatos e circunstâncias singulares em cada ação penal, impondo-se uma análise detalhada de cada situação. Hipótese dos autos em que o réu e a vítima eram namorados ao tempo do fato, mantendo, em sequência, relação marital, possuindo 2 filhos em comum, tudo a demonstrar a ausência de qualquer elemento de coação física ou moral. Acórdão mantido em juízo de retratação.
EM JUÍZO DE RETRAÇÃO, MANTIDO O ACÓRDÃO.
Apelação Crime
Sétima Câmara Criminal - Regime de Exceção
Nº 70083483495 (Nº CNJ: 0320258-84.2019.8.21.7000)
Comarca de Taquari
M.P.
..
APELANTE
M.L.S.F.
..
APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Magistrados integrantes da Sétima Câmara Criminal - Regime de Exceção do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em juízo de retratação, manter o acórdão recorrido.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des.ª Glaucia Dipp Dreher (Presidente e Revisora) e Des. Volcir Antonio Casal.
Porto Alegre, 25 de abril de 2022.
DR.ª VIVIANE DE FARIA MIRANDA,
Relatora.
RELATÓRIO
Dr.ª Viviane de Faria Miranda (RELATORA)
Na Comarca de Taquari/RS, o Ministério Público denunciou Manoel L. d. S. F., com 25 anos de idade na época dos fatos (nascido em 03/11/1986), dando-o como incurso nas sanções do artigo 217-A, c/c o artigo 226, inciso II, na forma do artigo 71, ?caput?, e artigo 249, ?caput?, na forma do artigo 69, todos do Código Penal.
É o teor da denúncia (fls. 02/03):
1º FATO:
No período compreendido entre 01 de maio de 2012 até a presente data, em horários e locais variados, no Município de Taquari, o denunciado MANOEL L. D. S. F., de forma reiterada e continua, manteve conjunção carnal com VITÓRIA D. O. A., sua sobrinha, à época com 12 e 13 anos de idade, pessoal vulnerável na acepção legal.
Para tanto, o denunciado, aproveitando-se de facilidade de coabitação com a vítima, sua sobrinha, que residia com a avó materna, seduziu Vitória, iniciando com ela um relacionamento amoroso, com práticas sexuais. Diante da suspeita de familiares, o denunciado convenceu a pequena vítima a fugir consigo, estando ambos até o presente momento desaparecidos da cidade de Taquari.
2º FATO:
No período compreendido entre 25 de maio de 2012 até a presente data, em horários e locais diversos, no Município de Taquari, o denunciado MANOEL L. D. S. F., subtraiu VITÓRIA D. O. A., sua sobrinha, à época com 12 e 13 anos de idade, do poder de quem a tinha sob sua guarda.
Para tanto o denunciado, nas circunstâncias descritas no primeiro fato, convenceu Vitória a fugir consigno, tendo-a levado de sua avó materna, com que residia, situação esta que perdura até a apresente data.
A denúncia foi recebida no dia 17/07/2013 (fl. 103).
Diante da não localizado do denunciado, este foi citado por edital (fl. 120), restando o feito e o prazo prescricional suspenso, nos termos do artigo 366 do Código de Processo Penal, a contar de 30/04/2014 (fl. 123).
O acusado foi citado pessoalmente em 11/09/2015 (fl. 136) e, por intermédio da Defensoria Pública, apresentou resposta à acusação (fl. 139/139v).
Durante a instrução, foram ouvidas a vítima e 3 testemunhas de acusação (mídias das fls. 247, 255 e 264).
O réu teve decretada sua revelia (fl. 253).
Convertido o debate oral em memorias, estes foram apresentados (fls. 281/289v e 290/300v).
Adveio sentença, publicada em 10/07/2018 (fl. 305v), que julgou improcedente a denúncia para absolver o réu Manoel L. d. S. F. das imputações que lhe foram feitas, com fulcro no artigo 386, inciso II, do Código de Processo Penal (fls. 301/305).
O Ministério Público apresentou recurso de apelação (fl. 306).
Em suas razões, clamou pela condenação do réu nos exatos termos da denúncia, sustentando devidamente comprovadas a materialidade e a autoria delitivas, sendo irrelevante o consentimento da ofendida para a configuração, ou não, do estupro de vulnerável, o qual se consuma independentemente do uso de violência ou grave ameaça. Ponderou, ainda, que devidamente configurado o crime de subtração de incapaz, o recorrido fugindo com a vítima para outro Estado, com ela vindo a residir em Santa Catarina, por alguns meses (fls. 308/315).
Apresentadas contrarrazões (fls. 317/322), subiram os autos a esta Corte, sendo o feito distribuído à minha Relatoria.
Após o lançamento de parecer pela Procuradoria de Justiça (fls. 335/341), em Sessão Virtual de julgamento realizada de 16/07/2020 até 22/07/2020, esta Colenda 7ª Câmara Criminal, à unanimidade, negou provimento ao apelo ministerial, alterando, todavia, de ofício, o dispositivo da sentença, para constar que a absolvição do apelado se deu pelo artigo 386, inciso III, do Código de Processo Penal (fls. 345/354). Eis a ementa do aresto:
APELAÇÃO-CRIME. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. SUBTRAÇÃO DE INCAPAZ; RELATIVIZAÇÃO DA VULNERABILIDADE. POSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. (i) Em que pese a existência de entendimento dos Tribunais Superiores sobre a presunção de vulnerabilidade em relação ao delito de estupro praticado contra menores de 14 anos, é cabível a relativização de tal elemento. Não é possível tratar todos os casos de forma idêntica com base em um marco etário imutável, uma vez que o direito penal lida com fatos e circunstâncias únicas em cada ação penal, impondo-se uma análise detalhada de cada situação. (ii) No caso dos autos, réu e vítima eram namorados ao tempo do fato, mantendo, em sequência, relação marital, tendo 2 filhos em comum, a demonstrar a ausência de qualquer elemento de coação física ou moral. (iii) Absolvição que se dá pela atipicidade das condutas e não pela inexistência de crimes. APELAÇÃO MINSITERIAL DESPROVIDA. ALTERAÇÃO DA FUNDAMENTAÇÃO DA ABSOLVIÇÃO. (Apelação Criminal, Nº 70083483495, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Viviane de Faria Miranda, Julgado em: 22-07-2020)
Contra tal decisão, o Ministério Público manejou Recurso Especial (fls. 360/364).
Após contrarrazões apresentadas pela Defensoria Pública (fls....
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