Acórdão nº 70083567263 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceiro Grupo de Câmaras Criminais, 29-01-2021

Data de Julgamento29 Janeiro 2021
ÓrgãoTerceiro Grupo de Câmaras Criminais
Classe processualRevisão Criminal
Número do processo70083567263
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO




ILB

Nº 70083567263 (Nº CNJ: 0328635-44.2019.8.21.7000)

2019/Crime


REVISÃO CRIMINAL.
CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ART. 213. ESTUPRO.

Prática de atos libidinosos com criança, filha, menor de 14 anos na época dos fatos.
Retratação da ofendida, dizendo que não foi vítima de abuso por parte do requerente. Conjunto probatório gerador da condenação que deve ser preservado, pois confiável, uma vez que as declarações da então adolescente foram confirmados por outros meios de prova, como os laudos psicológicos.

REVISÃO CRIMINAL IMPROCEDENTE.
UNÂNIME.
Revisão Criminal


Terceiro Grupo Criminal

Nº 70083567263 (Nº CNJ: 0328635-44.2019.8.21.7000)


Comarca de Santa Maria

L.A.V.G.

.
.
REQUERENTE

M.P.

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.
REQUERIDO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Magistrados integrantes do Terceiro Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar improcedente a revisão criminal.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des.ª Lizete Andreis Sebben, Des.
Sérgio Miguel Achutti Blattes, Dr. Ricardo Bernd e Dr. Volnei dos Santos Coelho.

Porto Alegre, 29 de janeiro de 2021.


DES. IVAN LEOMAR BRUXEL,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Ivan Leomar Bruxel (RELATOR)

Trata-se de revisão criminal em favor de LUIZ A. V. G., condenado por incurso nas sanções do artigo 213 do Código Penal.


Aponta novas provas diante da ação de justificação criminal nº 027/2.19.0007896-9, bem como declaração firmada por instrumento público quanto à inocência do revisionando.


Liminar indeferida.


Apensados os autos originais.

Parecer pelo improvimento.


É o relatório, disponibilizado no sistema informatizado.


VOTOS

Des. Ivan Leomar Bruxel (RELATOR)

Esta a descrição dos fatos na denúncia (abreviaturas ausentes no original):
?
No período compreendido entre 2004 a 2008, em horários não determinados, na residência do denunciado, nesta cidade, o denunciado LUIZ A. V. G. constrangeu AMANDA R. F. G., na época com 07 anos de idade (fl. 07), mediante violência presumida, a praticar ou permitir que com ela se praticasse outro ato libidinoso diverso da conjunção carnal.

No período mencionado, o denunciado acariciava a menina a banhá-la, passando suas mãos pelo corpo da vítima.
Outrossim, por diversas vezes, o denunciado obrigava a vítima a deitar-se com ele e nesse momento acariciava o corpo da vítima, introduzindo o dedo no órgão genital da vítima. Nessas ocasiões, a vítima chorava e pedia para o denunciado parar, mas ele respondia à vítima que aquilo era natural entre pai e filha.

Na oportunidade, o denunciado beijava a vítima na boca (selinho) frequentemente, e numa ocasião deu um ?
beijo de língua? na vítima, quando esta tinha 11 anos, bem como certa vez deu um chupão no pescoço da vítima, deixando-lhe uma marca (fl. 06).?
Assim foi fundamentada a sentença condenatória (abreviaturas ausentes no original):
Inexistem prefaciais a serem observadas.


Trata-se da análise de fato capitulado no artigo 214, parágrafo único, c/c artigo 224, ?
a?, ambos do CPB .

A materialidade decorre do BO de fls.
06/07, pareceres psicológicos de fls. 21/22 e 24/27, certidão de nascimento de fl. 11 , e prova oral coligida.

A autoria recai na pessoa de LUIZ A. V. G. .

Compulsando os autos, aquilatando os elementos probantes carreados, tem-se que a condenação do réu é medida que se impõe.


Alinho os motivos de meu convencimento.

Em prolepse, registre-se que o artigo 214 do CPB foi revogado, passando o tipo penal ser previsto no artigo 217-A do CPB.


O réu em juízo negou a prática delitiva; registou a vítima como filha, porque havia suspeita dela ser sua filha biológica; sempre prestou auxílio a vitima, retirando do convívio da família materna, porque a mãe da menor era garota de programa e o ambiente era inadequado, pela promiscuidade e pobreza; as acusações surgiram porque a vítima queira mais liberdade para sair e namorar, e o réu não permitia.


A vítima Amanda em juízo confirmou os abusos sofridos por parte do réu dos 7 aos 12 anos; o fato veio à tona quando passou a ter problemas psicológicos e resolveu contar as psicólogas; é de família muito pobre, e neste contexto o réu se aproximou, passando a assumir o papel de pai; o réu lhe prestava todo o tipo de auxílio; apresentava o réu comportamento sexualizado, o que na época a vítima não tinha discernimento; o réu a beijava na boca; deitava na mesma cama e passava as mãos nas suas partes íntimas, por baixo da calcinha, penetrando em sua genitália, situações que se repetiam com frequencia, continuamente; o réu, depois de assumir o papel de pai, começou a restringir o acesso a vitima com sua família natural, mãe e avó, mantendo-a a maior parte do tempo dentro de casa; o réu lhe orientava a não contar os abusos a ninguém, sob a alegação de que não entenderiam que aquilo era normal, que era normal aquele tipo de ?
carinho? com a filha, sendo que a própria depoente não compreendida se tratar de atos libidinosos; os abusos ocorriam quando estava sozinha com o réu; que certo dia chegou a ficar com o pescoço machucado, e teve que cobrir os hematomas com o cabelo; as cartas anexadas aos autos foram mandadas quando a vítima não tinha discernimento de compreender que os ?carinhos? do réu, na verdade era abusos sexuais; o réu chegou a oferecer dinheiro para si e sua família para não darem continuidade nas acusações.

A testemunha Cintia, mãe da vítima, verberou acreditar nas acusações da denúncia; o réu lhe procurou para desculpar, dizendo que agiu por impulso; a filha foi criada pela avó, e posteriormente pelo réu; foi uma surpresa para toda família; a vítima disse que foi abusada muitas vezes, referindo que o réu passava as mãos pelo corpo dela, nas partes íntimas; que um dia o réu chupou o pescoço da vítima; os abusos ocorriam na casa do réu; a vítima no início somente visitava o réu, e depois passou a morar com ele; tomou conhecimento dos fatos pelo réu , que lhe procurou para desculpar, relatando que tinha feito uma bobagem e estava arrependido; a vítima relatou os abusos a psicóloga Fabiana; a vítima voltou a morar com a avó.


A testemunha Nara, conselheira tutelar, verberou que atendida toda a família da vitima, que vivia em situação de vulnerabilidade social; não se recoda de detalhes sobre a acusação, mas confirmou ter feito o boletim de ocorrência de fls.
6/07, com base nos fatos trazidos pela psicóloga e da própria vítima.

A testemunha Horacília, avó da menor, informou que o réu se aproximou da família na condição de voluntário, demonstrando um maior interesse em ajudar sua neta; isso sempre foi encarado como uma coisa boa;a vítima morava com o réu; os fatos surgiram quando a vítima os relatou para a psicóloga, a qual proibiu que a vítima continuasse a morar com o réu; o réu procurou a depoente e confessou ter abusado de sua neta e que estava arrependido, mas que se fosse preciso mentir, ele ia mentir; a vítima voltou a morar com a depoente; o réu ia na residência para se desculpar com a vítima e chorava muito, demonstrando arrependimento; quando a vítima era nova, até uns 09 anos, o réu dava banho na vítima; comprova roupas íntimas para ela, e pedia para que ela experimentasse e mostrasse como tinha ficado.


A testemunha Fabiana, psicóloga, relatou que atendeu a vítima, e que no início o seu diagnóstico foi ansiedade; em meados de 2012 disse que a vítima, em meio a forte emoção, relatou situações de abuso por parte do réu, consistente em passar as mãos dentro de sua calcinha, na vagina, nos seus seios, além de beijo na boca, de língua, ?
chupão? no pescoço e ?selinhos?; o réu dizia a vítima que era normal coisa de pai e filha; o atendimento psicológico foi indicação da escola, em face de questões de ansiedade, de autoestima e de angustia da vítima, situações estas que entre os anos de 2010 e 2012 foram se intensificando até que em abril de 2012 a vítima em uma sessão com muito choro e angustia relatou os abusos praticados pelo réu; segundo relato da vítima, o réu dizia que os atos libidinosos eram coisas normais, porém, com o passar do tempo, começou a perceber que suas amigas não tinham este tipo de relação com seus pais e por isso a agonia em relatar os fatos; afirmou que o depoimento da vítima se mostrou verdadeiro, não lhe parecendo fantasioso; afirmou que no dia em que a vítima falou sobre os abusos, o réu já estava no ambulatório , ou chegou depois, não lembrou ao certo, e este chorou muito diante da situação trazida à tona.

A testemunha Enio em juízo informou que conhece o réu há muito tempo e não acredita que os fatos tenha ocorrido; ajudava o réu no sustento da vítima; tudo não teria passado de uma armação para prejudicar o réu, que queria impor limites a filha, mas esta queria namorar e então resolveu prejudicá-lo.


A testemunha Gerson em juízo aduziu ter convivido com o réu e a vítima; não acredita que os fatos tenham ocorrido; o comportamento do pai era normal.


A testemunha Susete em juízo verberou não acreditar que o réu abusado sexualmente da vítima; o réu sempre proveu o sustento da filha; a vítima não aceitava os limites impostos pelo réu na condição de pai e voltou a morar com a avó; a vítima estaria rebelde e teria um namorado; todas estas informações foram repassadas pelo réu.


Esta é a resenha dos fatos.

Os crimes contra a liberdade sexual são singulares, predicados pela clandestinidade, por sua própria natureza: nenhum agente será imprudente de cometê-lo ante testemunhas, e se o faz, procura cercar-se de todos os cuidados para não ser reconhecido posteriormente.


O Direito, em manifestações jurisprudenciais e da própria doutrina, valoriza a palavra da vítima e testemunhas, desde que seja coerente e se coadune com o histórico dos fatos.


É o que aqui ocorre.


O conjunto probatório produzido no caderno processual inclina-se coeso para um decreto condenatório.


Em prolepse, registre-se que o réu é pai registral da
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