Acórdão nº 70083654970 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Cível, 30-03-2022

Data de Julgamento30 Março 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo70083654970
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarta Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO


AMM

Nº 70083654970 (Nº CNJ: 0003856-64.2020.8.21.7000)

2020/Cível


apelação cível.
ação civil pública. direito público não especificado. construção de empreendimento em área de banhado/nascente (área de preservação permanente). arguição de ilegitimidade passiva afastada. área de propriedade do município de farroupilha. ente público que consta como empreendedor nas licenças de instalação. violação DO direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado. dever de reparação.

NEGARAM PROVIMENTO AO APELO.
UNÂNIME.
Apelação Cível


Quarta Câmara Cível

Nº 70083654970 (Nº CNJ: 0003856-64.2020.8.21.7000)


Comarca de Farroupilha

MUNICIPIO DE FARROUPILHA


APELANTE

MINISTERIO PUBLICO


APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), os eminentes Senhores Des.
Eduardo Uhlein e Des. Francesco Conti.

Porto Alegre, 24 de março de 2022.


DES. ALEXANDRE MUSSOI MOREIRA,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Alexandre Mussoi Moreira (RELATOR)

Trata-se de apelação cível interposta pelo MUNICÍPIO DE FARROUPILHA, nos autos da ação civil pública movida em seu desfavor pelo MINISTERIO PUBLICO, da sentença (fls.
857/859v.) que julgou parcialmente procedentes os pedidos, cuja parte dispositiva restou redigida nos seguintes termos:

Isso posto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE a ação civil pública ajuizada pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra MUNICÍPIO DE FARROUPILHA, para fins de condenar o réu a efetuar a compensação urbanística da área institucional do loteamento Morada do Sol (Residencial São Francisco), devendo o Município destinar outra área dominial das proximidades, com 8.991,00m² para afetação como bem de uso especial.


Custas pelo requerido, pela metade, visto que o ajuizamento da ação é anterior à Lei 14.634/2014.
Não há condenação ao pagamento de honorários advocatícios, eis que o autor da demanda é o Ministério Público.

Em suas razões de apelo (fls.867/873), o Município de Farroupilha sustenta que apenas doou o imóvel ao Fundo de Arrendamento Residencial ?
FAR, pessoa jurídica de direito privado representada pela Caixa Econômica Federal. Refere que fez prova da doação do imóvel, não sendo empreendedor ou construtor do Condomínio. Alega que o licenciamento ambiental e demais obras para a construção do Condomínio Residencial São Francisco foram de responsabilidade do Fundo de Arrendamento Residencial ? FAR. Aduz que a doação do terreno se operou e, 28/06/2010, anteriormente aos fatos narrados. Sustenta que as irregularidades dizem respeito ao Loteamento Felicitá, destacando, ainda, que não houve a possibilidade de definir a existência de banhado ou nascente no local. Alega que na área relativa ao Condomínio Residencial São Francisco não havia cobertura vegetal nativa em estágio inicial, médio ou avançado, apenas predomínio de capoeira em estágio primário. Salienta que qualquer bem público pode ter sua destinação pública específica alterada e ser objeto de transferência para o domínio privado ou público de outra entidade, invocando o art. 18 da CF. Assevera que os bens públicos, sejam quais forem, podem ser desafetados e posteriormente alienados. Pugna pelo provimento do apelo, a fim de que seja reconhecida sua ilegitimidade passiva.

Apresentadas as contrarrazões, o feito foi remetido à Superior Instância.


Com o parecer lançado pelo Ministério Público, vieram os autos, conclusos, para julgamento.


É o relatório.

VOTOS

Des. Alexandre Mussoi Moreira (RELATOR)

O apelo merece ser conhecido, porquanto preenchidos os requisitos de admissibilidade.


Conforme se depreende dos autos, o Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul ajuizou a presente ação civil pública com base nos fatos apurados no bojo do Inquérito Civil n. 00771.00034/2010.
Narrou o parquet, em suma, que, na área utilizada para construção do Condomínio Residencial São Francisco, caracterizada como área de preservação permanente, foi realizada drenagem de água com abertura de valas. Referiu o órgão ministerial que foi omitida, quando da concessão da Licença Ambiental, a existência de banhado ou curso de água na gleba.

Por primeiro, não há falar em ilegitimidade passiva do Município de Farroupilha.
No aspecto, cumpre registrar que, em que pese a construção do condomínio residencial tenha se dado sob responsabilidade do Fundo de Arrendamento Residencial ? FAR (contrato de doação de fls. 704/714), a causa de pedir reside, precipuamente, na omissão da existência de nascente/banhado quando do pedido de concessão de licença ambiental.

Destarte, há que ser considerado que Licença de Instalação n. 005/2010 (fls.
52/53), e a Licença de Instalação n. 011/2010 (fls. 88/89), ambas concedidas pela Prefeitura Municipal de Farroupilha, foram todas emitidas em prol do ente municipal, o qual constou, inclusive, como empreendedor responsável pela construção do Condomínio Residencial São Francisco. Ademais, em que pese a juntada de instrumento particular de doação, o qual não tem o condão de registrar a transferência de propriedade de bens imóveis, nos termos do art. 1.245 do Código Civil
, os elementos constantes nos autos, notadamente a Matrícula n. 30.367 do Registro de Imóveis da Comarca de Farroupilha (fl. 487), indica que a área objeto da lide é de propriedade do Município de Farroupilha.


Rejeita-se, pois, a alegação de ilegitimidade passiva.


Como é sabido, o meio ambiente ecologicamente equilibrado é direito de todos, protegido pela própria Constituição Federal, nos termos do caput art. 225 da Constituição Federal, in verbis:
Art. 225.
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.

Não bastasse, é um bem que ao mesmo tempo pertence a todos, mas a ninguém isoladamente, repercutindo de modo indelével sobre a vida de uma coletividade indeterminada de pessoas (macrobem).
Assim, o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado é tido como um direito fundamental de terceira dimensão, integrando o rol dos direitos de solidariedade.
A Constituição Federal no art. 225, §3º, trata da responsabilidade penal, administrativa e civil dos causadores de dano ao meio ambiente, como se vê:

§ 3º As condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente sujeitarão os infratores, pessoas físicas ou jurídicas, a sanções penais e administrativas, independentemente da obrigação de reparar os danos causados.

Assim, a Constituição recepcionou o art. 14, §1º, da Lei n. 6.938?
81, que estabeleceu responsabilidade objetiva para os causadores de dano ao meio ambiente, nos seguintes termos:

\
"Sem obstar a aplicação das penalidades previstas neste artigo, é o poluidor obrigado, independentemente de existência de culpa, a indenizar ou reparar os danos causados ao meio ambiente e a terceiros, afetados por sua atividade (...)\".
A adoção pela lei da responsabilidade civil objetiva significa apreciável
...

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