Acórdão nº 70083693614 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 31-08-2022

Data de Julgamento31 Agosto 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo70083693614
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoOitava Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO


FKO

Nº 70083693614 (Nº CNJ: 0007720-13.2020.8.21.7000)

2020/Crime


APELAÇÃO CRIME.
CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO E CONTRA PAZ PÚBLICA. ESTELIONATO E ORGANIZAÇÃO CRIMINOSA. LEI Nº 12.850/13. EMPRESA FICTÍCIA CRIADA PARA A VENDA FRAUDULENTA DE CASAS PRÉ-FABRICADAS. PROPÓSITO ÚNICO DE LUDIBRIAR AS VÍTIMAS E OBTER VANTAGEM INDEVIDA. DOLO ESPECÍFICO EVIDENCIADO. TESE DE AUSÊNCIA DE DOLO AFASTADA. CONTINUIDADE DELITIVA EVIDENCIADA EM RELAÇÃO AOS CRIMES DE ESTELIONATO. REDIMENSIONAMENTO DA PENA DO RECORRENTE.
1. Preliminar de nulidade processual por ofensa ao contraditório e ampla defesa afastada. Não houve, no ato judicial, qualquer prejuízo à defesa do apelante, requisito necessário para a decretação de nulidade no processo penal, à inteligência do princípio da pás de nullité sans grief, com o que deve ser rechaçada a prefacial.

2. Crimes de Estelionato. Para a configuração do delito ora em comento, art. 171 do Código Penal, exige-se sempre a prática de uma conduta composta, devendo ser demonstrada tanto a obtenção de vantagem indevida, para si ou para outrem, quanto o induzimento ou manutenção da vítima em erro. Requer, outrossim, a presença do dolo específico, consistente no animus fraudandi
3.
Nos casos em apreço, restou comprovado que o apelante, em mais de 40 oportunidades, induziu e manteve as vítimas em erro, logrando vantagem indevida de vultosa monta, tendo em vista que, através de organização criminosa estruturalmente organizada, o apelante e os corréus realizavam contratos de venda de casas pré-fabricadas, sem qualquer propósito de cumprir sua parte na avença. Assim, angariavam os valores dados como entrada do negócio e com as parcelas iniciais da avença, mas não entregavam o objeto contratual, causando prejuízo 46 famílias que buscavam a realização do seu projeto de casa própria e foram enganadas em decorrência da empreitada criminosa levada a efeito pelos réus. O réu teve importante atuação no processo de venda das casas, sendo um importante integrante da organização criminosa, pois se identificava das mais diversas formas, alternava papéis conforme a necessidade da organização criminosa, apresentava-se como profissional cujas as funções e atribuições sequer possuía habilitação para exercer (réu não possui graduação como arquiteto ou engenheiro), a fim de trabalhar em obras que sequer eram executadas, o que já afasta a tese defensiva de ausência de dolo por se tratar de pessoa ingênua, que sequer recebeu todo o seu salário. Dolo específico de ludibriar evidenciado em todos os nove recorrentes. Condenação mantida.

4. Continuidade delitiva evidenciada. A prova carreada ao feito dá conta que a empresa fictícia foi criada, assim como a própria organização criminosa estruturalmente organizada, com o único fito de vender casas pré-fabricadas, sem qualquer propósito de cumprir sua obrigação contratual, desimportando se fosse uma ou 46 vítimas. Houve pluralidade de condutas, provocando 46 crimes, o que, com efeito, se aproxima da regra relativa ao concurso material. No entanto, diferentemente do que ocorre no concurso material, os crimes perpetrados são da mesma espécie, ou seja, previstos no mesmo tipo penal e protegendo o mesmo bem jurídico, qual seja: a inviolabilidade patrimonial, aviltada pela prática de atos enganosos dos agentes. Correto, assim, o reconhecimento da figura jurídica inserida no art. 71, caput, do CP, crime continuado comum, não se cogitando a hipótese do parágrafo único do mesmo diploma legal, tendo em vista que, não obstante a assombrosa dimensão da lesão causada aos ofendidos, não se trata o Estelionato de crime com violência ou grave ameaça à pessoa, a justificar a incidência do crime continuado específico. Exasperação da pena à razão máxima de 2/3, considerando o número de infrações praticadas

5.
Dosimetria da Pena. Terceira fase da dosimetria da pena ajustada, com a exasperação da pena à fração máxima de 2/3 para o recorrente, em razão do reconhecimento do crime continuado.

6.
Delito de organização criminosa.
O crime em espécie é crime formal e não depende do cometimento efetivo de qualquer outro delito para a sua consumação, mas exige para a sua configuração a demonstração de que os agentes agiam de forma organizada, com caráter estável e permanente.

7. As provas colhidas ao longo da instrução criminal demonstram de forma inequívoca a estabilidade e permanência do grupo, bem como comprova o elemento subjetivo do tipo. Conjunto probatório que confirma a prática delitiva e autoriza a manutenção da condenação do recorrente quanto ao fato 47º descrito na denúncia. Dosimetria das Penas reajustada, observado, contudo, as penas fixadas na origem, diante da ausência de recurso da acusação, no ponto.

RECURSO DA DEFESA PARCIALMENTE PROVIDO.


RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO.


Apelação Crime


Oitava Câmara Criminal - Regime de Exceção

Nº 70083693614 (Nº CNJ: 0007720-13.2020.8.21.7000)


Comarca de Canoas

MINISTERIO PUBLICO


APELANTE/APELADO

RODRIGO RAZEIRA DA SILVA


APELANTE/APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Magistrados integrantes da Oitava Câmara Criminal - Regime de Exceção do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, negar provimento ao apelo ministerial e dar parcial provimento ao apelo defensivo para redimensionar as penas aplicadas ao réu.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, as eminentes Senhoras Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (Presidente e Revisora) e Des.ª Isabel de Borba Lucas.


Porto Alegre, 31 de agosto de 2022.


DR. FELIPE KEUNECKE DE OLIVEIRA,

Relator.


RELATÓRIO

Dr. Felipe Keunecke de Oliveira (RELATOR)

RODRIGO RAZEIRA DA SILVA, juntamente com AMILTON GALVÃO, ARMINDO CELESTINO GALVÃO, CIBELE PEREIRA LEAL, MAXWELL ROSALINO DOS SANTOS, MARCOS MARTINS, de alcunha ?
MARQUINHOS? ou ?BARRIGA?, ANTÔNIO CARLOS MARTINS, de alcunha ?NENÊ?, ITAMAR CHAVES, CARLOS ALBERTO MUNIZ, MARISA ANTUNES DA SILVA, MÔNICA FONSECA DA COSTA, VINÍCIUS LEAL GALVÃO, FELIPE LEAL GALVÃO, LUANA APARECIDA ESTACIO, SILVÉRIO DE OLIVEIRA NUNES, TATIANE SOARES SILVA, MARCELO DE OLIVEIRA NUNES, foram denunciados pelo Ministério Público pela prática dos seguintes fatos, assim descritos na exordial acusatória:

?
a) AMILTON GALVÃO, ARMINDO CELESTINO GALVÃO, CIBELE PEREIRA LEAL, MAXWELL ROSALINO DOS SANTOS, MARCOS MARTINS, ANTÔNIO CARLOS MARTINS, ITAMAR CHAVES, CARLOS ALBERTO MUNIZ, RODRIGO RAZEIRA DA SILVA, MARISA ANTUNES DA SILVA, MÔNICA FONSECA DA COSTA, VINÍCIUS LEAL GALVÃO, FELIPE LEAL GALVÃO, LUANA APARECIDA ESTACIO e SILVÉRIO DE OLIVEIRA NUNES nas sanções do artigo 171, caput, (46 vezes), do Código Penal, na forma dos artigos 29, caput, e 69, caput, do mesmo diploma legal, e nas sanções do artigo 2º da Lei nº 12.850/2013, incidindo para o denunciado AMILTON a agravante do § 3º do art. 2º da Lei 12.850/2013 e para o denunciado ITAMAR a agravante da reincidência do artigo 61, inciso I, do Código Penal;

b) AMÍLTON GALVÃO nas sanções dos artigos 298 (quatro vezes) e 304 (quatro vezes), ambos do Código Penal, na forma do artigo 69, caput, do mesmo diploma legal;

c) SILVÉRIO DE OLIVEIRA NUNES e TATIANE SOARES SILVA nas sanções do artigo 16, caput, e artigo 16, parágrafo único, inciso IV, ambos da Lei nº 10.826/2003, na forma dos artigos 69, caput, e 29, caput, do Código Penal;

d) SILVÉRIO DE OLIVEIRA NUNES, TATIANE SOARES SILVA e MARCELO DE OLIVEIRA NUNES nas sanções do artigo 288, parágrafo único, do Código Penal;

e) MAXWELL ROSALINO DOS SANTOS nas sanções do artigo 12 da Lei nº 10.826/03 e do artigo 180, caput, do Código Penal, na forma do artigo 69, caput, deste diploma legal; e

f) ARMINDO CELESTINO GALVÃO nas sanções dos artigos 12 e 16, caput, da Lei nº 10.826/03, na forma do artigo 69, caput, do Código Penal.


Narra a denúncia:

DOS ESTELIONATOS:

1º FATO:

No dia 27 de maio de 2015, em horário não apurado nos autos, no estabelecimento comercial ?
Casas Canoense?, situado na Rua Doutor Barcelos, nº 1.501, Centro, em Canoas/RS, os denunciados AMILTON GALVÃO, ARMINDO CELESTINO GALVÃO, CIBELE PEREIRA LEAL, MAXWELL ROSALINO DOS SANTOS, MARCOS MARTINS, ANTÔNIO CARLOS MARTINS, ITAMAR CHAVES, CARLOS ALBERTO MUNIZ, RODRIGO RAZEIRA DA SILVA, MARISA ANTUNES DA SILVA, MÔNICA FONSECA DA COSTA, VINÍCIUS LEAL GALVÃO, FELIPE LEAL GALVÃO, LUANA APARECIDA ESTACIO e SILVÉRIO DE OLIVEIRA NUNES, em comunhão de esforços e conjugação de vontades, obtiveram, para eles, vantagem ilícita, consistente em R$ 9.000,00 (nove mil reais), em prejuízo das vítimas Alexsandro Flores Soares e Sabrina Lemes da Silveira, induzindo e mantendo-as em erro, mediante ardil e meio fraudulento, conforme contrato de fl. 606 e comprovantes de transferência bancária de fl. 607.

2º FATO:

No dia 19 de junho de 2015, em horário não apurado nos autos, no estabelecimento comercial ?
Casas Canoense?, situado na Rua Doutor Barcelos, nº 1.501, Centro, em Canoas/RS, os denunciados AMILTON GALVÃO, ARMINDO CELESTINO GALVÃO, CIBELE PEREIRA LEAL, MAXWELL ROSALINO DOS SANTOS, MARCOS MARTINS, ANTÔNIO CARLOS MARTINS, ITAMAR CHAVES, CARLOS ALBERTO MUNIZ, RODRIGO RAZEIRA DA SILVA, MARISA ANTUNES DA SILVA, MÔNICA FONSECA DA COSTA, VINÍCIUS LEAL GALVÃO, FELIPE LEAL GALVÃO, LUANA APARECIDA ESTACIO e SILVÉRIO DE OLIVEIRA NUNES, em comunhão de esforços e conjugação de vontades, obtiveram, para eles, vantagem ilícita, consistente em R$ 32.450,00 (trinta e dois mil e quatrocentos e cinquenta reais), em prejuízo da vítima Paulo Roberto Scotta, induzindo e mantendo-a em erro, mediante ardil e meio fraudulento, conforme contrato de fl. 625 e comprovantes de débitos na fatura mensal de cartão de crédito de fls. 626/633.

3º FATO:

No dia 19 de agosto de 2015, em horário não apurado nos autos, no estabelecimento comercial ?
Casas Canoense?, situado na Rua Doutor Barcelos, nº 1.501, Centro, em Canoas/RS, os denunciados AMILTON GALVÃO, ARMINDO CELESTINO GALVÃO, CIBELE PEREIRA LEAL, MAXWELL ROSALINO DOS SANTOS, MARCOS MARTINS, ANTÔNIO...

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