Acórdão nº 70084013812 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 29-06-2022
Data de Julgamento | 29 Junho 2022 |
Órgão | Oitava Câmara Criminal |
Classe processual | Apelação |
Número do processo | 70084013812 |
Tribunal de Origem | Tribunal de Justiça do RS |
Tipo de documento | Acórdão |
PODER JUDICIÁRIO
NOP
Nº 70084013812 (Nº CNJ: 0039740-57.2020.8.21.7000)
2020/Crime
APELAÇÃO CRIME. CRIMES DO CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO. HOMICÍDIO CULPOSO NA DIREÇÃO DE VEÍCULO AUTOMOTOR. MÉRITO. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. CONDENAÇÃO MANTIDA.
Comprovadas suficientemente no curso da instrução processual a autoria e materialidade do delito de homicídio culposo na direção de veículo automotor imputado ao apelante. Significativas inconsistências existentes entre as declarações prestadas pelo réu durante a persecução penal, referendadas por robusta prova documental, são subsídios que se sobrepõem à tese de insuficiência probatória sustentada pela defesa.
Elemento subjetivo culpa caracterizado pela imprudência do agente, que deixou de observar dever objetivo de cuidado indispensável à segurança viária, causando o acidente. Inteligência dos artigos 28 e 34 do Código de Trânsito Brasileiro. Culpa exclusiva da vítima indemonstrada. Manutenção do decreto condenatório.
PRIVATIVA DE LIBERDADE e regime inicial de cumprimento de pena INALTERADos. SUBSTITUIÇÃO POR DUAS RESTRITIVAS DE DIREITOS MANTIDA. prestação pecuniária e período de suspensão do direito de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor arrefecidos.
RECURSO DEFENSIVO parcialmente PROVIDO.
Apelação Crime
Oitava Câmara Criminal
Nº 70084013812 (Nº CNJ: 0039740-57.2020.8.21.7000)
Comarca de Porto Alegre
RICARDO VARGAS LOPES
APELANTE
MINISTERIO PUBLICO
APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao apelo defensivo, ao efeito de reduzir a restritiva de direitos consistente em prestação pecuniária para 02 (dois) salários mínimos e o período de suspensão ou proibição de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo para 02 (dois) anos e 08 (oito) meses, mantidas as demais disposições da sentença.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores Des.ª Fabianne Breton Baisch e Des. Leandro Figueira Martins.
Porto Alegre, 29 de junho de 2022.
DES.ª NAELE OCHOA PIAZZETA,
Relatora.
RELATÓRIO
Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (RELATORA)
O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra RICARDO VARGAS LOPES, nascido em 20-11-1963, com 49 (quarenta e nove) anos de idade à época dos fatos, dando-o como incurso nas sanções do artigo 302, § 1º, inciso III, do Código de Trânsito Brasileiro, pelo fato assim narrado na peça acusatória:
?[...]
No dia 10 de junho de 2013, por volta das 11h34min, na Av. Icaraí, próximo ao n.° 1526, Bairro Cristal, nesta Capital, o denunciado RICARDO VARGAS LOPES, na direção do veículo Fiat/Palio Adventure, cor prata, placa IMC1386, matou, culposamente, a vítima Vitor do Nascimento Crispim, atropelando-a e produzindo-lhe, em consequência, as lesões somáticas descritas no auto de necropsia1, que atesta como causa da morte ?hemorragia intracraniana e toraco abdominal por politraumatismo?.
Na ocasião, o denunciado conduzia o veículo supramencionado pela referida via, sentido centro-bairro, em velocidade elevada, quando atropelou o pedestre, que atravessava a via da esquerda para a direita. Com o choque, a vítima sofreu graves lesões, que a levaram a óbito instantaneamente. Ato contínuo, o denunciado evadiu-se do local, sem prestar socorro à vítima.
O denunciado foi imprudente e negligente, porquanto desenvolvia velocidade excessiva e incompatível com as condições do local, que possui intenso fluxo de veículo e pedestres, além de trafegar de maneira desatenta, sem os cuidados e cautelas exigidas, não percebendo a presença da vítima.
Foi também imperito, pois não logrou êxito em efetuar manobra que evitasse ou minorasse as consequências do resultado trágico.
[...]?.
Denúncia recebida em 22-06-2015 (fl. 120).
Citado por edital (fls. 147-148v), foi determinada a suspensão do processo e do curso do prazo prescricional, na forma do artigo 366 do Código de Processo Penal (fl. 149).
Citado pessoalmente (fl. 168 ? 13.12-2018), apresentou resposta à acusação por meio de defensor constituído (fls. 171-174).
Não havendo hipótese ensejadora de absolvição sumária, nos termos do artigo 397 do Código de Processo Penal, foi determinado o prosseguimento do feito (fl. 180).
Durante a instrução, foram inquiridas 05 (cinco) testemunhas e interrogado o réu (fls. 196-198 e 216-218).
A defesa apresentou quesitos aos peritos (fls. 205-207v), sendo acostado laudo complementar (fls. 210-213).
Apresentados memoriais pelo Ministério Público (fls. 226-231 e 263) e pela defesa (fls. 265-276).
A defesa peticionou (fls. 234-236), juntando parecer efetuado por seu assistente técnico (fls. 237-261).
Sobreveio sentença (fls. 271-278), publicada em 19-12-2019 (fl. 279), julgando procedente a pretensão punitiva, para condenar o acusado como incurso nas sanções do artigo 302, § 1°, inciso III, do Código de Trânsito Brasileiro, à privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestações pecuniária no valor de 05 (cinco) salários mínimos e de serviços à comunidade, bem como à suspensão ou proibição de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor por 03 (três) anos
. Custas por ele suportadas e deferido o direito de recorrer em liberdade.
Intimado da sentença pessoalmente (fls. 297), interpôs recurso de apelação (fl. 283).
Em suas razões, postula a absolvição por insuficiência probatória nos termos do artigo 386, incisos IV, V ou VII, do Código de Processo Penal. Sustentar que não era o réu a conduzir o veículo por ocasião do sinistro, visto que o automóvel estava emprestado a uma mulher. Tece considerações sobre o parecer técnico acostado ao feito, indicando impropriedades no laudo elaborado pelo Instituto-Geral de Perícias. Refere, por fim, que a vítima se encontrava sob efeito de substânticas entorpecentes, atravessando a via de inopino, sem perceber a presença do veículo que lhe atropelou, evidenciada sua culpa exclusiva. (fls. 303-319).
Recebida (fl. 284) e contrariada a inconformidade (fls. 321-328), vieram os autos a esta Corte, manifestando-se o ilustre Procurador de Justiça, Roberto Divino Rolim Neumann, desprovimento do recurso defensivo (fls. 331-336v).
Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, tendo sido atendido o disposto no art. 609 do Código de Processo Penal, bem como o art. 207, II, do RITJERGS.
Conclusos para julgamento.
Breve relato.
VOTOS
Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (RELATORA)
Trata-se de recurso de apelação interposto por defensor constituído em favor de RICARDO VARGAS LOPES contra condenação pela prática do crime de homicídio culposo na direção de veículo automotor, à privativa de liberdade de 02 (dois) anos e 08 (oito) meses de detenção, em regime inicial aberto, substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestações pecuniária no valor de 05 (cinco) salários mínimos e de serviços à comunidade, e à suspensão ou proibição de obter permissão ou habilitação para dirigir veículo automotor pelo mesmo período da corporal.
Em suas razões, postula a absolvição por insuficiência probatória nos termos do artigo 386, incisos IV, V ou VII, do Código de Processo Penal. Sustenta que não era o réu a conduzir o veículo por ocasião do sinistro, visto que o automóvel estava emprestado a uma mulher. Tece considerações sobre o parecer técnico acostado ao feito, indicando impropriedades no laudo elaborado pelo Instituto-Geral de Perícias. Refere, por fim, que a vítima se encontrava sob efeito de substânticas entorpecentes, atravessando a via de inopino, sem perceber a presença do veículo que lhe atropelou, evidenciada sua culpa exclusiva.
Não colhe.
A materialidade e a autoria do fato vieram demonstradas por meio do registro de ocorrência policial (fls. 09-10), autos de apreensão (fls. 16-18) e necropsia (fls 54-55), imagens captadas por câmera da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC) (fls. 43-44), laudo pericial nº 76.969/2013 (fls. 58-89), bem como pela prova oral colhida, esta devidamente sintetizada pela julgadora singular, Dra. Keila Lisiane Kloeckner Catta-Preta, ao que transcrevo o respectivo trecho da sentença a fim de evitar desnecessária repetição:
A testemunha Cristofer Silveira da Silva, em seu depoimento de fls. 196/198, declarou que trabalhava na seguradora Porto Seguro, como motorista do guincho, quando lhe enviaram para buscar o veículo do réu. Quando chegou ao local, viu o réu limpando o parabrisa, o qual lhe disse que passou por uma construção e atiraram um tijolo no carro. Não lembra para onde deveria levar o veículo, mas o levou até o palácio da polícia pois, durante o transporte, foi abordado por um policial que solicitou que o acompanhasse até o palácio. Foi abordado próximo ao meio-dia. O policial comentou algo sobre um acidente de trânsito, em local bem próximo de onde passou. Após os policiais tirarem o carro do guincho, não mais teve contato com o caso.
O policial militar Elissandro Calebe dos Santos Fernandez, ouvido em juízo (fls. 196/198), declarou que não recorda detalhes mas ratifica tudo que informou na ocorrência. No local do fato existe semáforo, faixa de pedestres e câmera da EPTC. Não confeccionou o boletim de fls. 09/10, que se trata de formulário da polícia civil, ressaltando que a letra não é sua e que seu nome foi escrito com a grafia errada.
O Delegado de Polícia João Cesar Nazário, em seu depoimento judicial (fls. 216/218), disse que não sabe quem colocou a afirmação ?motorista mulher? no documento de fls. 09/10. Fez o ?local de crime? mas não presidiu o inquérito. Foi atender um homicídio de trânsito na Av. Icaraí e chegando lá lhe chamou a atenção um parachoque de Palio Weekend atirado no chão, sendo que tal peça combinava com um...
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