Acórdão nº 70084519172 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Oitava Câmara Criminal, 17-02-2023

Data de Julgamento17 Fevereiro 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo70084519172
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO


NOP

Nº 70084519172 (Nº CNJ: 0090276-72.2020.8.21.7000)

2020/Crime


APELAÇÃO CRIME.
CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. RECEPTAÇÃO DOLOSA. PRELIMINAR. CONTINUIDADE DELITIVA. RECONHECIMENTO. INVIABILIDADE. HABITUALIDADE CRIMINOSA.
Reconhecimento da habitualidade criminosa que afasta a incidência do benefício do crime continuado.
Preliminar defensiva rechaçada.
MATERIALIDADE E AUTORIA DEMONSTRADAS.
CONDENAÇÃO MANTIDA. PLEITO DESCLASSIFICATÓRIO DESACOLHIDO.

Elementos de convicção constantes dos autos que revelam a existência material e a autoria do delito de receptação dolosa narrado na incoativa.
Conhecimento pelos acusados acerca da origem ilícita dos animais silvestres receptados demonstrado a partir das circunstâncias que revestem o fato, bem como pelos indícios e dados que compõem o acervo probante. Adoção do sistema do livre convencimento motivado e da persuasão racional que afasta a hierarquia e a prévia tarifação dos meios de prova. Impossibilidade de desclassificação do delito para a forma culposa.
ATIPICIDADE DA CONDUTA.
PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA. INAPLICABILIDADE.

O princípio da insignificância visa a afastar a tipicidade material de delitos que não atingem de modo socialmente relevante bens protegidos pelo ordenamento jurídico.
Para o seu reconhecimento, exigível que o fato seja de mínima ofensividade e desprovido de periculosidade social, que possua reduzido grau de reprovabilidade e que a lesão provocada seja manifestamente inexpressiva. Circunstâncias do caso em concreto que impedem a consideração da conduta como insignificante, avaliadas as 16 aves aprendidas em valor que supera o dobro do salário-mínimo da época do fato.
PRIVILEGIADORA. RECONHECIMENTO. IMPOSSIBILIDADE.

Para o reconhecimento da privilegiadora prevista no §5º do artigo 180 do Código Penal necessário que o réu seja primário e que o bem seja avaliado em quantia inferior ao salário-mínimo vigente ao tempo fato.
Ausência dos requisitos autorizadores no caso concreto.
DOSIMETRIA. PRIVATIVAs de liberdade redimensionadas. PECUNIÁRIA arrefecida para a segunda ré. SUBSTITUIÇÃO POR RESTRITIVA DE DIREITOS inviabilizada. exigibilidade das custas processuais suspensa. MATÉRIA PREQUESTIONADA.

REJEITADA A PRELIMINAR DEFENSIVA E, NO MÉRITO, desprovido o apelo ministerial e parcialmente provido o recurso defensivo.

Apelação Crime


Oitava Câmara Criminal

Nº 70084519172 (Nº CNJ: 0090276-72.2020.8.21.7000)


Comarca de Lagoa Vermelha

MINISTÉRIO PUBLICO


APELANTE/APELADO

CÉSAR ADELINO MALAQUIA PEDROSO


APELANTE/APELADO

FLAVIANE DE GRAAW PEREIRA


APELANTE/APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam as Desembargadoras integrantes da Oitava Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em rejeitar a preliminar suscitada e, no mérito, negar provimento ao apelo ministerial e dar parcial provimento ao recurso defensivo ao efeito de redimensionar as penas de César Adelino Malaquia Pedroso para 03 anos e 06 meses de reclusão, e de Flaviane de Graaw Pereira para 02 anos e 06 meses de reclusão e 15 dias-multa, inalteradas as demais disposições sentenciais e suspensa a exigibilidade das custas processuais.


Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), as eminentes Senhoras Des.ª Fabianne Breton Baisch e Des.ª Isabel de Borba Lucas.


Porto Alegre, 17 de fevereiro de 2023.


DES.ª NAELE OCHOA PIAZZETA,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (RELATORA)

O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra CÉSAR ADELINO MALAQUIA PEDROSO, nascido em 20-10-1981 (fl. 44), com 30 anos de idade, dando-o como incurso nas sanções do artigo 180, caput, combinado com os artigos 29, caput, e 61, inciso I, todos do Código Penal, e contra FLAVIANE DE GRAAW PEREIRA, nascida em 27-8-1981 (fl. 46), com 30 anos de idade, dando-a como incursa nas sanções do artigo 180, caput, combinado com o artigo 29, caput, ambos do Estatuto Repressivo, pelo fato assim narrado na peça acusatória:

?
[...]

Em data e horários não-precisados no Inquérito Policial, mas entre os dias 15 de abril e 22 de junho de 2012, na Rua Algemiro Pacheco, 76, Bairro Suzana, nesta Cidade, os denunciados, em comunhão de esforços e acordo de vontades, receberam, em proveito próprio, 16 calopsitas, avaliadas em R$ 1.280,00 (mil e duzentos e oitenta reais), pertencentes à vítima Idiomar Antônio Deggerone, objetos que sabiam ser oriundos de crime ?
Autos de Busca e Apreensão das fls. 13/20-B e de Avaliação Indireta da fl. 33.
Para tanto, os denunciados, adredemente acordados entre si, receberam as aves acima descritas como forma de pagamento pelas substâncias entorpecentes que comercializavam ilicitamente, sendo ciente da origem delituosa na medida em que os animais eram exatamente subtraídos por usuários a fim de poderem ter valores suficientes para aquisição de entorpecentes.

As aves foram restituídas à vítima (Termo de Depósito da fl. 22)
O acusado César é reincidente (certidão de antecedentes judiciais das fls.
47 e seguintes).
[...]?.

Denúncia recebida em 10-11-2014 (fl. 106).


Citados pessoalmente (fls.
115 e 131), apresentaram resposta à acusação por intermédio da Defensoria Pública sem rol de testemunhas (fls. 132-134).

Não havendo hipótese ensejadora de absolvição sumária, nos termos do artigo 397 do Código de Processo Penal, foi determinado o prosseguimento do feito (fls.
135-v).

Durante a instrução, foram colhidas as declarações da vítima, inquiridas 04 testemunhas e interrogados os réus (CD da fl. 178).


Apresentados memoriais pelo Ministério Público (fls.
248-252v) e pela defesa (fls. 255-260v).

Atualizados os antecedentes criminais (fls.
229-243v e 244-247).

Sobreveio sentença (fls.
261-274), publicada em 01-11-2019 (primeiro ato subsequente - fl. 274v), julgando procedente a pretensão punitiva para condenar os réus CÉSAR e FLAVIANE como incursos nas sanções do artigo 180, caput, combinado com o artigo 61, inciso I, ambos do Código Penal, às penas, ao primeiro, de 04 anos de reclusão no regime inicial semiaberto e, à segunda, de 03 anos de reclusão no regime inicial aberto, cumuladas com 20 dias-multa à razão unitária mínima
, custas por eles suportadas e deferido o direito de recorrerem em liberdade.

Intimados da sentença pessoalmente (fls.
289-v e 319-v), interpuseram recurso de apelação (fl. 280).
Em razões apresentadas pela DEFENSORIA PÚBLICA suscitam, preliminarmente, seja reconhecida a continuidade delitiva entre o fato ora analisado e os delitos de receptação apurados nos autos do processo-crime nº 057/2.12.0001147-7.
No mérito, a absolvição por insuficiência probatória quanto ao dolo exigido pelo tipo previsto no artigo 180 do Estatuto Repressivo, questionando a validade dos relatos reunidos em pretório, alternativamente alegando atipicidade da conduta em atenção ao princípio da insignificância. Modo subsidiário, a desclassificação para o delito em sua forma culposa e o reconhecimento da privilegiadora em razão de ínfimo o valor do bem receptado, o qual foi restituído à vítima, que não teve prejuízo. Mantidas as condenações, a redução das penas-base ao piso normativo ou o distanciamento arbitrado na fração de 1/8 (um oitavo), tangente à reincidência o emprego da fração de 1/6 (um sexto) para agravamento, ao final substituídas as privativas de liberdade por restritivas de direito, reduzidas as multas ao menor patamar possível e prequestionada a matéria (fls. 296-307).
O MINISTÉRIO PÚBLICO interpôs recurso de apelação (fl. 275).
Em razões, requer o aumento da pena-base aplicada ao réu CÉSAR, para que seja valorada negativamente a moduladora atinente à conduta social, prequestionando a matéria (fls. 275v-279).

Recebidas (fl. 292) e contrariadas as inconformidades (fls.
293-295 e 308-317), vieram os autos a esta Corte, manifestando-se a ilustre Procuradora de Justiça, Maria Cristina Cardoso Moreira de Oliveira, pela rejeição da preliminar arguida e, no mérito, pelo desprovimento do recurso defensivo e pelo provimento do apelo ministerial (fls. 322-327).
Esta Câmara Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRS, tendo sido atendido o disposto no art. 609 do Código de Processo Penal, bem como o art. 207, II, do RITJERGS.


Conclusos para julgamento.

Breve relato.
VOTOS

Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (RELATORA)

Trata-se de recursos de apelação interpostos pelo MINISTÉRIO PÚBLICO e pela DEFENSORIA PÚBLICA no qual se insurgem da condenação de CÉSAR ADELINO MALAQUIA PEDROSO e FLAVIANE DE GRAAW PEREIRA em razão da prática do crime de receptação às penas, respectivamente, de 04 anos de reclusão no regime inicial semiaberto e de 03 anos de reclusão no regime inicial aberto, cumuladas com 20 dias-multa à razão unitária mínima.


Há duplo apelo.

O MINISTÉRIO PÚBLICO requer o recrudescimento da pena-base cominada ao corréu CÉSAR, valorando-se negativamente a moduladora atinente à conduta social, ao final prequestionando a matéria (fls.
275v-279).
Já a DEFENSORIA PÚBLICA suscita, preliminarmente, seja reconhecida a continuidade delitiva entre o fato ora analisado e os delitos de receptação apurados nos autos do processo-crime nº 057/2.12.0001147-7.
No mérito, a absolvição por insuficiência probatória quanto ao dolo exigido pelo tipo previsto no artigo 180 do Estatuto Repressivo, questionando a validade dos relatos reunidos em pretório, alternativamente alegando atipicidade da conduta em atenção ao princípio da insignificância. Modo subsidiário, a desclassificação para o delito em sua forma culposa e o reconhecimento da privilegiadora em razão de ínfimo o valor do bem receptado, o qual foi restituído à vítima, que não teve prejuízo. Mantidas as condenações, a redução das penas-base ao piso normativo ou o distanciamento arbitrado na fração de 1/8 (um oitavo), tangente à reincidência o emprego da fração de 1/6 (um sexto) para agravamento, ao final substituídas as privativas de liberdade por restritivas de direito, reduzidas as...

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