Acórdão nº 70084614692 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarta Câmara Criminal, 23-02-2022

Data de Julgamento23 Fevereiro 2022
ÓrgãoQuarta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo70084614692
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO


JCF

Nº 70084614692 (Nº CNJ: 0099828-61.2020.8.21.7000)

2020/Crime


aPELAÇÃO CRIMINAL.
peculato. art. 312, §1º, do CP. PROVAS DE MATERIALIDADE E AUTORIA. condenação mantida. pena reduzida. menoridade. extinção da punibilidade pela prescrição.

1. A partir das provas produzidas, não houve dúvida de que o acusado, valendo-se da facilidade que lhe proporcionava a condição de estagiário pela FDRH junto à Polícia Civil, assim considerado funcionário público por equiparação (art. 327, § 1º, do Código Penal), subtraiu bens integrantes do patrimônio da Polícia Civil-DENARC. Dolo evidenciado. Condenação mantida.

2. Compete ao Juízo da origem definir a pena adequada ao caso, comportando alteração, em grau de recurso, apenas em situações em que se constatar fundamentação deficiente ou viciada, contrariedade à lei ou preceito constitucional, ou desproporcionalidade no quantum aplicado. Consequências do crime inerentes à espécie. Pena reduzida.

3. Diante da redução operada, imperioso o reconhecimento da extinção da punibilidade pela prescrição. Prazo prescricional reduzido em metade em face da menoridade do réu. Prazo prescricional de 02 anos transcorrido entre o recebimento da denúncia (22/08/2017) e a publicação da sentença condenatória (06/03/2020). Artigos 107, inc. IV, 110, §1º, 109, inc. V, e 115, todos do CP.
APELAÇÃO PARCIALMENTE PROVIDA.

PRESCRIÇÃO DECLARADA.

Apelação Crime


Quarta Câmara Criminal

Nº 70084614692 (Nº CNJ: 0099828-61.2020.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

DOUGLAS DA SILVA SILVEIRA


APELANTE

MINISTERIO PUBLICO


APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Quarta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso para reduzir a pena a 02 anos de reclusão, mantidas as demais disposições da sentença, reconhecendo, por fim, a extinção da punibilidade pela prescrição da pretensão punitiva retroativa, com fulcro nos arts.
107, inc. IV, 110, §1º, 109, inc. V, e 115, todos do CP.
Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
Aristides Pedroso de Albuquerque Neto (Presidente e Revisor) e Des. Newton Brasil de Leão.

Porto Alegre, 23 de fevereiro de 2022.


DES. JULIO CESAR FINGER,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Julio Cesar Finger (RELATOR)

O Ministério Público ofereceu denúncia contra DOUGLAS DA SILVA SILVEIRA, já qualificado, como incurso nas sanções do art. 312, § 1º, c/c art. 71, caput, e art. 327, § 1º, todos do Código Penal, em razão da prática do seguinte fato relatado na denúncia:

FATOS DELITUOSOS:

PECULATOS-FURTO EM CONTINUIDADE DELITIVA

Entre data inicial não referida, mas entre os meses de março a junho de 2017, na Avenida Presidente Franklin Roosevelt, 88, Navegantes, nesta Capital, o denunciado DOUGLAS DA SILVA SILVEIRA, valendo-se da facilidade que lhe proporcionava a condição de estagiário pela FUNDAÇÃO PARA DESENVOLVIMENTO DE RECURSOS HUMANOS ?
FDRH, designado para exercer função de auxiliar de arquivo, protocolo, digitação e atendimento telefônico no Departamento Estadual do Narcotráfico (DENARC), sendo assim considerado funcionário público por equiparação (art. 327, § 1º, do Código Penal), subtraiu para si ou para outrem, as seguintes coisas móveis integrantes do patrimônio da Polícia Civil-DENARC, das quais não tinha a posse anterior:
- 01 pistola Taurus Pt 380, numeração KWE67189, sem carregador; - 27 cartuchos calibre .40; - 02 cartuchos calibre 9mm; - 01 teclado para tablet; - 01 GPS marca BOOSTER; - 02 calças táticas de cor preta; - 01 jaqueta com a inscrição da Polícia Civil; - 01 colete identificador com a inscrição da Polícia Civil; - 01 banner do DENARC; - 01 banner com inscrição da Polícia Civil ?
1.ª DIN; - 01 banner com inscrição da Polícia Civil ? DENARC; - 09 camisetas brancas com inscrição da Polícia Civil; - 01 camiseta preta com inscrição da Polícia Civil; - 01 camiseta preta com inscrição da Polícia Civil ? DEIC; - 13 medalhas da Polícia Civil ? DENARC; - Diversos documentos sigilosos; - 01 notebook Lenovo ? ID 274338P; - 01 notebook HP ? IMEI 980052000086749; - 20 logotipos da Polícia Civil ? DENARC; - 01 bandeira pequena, de mesa; - 06 etiquetas adesivas relativas a convênio com o Ministério da Justiça; - 01 simulacro de revólver de plástico; - 01 máquina fotográfica, marca Sony, com bolsa; - 01 tablet Tb 7700, com capa de borracha; - 01 tablet Tb 11; - 01 tablet Gênesis; - 01 GPS Carmim; - 01 tablet Gênesis Gt 7204; - 01 máquina fotográfica Sony; - 01 par de algemas; - 01 insígnia da Polícia Civil; - 02 retroprojetores Nec com um controle remoto; - 01 placa comemorativa do DENARC; - 02 rádios comunicadores Motorola, com base; - 01 rádio comunicador Motorola Ep 450, com base e carregador; - 01 colete balístico, série KEV1300143; - 02 luminárias Bescor; - 01 bandeira da Polícia Civil; - 01 filmadora HD Max; - 01 par de placas veiculares IUQ-7331; - 01 pen drive; - 01 porta documentos da Polícia Civil.
Os sucessivos peculatos-furtos chegaram ao conhecimento da Autoridade Policial através do site de vendas online OLX, no qual o denunciado ofertava os produtos subtraídos da Corporação (fls.
46/54).

No dia 05 de junho de 2017, na Rua Dona Josefina, 403, Sapucaia do Sul, endereço onde reside o denunciado e seus pais, esta franqueou o acesso dos policiais civis ao seu domicílio, onde, no quarto do denunciado, foram apreendidas as coisas acima descritas, conforme consta no auto de apreensão das fls.
14/15, nas fotografias das fls. 36/43 e na mídia digital juntada à fl. 44.

O denunciado foi preso em flagrante (fls.
58/60), mas lhe foi concedida a liberdade provisória sob a condição de apresentar-se bimensalmente em Cartório para comprovar as suas atividades (fl. 72).

As coisas foram avaliadas diretamente em R$ 25.051,35 (autos de avaliação direta das fls.
81/89), tendo sido restituídas ao órgão policial vítima (auto de restituição das fls. 132/133).
A denúncia foi recebida em 22/08/2017 (fl. 137)

Após regular instrução, sobreveio sentença (fls.
288/296), publicada em 06/03/2020 (fl. 297), que condenou o réu pela prática do crime do art. 312, §1º, c/c art. 327, §1º, ambos do CP, à pena de 02 anos e 06 meses de reclusão, em regime aberto, mais pagamento de 20 dias-multa à razão de 1/30 do salário mínimo vigente à época do fato. A pena privativa de liberdade foi substituída por duas restritivas de direitos, consistentes em prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária no valor de dez salários-mínimos.

A defesa apelou à fl. 305 e, nas razões (fls.
336/338), sustenta não ter restado comprovado o dolo na conduta do acusado de vender ou desviar para terceiros os materiais de propriedade do DENARC. Subsidiariamente, pugna pela redução da pena-base ao mínimo legal.

O Ministério Público apresentou contrarrazões nas fls.
339/342.
A Procuradoria de Justiça lançou parecer nas fls.
346/352, opinando pelo parcial provimento do recurso, apenas para reduzir a pena fixada.
É o relatório.

VOTOS

Des. Julio Cesar Finger (RELATOR)

I. Admissibilidade

O recurso preencheu os requisitos para a admissibilidade, pelo que vai conhecido.


II. Mérito

O Ministério Público imputa ao réu a prática do crime de peculato, sustentando que ele, na condição de estagiário do DENARC ?
e valendo-se da facilidade que lhe proporcionava essa condição ?, subtraiu objetos pertencentes ao órgão.

A materialidade do crime foi comprovada pela comunicação de ocorrência (fls.
09/13); auto de apreensão (fls. 14/15); fotografias (fls. 36/43); imagens da diligência na residência do acusado (DVD da fl. 44); anúncios de venda dos objetos subtraídos da Delegacia de Polícia (fls. 46/54), e pela prova oral colhida.

Não há dúvida, tampouco, a respeito da autoria, como se vê dos elementos colhidos na instrução, bem destacados pela decisão atacada, de lavra da Dra.
Jocelaine Teixeira, que passo a transcrever:

(...)

O informante EZAIR (mídia da fl. 197), pai do acusado, disse que soube dos fatos apenas quando os policiais foram até sua casa.
Que seu filho estudava pela manhã e trabalhava no DENARC das 13h40min às 18h. O informante trabalhava à noite e não via o filho chegar em casa. O acusado trabalhou por dois anos no DENARC, de onde nunca recebeu reclamações do filho, somente elogios. A polícia fez buscas no quarto do acusado, onde apreendeu os objetos, que viu no local durante a operação de busca e apreensão. O notebook Samsung e a CPU apreendidos são seus, bens dos quais perdeu a nota fiscal, mas que não funcionam, razão pela qual não tem interesse na restituição. O acusado não sabia atirar com arma de fogo e não é violento, dizendo trata-se de excelente filho, sem problemas na escola. Havia visto medalhas da polícia, que o acusado dizia que ganhava em torneios de futebol. O filho sempre dizia que queria ser policial. Lembra que lhe foram mostrados pelos policiais, na apreensão, um tablete, uma pistola sem o carregador, projéteis, banner, camiseta, colete à prova de bala. O acusado admitiu o erro e disse que levava os objetos para se sentir como policial.
A informante FABIANA (mídia da fl. 197), mãe do acusado, disse que também não viu o filho levar os bens públicos para casa, exceto uma pequena bandeira e medalhas de jogos de futebol.
O filho sempre foi tranquilo, e sem reclamações da escola. O acusado somente sai de casa apenas para ir trabalhar e para faculdade. Levava o acusado para o trabalho em casa de família, onde ele nunca mexeu em nada. O acusado não é agressivo ou violento. O filho cursa Direito e que tem sonho de ser policial.

A policial civil BRUNA (mídia da fl. 215) disse que o acusado era estagiário da secretaria ou da DINARC do DENARC, mas não sabe das atribuições específicas.
Tinha contato com o acusado quando entregava correspondências no setor que ele trabalhava. Deram falta de uma máquina fotográfica profissional. Há uma sala fechada com armário...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT