Acórdão nº 70084633858 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Criminal, 28-01-2021

Data de Julgamento28 Janeiro 2021
ÓrgãoPrimeira Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo70084633858
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO


MJML

Nº 70084633858 (Nº CNJ: 0101744-33.2020.8.21.7000)

2020/Crime


APELAÇÃO CRIME.
TRÁFICO DE DROGAS. CONDENAÇÃO. APELO DEFENSIVO. PRELIMINAR QUE SE CONFUNDE COM O MÉRITO. MANUTENÇÃO DO JUÍZO CONDENATÓRIO.

Quanto à preliminar, não faz sentido a alegação de ofensa ao princípio da inviolabilidade do domicílio quando a abordagem inicial, momento em que localizado entorpecente com o denunciado, se deu em via pública.
Ademais, inviável falar-se em insuficiência de provas ou desclassificação para uso próprio quando o réu é detido na posse de vultosa quantidade de droga, incompatível com tal alegação, e um usuário aponta ter adquirido entorpecente dele.
Apelo improvido.

Apelação Crime


Primeira Câmara Criminal

Nº 70084633858 (Nº CNJ: 0101744-33.2020.8.21.7000)


Comarca de Canoas

CARLOS ALBERTO RODRIGUES


APELANTE

MINISTERIO PUBLICO


APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Magistrados integrantes da Primeira Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
Honório Gonçalves da Silva Neto e Dra. Andréia Nebenzahl de Oliveira.

Porto Alegre, 28 de janeiro de 2021.


DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Manuel José Martinez Lucas (RELATOR)

Na Comarca de Canoas, CARLOS ALBERTO RODRIGUES, 29 anos à época dos fatos, foi denunciado como incurso nas sanções do art. 33, caput da Lei nº 11.343/06.


A peça acusatória, recebida em 22/11/2016, foi do seguinte teor:

?
No dia 04 de novembro de 2015, por volta das 19h40min, na Rua João Paulo I, 31, bairro Harmonia, em Canoas/RS, o denunciado CARLOS ALBERTO RODRIGUES trazia consigo, para fins de traficância, 29 (vinte e nove) pedras de cocaína, processadas na forma de crack, pesando aproximadamente 4,15 gramas (cf. auto de apreensão da fl. 18 do IP), além de efetivamente ter vendido, e, ainda, guardava, também para fins de traficância, 01 pedra grande de cocaína, processada na forma de crack, pesando aproximadamente 27,50 gramas, substancias entorpecentes que causam dependência física e psíquica, de uso proscrito no Brasil, segundo Portaria n.º 344/98 da SVS/MS (cf. laudo de constatação da fl. 22 do IP), sem autorização e em desacordo com determinação legal e regulamentar.

Na oportunidade, policiais civis, ao averiguarem uma denúncia anônima de tráfico nas proximidades da escola João Paulo I, avistaram dois indivíduos em atitudes suspeitas.
Abordados, os indivíduos foram identificados como o denunciado Carlos Alberto Rodrigues e a testemunha Luiz Carlos do Amaral Silveira.

Em revista pessoal, os policiais encontram com o denunciado Carlos Alberto uma embalagem plástica contendo 29 pedras de crack, além de celular e a quantia de R$ 74,00 (setenta e quatro reais), em notas de diversos valores.
Luiz Carlos do Amaral Silveira, por sua vez, foi flagrado com uma porção de crack e relatou aos policiais que havia comprado-a do denunciado Carlos Alberto.

Na sequência, os policiais se deslocaram até a residência do denunciado, e, em revista ao local, encontraram, no quarto de denunciado, uma pedra grande de crack, pesando aproximadamente 27,50 gramas, além de apetrechos para separação das drogas, tais como, 01 (uma) balança de precisão, 01 (uma) faca e 01 (uma) vela, que estavam acondicionadas dentro de uma pasta pequena de coura.


A droga e os demais objetos foram apreendidos (fl. ??
07 do IP), sendo as primeiras encaminhadas à perícia preliminar (fl. 22 do IP), a qual constou se tratar efetivamente de crack, substância proscrita que geram dependência física e psíquica.

A apreensão se deu nas imediações da Escola Municipal João Paulo I.?


Processado o feito, sobreveio sentença de fls.
182/213, prolatada em 03/10/2019, julgando procedente a ação penal para CONDENAR o réu CARLOS ALBERTO RODRIGUES como incurso nas sanções do art. 33, § 4º da Lei n.º 11.343/06, à pena de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão, em regime inicial aberto, e ao pagamento de 500 (quinhentos) dias-multa, à razão de 1/30 do salário mínimo vigente ao tempo do fato. Presentes os requisitos do art. 44 do Código Penal, foi concedida ao réu a substituição da reprimenda privativa de liberdade por duas restritivas de direitos, consistentes em: a) prestação de serviços à comunidade; e b) prestação pecuniária, no valor de 01 (um) salário mínimo.

Irresignada, a Defesa interpôs recurso de apelação (fl. 215).
Em suas razões (fls. 217/223), suscitou, preliminarmente, a ilegalidade da prisão em flagrante do acusado. Quanto ao mérito, requereu a absolvição do apelante por insuficiência probatória. De forma subsidiária, postulou a desclassificação do delito para a conduta prevista no art. 28 da Lei de Tóxicos, bem como a isenção da pena de multa ou sua redução ao mínimo legal.

Foram apresentadas contrarrazões pelo Ministério Público às fls.
224/230.

Vieram os autos a este Tribunal.


Nesta instância, o parecer do Procurador de Justiça Dr. Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa foi pela rejeição da preliminar e, no mérito, pelo improvimento do recurso interposto.


Esta Câmara adotou o procedimento informatizado, tendo sido observado o disposto no art. 613, inciso I do Código de Processo Penal.


É o relatório.
FSA
VOTOS

Des. Manuel José Martinez Lucas (RELATOR)

O recurso é tempestivo e preenche os demais pressupostos de admissibilidade, daí por que é conhecido.


E, porque adequadamente o examinou, de forma idêntica à que eu apreciaria, assim como a fim de evitar inútil tautologia e em homenagem ao seu trabalho, adoto como razões de decidir os fundamentos do parecer do ilustre Procurador de Justiça que oficiou no feito, Dr. Luiz Henrique Barbosa Lima Faria Corrêa, que passo a transcrever parcialmente, a título ilustrativo:

?
(...) 3. Preliminarmente, no tocante à sustentada ilegalidade prisão em flagrante do apelante, diversamente do que sustenta a Defesa, não houve qualquer ilegalidade na forma como procedida a busca na residência e na prisão do réu, uma vez que o delito de tráfico de entorpecentes é permanente, o que gera constante estado de flagrância, sendo desnecessária a expedição de mandado de busca e apreensão para realização de buscas, nos termos do artigo 5º, inciso XI, da CF/88, bem como nos termos da remansosa jurisprudência:

CRIMINAL.
HABEAS COUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. APREENSÃO REALIZADA PELA POLÍCIA MILITAR.

NULIDADE NÃO EVIDENCIADA.
MANDADOS DE BUSCA E APREENSÃO REQUISITADOS PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. LEGITIMIDADE. DROGA DEPOSITADA NA RESIDÊNCIA DO PACIENTE. ESTADO FLAGRANCIAL CONFIGURADO. CRIME PERMANENTE. LIBERDADE PROVISÓRIA. GRAVIDADE DO DELITO. SUPOSIÇÕES ABSTRATAS. AUSÊNCIA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA. ARTIGO 44 DA LEI 11.343/2006. INCONSTITUCIONALIDADE DO ÓBICE DECLARADA PELO PLENÁRIO DO STF. ORDEM CONCEDIDA.

I. Hipótese na qual policiais militares, durante o cumprimento de mandado de busca e apreensão na residência de corréu, foram por ele informados que o ora paciente seria o fornecedor das drogas apreendidas e, em seguida, dirigiram-se à sua casa, onde foi localizada quantidade expressiva de entorpecentes, além de uma balança de precisão.


II. Tratando-se de crime permanente, torna-se despicienda a expedição de mandado de busca e apreensão, sendo lícito ao policial militar ingressar na residência do agente, a qualquer hora do dia ou da noite, a fim de fazer cessar a prática criminosa e apreender a substância entorpecente encontrada no local.

(HC 233.302/SP, Rel.
Ministro GILSON DIPP, QUINTA TURMA, julgado em 12/06/2012, DJe 20/06/2012)

Cediço que o estado de flagrância se constitui em ressalva à inviolabilidade domiciliar, nos termos do próprio art. 5º, item XI, da Constituição Federal, in verbis:

XI ?
a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial. (grifei)

Sobre a desnecessidade de mandado em caso de flagrante, é perfeitamente adequada ao caso a lição de Guilherme de Souza Nucci
ao comentar o artigo 241 do Código de Processo Penal:

É indiscutível que a ocorrência de um delito no interior do domicílio autoriza a sua invasão, a qualquer hora do dia ou da noite, mesmo sem o mandado, o que, aliás, não teria mesmo sentido exigir fosse expedido.
Assim, a polícia pode ingressar em casa alheia para intervir num flagrante delito, prendendo o agente e buscando salvar, quando for o caso, a vítima.

Idêntica é a lição de Júlio Fabbrini Mirabete
:

A Constituição não proíbe a entrada em casa alheia, ainda que à noite, se houver caso de flagrante delito (art. 5º, XI), ocasião em que se poderá efetuar a busca e apreensão.


Assim, faz-se imprescindível reconhecer que as provas carreadas aos autos não deixam qualquer dúvida quanto à autoria delitiva, não havendo, tampouco, qualquer mácula ao caderno probatório no tocante ao modo que foi produzido.


Além disso, o auto de prisão em flagrante restou homologado nas fl. 36/39, porquanto revestido da legalidade necessária.


Da mesma forma, ressalta-se que nenhuma nulidade resulta da averiguação feita a partir da ?
denúncia anônima?, presente a permanência da prática delitiva, na linha do seguinte julgado:

Ementa: APELAÇÃO CRIME.
TRÁFICO DE ENTOECENTES (ARTIGO 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06). CORRUPÇÃO DE MENORES (ARTIGO 244-B DA LEI 8.069/90) IRRESIGNAÇÃO DEFENSIVA. PRELIMINAR DE NULIDADE DA PROVA COLHIDA A PARTIR DE DENÚNCIA ANÔNIMA. INOCORRÊNCIA. No caso dos autos, verifica-se que a denúncia anônima não...

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