Acórdão nº 70084676766 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quinta Câmara Criminal, 11-02-2021

Data de Julgamento11 Fevereiro 2021
ÓrgãoQuinta Câmara Criminal
Classe processualApelação
Número do processo70084676766
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO


ILB

Nº 70084676766 (Nº CNJ: 0106035-76.2020.8.21.7000)

2020/Crime


APELAÇÃO.
CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ART. 217-A, § 1°. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DEFICIENTE MENTAL.
EXISTÊNCIA DO FATO E AUTORIA.


Depreende-se do contexto probatório que o acusado agarrou a vítima, deficiente mental, pelo braço, levou-a à força para a casa dele e, em seguida, mordeu um de seus seios e introduziu os dedos em sua vagina.
Autoria evidente. Condenação mantida.

PALAVRA DA VÍTIMA.


Em delitos desta natureza, normalmente cometidos sob o pálio da clandestinidade, a versão fática trazida pela vítima ganha especial relevo, especialmente quando não é elidida por outros elementos de prova.

DESCLASSIFICAÇÃO. IMPORTUNAÇÃO SEXUAL.

Inviável. Para configuração do delito de importunação sexual, a conduta do agente não pode caracterizar crime mais grave.

PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE.


Pena-base afastada do mínimo legal, pois considerados desfavoráveis os antecedentes criminais e a culpabilidade.
Reconhecida a agravante da reincidência, a pena foi elevada, agora, em oito meses. Pena total reduzida.

REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA.


Fechado, diante da quantidade de pena aplicada e reincidência.

PENAS SUBSTITUTIVAS.


A natureza do fato, e a quantidade da penas, impedem a substituição, e também o sursis.


APELO DEFENSIVO PROVIDO, EM PARTE.
UNÂNIME.
Apelação Crime


Quinta Câmara Criminal

Nº 70084676766 (Nº CNJ: 0106035-76.2020.8.21.7000)


Comarca de Quaraí

V.P.

.
.
APELANTE

M.P.

..
APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Quinta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento, em parte, ao apelo defensivo, para reduzir a pena para ?
nove anos e oito meses de reclusão?.
Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário (Presidente), as eminentes Senhoras Des.ª Lizete Andreis Sebben e Des.ª Maria de Lourdes Galvão Braccini de Gonzalez.


Porto Alegre, 09 de fevereiro de 2021.


DES. IVAN LEOMAR BRUXEL,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Ivan Leomar Bruxel (RELATOR)

VILSON PEREIRA, com 52 anos de idade na data do fato (DN 26/07/1966), foi denunciado e condenado por incurso no artigo 217-A, § 1º do Código Penal.


O fato foi assim descrito na denúncia, recebida em 27/05/2019 (abreviaturas ausentes no original):

?
No dia 06 de maio de 2019, por volta da 01h00min, na Rua Iracema Saldanha, nº168, nesta cidade, o denunciado VILSON PEREIRA praticou conjunção carnal com a vítima Maria Cristina V. G., portadora de deficiência mental e sem necessário discernimento para a prática do ato.

Na oportunidade, o imputado estava em um baile no Piquete Acorda Rio Grande, local em que também estava a ofendida, juntamente com sua mãe e outra amiga.
Em seguida, Maria Cristina foi embora, ocasião em que o denunciado pegou a vítima pelo braço e a levou até sua residência, localizada nas proximidades do Piquete.

Ao chegar na sua casa, o denunciado levou a vítima para o quarto e retirou suas roupas, na sequência, segurou a ofendida e passou a lhe beijar e morder, bem como introduziu os dedos na vagina da ofendida e, logo após, o pênis.


Quando a genitora da ofendida tomou conhecimento de que ela havia saído do baile com o acusado, dirigiu-se até a residência deste e, diante dos gritos da ofendida, passou a bater nas janelas, tendo aquela conseguido fugir do local.


A vítima, que padece de Deficiência Mental Moderada, (CID F71.1 ?
atestado das fls. 32/33 do IP) e necessita de constante supervisão familiar (Atestado da fl. 31 do IP), apresentou penetração com ruptura himenal e equimose avermelhada medindo 5mm x 1mm na região periareolar da mama esquerda (Laudo Pericial das fls. 55/56 do IP).

O acusado foi preso em flagrante (Auto de Prisão em Flagrante ?
fl. 09 do IP). (...)?
A DEFESA apelou, buscando absolvição, alegando insuficiência probatória.
Subsidiariamente, postula desclassificação para importunação sexual.

Oferecida contrariedade.


Parecer pelo improvimento.

É o relatório, disponibilizado no sistema informatizado.

VOTOS

Des. Ivan Leomar Bruxel (RELATOR)

Esta a fundamentação da sentença (abreviaturas ausentes no original, portanto desatendidas as recomendações do Of.
Circ. 001/2016-CGJ, art. 25, XVIII da Cons. Normativa Judicial, e Resolução 01/2017-OE/TJRS).

:

?(...) O processo transcorreu de forma regular, não havendo nulidades a serem sanadas, nem preliminares a serem analisadas, motivo pelo qual passo de imediato ao exame do mérito.
Trata-se de processo-crime no qual se apura a prática, em tese, do delito de estupro de vulnerável, ocorrido em 06 de maio de 2019, cuja autoria é atribuída ao acusado Vilson Pereira.

Na hipótese concreta, a existência do crime restou comprovada pelo boletim de ocorrência (fls.
03/04), relatório psicológico (fls. 30), atestado na fl. 31, laudo médico da Fl. 32, Laudo Pericial das fls. 55/56, bem como pelas declarações prestadas em sede policial e posteriormente confirmadas em juízo.
A autoria, da mesma forma, é certa e recai na pessoa do denunciado, embora tenham negado a prática do delito.
Vejamos.
A vítima MARIA CRISTINA V. G., declarou que é estudante da APAE, onde aprendeu a ler e escrever, informou que o acusado é vizinho da madrinha.
Ao ensejo, declarou que foi ao baile sob os cuidados da patroa do Piquete (Sônia), e que por volta da meia-noite se deslocou até o bar para comprar um refrigerante a pedido de Sônia. Ao vê-la no bar, o increpado lhe perguntou se estaria fugida, respondeu que não. Logo após, foi dançar com Luiz Ailton, momento em que o réu passou e disse a Luiz Ailton que não ?agarrasse? muito a vítima, convidando-a para ir até a casa dele, a ofendida disse que não queria ir. A vítima saiu para frente do Piquete com o amigo Luiz Ailton, momento em que o réu perguntou para a ofendida se ela queria ir para casa dele para fazerem ?aquilo?, a ofendida respondeu que não, oportunidade em que o réu lhe agarrou pelo braço e a levou. O increpado ofereceu-lhe cerveja, mas recusou. Vilson perguntou se ela teria interesse nele, respondeu que não. Levou-a para sua residência, abriu a porta e ligou a televisão com o volume alto, levou-a para o quarto, jogou-a na acama e foi para cima com violência, agarrando-a pelos pulsos e mordendo o seio esquerdo da vítima. Momento em que penetrou dois dedos em sua genitália, começou a gritar, oportunidade que chegou a sua mãe. A casa foi invadida pela sua mãe, que desferiu uns tapas no acusado. Declarou que não houve penetração, que o pênis não penetrou em sua vagina, mas que após a penetração dos dedos, ficou sangrando. Relata que já teve namorados. Em datas anteriores ao fato, o acusado havia levado a vítima para o Saladeiro. Não houve ejaculação. Informou que tomou coquetel quando foi ao médico, e não realizaram procedimentos na sua vagina em relação a violência sexual, contudo sentiu muita dor por alguns dias. Relatou que seu pescoço ficou vermelho e teve hematomas em seu seio, ocasionadas por uma mordida no seio. Informou que enquanto era levada para a residência do acusado, pediu para ele soltar seu braço e o increpado ordenou que ficasse calada. Nunca mantiveram relacionamento como namorados, que só conhecia o acusado como vizinho. Sua mãe ficou sabendo do fato por Sônia, patroa do Piquete. A mãe bateu à porta e a janela da residência, momento em que se vestiu e saiu. Relatou que recebe tratamento psicológico, e ficou traumatizada em relação ao fato. Assegurou que é virgem. Negou estar menstruada no dia dos fatos. Informou que toma uma injeção trimestral de progesterona para não engravidar. Informou que entende o que é uma relação sexual entre um homem e uma mulher. Tinham pessoas na frente do Piquete no momento do fato e asseverou que presenciaram ao fato, oportunidade que Luis Ailton disse ao acusado que este não poderia levá-la, embora sendo que o increpado disse que não se importava. Relatou que o acusado estava embriagado, quase caindo e que quase lhe derrubou no meio-fio. Afirmou que sua mãe chegou à residência do increpado após a vítima estar no local por aproximadamente 10min. Questionada sobre quanto tempo relataria os fatos não soube responder. (Grifei)
Sabe-se que nos crimes contra a dignidade sexual o depoimento da vítima assume especial relevo, pois geralmente é a única prova do acontecimento do delito.
A ofendida descreveu de forma convicta com detalhes como se desenrolou o ato libidinoso, descrevendo que o réu a levou a força até sua residência a tirando-a do baile, e iniciou os atos de cunho sexual contra ela, detalhando, inclusive que ele lhe desferiu uma mordida no seio esquerdo, além de ter introduzido dois dedos em sua genitália, e a todo tempo o réu lhe segurou pelos punhos.
Como se viu, não teria a vítima qualquer motivo para fantasiar tais relatos, acusando injustamente um indivíduo por quem possuía uma relação de afinidade por ser vizinho de sua madrinha.

A respeito do depoimento da vítima, Guilherme de Souza
?
(?) Trata-se de ponto extremamente controverso e delicado na avaliação da prova. Primeiramente, convém mencionar que as declarações do ofendido constituem meio de prova, tanto quanto é o interrogatório do réu, quando este resolve falar ao juiz. Entretanto, não se pode dar o mesmo valor à palavra da vítima, que se costuma conferir ao depoimento de uma testemunha, esta, presumidamente imparcial. Por outro lado é importante destacar que a prática forense nos mostra haver vítimas muito mais desprendidas e imparciais do que as próprias testemunhas, de forma que suas declarações podem se tornar fontes valorosas de prova. (...) Ao magistrado só resta exercitar ao máximo a sua capacidade de observação, a sua sensibilidade para captar verdades e inverdades, a sua particular tendência de ler nas entrelinhas e perceber a realidade na linguagem figurada ou propositadamente distorcida. Acima de tudo não deve o juiz permitir que qualquer forma de preconceito seu...

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