Acórdão nº 70084713684 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Tribunal Pleno, 12-02-2021

Data de Julgamento12 Fevereiro 2021
ÓrgãoTribunal Pleno
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade
Número do processo70084713684
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO




JLD

Nº 70084713684 (Nº CNJ: 0109727-83.2020.8.21.7000)

2020/Cível


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
LEI Nº 6.302/2020, DO MUNICÍPIO DE ALEGRETE. REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA SOCIAL (PS). PRELIMINAR DE VÍCIO NA REPRESENTAÇÃO PROCESSUAL. REJEITADA. ANÁLISE DE NORMA INFRACONSTITUCIONAL E ATO NORMATIVO SECUNDÁRIO. OFENSA REFLEXA. IMPOSSIBILIDADE. INICAITIVA LEGISLATIVA RESERVADA AO CHEFE DO EXECUTIVO. EMENDA PARLAMENTAR. AUMENTO DE DESPESA. AUSÊNCIA DE ESTIMATIVA DO IMPACTO ORÇAMENTÁRIO E FINANCEIRO. ALÍQUOTAS INFERIORES ÀS DA UNIÃO. DÉFICIT.
1. Rejeitada a preliminar de vício na representação processual. O instrumento de mandato irregular foi substituído por procuração adequadamente outorgada pelo Prefeito Municipal.

2. Afastada a análise de ofensa à Lei Orgânica do Município, uma vez que se trata de regra infraconstitucional. Crise de legalidade. Afastada análise de confronto com a Portaria nº 1.348/2019 do Ministério da Economia. Ato normativo secundário, que não serve de paradigma em controle de constitucionalidade. Ofensa reflexa ao texto constitucional não autoriza o controle concentrado.

3. Lei Municipal nº 6.302/2020, que altera o Plano de Custeio do PS do Município de Alegrete. Matéria de iniciativa legislativa reservada ao Prefeito (arts. 8º, 60, II, ?b?, e 82, III e VII, todos da CE/89). Independência dos Poderes Estruturais no âmbito Municipal (art. 10 da CE/89). Nesses casos, a jurisprudência pátria não suprime o poder de emenda do Legislativo, visto que esse não se confunde com a iniciativa em si, mas há duas restrições: 1) a emenda não pode resultar em aumento de despesa, e 2) tem de haver pertinência temática entre a emenda e a matéria tratada no Projeto de Lei. Emenda parlamentar substitutiva que alterou a redação dos arts. 3º e 7º da Lei. Substituição da alíquota uniforme de 14% por alíquotas progressivas. Diminuição da alíquota da taxa de administração de 2% para 1,5%. Resultado de consulta à Secretaria de Políticas de Previdência Social (fl. 181) e o resultado de consulta atuarial (fls. 42/44) demonstram que as alíquotas progressivas, da forma como foram instituídas pela Lei Municipal nº 6.302/2020, resultam em média percentual total inferior aos 14% inicialmente previstos. Tal constatação é signo presuntivo de aumento de despesa para os cofres municipais, uma vez que, com a redução do percentual médio total, haverá necessidade de compensação por outras fontes de receita, mormente pelo aumento da contribuição patronal do Município, a fim de evitar o aumento do déficit atuarial. As mesmas considerações se aplicam à redução da alíquota da taxa de administração.

4. Inexistência de estimativa do impacto orçamentário e financeiro. Violação do art. 113 do ADCT.

5. A despeito do déficit atuarial, o art. 3º da Lei implementa alíquotas inferiores às adotadas pela União, em descompasso com exigência do art. 9º, §4º, da EC nº 103/2019.
6. Impõe-se afastamento dos arts. 3º e 7º, ante a inconstitucionalidade formal e material da redação dada pela emenda parlamentar; e do art. 8º, no afã de viabilizar a aplicação dos dispositivos da Lei Municipal nº 4.242/2008 que não conflitem com a Lei Municipal nº 6.302/2020, até que se edite nova lei, conforme almejado pelo proponente.
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE PARCIALMENTE PROCEDENTE.
UNÂNIME.

Ação Direta de Inconstitucionalidade


Órgão Especial

Nº 70084713684 (Nº CNJ: 0109727-83.2020.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

PREFEITO DO MUNICIPIO DE ALEGRETE


PROPONENTE

CAMARA MUNICIPAL DE ALEGRETE


REQUERIDO

PROCURADOR-GERAL DO ESTADO


INTERESSADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar parcialmente procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade dos arts. 3º, 7º e 8º da lei nº 6.302/2020, do município de Alegrete.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
Voltaire de Lima Moraes (Presidente), Des. Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Des. Arminio José Abreu Lima da Rosa, Des. Marcelo Bandeira Pereira, Des. Newton Brasil de Leão, Des. Sylvio Baptista Neto, Des. Ivan Leomar Bruxel, Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Des. Manuel José Martinez Lucas, Des. Marco Aurélio Heinz, Des. Guinther Spode, Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana, Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro, Des. Luís Augusto Coelho Braga, Des. André Luiz Planella Villarinho, Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira, Des.ª Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Des. Ney Wiedemann Neto, Des. Altair de Lemos Júnior, Des. Eduardo Uhlein, Des. Roberto Sbravati, Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório e Des.ª Lizete Andreis Sebben.

Porto Alegre, 12 de fevereiro de 2021.


DES. JORGE LUÍS DALL\'AGNOL,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Jorge Luís Dall\'Agnol (RELATOR)

Trata-se de Ação Direta de Inconstitucionalidade ajuizada pelo PREFEITO DO MUNICÍPIO DE ALEGRETE em face da Lei nº 6.302, de 05 de agosto de 2020, do Município de Alegrete, que alterou o Plano de Custeio do Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores Públicos Municipais.


Em síntese, o proponente informou que o Projeto de Lei nº 036/2020 foi encaminhado pelo Executivo Municipal com o objetivo de alterar as alíquotas de contribuição do Regime Próprio de Previdência Social (PS) dos Servidores Públicos do Município de Alegrete, ante as exigências de adequação advindas da Emenda Constitucional (EC) nº 103/2019.
Nesse sentido, haveria alteração da alíquota uniforme de 11% para 14%. Entretanto, alegou que o Projeto de Lei foi objeto de emenda parlamentar que, ao modificar os artigos 3º e 7º, tornou a redação da Lei Municipal inconstitucional. Informou que tais alterações foram vetadas, entretanto, apontou que o veto foi derrubado pelo Legislativo Municipal. Alegou que a Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final emitiu relatório contrário à emenda parlamentar. Argumentou que a instituição de alíquota progressiva não foi acompanhada de avaliação atuarial, em descompasso com o artigo 2º, §1º, da Portaria nº 1.348/2019, e artigo 9º da EC nº 103/2019. Outrossim, arguiu que a emenda implicaria aumento de despesa em projeto de lei de iniciativa reservada do Poder Executivo, além de alterar a substância da proposição legislativa, resultando em invasão de competência e desrespeito aos artigos , 10, 60, 61, 82, incisos III e VII, da Constituição Estadual, e artigo 101 da Lei Orgânica Municipal. Sustentou que o artigo 2º, inciso II, alínea ?b?, item 1, da Portaria nº 1.348/2019, condicionou a progressividade das alíquotas ao referendo integral, pelo ente municipal, do artigo 149 da Constituição Federal, em especial no que toca à taxação dos inativos, o que não teria sido feito. Alegou que há violação do artigo 9º, §4º, da EC nº 103/2020, pois, embora haja déficit atuarial, a Lei Municipal estabeleceu alíquota inferior à adotada para os servidores da União. Ponderou que há desrespeito ao artigo 11, §2°, da EC nº 103/2019, pois as alíquotas progressivas deveriam incidir sobre cada faixa específica (fls. 04/26).

Juntou documentos: procuração (fls.
28 e 193), certidão de vigência da Lei Municipal nº 6.302/2020 (fl. 30), Projeto de Lei nº 036/2020 e justificativa (fls. 34/39), Lei Municipal nº 4.242/2008 (fls. 40/41 e 90/92), resultado de consulta atuarial (fls. 42/44), tabela de aplicabilidade da EC nº 103/2019 aos Estados, Distrito Federal e Municípios (fls. 46/52); Portaria nº 1.348/2019 do Ministério da Economia (fls. 53/54 e 86/87), emenda parlamentar e justificativa (fls. 57/59), relatório da Comissão de Legislação, Justiça e Redação Final (fls. 61/64), veto (fls. 66/74), rejeição do veto (fl. 76), redação final do Projeto de Lei nº 036/2020 (fls. 78/80), Lei Municipal nº 6.302/2020 (fls. 82/84), Lei Complementar Municipal nº 17/2005 (fls. 94/116), Lei Orgânica Municipal (fls. 119/178), resultado de consulta à Secretaria de Políticas de Previdência Social (fls. 181/182), e certificado de regularidade previdenciária (fl. 184).
O pedido liminar foi parcialmente deferido (fls.
195/207).

A Câmara Municipal de Vereadores de Alegrete apresentou preliminar de defeito na representação processual, porquanto a procuração teria sido outorgada pelo Município de Alegrete.
No tocante ao mérito, sustentou que a Constituição Federal não pode servir como parâmetro de constitucionalidade para ação direta de inconstitucionalidade julgada por Tribunal de Justiça, inviabilizando a utilização da utilização da EC nº 103/2019 como paradigma. Outrossim, rechaçou a utilização da Portaria nº 1.348/2019, por ser ato normativo secundário, e do artigo 101 da Lei Orgânica Municipal, por ser norma infraconstitucional. Entendeu que o proponente não apresentou artigo da Constituição Estadual apto a servir como parâmetro para aferição da inconstitucionalidade e que a jurisprudência afasta a análise de ofensa reflexa. Defendeu a constitucionalidade da Lei com base na presunção que milita em seu favor. Arguiu que o Legislativo possui competência para emendar projeto de iniciativa reservada ao Executivo e que a emenda aprovada possui pertinência temática. Quanto à ausência de cálculo atuarial, argumentou que vereadores não dispõem de meios para fazê-lo (fls. 226/234)

O Procurador Geral do Estado do Rio Grande do Sul defendeu a norma impugnada (fl. 242).


O Ministério Público exarou parecer, opinando pela parcial procedência do pedido (fls.
248/268).

É o relatório.

VOTOS

Des. Jorge Luís Dall\'Agnol (RELATOR)

Inicialmente, empreendo análise da preliminar de defeito na representação processual, arguida pela Câmara Municipal de Vereadores de Alegrete, nos termos do artigo 337, inciso IX, do Código de Processo Civil.


Não há que se falar em vício na representação.


De fato, o instrumento de mandato de fl. 28 foi outorgado pelo Município de Alegrete, pessoa jurídica de direito público interno que não consta do rol de
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