Acórdão nº 70085161131 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Sexta Câmara Criminal, 30-06-2022

Data de Julgamento30 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo70085161131
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSexta Câmara Criminal

PODER JUDICIÁRIO


PAOI

Nº 70085161131 (Nº CNJ: 0029666-07.2021.8.21.7000)

2021/Crime


apelação criminal.
estupro de vulnerável em continuidade delitiva. insurgência defensiva. preliminar de nulidade de audiência de instrução realizada em desconformidade com o artigo 212 do CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. AUSÊNCIA DO MINISTÉRIO PÚBLICO NA SOLENIDADE. NUILIDADE DECLARADA.

Denota-se que a atuação do magistrado no presente feito ocorreu de forma principal e direta ao realizar a audiência de instrução sem a presença do Ministério Público, pois o juiz exerceu função que seria inerente ao órgão acusador, produzindo prova que, posteriormente, foi utilizada para a condenação dos recorrentes.


Assim, resta evidente que o magistrado de origem produziu prova cujo ônus cabia à acusação, violando o artigo 212 do Código de Processo Penal, e distanciando-se, portanto, da posição imparcial e equidistante que lhe cabe à luz do sistema acusatório insculpido na Constituição da República e também no Código de Processo Penal.


Além disso, o prejuízo é claro, pois a condenação lastreou-se também na prova oral colhida a partir de questionamentos formulados pelo próprio magistrado, razão pela qual vai declarada a nulidade do processo.

PRELIMINAR ACOLHIDA.
NULIDADE DECLARADA. MÉRITO RECURSAL PREJUDICADO.

Apelação Crime


Sexta Câmara Criminal

Nº 70085161131 (Nº CNJ: 0029666-07.2021.8.21.7000)


Comarca de Frederico Westphalen

R.S.L.D.

.

APELANTE

V.O.D.S.B.

.

APELANTE

M.P.

.
APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Magistrados integrantes da Sexta Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em acolher preliminar suscitada, ao efeito de desconstituir a sentença vergastada, a fim de que seja renovada a instrução processual a partir da audiência de instrução realizada em 10/05/2016, prejudicado o exame do mérito recursal, vencido o Desembargador João Batista Marques Tovo que negava provimento ao apelo quanto a arguição de nulidade.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
João Batista Marques Tovo (Presidente e Revisor) e Des.ª Bernadete Coutinho Friedrich.

Porto Alegre, 30 de junho de 2022.


PAULO AUGUSTO OLIVEIRA IRION,

Relator.


RELATÓRIO

Paulo Augusto Oliveira Irion (RELATOR)

O Juízo da 3ª Vara Judicial da Comarca de Frederico Westphalen elaborou, quando da prolação da sentença, o relatório a seguir, que passo a adotar, in verbis:
O MINISTÉRIO PÚBLICO ofereceu denúncia contra V. O. D. S. B., brasileiro , em união estável, nascido em 10 de fevereiro de 1986, natural de Vicente Dutra/RS, filho de S. d. S. B. e C. d. S. B., e R. D. L. F., brasileira, em união estável, nascida em 5 de junho de 1989, natural de Vicente Dutra/RS, filha de A. J. F. e J. d. L., dando-os como incursos nos artigos 217-A c/c artigo 226, incisos I e II, e artigo 61, inciso II, alínea ?
f?, todos do Código Penal, com incidência das disposições da Lei nº 8.072/90, na forma dos artigos 29, caput, e 71, ambos do Código Penal e, por fim, do artigo 13, §2º, ?a?, do Código Penal, somente em relação à ré Rosemara, pela prática do seguinte fato delituoso:

Em datas e horários não especificados nos autos, mas anteriormente ao dia 24 de dezembro de 2013, na cidade de Frederico Westphalen/RS, por diversas vezes, V. O. D. S. B., na condição de padrasto da vítima, em comunhão de esforços e conjunção de vontades, com R. D. L. F., prevalecendo-se das relações domésticas, praticou conjunção carnal e outros atos libidinosos com a criança C. F. de J., com 08 anos de idade quando se iniciaram os fatos (conforme certidão de nascimento da fl. 87).

Nas ocasiões, em reiteradas e sucessivas vezes, V. O. D. S. B., aproveitando-se de sua condição de padrasto e do fato de residir no mesmo local, praticou com a vítima conjunção carnal e outros atos libidinosos.
Nas oportunidades, o denunciado ordenava que a vítima se despisse e deitasse na cama. Ato contínuo, introduzia o pênis na vagina e no ânus da criança.
A denunciada R. D. L. F. incidiu na conduta típica de estupro contra vulnerável mediante omissão de seu dever legal de cuidado, proteção e vigilância, inerente ao poder familiar em relação a sua filha C. F. de J., uma vez que tinha ciência de que ela estava sendo vítima de abuso sexual pelo denunciado.

A acusada, contudo, nada fez para evitar o resultado que, como mãe, tinha o dever legal de evitar, se demitindo de seus deveres legais e morais e, ainda, omitindo, na fase policial, que tinha o conhecimento dos fatos investigados, concorrendo, assim, para o cometimento do delito de estupro de vulnerável.

Os réus foram citados e apresentaram resposta escrita (fls.
228-233/238-242).

A denúncia foi recebida em 25 de fevereiro de 2016 (fl. 248).


Durante a instrução, foi ouvida a vítima (CD da fl. 347), cinco testemunhas de acusação (CD?s 283/347/366), três testemunhas de defesa (CD da fl. 388) e realizados os interrogatórios dos réus (CD da fl. 388).


Encerrada a instrução (fl. 387), foram apresentados memoriais escritos.
O Ministério Público postulou a procedência da denúncia, com a condenação dos réus como incursos nos artigos 217-A c/c artigo 226, incisos I e II, e artigo 61, inciso II, alínea ?f?, todos do Código Penal, com a incidência das disposições da Lei n
º 8.072/90, na forma dos artigos 29, caput, e 71, ambos do Código Penal.
Por outro lado, a defesa técnica pugnou a absolvição dos réus sob o fundamento da insuficiência de provas (fls. 404-406).

Sobreveio sentença, que julgou procedente a pretensão acusatória para condenar V. O. D. S. B. e R. D. L. F. como incursos nas sanções do artigo 217-A, caput, combinado com o artigo 226, incisos I (uma vez em relação à ré) e II, e artigo 61, inciso II, alínea ?
f?, na forma do artigo 71, caput, (três vezes para ela e quatro vezes para ele) todos do Código Penal, sendo que em relação à ré incide ainda o artigo 13, §2º, alínea ?a?, do mesmo diploma legal, às seguintes penas:

a) V. O. D. S. B., à pena privativa de liberdade de vinte e seis (26) anos, onze (11) meses e doze (12) dias de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado, e à pena pecuniária de oitenta (80) dias-multa, no valor de um trigésimo (1/30) do salário mínimo vigente à data do fato; e

b) R. D. L. F., à pena privativa de liberdade em vinte e cinco (25) anos, dez (10) meses e quatorze (14) dias de reclusão, em regime inicial fechado, e à pena pecuniária de oitenta (80) dias-multa, no valor de um trigésimo (1/30) do salário mínimo vigente à data do fato.


A defesa constituída de V. e R. interpôs recurso de apelação (fl. 441).


Nas razões recursais, apresentadas nesta instância, a defesa sustentou, preliminarmente, que a audiência de instrução e julgamento ocorrida em 10/05/2016 está eivada de nulidade, pois o magistrado singular tomou a iniciativa de realizar perguntas às testemunhas, de forma principal e não subsidiária, substituindo-se ao órgão acusador - cujo membro não se fez presente na solenidade -, a violar disposição do artigo 212 do Código de Processo Penal e ensejar a declaração de nulidade de todos os atos subsequentes a aludida audiência, posto a comprovação de prejuízo.
Alega, ainda, em preliminar, a quebra de cadeia de custódia por falta de registro do primeiro depoimento prestado pela...

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