Acórdão nº 70085247963 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Tribunal Pleno, 20-06-2022

Data de Julgamento20 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade
Número do processo70085247963
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoTribunal Pleno

PODER JUDICIÁRIO




LLJ

Nº 70085247963 (Nº CNJ: 0038349-33.2021.8.21.7000)

2021/Cível


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
artigos 2º, § 2º, e 3º da LEI Nº 4.609/2020 DO MUNICÍPIO DE CACHOEIRINHA. UNIFICAÇÃO DE CARGOS PÚBLICOS COM ACUMULAÇÃO REMUNERATÓRIA. Orientador Educacional e Supervisor de Escola (criados pela Lei Municipal nº 1.159/91). VIOLAÇÃO DO ART. 37, INCISO xvi, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL E ART. 8º, caput, da Constituição Estadual. nORMAs DE OBSERVÂNCIA OBRIGATÓRIA. TENTATIVA DE BURLAR A INCONSTITUCIONALIDADE DE SERVIDORES OCUPANTES DE DOIS CARGOS PÚBLICOS AO CONCEDER ?GRATIFICAÇÃO DE UNIFICAÇÃO?. MODULAÇÃO DOS EFEITOS.
1. Os Tribunais de Justiça podem exercer controle abstrato de constitucionalidade de lei, utilizando como parâmetro as normas da Constituição Federal, desde que se trate de normas de reprodução obrigatória pelos Estados. No caso dos autos, o artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal versa sobre a organização da administração pública em âmbito nacional, devendo ser observada por todas as unidades da federação, sendo, pois, estratificada como de reprodução obrigatória na ordem constitucional, passível de figurar como fundamento legítimo no controle abstrato de constitucionalidade por esta Corte Estadual de Justiça.
2. Cuida-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral de Justiça, objetivando à retirada do ordenamento jurídico do artigo 2º, §2º, e artigo 3º da Lei n.º 4.609, de 18 de junho de 2020, do Município de Cachoeirinha, que ?unifica os cargos de Orientador Educacional e de Supervisor de Escola, criados pela Lei Municipal nº 1.159, de 23 de janeiro de 1991, no âmbito do Poder Executivo Municipal, e dá outras providências?, por ofensa ao artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal e artigos , , caput, e 19, caput, da Constituição Estadual.

3. A Suprema Corte estabeleceu a necessidade de observância de três requisitos para, diante de leis de reestruturação de carreiras nos serviço público, caracterizar a conformidade com a Constituição no que concerne à extinção de cargos e posterior aproveitamento dos respectivos servidores em outro cargos recém-criados: (I) uniformidade de atribuições entre o cargo extinto e aquele no qual serão os servidores reenquadrados; (II) identidade dos requisitos de escolaridade para ingresso no cargo público; (III) identidade remuneratória entre o cargo criado e o extinto.

3. In casu, ausente identidade remuneratória entre o cargo criado e os extintos. Com efeito, os artigos 2º, §2º, e 3º da Lei impugnada buscam solucionar a acumulação irregular de cargos públicos com sua unificação e criação de uma gratificação para manutenção dos efeitos remuneratórios decorrentes do duplo provimento. Inclusive, a proibição de acumulação remunerada de cargos públicos é reconhecida pelo Município na justificativa para o envio do projeto, bem como no corpo do art. 2º, §2º, da Lei em debate ao afirmar cuidar-se de ?direito adquirido e irredutibilidade de vencimentos?, embora cuide-se de situação fática pretérita de flagrante inconstitucionalidade. Ademais, inexiste direito adquirido para perpetuação de situação inconstitucional - no caso, da acumulação de cargos públicos fora da exceção constitucional relativa a professores e profissionais da saúde (art. 37, inciso XVI, alíneas ?a?, ?b? e ?c?, da Lei Maior).

4. Inexiste impedimento ao reenquadramento dos ocupantes dos cargos de Orientador Educacional e de Supervisor de Escola ao novo cargo de Especialista Educacional. Conforme o permissivo do artigo 27 da Lei nº 9.868/99, produção de efeitos após a aposentadoria ou exoneração dos servidores ou servidoras nomeadas por concurso público para os respectivos cargos. Ponderada a legalidade estrita imposta à administração pública e a segurança jurídica necessária às relações decorrentes do exercício da Administração pelos agentes políticos, especialmente em área tão nobre e de política de longo prazo como a educação. Resguardo que tem amparo na boa-fé e tempo de serviço dos profissionais envolvidos.
À UNANIMIDADE, JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
POR MAIORIA, MODULARAM OS EFEITOS PARA QUE OCORRAM APÓS APOSENTADORIA OU EXONERAÇÃO DOS SERVIDORES.
Ação Direta de Inconstitucionalidade


Órgão Especial

Nº 70085247963 (Nº CNJ: 0038349-33.2021.8.21.7000)




PROCURADOR-GERAL DE JUSTICA


PROPONENTE

CAMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE CACHOEIRINHA


REQUERIDO

PREFEITO MUNICIPAL DE CACHOEIRINHA


REQUERIDO

PROCURADOR-GERAL DO ESTADO


INTERESSADO

SINDICATO DOS MUNICIPARIOS DE CACHOEIRINHA RS (SIMCA)


AMICUS CURIAE


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade e, por maioria, modular os efeitos para que ocorram após aposentadoria ou exoneração dos servidores ou servidoras nomeadas por concurso público para os respectivos cargos, vencidos os Desembargadores Laura Louzada Jaccottet, Relatora, Vicente Barroco de Vasconcellos, Newton Brasil de Leão, Sylvio Baptista Neto, Rui Portanova, Jorge Luis Dall\'Agnol, Ivan Leomar Bruxel, Maria Isabel de Azevedo Souza, Marco Aurélio Heinz, Matilde Chabar Maia e Lizete Andreis Sebben quanto à modulação de efeitos.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (Presidente), Des.
Arminio José Abreu Lima da Rosa, Des. Vicente Barroco de Vasconcellos, Des. Newton Brasil de Leão, Des. Sylvio Baptista Neto, Des. Rui Portanova, Des. Jorge Luís Dall\'Agnol, Des. Francisco José Moesch, Des. Ivan Leomar Bruxel, Des. Nelson Antonio Monteiro Pacheco, Des.ª Maria Isabel de Azevedo Souza, Des. Irineu Mariani, Des. Marco Aurélio Heinz, Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana, Des.ª Matilde Chabar Maia, Des. Carlos Cini Marchionatti, Des. João Batista Marques Tovo, Des.ª Lizete Andreis Sebben, Des. Antonio Vinicius Amaro da Silveira, Des. Giovanni Conti, Des. Carlos Eduardo Richinitti, Des. Ricardo Torres Hermann, Des. Alberto Delgado Neto e Des. Ricardo Pippi Schmidt.

Porto Alegre, 20 de junho de 2022.


DES.ª LAURA LOUZADA JACCOTTET,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Laura Louzada Jaccottet (RELATORA)

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, objetivando à retirada do ordenamento jurídico do artigo 2º, parágrafo 2º, e artigo 3º da Lei nº 4.609, de 18 de junho de 2020, do Município de Cachoeirinha, que unifica os cargos de Orientador Educacional e de Supervisor de Escola, criados pela Lei Municipal nº 1.159, de 23 de janeiro de 1991, no âmbito do Poder Executivo Municipal, e dá outras providências?
, por ofensa ao artigo 37, inciso XVI, da Constituição Federal, e artigos , , caput, e 19, caput, da Constituição Estadual (fls. 04/40 e documentos das fls. 41/595).
Para tanto, aduz que inexiste vício formal, porquanto o projeto de lei que resultou no regramento parcialmente guerreado teve leito no Poder Executivo, respeitando a competência privativa do Chefe do Poder Executivo local para disciplinar a matéria, eminentemente administrativa, nos termos dos artigos 60, inciso II, alíneas ?
a? e ?b?, e 82, incisos III e VII, aplicáveis aos Municípios por força do artigo 8º, caput, todos das Constituição Estadual
.
No mais, afirma que em relação ao instituto da reclassificação de cargos, o Pretório Excelso esposa o entendimento de que não há impedimento constitucional à transformação de cargo público, conquanto haja afinidade de atribuições e equivalência de vencimentos e requisitos de investidura, ultimando-se o aproveitamento com o propósito de racionalização das atividades da Administração Pública, desde que, no tocante ao cargo primitivo, tenha sido realizado regular concurso público. Nesse sentido, discorre que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento da ADI n.º 2713-1-DF, visando a impugnar parte da Medida Provisória nº 43/2002, que estabeleceu a transformação dos cargos de carreira de Assistente Jurídico da AGU em cargos da Carreira da Advocacia-Geral da União, firmou o posicionamento de que o enquadramento dos cargos analisados não violava a previsão constitucional acerca da necessidade de concurso público para ingresso no serviço, uma vez que fora comprovada a identidade de atribuições entre as categorias, a compatibilidade de funções e a equivalência da remuneração. Assim, salienta ser imperioso que haja completa identidade substancial entre os cargos em exame, além de compatibilidade funcional e remuneratória e equivalência dos requisitos exigidos em concurso. No caso em tela, entende que, embora não se discuta a possibilidade de unificação dos cargos públicos de Orientador Educacional e de Supervisor de Escola, nos moldes levados a efeito pela legislação em comento, os dispositivos impugnados acabam por chancelar a acumulação de cargos públicos, o que é vedado pelo ordenamento constitucional, fora das hipóteses por ele expressamente admitidas. Logo, os artigos impugnados, ao autorizarem a acumulação, regulando os efeitos pecuniários dela decorrentes, afrontaram a vedação constitucional, padecendo de mácula material de constitucionalidade. Colaciona precedentes deste Tribunal Estadual e da Corte Suprema. De outro lado, registra que conquanto o ato normativo esteja fundado em competência constitucional e seja formalmente válido, apresenta vício intrínseco, decorrente do divórcio em relação ao fim a que persegue ou deveria perseguir, visto que os dispositivos inquinados na norma municipal em relevo têm como desiderato, conforme se deflui do próprio texto legal e da sua exposição de motivos, dar feição de legalidade às situações jurídicas havidas na municipalidade, em que determinados servidores ocupantes dos cargos de Orientador Educacional e de Supervisor de Escola acumulavam, indevidamente, os dois cargos, ao arrepio da vedação...

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