Acórdão nº 70085433266 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Tribunal Pleno, 14-04-2022

Data de Julgamento14 Abril 2022
ÓrgãoTribunal Pleno
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade
Número do processo70085433266
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO




MBP

Nº 70085433266 (Nº CNJ: 0056879-85.2021.8.21.7000)

2021/Cível


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
LEI MUNICIPAL Nº 4.749/2021 DE encantado. LEGISLAÇÃO QUE TRATA DA obrigatoriedade de divulgação constante da listagem de medicamentos disponíveis e em falta na rede municipal de saúde. ausência de inconstitucionalidade na determinação legal. norma que não usurpa competência privativa do chefe do poder executivo, não implicando aumento de estrutura ou despesa. lei de interesse local cuja iniciativa também se dá ao poder legislativo. inocorrente afronta à separação e independência dos poderes. lei que visa a dar concretude ao princípio constitucional da publicidade, além de atender de forma plena a determinação legal de transparência dos atos administrativos.

improcedência do pedido.


Ação Direta de Inconstitucionalidade


Órgão Especial

Nº 70085433266 (Nº CNJ: 0056879-85.2021.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

PREFEITO MUNICIPAL DE ENCANTADO


PROPONENTE

CAMARA MUNICIPAL DE VEREADORES DE ENCANTADO


REQUERIDO

PROCURADOR-GERAL DO ESTADO


INTERESSADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar improcedente a ação direta de inconstitucionalidade.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (Presidente), Des.
Arminio José Abreu Lima da Rosa, Des. Newton Brasil de Leão, Des. Sylvio Baptista Neto, Des. Rui Portanova, Des. Jorge Luís Dall\'Agnol, Des. Francisco José Moesch, Des. Ivan Leomar Bruxel, Des. Nelson Antonio Monteiro Pacheco, Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Des.ª Maria Isabel de Azevedo Souza, Des. Irineu Mariani, Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana, Des. Carlos Cini Marchionatti, Des.ª Angela Terezinha de Oliveira Brito, Des. Ney Wiedemann Neto, Des. Leonel Pires Ohlweiler, Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório, Des.ª Lizete Andreis Sebben, Des. Antonio Vinicius Amaro da Silveira, Des. Giovanni Conti, Des. Carlos Eduardo Richinitti, Des. Ricardo Torres Hermann e Des. Alberto Delgado Neto.

Porto Alegre, 14 de abril de 2022.


DES. MARCELO BANDEIRA PEREIRA,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Marcelo Bandeira Pereira (RELATOR)

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pelo PREFEITO DO MUNICÍPIO DE ENCANTADO em face da Lei nº 4.749/2021, que instituiu a divulgação da listagem dos medicamentos disponíveis e em falta na rede pública de saúde em todas as unidades de saúde e locais de dispensação do medicamento, bem como no sítio eletrônico oficial do município.


Alega que a norma apresenta vício de origem, pois derivada de iniciativa parlamentar.
Referida lei exige do Poder Executivo modificações ou criação de rotinas administrativas e custos, sendo materialmente impossível de ser cumprida. Argumenta que, a cada dispensação de medicamento, a lista teria de ser atualizada. Ressalta que há medicamentos que estão no estoque das Unidades Básicas de Saúde que servem tanto para dispensação aos munícipes quanto para uso nos atendimentos da própria UBS. A norma invade competência exclusiva do Chefe do Executivo Municipal. Há violação ao art. 60, inciso II, alínea ?d?, e art. 82, inciso VII, ambos da Constituição Estadual. Requer seja suspensa liminarmente a aplicabilidade da norma e, ao final, a procedência do pedido, declarando-se a inconstitucionalidade da referida lei.

Recebida a ação, foi deferida a medida liminar, suspendendo a legislação impugnada.


O Procuradoria-Geral do Estado apresentou defesa à norma impugnada, referindo que a obrigatoriedade de publicação da lista de medicamentos disponíveis e dos que estão em falta, destinados à entrega gratuita aos usuários do SUS em nada interfere na iniciativa legislativa reservada ao Chefe do Executivo, pois cria obrigação de divulgação da lista de medicamentos, não interferindo no conteúdo do serviço de saúde do Município, nem mesmo na forma de sua prestação aos munícipes.
Disse que a norma apenas visa a dar concretude ao princípio da publicidade dos atos administrativos, franqueando amplo acesso às informações à população, não dispondo sobre aspecto material atinente à organização ou ao funcionamento do serviço público municipal. Sustentou que a ampla e efetiva disponibilização da informação acerca de medicamentos, aos principais destinatários do serviço público de saúde básica, permite uma maior fiscalização dos serviços prestados pelos próprios administrados, conduzindo a um maior atendimento do interesse público primário e à concretização do direito fundamental à boa administração pública. Salientou que o Poder Legislativo pode fazer lei direcionada ao Poder Executivo. Asseverou que a legislação do SUS (Lei nº 8.080/90) estabelece a divulgação das informações como princípio do sistema, estando igualmente a legislação municipal a cumprir as determinações da legislação federal referente à transparência (Lei nº 12.527/2011). Aduziu que a lei municipal está não só a garantir a publicidade e transparência, mas também os direitos constitucionais de dignidade da pessoa ao usuário do SUS que aguarda e depende da medicação para realizar seu tratamento de saúde. Requereu o julgamento de improcedência do pedido.

A Câmara Municipal de Encantado prestou informações, alegando que a norma é constitucional, pois legisla sobre assunto de interesse local, suplementando a legislação estadual e federal, revelando-se como um novo instrumento de garantia dos direitos à publicidade e transparência, trazidos pelo artigo 37 da CF e pela Lei nº 12.527/2011.
Disse que a lei trata de assuntos cuja deflagração do processo legislativo é comum aos poderes executivo e legislativo municipal, não violando a competência privativa do Chefe do Executivo. Requereu seja julgado improcedente o pedido.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela improcedência do pedido.

É o relatório.

VOTOS

Des. Marcelo Bandeira Pereira (RELATOR)

Desde logo adianto que o pedido não vai acolhido.


Quando do recebimento da ação, deferi o pedido liminar, para suspender a Lei Municipal nº 4.749/2021, de Encantado, em decisão que assim dispôs:

?
2. Pretende o Prefeito Municipal de Encantado seja reconhecida a inconstitucionalidade da Lei Municipal nº 4.749/2021, que ?institui a divulgação da listagem dos medicamentos disponíveis e em falta na rede pública municipal de Saúde por vício formal de iniciativa?, em ofensa ao art. 60, inciso II, alínea ?d?, e art. 82, inciso VII, ambos da Constituição Estadual, todos da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul.

Assim dispõe a lei impugnada:

Art. 1º O Poder Executivo fará a divulgação da listagem de todos os medicamentos disponíveis e, dos que estão em falta, destinados gratuitamente aos usuários do Sistema Único de Saúde - SUS.


Parágrafo único. A listagem de que trata o caput deste artigo deverá ser atualizada sempre que ocorrer alteração dos medicamentos disponíveis para entrega imediata.

Art. 2º A divulgação, referida no art. 1º, será feita mediante a fixação da listagem impressa, em local de fácil visualização e com um bom tamanho de fonte para facilitar a leitura, nos Postos de Estratégia de Saúde da Família - ESF, nas Unidades Básicas de Saúde - UBS e no local de distribuição dos medicamentos do Município.


Art. 3º A listagem dos medicamentos também deverá ser disponibilizada no site oficial da Prefeitura Municipal, na internet.


Art. 4º No caso de falta de algum medicamento, o Poder Executivo colocará esta informação no seu site na internet e nos locais de distribuição, bem como colocará informação sobre a previsão de chegada do mesmo.


Pelo vício formal de iniciativa, sustenta a ofensa à separação dos poderes, em razão da violação do Poder Legislativo Municipal às competências reservadas ao Poder Executivo.


Com efeito, estabelece a Constituição do Estado do Rio Grande do Sul:

Art. 8.
º O Município, dotado de autonomia política, administrativa e financeira, reger-se-á por lei orgânica e pela legislação que adotar, observados os princípios estabelecidos na Constituição Federal e nesta Constituição.

§ 1.º O território do Município poderá ser dividido em distritos e subdistritos, criados, organizados e extintos por lei municipal, observada a legislação estadual.

§ 2.º A sede do Município lhe dá o nome.

Art. 60. São de iniciativa privativa do Governador do Estado as leis que:

I - fixem ou modifiquem os efetivos da Brigada Militar;

II - disponham sobre:

a) criação e aumento da remuneração de cargos, funções ou empregos públicos na administração direta ou autárquica;

b) servidores públicos do Estado, seu regime jurídico, provimento de cargos, estabilidade e aposentadoria de civis, e reforma ou transferência de militares para a inatividade;

c) organização da Defensoria Pública do Estado;

d) criação, estruturação e atribuições das Secretarias e órgãos da administração pública.


Art. 82. Compete ao Governador, privativamente:

(...)

III - iniciar o processo legislativo, na forma e nos casos previstos nesta Constituição;

(...)

VII - dispor sobre a organização e o funcionamento da administração estadual;

Os dispositivos da lei municipal antes reproduzidos, efetivamente, vêm tratar de matérias que, de acordo com o que dispõe à Constituição Estadual, estariam reservadas à iniciativa do Chefe do Poder Executivo.


Isso porque não cabe ao Poder Legislativo a iniciativa de organização do trabalho realizado pela Secretaria de Saúde, especialmente, no caso, porque suas disposições importam na necessidade de alteração do funcionamento do serviço público de saúde no Município, além de causar dificuldade de sua implementação pela natureza das informações a serem prestadas.


Conforme sustenta o Prefeito Municipal, ?
ao exigir listagem a seja sempre atualizada (artigo 1º, parágrafo único), à cada entrega de medicamente as listas devem ser novamente impressas. E mais, há...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT