Acórdão nº 70085462877 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Primeira Câmara Cível, 01-06-2022

Data de Julgamento01 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualApelação
Número do processo70085462877
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoPrimeira Câmara Cível

PODER JUDICIÁRIO




NLMF

Nº 70085462877 (Nº CNJ: 0059840-96.2021.8.21.7000)

2021/Cível


APELAÇÃO CÍVEL.
DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. TRÂNSITO. MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO INFRATOR PELO PROPRIETÁRIO. ART. 257, § 7º, DO CTB.
Não há a necessidade da flagrância para a autuação, visto que a lei possibilita o afastamento da presunção de que o proprietário é o condutor, ao lhe conceder prazo para a indicação do infrator.
No caso de omissão da respectiva indicação, a responsabilidade recairá sobre o proprietário, autorizada a ?infração virtual?. Hipótese em que o proprietário, muito embora devidamente notificado para identificar o infrator, restou inerte, recaindo sobre ele a responsabilidade pela infração cometida.
APELAÇÃO DESPROVIDA.
POR MAIORIA.
Apelação Cível


Primeira Câmara Cível

Nº 70085462877 (Nº CNJ: 0059840-96.2021.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

CARLOS NEI BATISTA JEZUS


APELANTE

DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRANSITO - DETRAN


APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Primeira Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, por maioria, em negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
Irineu Mariani (Presidente), Des. Carlos Roberto Lofego Caníbal, Des.ª Denise Oliveira Cezar e Des.ª Lúcia de Fátima Cerveira.

Porto Alegre, 01 de junho de 2022.


DES. NEWTON LUÍS MEDEIROS FABRÍCIO,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Newton Luís Medeiros Fabrício (RELATOR)

Trata-se de apelação cível interposta por CARLOS NEI BATISTA JEZUS em face de sentença que denegou a ordem postulada nos autos do mandado de segurança impetrado contra ato do DIRETOR DO DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO DETRAN/RS.


Em suas razões recursais, alega que ?
a autuação de série D003536442 restou lavrada sem abordagem (sem declaração de autorização de trânsito), bem como sem qualquer registro por equipamento eletrônico, tendo por fundamento o disposto no §2º, do artigo 5º da Resolução n. 619/16 do CONTRAN, ou seja, em presunção criada, instituída por norma infralegal, em clara afronta à disposição constitucional e ao posicionamento do Supremo Tribunal Federal?. Argumenta que o flagrante é requisito essencial à cassação do direito de dirigir. Colaciona julgados. Pede o provimento.

Sem contrarrazões.


O Ministério Público opinou pelo desprovimento do recurso de apelação.

É o relatório.

VOTOS

Des. Newton Luís Medeiros Fabrício (RELATOR)

Presentes os pressupostos de admissibilidade recursal, conheço da apelação.


A parte autora foi autuada por infringir o disposto no art. 162, II, do CTB, in verbis:
Art. 162.
Dirigir veículo:

I - sem possuir Carteira Nacional de Habilitação, Permissão para Dirigir ou Autorização para Conduzir Ciclomotor;

II - com Carteira Nacional de Habilitação, Permissão para Dirigir ou Autorização para Conduzir Ciclomotor cassada ou com suspensão do direito de dirigir;
III - com Carteira Nacional de Habilitação ou Permissão para Dirigir de categoria diferente da do veículo que esteja conduzindo;

IV - (VETADO)

V - com validade da Carteira Nacional de Habilitação vencida há mais de trinta dias;

VI - sem usar lentes corretoras de visão, aparelho auxiliar de audição, de prótese física ou as adaptações do veículo impostas por ocasião da concessão ou da renovação da licença para conduzir.
(grifei)



O Extrato do Auto de Infração de Trânsito acostado aos autos demonstra que as notificações (NAITs) foram entregues ao proprietário do veículo, que não indicou o condutor, de forma que restou lavrada autuação em desfavor dele, denominada autuação virtual, gerada administrativamente no órgão de trânsito, através do cruzamento de dados do sistema.


Cumpre registrar que a Resolução 404/2012 e a Resolução 619/2016, ambas do CONTRAN, estabelecem que estando o condutor indicado ou o proprietário de veículo (que não indicar condutor no prazo estabelecido) em situação que se enquadre nas condutas previstas nos incisos do art. 162 do CTB serão lavrados, sem prejuízo das demais sanções administrativas e criminais previstas no código, os respectivos autos de infração de trânsito.


Veja-se o disposto nas Resoluções 404/2012 e 619/2016 do CONTRAN, respectivamente, acerca da identificação do condutor infrator, bem como sobre a responsabilidade do proprietário:

III ?
DA IDENTIFICAÇÃO DO CONDUTOR INFRATOR

Art. 4º Sendo a infração de responsabilidade do condutor, e este não for identificado no ato do cometimento da infração, a Notificação da Autuação deverá ser acompanhada do Formulário de Identificação do Condutor Infrator, que deverá conter, no mínimo:

(...)

§ 2º No caso de identificação de condutor infrator em que a situação se enquadre nas condutas previstas nos incisos do art. 162 do CTB, serão lavrados, sem prejuízo das demais sanções administrativas e criminais previstas no CTB, os respectivos Autos de Infração: I ?
ao proprietário do veículo, por infração ao art. 163 do CTB, exceto se o condutor for o proprietário; e II ? ao condutor indicado, ou ao proprietário que não indicá-lo no prazo estabelecido, pela infração cometida de acordo com as condutas previstas nos incisos do art. 162 do CTB.

§ 3º Ocorrendo a situação prevista no parágrafo anterior, o prazo para expedição da notificação da autuação de que trata o inciso II, parágrafo único, do art. 281 do CTB, será contado a partir da data do protocolo do Formulário de Identificação do Condutor Infrator junto ao órgão autuador ou do prazo final para indicação.


IV ? DA RESPONSABILIDADE DO PROPRIETÁRIO

Art. 5º Não havendo a identificação do condutor infrator até o término do prazo fixado na Notificação da Autuação ou se a identificação for feita em desacordo com o estabelecido no artigo anterior, o proprietário do veículo será considerado responsável pela infração cometida, respeitado o disposto no § 2º do art. 4º.


Da Identificação do Condutor Infrator

Art. 5º - Sendo a infração de responsabilidade do condutor, e este não for identificado no ato do cometimento da infração, a Notificação da Autuação deverá ser acompanhada do Formulário de Identificação do Condutor Infrator, que deverá conter, no mínimo:

Responsabilidade do Proprietário

Art. 6º - O proprietário do veículo será considerado responsável pela infração cometida, respeitado o disposto no § 2º do art. 5º, nas seguintes situações:

I - caso não haja identificação do condutor infrator até o término do prazo fixado na Notificação da Autuação;

II - caso a identificação seja feita em desacordo com o estabelecido no artigo anterior; e

III - caso não haja registro de comunicação de venda à época da infração.


Art. 7º - Ocorrendo a hipótese prevista no artigo anterior e sendo o proprietário do veículo pessoa jurídica, será imposta multa, nos termos do § 8º do art. 257 do CTB, expedindo-se a notificação desta ao proprietário do veículo, nos termos de regulamentação específica.


O art. 257, § 7º, do CTB, prevê que, não identificado o infrator pelo proprietário, este será responsabilizado, in verbis:
Art. 257.
As penalidades serão impostas ao condutor, ao proprietário do veículo, ao embarcador e ao transportador, salvo os casos de descumprimento de obrigações e deveres impostos a pessoas físicas ou jurídicas expressamente mencionados neste Código.

(...)

§ 7o Não sendo imediata a identificação do infrator, o principal condutor ou o proprietário do veículo terá quinze dias de prazo, após a notificação da autuação, para apresentá-lo, na forma em que dispuser o Conselho Nacional de Trânsito (Contran), ao fim do qual, não o fazendo, será considerado responsável pela infração o principal condutor ou, em sua ausência, o proprietário do veículo.
(Redação dada pela Lei nº 13.495, 2017) (Vigência)
Importante registrar que a lei possibilita o afastamento da presunção de que o proprietário é o condutor (infrator), ao conceder-lhe prazo para a indicação daquele.
Somente após esta oportunidade e, na omissão do proprietário, é que este será considerado o condutor-infrator, inexistindo, portanto, afronta aos direitos da parte.

Registro, ainda, que a decisão proferida pelo STF quando do julgamento da ADI 2.998 não versa sobre a situação evidenciada nos autos, conforme bem pontuou o Des.
Irineu Mariani quando do julgamento de caso análogo ao presente (Apelação Cível nº 70084836543):

?
(...) não se aplica a decisão do STF na ADI 2.998, julgada em 10-4-2019, visto que não examinou a matéria versada no caso sub judice, e sim outras relacionadas às condições criadas pelo CONTRAN, como a condição de serem pagos os tributos, encargos e multas para ser expedido o novo certificado de licenciamento anual?
Porque pertinente, cabe destacar que a questão foi objeto de Incidente de Uniformização de Jurisprudência perante as Turmas Recursais da Fazenda Pública que decidiu pela validade da infração virtual.
Ainda que a decisão não seja vinculante, como atentou o apelante, é verdade que sua observância prestigia a segurança jurídica das relações, valorizando a uniformidade da prestação jurisdicional. Segue a ementa do julgado:

INCIDENTE DE UNIFORMIZAÇÃO DE JURISPRUDÊNCIA.
TURMAS RECURSAIS DA FAZENDA PÚBLICA REUNIDAS. DEPARTAMENTO ESTADUAL DE TRÂNSITO DO RIO GRANDE DO SUL ? DETRAN/RS. INFRAÇÕES VIRTUAIS/ CORRELATAS. - Tanto a Resolução n° 404/2012 quanto a que a sucedeu, a Resolução n° 619/2016, ambas do CONTRAN, estabelecem que estando o condutor indicado ou o proprietário de veículo (que não indicar condutor no prazo estabelecido) em situação que se enquadre nas condutas previstas nos incisos do art. 162 do CTB, serão lavrados, sem prejuízo das demais sanções administrativas e criminais previstas no código, os respectivos autos de infração de trânsito. - A discussão acerca da necessidade de flagrância para a autuação não se sustenta. Ainda que não identificado o real condutor quanto da primeira infração, certo é que a lei possibilita que se...

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