Acórdão nº 70085523579 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Câmara Cível, 14-04-2022

Data de Julgamento14 Abril 2022
ÓrgãoSegunda Câmara Cível
Classe processualApelação
Número do processo70085523579
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO




LFC

Nº 70085523579 (Nº CNJ: 0001846-76.2022.8.21.7000)

2022/Cível


APELAÇÃO CÍVEL.
DIREITO PÚBLICO NÃO ESPECIFICADO. CONCESSÃO DOS direitos de exploração dos serviços de distribuição de gás. MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE E COMPANHIA DE GÁS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - SULGÁS. COBRANÇA, PELO MUNICÍPIO, DE REMUNERAÇÃO, OU DAÇÃO EM PAGAMENTO, PELA UTILIZAÇÃO DO SUBSOLO DE VIA PÚBLICA PARA A INSTALAÇÃO DE DUTOS OBJETIVANDO O TRANSPORTE DE GÁS NATURAL. LEI MUNICIPAL Nº 8.712/89. INVIABILIDADE FRENTE À CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO ESTADUAL. TEMA Nº 261 DO STF. REPERCUSSÃO GERAL. RE 581.947/RO. PRECEDENTES JURISPRUDENCIAIS.

1. O Plenário do STF, no julgamento do RE 581.947/RO, rel. Min. Eros Grau, firmou o entendimento de que o Município não pode cobrar indenização das concessionárias de serviço público em razão da instalação de equipamentos necessários à prestação do serviço em faixas de domínio público de vias públicas (bens públicos de uso comum do povo), a não ser que a referida instalação resulte em extinção de direitos. Tema 261 do STF.

2. Mostra-se pacífico o entendimento tanto do STF, quanto do STJ, no sentido de que a cobrança em face de concessionária de serviço público, pelo uso de solo, subsolo ou espaço aéreo é ilegal (seja para a instalação de postes, dutos ou linhas de transmissão, p. ex.) porque a utilização, neste caso, reverte em favor da sociedade, razão pela qual não cabe a fixação de preço público, e a natureza do valor cobrado não é de taxa, pois não há serviço público prestado ou poder de polícia exercido.

APELO PROVIDO.

Apelação Cível


Segunda Câmara Cível

Nº 70085523579 (Nº CNJ: 0001846-76.2022.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

COMPANHIA DE GAS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - SULGAS


APELANTE

MUNICIPIO DE PORTO ALEGRE


APELADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Segunda Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em dar provimento ao recurso.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária (Presidente), os eminentes Senhores Des.ª Laura Louzada Jaccottet e Des.
João Barcelos de Souza Júnior.

Porto Alegre, 14 de abril de 2022.


DES.ª LÚCIA DE FÁTIMA CERVEIRA,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Lúcia de Fátima Cerveira (RELATORA)

Trata-se de recurso de apelação interposto por COMPANHIA DE GAS DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL - SULGAS em face da sentença que julgou improcedente a ação ordinária que move contra o MUNICÍPIO DE PORTO ALEGRE, nos seguintes termos:

?
...

ISSO POSTO, JULGO IMPROCEDENTE o pedido formulado pela parte autora na inicial, rejeitada a preliminar, nos exatos termos da fundamentação.


CONDENO a parte requerente ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, os quais vão fixados em 10% sobre o valor atribuído à causa, tendo em vista o trabalho desenvolvido, em observância ao artigo 20, §3º, do CPC.


Publique-se.

Registre-se.

Intimem-se.?

Em suas razões, diz ser concessionária do serviço público estadual de distribuição de gás natural canalizado do Estado do Rio Grande do Sul, e para a fiel execução dos serviços concedidos mostra-se necessária a construção de ramais de distribuição de gás.
Relata que, através de Contrato de Concessão celebrado entre o Estado do Rio Grande do Sul e a SULGÁS, foi dado em concessão à Autora, pelo período de cinquenta anos, os ?direitos de exploração dos serviços de distribuição de gás, por meio de canalizações, a todo e qualquer consumidor ou segmentos industrial, comercial, institucional e residencial, para toda e qualquer utilização ou finalidade.\" Afirma que o contrato de concessão é expresso em autorizar e, até mesmo, obrigar a exploração e distribuição de gás natural no Estado do Rio Grande do Sul, de forma exclusiva, em prol da efetiva continuidade da prestação do serviço público essencial. Diz ser necessária a construção de uma rede de tubulação de gás, feita por meio de canalizações subterrâneas, o que demanda significativos investimentos com a instalação de tubos e caixas. Essa construção, contudo, acaba sendo ainda mais onerosa por conta de uma ?remuneração? cobrada pelo Município de Porto Alegre, que foi transformada em uma ?dação em pagamento?. Alega que com a edição da Lei Municipal nº 8.721/01, regulamentada pelo Decreto Municipal nº 13.384/01 e suas alterações, o uso do subsolo das vias públicas ficou condicionado ao pagamento de uma elevada ?remuneração? ao Município de Porto Alegre. Para efeito da cobrança da remuneração, conforme disposto no art. 2º da referida Lei, ?considera-se a utilização do solo das vias públicas, passeios públicos, prédios públicos, obras de arte, logradouros, bem como a utilização da via aérea com ponto de apoio nos postes, ou na parte inferior da via ou leitos, com postes de visita ou não?. Diz ser obrigada a atender aos dispositivos da Lei Municipal nº 8.712/01, bem como do Decreto Municipal nº 15.508/07, sob pena de não conseguir a licença para instalação dos ramais de distribuição de gás, conforme se demonstra pelas licenças já anexadas aos autos do processo. Alega que o desenvolvimento de novas redes de gás está ameaçado por estes altíssimos custos impostos pelo Município, de forma ilegítima, abusiva e ilegal, com a edição da Lei Municipal nº 8.721/01, cujo pagamento se tornou condição para a ?permissão? do exercício da atividade da Autora. Ressalta que o subsolo nas vias públicas constitui bem público, inserido na categoria dos bens de uso comum do povo, entendidos como propriedade pública. Alega que a lei municipal não estabeleceu parâmetro algum para a fixação da ?remuneração?, o que foi feito apenas no Decreto nº 13.384/01 e suas alterações que a regulamentou, sendo definido arbitrariamente pelo Município. Diz que, além de os parâmetros da cobrança não constarem de uma lei, sua determinação depende de variável fixada unilateral e arbitrariamente pelo Município, conduzindo a valores abusivos. Refere que o pagamento é exigido sem que haja qualquer contrapartida ou ônus suportado pelo Município. Ressalta que se está diante de uma cobrança com evidente natureza tributária, tendo em vista sua compulsoriedade e pelas circunstâncias em que é exigida. Sustenta que as prestadoras de serviços que fazem uso do subsolo são instadas a pagar uma ?taxa municipal? que não possui qualquer contrapartida. Diz que o Município está criando sérios entraves à adequada oferta de fornecimento de gás na região de Porto Alegre, em razão da cobrança ilegal da ?remuneração? para o uso do subsolo, que tem impacto significativo no custo para disponibilização do serviço, prejudicando os seus usuários. Alega que a atuação do Município, com base na malfadada legislação, causa problemas à exploração do serviço público essencial e à expansão da rede de gás na capital gaúcha. Refere que o Município viola a esfera de competência da União Federal, a quem cabe legislar privativamente sobre energia (como é o caso do gás natural), conforme dispõe o art. 22, inciso IV, da Constituição Federal. Refere violação ao princípio da legalidade, pois embora a ?remuneração? seja referida na Lei Municipal nº 8.712/01, é por meio do Decreto nº 13.384/01 e suas alterações que foi efetivamente instituída e foram delimitados os parâmetros para sua cobrança, gerando valores arbitrários e absurdos. Sustenta que não deve ser cobrada a remuneração em tela em razão de incidir diretamente sobre bens essenciais à prestação do serviço público pela concessionária de distribuição de gás natural ? SULGÁS. Diz que o contrato de concessão prevê que a SULGÁS está autorizada a praticar todos os atos necessários à instalação, manutenção e exploração dos serviços concedidos, bem como a sua atualização e adequação às necessidades dos usuários, e ao fiel cumprimento das obrigações assumidas. Aduz que o Município não poderia efetuar nenhuma cobrança pela utilização do subsolo por outras concessionárias de serviços públicos, como ocorre no caso vertente, sob pena de contrariar objetivo do legislador de preservar a modalidade das tarifas públicas, garantindo, com isso, a disponibilidade dos serviços públicos para todos indistintamente. Observa que a Lei Federal nº 11.909/2009 foi revogada pela Lei Federal nº 14.134/2021 (nova lei do gás), que entrou em vigor em 09/04/2021. Diz que o contrato de concessão celebrado entre o Estado do RGS e a SULGÁS compreende a prestação do serviço em todo o Estado do Rio Grande do Sul. Nesse sentido, deve ser observada a hierarquia constitucional existente entre os entes federativos (Estado e Município), sendo evidente que o Município não pode interferir nessas questões (quais sejam, prestação dos serviços locais de gás canalizado). Alega que, no caso, as exigências e condições impostas pelo Município de Porto Alegre violam a regra constitucional antes mencionada, e não permitem o desenvolvimento econômico local (diga-se, do próprio município), onerando os serviços públicos prestados pela SULGÁS e todos os usuários do gás natural (residências, comércios, hospitais, indústrias, veículos, entre outros). Destaca que a competência para legislar sobre energia (como é o caso do gás natural) é privativa da União, conforme art. 22, inciso IV, da Constituição Federal, não podendo o Município, evidentemente, legislar sobre tais questões, mesmo que relacionadas a interesse local, em razão da especificidade da matéria e da hierarquia existente entre os entes federados. Além disso, conforme Parágrafo Único, do art. 22, da Constituição da República, somente os Estados ficam autorizados, mediante lei complementar, a legislar sobre tal assunto. Afirma que a Lei outorgou ao Poder Executivo a mais ampla discricionariedade com relação aos valores a serem cobrados. Diante disso, não poderia o Município-Recorrido impor uma obrigação pecuniária compulsória sem que lei disciplinasse de forma estrita e clara os parâmetros de fixação dos valores em cada caso...

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