Acórdão nº 70085568509 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Câmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores, 29-06-2022

Data de Julgamento29 Junho 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualReclamação Criminal
Número do processo70085568509
Tipo de documentoAcórdão

PODER JUDICIÁRIO




AVAS

Nº 70085568509 (Nº CNJ: 0006339-96.2022.8.21.7000)

2022/Crime


RECLAMAÇÃO.
TURMA RECURSAL CRIMINAL. PRECEDENTES DO STJ. DIVERGÊNCIA. INADEQUAÇÃO PROCEDIMENTAL. HIPÓTESE DE CABIMENTO NÃO CONFIGURADA. SUCEDÂNEO RECURSAL. INVIABILIDADE. RECLAMAÇÃO NÃO CONHECIDA.
Reclamacao Criminal


Câmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores


Nº 70085568509
Nº CNJ: 0006339-96.2022.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

ALEXANDRE ILHA GONSALVES


RECLAMANTE

JUIZO DA TURMA RECURSAL CRIMINAL


RECLAMADO

MINISTéRIO PúBLICO


INTERESSADO

LUCIANA LEITE JúNIOR


INTERESSADa


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes da Câmara da Função Delegada dos Tribunais Superiores do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em não conhecer da reclamação.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.
Alberto Delgado Neto (Presidente) e Des.ª Lizete Andreis Sebben.

Porto Alegre, 29 de junho de 2022.


DES. ANTONIO VINICIUS AMARO DA SILVEIRA,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Antonio Vinicius Amaro da Silveira (RELATOR)

1.
ALEXANDRE ILHA GONSALVES foi denunciado pelo MINISTÉRIO PÚBLICO como incurso nas sanções do artigo 65 do Decreto-Lei nº 3.688/41.

Em 30 de outubro de 2019, o juízo de piso julgou procedente a denúncia e condenou o ora Reclamente nas sanções do artigo 65 do Decreto-Lei nº 3.688/41.


Intimado, o Reclamante interpôs o Recurso Crime 71009243007, o qual foi conhecido em parte e, na parte em que conhecido, parcialmente provido, em acórdão da Turma Recursal Criminal dos Juizados Especiais Criminais assim ementado:
PERTURBAÇÃO DA TRANQUILIDADE.
ART. 65 DO DL 3.688/41. 1. IMPARCIALIDADE DO JUÍZO ?A QUO? ? EXCEÇÃO DE SUSPEIÇÃO. INÉPCIA DA DENÚNCIA. MATÉRIAS JÁ ANALISADAS EM JULGAMENTOS ANTERIORES. IMPOSSIBILIDADE DE REDISCUSSÃO. NÃO CONHECIMENTO. Não há como conhecer do recurso na parte em que questiona a imparcialidade da magistrada singular e a inépcia da inicial acusatória, porquanto se tratam de matérias já apreciadas em acórdãos anteriores por esta TRCrim (exceção de suspeição nº 71008552762, julgada em 08.07.2019; Habeas Corpus nº 71008500480, Julgado em 13.05.2019), ocasiões em que refutadas as referidas alegações, estando, portanto, acobertadas as matérias pelo manto da coisa julgada. Apelo parcialmente conhecido. MÉRITO. SENTENÇA CONDENATÓRIA MANTIDA. 2. Réu que, acintosamente, perturbou a tranquilidade da vítima, massoterapeuta, por diversas vezes, por meio de ligações e mensagens (via SMS e Whatsapp) telefônicas, insistindo para que lhe aplicasse massagem tântrica, e, mesmo com a recusa, insistiu na realização do serviço, enviando à ofendida foto de seu órgão sexual. Posteriormente, após a vítima publicar em rede social relato do ocorrido, o acusado perpetrou nova perturbação da tranquilidade, desta vez ao forçar encontro pessoal com a ofendida ao comparecer em seu local de trabalho para pleitear a exclusão da postagem. Elementos subjetivos configurados - dolo e motivo reprovável. Palavra da vítima corroborada pela prova testemunhal e documental. Impositiva a manutenção do édito condenatório. 3. Ausente qualquer circunstância judicial negativa, deve a pena privativa de liberdade ser substituída pela pena de multa, fixada em 10 dias-multa, à razão unitária mínima. 4. Nos termos do art. 84, parágrafo único, da Lei 9.099/95, efetuado o pagamento da multa, não deve constar o registro no rol de culpados. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO, E, NO QUE CONHECIDO PARCIALMENTE PROVIDO.

Interpostos desse julgado, pelo ora Reclamante, os Embargos de Declaração 71009791815, restaram rejeitados, em acórdão de seguinte ementa:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
OMISSÕES E CONTRADIÇÕES INEXISTENTES. EFEITOS MODIFICADORES. INADMISSIBILIDADE. 1. Os embargos de declaração são o instrumento facultado às partes para a integração ? não substituição ? de decisões judiciais, os quais têm cabimento quando a decisão atacada apresentar obscuridade, contradição ou omissão, nos termos do art. 83 da Lei 9.099/95, hipóteses não configuradas no caso em apreço. 2. Impropriedade do pedido de retorno dos autos à origem para exame da possibilidade de proposição de acordo de não persecução penal (ANPP), figura introduzida no CPP pela Lei nº 13.964/19, aplicável apenas aos crimes não passíveis de transação penal, e mesmo assim antes da sentença. 3. Inviabilidade de novo enfrentamento de matérias já decididas nos autos. 4. Impossibilidade de reexame do conjunto probatório pela via dos embargos declaratórios. EMBARGOS REJEITADOS.

Inconformado, ajuíza o Reclamante a reclamação em epígrafe, forte nos artigos 33, § 2º, do Regimento Interno do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul e 1º e 2º da Resolução n.º 03/2016 do Superior Tribunal de Justiça, combinados com os artigos 988 a 993 do Código de Processo Civil e artigo 3º do Código de Processo Penal.
Alega, para tanto, que o acórdão reclamado diverge da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, pois (I) incorreu em nulidade, (a) por cerceamento de defesa, visto que, ?havendo pedido expresso de preferência de julgamento, com sustentação oral, ao interpor o recurso (fl. 205), oportunidade em que o defensor do acusado requereu a intimação, com antecedência, da sessão de julgamento para realizar sustentação oral, não poderia o órgão julgador proceder com o julgamento de forma virtual, sem possibilitar à defesa o direito de sustentar oralmente suas razões perante o órgão julgador? (fl. 07 dos autos eletrônicos), e (b) por ausência de fundamentação da decisão que recebeu a denúncia, deixando, ainda, de enfrentar as teses defensivas ?relevantes e urgentes trazidas na defesa prévia? (fl. 18 dos autos eletrônicos), e (II) ?inexistente a continuidade normativo-típica, a amparar a condenação do acusado, visto que o crime antecedente não se enquadra típica e formalmente no art. 147-A do Código Penal que exige a perturbação ?reiteradamente e por qualquer meio??, razão pela qual postula o reconhecimento da abolitio criminis ?em razão da superveniência da Lei nº 14.132/2021, que revogou o art. 65 do Decreto-Lei nº 3.688/1941, pelo qual o reclamante foi denunciado e condenado criminalmente, devendo haver a extinção da punibilidade do recorrente, nos termos do art. 107, inciso III, do Código Penal, tendo em vista o princípio da legalidade e da retroatividade de lei penal mais benéfica, insculpidos no art. 5º, incisos XXXIX e XL da Constituição Federal, considerando as premissas fixadas no AgRg nos EDcl no REsp 1.863.977/SC, julgado em 14/12/2021, da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça? (fl. 23 dos autos eletrônicos).

Instado, e. Juiz Relator do acórdão objurgado prestou informações.


A vítima contestou, pugnando pela improcedência da reclamação.


Ministério Público manifestou-se pelo não acolhimento da reclamação.


É o relatório.

VOTOS

Des. Antonio Vinicius Amaro da Silveira (RELATOR)

Consoante ministério de Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha
, a reclamação insculpida no artigo 988 do Código de Processo Civil
?
é uma ação de competência originária de tribunal, prevista na Constituição Federal, nas Constituições Estaduais e no CPC, que tem o objetivo de preservar a competência e garantir a autoridade das decisões dos tribunais, bem como garantir a observância de decisão do STF em controle concentrado de constitucionalidade, a observância de enunciado de súmula vinculante e de precedente proferido em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência?.
Supremo Tribunal Federal, quando julgamento, em Sessão Plenária, de 26/8/2009, do EDcl em RE 571572, capitaneado pelo voto da e. Ministra Ellen Gracie, definiu ?
o cabimento, em caráter excepcional, da reclamação prevista no art. 105, I, f, da Constituição Federal, para fazer prevalecer, até a criação da turma de uniformização dos juizados especiais estaduais, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça na interpretação da legislação infraconstitucional?, em acórdão assim ementado:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO.
RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUSÊNCIA DE OMISSÃO NO ACÓRDÃO EMBARGADO. JURISPRUDÊNCIA DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. APLICAÇÃO ÀS CONTROVÉRSIAS SUBMETIDAS AOS JUIZADOS ESPECIAIS ESTADUAIS. RECLAMAÇÃO PARA O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. CABIMENTO EXCEPCIONAL ENQUANTO NÃO CRIADO, POR LEI FEDERAL, O ÓRGÃO UNIFORMIZADOR.

1. No julgamento do recurso extraordinário interposto pela embargante, o Plenário desta Suprema Corte apreciou satisfatoriamente os pontos por ela questionados, tendo concluído: que constitui questão infraconstitucional a discriminação dos pulsos telefônicos excedentes nas contas telefônicas; que compete à Justiça Estadual a sua apreciação; e que é possível o julgamento da referida matéria no âmbito dos juizados em virtude da ausência de complexidade probatória. Não há, assim, qualquer omissão a ser sanada.

2. Quanto ao pedido de aplicação da jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, observe-se que aquela egrégia Corte foi incumbida pela Carta Magna da missão de uniformizar a interpretação da legislação infraconstitucional, embora seja inadmissível a interposição de recurso especial contra as decisões proferidas pelas turmas recursais dos juizados especiais.

3. No âmbito federal, a Lei 10.259/2001 criou a Turma de Uniformização da Jurisprudência, que pode ser acionada quando a decisão da turma recursal contrariar a jurisprudência do STJ. É possível, ainda, a provocação dessa Corte Superior após o julgamento da matéria pela citada Turma de Uniformização.

4. Inexistência de órgão uniformizador no âmbito dos juizados estaduais, circunstância que inviabiliza a aplicação da jurisprudência do STJ. Risco de manutenção de decisões divergentes quanto à interpretação da legislação federal, gerando insegurança jurídica e uma prestação jurisdicional incompleta, em decorrência da inexistência de outro meio eficaz para resolvê-la.

5...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT