Acórdão nº 70085605723 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Tribunal Pleno, 05-05-2022

Data de Julgamento05 Maio 2022
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualDireta de Inconstitucionalidade
Número do processo70085605723
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoTribunal Pleno

PODER JUDICIÁRIO




CER

Nº 70085605723 (Nº CNJ: 0010061-41.2022.8.21.7000)

2022/Cível


AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE.
MUNICÍPIO DE VERANÓPOLIS. LEI MUNICIPAL Nº 7.583, DE 15 DE JANEIRO DE 2021. INOBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGISLATIVO. AUSÊNCIA DA OBRIGATÓRIA PARTICIPAÇÃO POPULAR PARA DELIBERAÇÃO ACERCA DE LEI SOBRE A OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO E PLANEJAMENTO MUNICIPAL. INEXISTÊNCIA DE ESTUDO TÉCNICO PARA ACOMPANHAR O PROJETO DE LEI. INCONSTITUCIONALIDADE FORMAL.
1. É formalmente inconstitucional lei municipal que verse sobre planejamento municipal e ocupação do território sem a observação do devido processo legislativo que impõe a participação popular. Caso em que a Lei nº 7.583/2021, que dispõe sobre loteamentos, desmembramentos, fracionamentos de imóveis urbanos e arruamentos no Município e dá outras providências, foi promulgada sem qualquer participação popular, violando o disposto no art. 177, § 5º, da Constituição Estadual e, por conseguinte, o art. 29, XII, da Constituição Federal.

2. Evidenciado, ainda, que o Projeto de Lei nº 485/2019, que culminou na Lei impugnada, foi enviado à Casa Legislativa desacompanhado de qualquer estudo técnico a respeito das novas diretrizes que estavam sendo traçadas para o planejamento e a efetivação da política territorial urbana de Veranópolis, com os seus respectivos impactos, o que seria de muita valia para que o legislador ? e a sociedade que foi preterida de previamente analisá-lo e discuti-lo - bem avaliasse o que estava sendo proposto, sem perder de vista as diretivas estabelecidas pelo art. 176 da Constituição do Estado. Inconstitucionalidade formal configurada.
AÇÃO DIRETA JULGADA PROCEDENTE.


Ação Direta de Inconstitucionalidade


Órgão Especial

Nº 70085605723 (Nº CNJ: 0010061-41.2022.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

PROCURADOR-GERAL DE JUSTICA


PROPONENTE

PREFEITO DO MUNICIPIO DE VERANOPOLIS


REQUERIDO

CAMARA DE VEREADORES DE VERANOPOLIS


REQUERIDO

PROCURADOR-GERAL DO ESTADO


INTERESSADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Órgão Especial do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar procedente a ação direta de inconstitucionalidade.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.ª Iris Helena Medeiros Nogueira (Presidente), Des.
Marcelo Bandeira Pereira, Des. Vicente Barroco de Vasconcellos, Des. Sylvio Baptista Neto, Des. Jorge Luís Dall\'Agnol, Des. Francisco José Moesch, Des. Nelson Antonio Monteiro Pacheco, Des. Luiz Felipe Brasil Santos, Des. Irineu Mariani, Des. Sérgio Fernando Silva de Vasconcellos Chaves, Des. Jorge Alberto Schreiner Pestana, Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro, Des. Carlos Cini Marchionatti, Des. João Batista Marques Tovo, Des. Ney Wiedemann Neto, Des.ª Laura Louzada Jaccottet, Des. Ícaro Carvalho de Bem Osório, Des.ª Lizete Andreis Sebben, Des. Antonio Vinicius Amaro da Silveira, Des. Giovanni Conti, Des. Ricardo Torres Hermann, Des. Alberto Delgado Neto, Des. Ricardo Pippi Schmidt e Des. Niwton Carpes da Silva.

Porto Alegre, 09 de setembro de 2022.


DES. CARLOS EDUARDO RICHINITTI,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Carlos Eduardo Richinitti (RELATOR)

Trata-se de ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA, Ilustre Senhor Marcelo Lemos Dornelles, em face da Lei Municipal nº 7.583, de 15 de janeiro de 2021, do Município de Veranópolis, a qual dispõe sobre loteamentos, desmembramentos, fracionamentos de imóveis urbanos e arruamentos no Município e dá outras providências.

Em suas razões, aponta, em suma, para a existência de vício formal na Lei porque dispõe sobre ordenamento urbano da municipalidade sem a devida participação popular, cuja importância é estampada nos artigos 29, XII, e 182 da Constituição Federal e 177, § 5º, da Constituição Estadual.
Assevera que, ainda que a Constituição e o artigo 2º, II, do Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/01) não disciplinem a forma de inclusão da sociedade na deliberação, refere este último a necessidade de que ela seja assegurada, trazendo diretrizes em seu artigo 43. No caso em análise, afirma que a Câmara de Vereadores de Veranópolis recebeu o Projeto de Lei nº 485, de 11/12/2019, aprovando-o em 21/02/2020, sem propiciar qualquer participação popular seja de cidadãos seja de entidades representativas da sociedade. Além disso, o Projeto de Lei não foi acompanhado de estudo técnico, o qual permitiria ao legislador avaliar o impacto da mudança realizada sobre os diversos vetores que orientam o planejamento e a efetivação da política territorial urbana, o que vai de encontro ao que disciplina o artigo 176 da Constituição Estadual. Colaciona doutrina e jurisprudência. Pede a procedência da ação com a declaração de inconstitucionalidade da Lei nº 7.583/2021 do Município de Veranópolis por ofensa aos artigos 8º, caput, 176 e 177, § 5º, da Constituição Estadual, bem como ao artigo 29, XII, da Constituição Federal. Junta documentos (fls. 25/235).

A petição inicial foi recebida (fls.
241/242).

A Câmara Municipal de Vereadores de Veranópolis ofereceu informações, destacando a ausência de qualquer apontamento de irregularidade quanto ao mérito da Lei e que ela está em vigor há 1 ano e 4 meses.
Defende que, não havendo prejuízo, não há razão para a declaração de inconstitucionalidade de caráter puramente formal. Afirma, ainda, que não há obrigatoriedade legal de realização de audiência pública, seja na Constituição Federal, seja no Estatuto da Cidade, quanto a leis de parcelamento do solo urbano. Essa obrigatoriedade existe apenas para a elaboração do Plano Diretor, conforme artigo 40, § 4º, I, do Estatuto da Cidade (fls. 264/269).

Citado na forma do artigo 95, § 4º, da Constituição Estadual, pugnou o Procurador-Geral do Estado pela manutenção da Lei questionada com base no princípio da presunção de constitucionalidade das leis (fls.
275/278).

O Prefeito Municipal de Veranópolis, por sua vez, embora regularmente notificado (fl. 258), deixou transcorrer o prazo legal sem manifestação (certidão da fl. 281).

Finalmente, a Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela procedência da ação (fls.
282/303).

Vieram-me os autos conclusos para julgamento.


É o relatório.

VOTOS

Des. Carlos Eduardo Richinitti (RELATOR)

Eminentes Colegas.


Como antecipado, insurge-se o proponente da ação contra a Lei nº 7.583, de 15 de janeiro de 2021, do Município de Veranópolis, a qual dispõe sobre loteamentos, desmembramentos, fracionamentos de imóveis urbanos e arruamentos no Município e dá outras providências.
Para que não pairem dúvidas a respeito de seu objeto, transcrevo os seus dois primeiros artigos:
Art. 1º Esta Lei estabelece normas gerais sobre as diversas formas de parcelamento do solo urbano no Município de Veranópolis, supletivamente à Legislação Federal e Estadual, bem como consolida as leis que tratam do mesmo assunto no âmbito Municipal.


Art. 2º O parcelamento do solo, para fins urbanos, será realizado sob a forma de loteamentos abertos ou de Acesso Controlado, desmembramento e condomínio de lotes por unidade autônoma, conforme segue:

§ 1º Considera-se loteamento aberto ou de acesso controlado; a subdivisão de gleba em lotes, que implique na abertura de novos logradouros ou vias de circulação, ou ainda o prolongamento, modificação e ampliação dos já existentes, com a implantação da infraestrutura prevista nesta Lei.


§ 2º Considera-se desmembramento, a subdivisão do imóvel em unidades juridicamente independentes, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique na abertura de novas vias e logradouros públicos, nem de prolongamento, modificação ou ampliação das já existentes.


§ 3º Os Condomínios de lotes, obrigatoriamente, deverão ter normas e legislação condominial próprias, Convenção de Condomínio e Regimento Interno, registrada no Cartório de Registros de Imóveis, conforme o capítulo exclusivo desta Lei, bem como o disposto na Lei Federal 4.591 de 16 de Dezembro de 1.964, o Decreto Lei 271/67, Artigo 3º e outras pertinentes.
(Grifei)
A apontada inconstitucionalidade formal está assentada em dois fundamentos segundo o proponente: (a) ausência de participação popular no processo legislativo; e (b) inexistência de estudo técnico quando da apresentação do Projeto de Lei nº 485 de 11/12/2019 ao Poder Legislativo.


Adianto, desde já, que assiste razão ao proponente.


Primeiramente, vejamos o que estabelece o artigo 177, § 5º, da Constituição Estadual:

Art. 177 - Os planos diretores, obrigatórios para as cidades com população de mais de vinte mil habitantes e para todos os Municípios integrantes da região metropolitana e das aglomerações urbanas, além de contemplar os aspectos de interesse local, de respeitar a vocação ecológica, o meio ambiente e o patrimônio cultural, serão compatibilizados com as diretrizes do planejamento do desenvolvimento regional.
(Redação dada pela Emenda Constitucional nº 44,...

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