Acórdão nº 70085649713 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Terceiro Grupo de Câmaras Criminais, 26-04-2023

Data de Julgamento26 Abril 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRevisão Criminal
Número do processo70085649713
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoTerceiro Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO


@ (PROCESSO ELETRÔNICO)

BCF

Nº 70085649713 (Nº CNJ: 0014460-16.2022.8.21.7000)

2022/Crime


REVISÃO CRIMINAL.
ATENTADO VIOLENTO AO PUDOR CONTRA CRIANÇA.

1. AFIRMADA ILEGITIMIDADE AD CAUSAM DO MINISTÉRIO PÚBLICO. Ação não conhecida no ponto. Revisão criminal não cumpre a função de sucedâneo recursal. Pretensão desacolhida.

2. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DO ART. 215-A DO CP. IMPOSSIBILIDADE. Inviabilidade de desclassificação do delito para o crime de importunação sexual, uma vez que a hipótese ora em apreço não se subsome ao novel tipo penal previsto no art. 215-A do CP e, sim, crime de estupro de vulnerável.

3. REFORMATIO IN PEJUS INDIRETA. REDUÇÃO DA PENA EM DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO. Havendo novo julgamento com imposição de pena superior à fixada no primeiro (anulado), resta caracterizada a violação do princípio da ne reformatio in pejus. Violação ao princípio da non reformatio in pejus, devendo prevalecer a pena máxima réu de oito (08) anos, um (01) mês e trinta (30) dias de reclusão, mantido o regime fechado.

4. DETERMINADA A RETIFICAÇÃO DO PEC DO APENADO.

CONHECIMENTO PARCIAL DA AÇÃO E, NO MÉRITO, JULGADA IMPROCEDENTE, COM REDUÇÃO DE PENA EM DISPOSIÇÃO DE OFÍCIO.
UNÂNIME.
Revisão Criminal


Terceiro Grupo Criminal

Nº 70085649713 (Nº CNJ: 0014460-16.2022.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

L.C.Z.

.
.
REQUERENTE

M.R.-.
M.P.E.R.G.S.

..
REQUERIDO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Terceiro Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em conhecer em parte da revisão criminal e, no mérito, negar-lhe provimento, e, em disposição de ofício, reduzir a pena aplicada réu para oito (08) anos, um (01) mês e trinta (30) dias de reclusão, em atenção à vedação de reformatio in pejus indireta, determinada a retificação do PEC do apenado.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des.
Ivan Leomar Bruxel (Presidente), Des.ª Vanderlei Teresinha Tremeia Kubiak, Des. Sérgio Miguel Achutti Blattes e Des. João Batista Marques Tovo.

Porto Alegre, 26 de abril de 2023.


DES.ª BERNADETE COUTINHO FRIEDRICH,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Bernadete Coutinho Friedrich (RELATORA)

Trata-se de revisão criminal ajuizada por L. C. Z. contra acórdão unânime trânsito em julgado que, nos autos da apelação criminal autuada sob o nº 70082063348, de Relatoria da Desa.
Lizete Andreis Sebben, desacolheu a preliminar e, no mérito, desproveu o recurso de defensivo, mantendo hígida a sentença que condenou o réu nas sanções dos art. 214, c/c 224, ?a?, na forma do art. 71, todos do CP, à pena definitiva de nove (09) anos, dez (10) meses e quatro (04) dias de reclusão, em regime inicial fechado.

Na petição inicial, o autor preliminarmente disserta sobre a ilegitimidade ad causam do Ministério Público para a propositura da ação penal, aduzindo a decadência do direito de queixa e postulando o reconhecimento da extinção da punibilidade com base no art. 107, inciso IV, do CPP.
No mérito, requer a desclassificação da conduta para o crime de importunação sexual, previsto no art. 215-A, do CP.

Postula a procedência da revisão criminal.


O Ministério Público lança parecer, opinando pelo conhecimento parcial da revisão criminal e, no mérito, pelo respectivo desprovimento, com redução da pena, em disposição de ofício.


Conclusos para julgamento.


O Terceiro Grupo Criminal adotou o procedimento informatizado utilizado pelo TJRGS, tendo sido atendido o disposto no art. 609 do CPP.

É o relatório.

VOTOS

Des.ª Bernadete Coutinho Friedrich (RELATORA)

Conheço, em parte, da ação, reportando-me como fundamento de decidir, ao parecer ministerial, de lavra da Exma.
Procuradora, Dra. MARIA IGNEZ FRANCO SANTOS, que passo a transcrever:

?
A decisão condenatória transitou em julgado em 8- 2-2022, estando preenchido o requisito estampado no art. 621, caput (processo findo), do Código de Processo Penal (fl. 127).

É caso de conhecimento parcial do pedido, apenas no tocante à alegação de erro técnico da dosimetria da pena, com base nos artigos 621, III, e 626, caput, ambos do CPP.


Em relação à aventada decadência do direito de ação, observa-se que a questão foi rechaçada na ação originária.
Interpostos embargos de declaração em face do acórdão que julgou a Apelação Criminal n.º 70082063348, aduziu a 5ª Câmara Criminal, à unanimidade, que ?A preliminar aventada pela defesa não merece prosperar, uma vez que demonstrada a hipótese (umas delas, quando vítima ou seus pais não podem prover as despesas do processo), fl. 08, que excepcionava a previsão legal ? em relação à ação penal privada - à época dos fatos (anteriores à alteração legislativa promovida pela Lei nº 12.015/2009)? (fl. 1067, apenso). Ou seja, entendeu o juízo ad quem que o pai da ofendida, declarando hipossuficiência financeira, ofereceu a necessária representação (fl. 8, em apenso), preenchendo-se o requisito estampado na antiga redação do art. 225, § 1º, inciso I, e § 2º, do CP.

Consoante remansosa jurisprudência, a revisão criminal não constitui segunda apelação à disposição do condenado insatisfeito com o resultado do julgamento:

?
REVISÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE DROGAS E ASSOCIAÇÃO PARA O NARCOTRÁFICO. CONDENAÇÕES. PLEITO ABSOLUTÓRIO OU DESCLASSIFICATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE DE REVOLVIMENTO FÁTICO
PROBATÓRIO.
DIMINUIÇÃO DAS SANÇÕES. AUSÊNCIA DE ERRO TÉCNICO. NÃO CONHECIMENTO. As insurgências do autor demonstram insatisfação com o resultado proferido no processo, pois busca ele a reapreciação de teses defensivas já contempladas na ação originária e reexaminadas na via recursal, não se enquadrando, no entanto, em nenhuma das hipóteses previstas no art. 621 do CPP, até porque ausente qualquer prova nova. Além disso, não houve contrariedade a nenhum entendimento externado por Tribunal Superior, tratando-se de mera inconformidade acerca da análise do conjunto probatório. Por fim, impossível eventual modificação da pena em sede de ação revisional, a qual não tem natureza de segunda apelação, não se prestando ao mero reexame de questões já apreciadas e decididas no processo de origem. Revisão criminal não conhecida. Unânime? (Revisão Criminal n.º 70085554640, Primeiro Grupo de Câmaras Criminais, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em: 14-07-2022). Sem grifo no original.

Pelo conhecimento parcial do pedido.


MÉRITO

Não prospera o pleito subsidiário de desclassificação da conduta para o delito de importunação sexual (art. 215-A do Código Penal, com redação da Lei n.º 13.718/20181).


O crime praticado amolda-se perfeitamente à descrição do art. 214 do CP, revogado pela Lei n.º 12.015/2009, que descrevia a conduta de ?
Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso diverso da conjunção carnal?, sendo que a vítima, no caso concreto, possuía, à época, apenas 7 anos de idade. Na espécie, não há como enquadrar a conduta no art. 215-A do Código Penal, que somente incide ?...se o ato não constitui crime mais grave?.

Ademais, recentemente (08-06-2022), houve definição do Tema Repetitivo n.º 1121 da Terceira Seção de Julgamento do Superior Tribunal de Justiça, que entendeu pela impossibilidade de desclassificação do crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP, incluído no CP pela Lei n.º 12.015/2009) para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP).


A tese fixada originou-se da análise dos Recursos Especiais nº 1.958.862, n.º 1.959.697, n.º 1.954.997 e n.º 1.957.637, afetados como paradigmas da controvérsia repetitiva, nos seguintes termos: \
"Presente o dolo específico de satisfazer lascívia própria ou de terceiro, a prática de ato libidinoso com menor de quatorze anos configura o crime de estupro de vulnerável (art. 217-A do CP), independentemente da ligeireza ou da superficialidade da conduta, não sendo possível a desclassificação para o delito de importunação sexual (art. 215-A do CP)\".

Colacionam-se alguns julgados do Superior Tribunal de Justiça assentando que prática de qualquer ato libidinoso contra menor de 14 anos configura estupro de vulnerável:

?
PENAL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. DESCLASSIFICAÇÃO DA CONDUTA PARA IMPORTUNAÇÃO SEXUAL. IMPOSSIBILIDADE. VÍTIMA MENOR DE 14 ANOS. PRESUNÇÃO ABSOLUTA DE VIOLÊNCIA. PRINCÍPIO DA ESPECIALIDADE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. No caso concreto, o Tribunal a quo desclassificou a conduta do acusado, tio das vítimas, do crime do art. 65 do Decreto-Lei nº 3.688/41 para o do art. 217-A do CP, por ter ele realizado carícias nos seios e órgão genial de uma das vítimas e nas nádegas da outra, ainda que por cima da roupa. 2. A conduta imputada ao recorrente se coaduna com a figura típica descrita no art. 217-A do Código Penal, estando a autoria e a materialidade delitiva evidenciadas nos autos. Na expressão \"ato libidinoso\" estão contidos todos os atos de natureza sexual, diversos da conjunção carnal, que tenham a finalidade de satisfazer a libido do agente. 3. Ressalvado meu ponto de vista quanto à possibilidade de desclassificação do tipo penal do art. 217-A para o do art. 215-A, ambos do Código Penal, acompanho o entendimento de ambas as Turmas do Superior Tribunal de Justiça, no sentido da impossibilidade de desclassificação, quando se tratar de vítima menor de 14 anos, concluindo-se ser inaplicável o art. 215-A do CP para a hipótese fática de ato libidinoso diverso de conjunção carnal praticado com menor de 14 anos, pois tal fato se amolda ao tipo penal do art. 217-A do CP, devendo ser observado o princípio da especialidade (AgRg nos EDcl no AREsp n....

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