Acórdão nº 70085663995 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Décimo Primeiro Grupo Cível, 17-03-2023

Data de Julgamento17 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualAção Rescisória
Número do processo70085663995
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoDécimo Primeiro Grupo Cível

PODER JUDICIÁRIO


@ (PROCESSO ELETRÔNICO)

MIAS

Nº 70085663995 (Nº CNJ: 0015888-33.2022.8.21.7000)

2022/Cível


Ação RESCISÓRIA.
ART. 966, V, CPC. VIOLAÇÃO À NORMA JURÍDICA. POÇO ARTESIANO. SÚMULA 343 DO STF. SUCEDÂNEO RECURSAL.

1. A ação rescisória com fundamento no inciso V do art. 966 do CPC pressupõe ofensa inequívoca, direta e evidente à norma jurídica. Hipótese em que o acórdão rescindendo está de acordo com a jurisprudência dominante à época do julgamento, não havendo falar em violação a dispositivo legal.

2. Não é admissível a utilização da ação rescisória como sucedâneo recursal.
Ação rescisória julgada improcedente.

Ação Rescisória


Décimo Primeiro Grupo Cível

Nº 70085663995 (Nº CNJ: 0015888-33.2022.8.21.7000)


Comarca de Porto Alegre

CONDOMINIO EDIFICIO PLAZA RESIDENCIAL


AUTOR

ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL


REU


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Décimo Primeiro Grupo Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, julgar improcedente a ação rescisória.

Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Des.
Arminio José Abreu Lima da Rosa (Presidente), Des. Marco Aurélio Heinz, Des.ª Liselena Schifino Robles Ribeiro, Des.ª Marilene Bonzanini, Des. Miguel Ângelo da Silva, Des. Marcelo Bandeira Pereira e Des. Francisco José Moesch.

Porto Alegre, 17 de março de 2023.


DES.ª MARIA ISABEL DE AZEVEDO SOUZA,

Relatora.


RELATÓRIO

Des.ª Maria Isabel de Azevedo Souza (RELATORA)

Adota-se o relatório da decisão das fls.
704/708:

?Trata-se de ação rescisória ajuizada pelo CONDOMINIO EDIFICIO PLAZA RESIDENCIAL contra o ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL para desconstituir o acórdão da Colenda Vigésima Primeira Câmara Cível que, nos autos da ação ajuizada para obter a autorização para captação de água subterrânea para manter seu poço aberto e em funcionamento, com a finalidade de consumo humano e sistema de combate de incêndio, negou provimento à apelação, confirmando a sentença que julgara improcedente a ação, de seguinte ementa:

?
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. POÇO ARTESIANO. AUTORIZAÇÃO PARA CONSUMO HUMANO. OUTORGA PELO ESTADO. ARTIGOS 12, I, E 30, I, LEI Nº 9.433/97. INDEFERIMENTO. LOCAL DOTADO DE REDE DE ABASTECIMENTO PÚBLICA. ART. 45, § 2º, LEI Nº 11.445/07. A água, como relevantíssimo recurso natural, é bem de uso público comum, como se extrai do art. 1º, I, Lei nº 9.433/97. Com isso, inafastável a necessidade de sua outorga, como decorre do art. 12, I, Lei nº 9.433/97. A legislação estadual assente na competência prevista em o inc. VI, art. 24, CF/88, e, no caso, em norma do art. 30, I, Lei nº 9.433/97, não entra em testilha com a legislação federal, antes a ela se ajustando. Correto, assim, o indeferimento do pleito, assente no art. 96, Decreto Estadual nº 23.430/74, não fosse o art. 45, Lei nº 11.445/07. APELAÇÃO DESPROVIDA.(Apelação Cível, Nº 70084466259, Vigésima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Armínio José Abreu Lima da Rosa, Julgado em: 23-09-2020)?

Fundamenta o pedido no artigo 966, inciso V, do Código de Processo Civil.
Para tanto, alega que (I) ?a decisão viola manifestamente norma jurídica, no caso o artigo 96 do Código das Águas e artigo 12 § 01º e incisos da Lei Federal 9.433/97, artigo 45, § 11 e 12 da Lei Federal 11.445/07 com alteração legislativa dada pela Lei 14.026/2020 e ainda violando os artigos 3º e 31º da Lei Estadual 10.350/94 e artigo 18 da Lei Estadual 6.503/72? e artigo 96 do Código das Águas, (II) ?o Decreto 23.430/74, mais especificamente seus artigos 87 e 96, utilizados pelo DRH/SEMA/RS, como base para o indeferimento administrativo, proibindo o uso da água de poço, são ilegais?, (III) a água do seu poço é apta para o consumo humano, conforme será comprovado, (IV) a água fornecida pela rede pública pode causar risco à saúde pública e ao meio ambiente, diferentemente da água extraída do seu poço, que não prejudica a saúde nem o meio ambiente, (V) ?o artigo 18 da referida Lei, que versa sobre a promoção, proteção e recuperação da saúde pública, impõe ligação à rede pública de abastecimento, mas não torna cogente a utilização exclusiva do sistema público de abastecimento de água?, (VI) ?em 30 de janeiro de 2018, entrou em vigor o Decreto Estadual 53.901/18 que Alterou o artigo 96 do Decreto Estadual 23.430/74, e autorizou o uso de poço para consumo humano, em casos de emergência ou intermitência?, (VII) ?o caso do requerente, encontra-se em plena harmonia com a Lei Federal, pois a captação de água no presente caso, é de quantidade insignificante, tendo a r. decisão, violada manifestamente as normas jurídicas? e (VIII) ?o artigo 96 do Decreto Estadual 23.430/74, viola drasticamente o artigo 84, inciso VI da nossa Carta Republicana de 1988, pois adjudica restrições inexistentes na lei que veio a regulamentar?. Pede a antecipação da tutela para captação de água subterrânea, com a finalidade de consumo humano, até julgamento final. Requer, então, a procedência da ação para condenar o Réu ?a fornecer a outorga ao requerente para utilização de seu poço para ?Consumo Humano, Limpeza e Sistema de Incêndio??. É o relatório.?

Na decisão das fls.
704/708, o pedido de antecipação da tutela foi indeferido.

Citado, o Réu contestou o feito, alegando que (I) as normas jurídicas supostamente violadas foram interpretadas e aplicadas adequadamente, não havendo violação manifesta a qualquer norma, (II) ?
não obstante a existência de jurisprudência conflitante, há inúmeros acórdãos na mesma linha de entendimento do v. acórdão rescindendo?, (III) é aplicável ao caso a Súmula 343 do Supremo Tribunal Federal, segundo a qual ?Não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais?, (IV) o Autor recorre à ação rescisória como sucedâneo recursal, o que não se admite, (V) não houve inovação normativa, pois o Decreto Estadual 53.901/18, ?que Alterou o artigo 96 do Decreto Estadual 23.430/74, e autorizou o uso de poço para consumo humano, em casos de emergência ou intermitência?, é contemporâneo à tramitação do processo e não amparava a procedência da ação e, (VI) conforme informações apresentadas pela Secretaria Estadual do Meio Ambiente (SEMA), não houve novo pedido de outorga e nem alteração na legislação estadual sobre o tema (fls. 717/729).

Intimado, o Autor apresentou a réplica à contestação (fls.
737/749). No parecer, o Ministério Público opinou pela extinção do processo por não estar ?caracterizada hipótese de cabimento de ação rescisória pelo fundamento do art. 966, inc. V, do CPC? (fls. 755/761). É o relatório.

VOTOS

Des.ª Maria Isabel de Azevedo Souza (RELATORA)

A ação rescisória com fundamento no art. 966, V, do Código de Processo Civil
pressupõe ofensa inequívoca à norma jurídica, consoante ensina a doutrina de Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery, verbis:

?
A decisão de mérito transitada em julgado que não aplicou a lei ou a aplicou incorretamente é rescindível com fundamento no CPC 966 V, exigindo-se agora, de forma expressa, que tal violação seja visível, evidente ? ou, como certa vez se manifestou o STJ a respeito, pressupõe-se que ?é a decisão de tal modo teratológica que consubstancia o desprezo do sistema de normas pelo julgado rescindendo? (STJ, 3.ª Seção, AR 2625-PR, rel. Min. Sebastião Reis Junior, rel. p/ acórdão Min. Marco Aurélio Bellizze, j. 11.9.2013, DJUe 1.º.10.2013). Pode ser rescindida a decisão que violou o direito em tese, isto é, a correta interpretação da norma jurídica. Nesse sentido: Câmara. Rescisória, p. 81. Lei tem aqui sentido amplo, seja de caráter material ou processual, em qualquer nível ( federal, estadual, municipal e distrital), abrangendo a CF, MedProv., DLeg, D etc. A violação do direito estrangeiro, quando tenha de ser aplicado ao caso concreto, constitui motivo para a rescisão da sentença (Pontes de Miranda. Rescisória [2016], § 24, n. 2, p. 349; Barbosa Moreira. Comentários CPC 17, n. 78, p. 129). Decisão que viole a jurisprudência, bem como súmula de tribunal, não enseja ação rescisória. A ação rescisória é cabível quando a sentença de mérito viole cláusulas gerais, tais como a função social do contrato (CC 421), boa-fé objetiva (CC 422), função social da propriedade (CF 5.º XXIII e 170 III; CC 1228 § 1.º), função social da empresa (CF 170; CC 421 c/c 981) etc. É admissível a ação rescisória, com base no CPC 966 V, por ofensa à analogia, aos costumes e aos princípios gerais de direito, porque são regras jurídicas com previsão expressa na lei (LINDB 4.º) (Pontes de Miranda. Rescisória [2016], § 24, n. 1, p. 318) e, portanto, fontes de direito, equiparando-se à lei em sentido amplo. Sentença de mérito inconstitucional ou ilegal por ser desconstituída por ação rescisória (v. coments. CPC 502); caso não o seja, a coisa julgada material produz seus efeitos normalmente, em decorrência da inevitabilidade da jurisdição, da segurança e, principalmente, do Estado Democrático de Direito (CF 1.º caput).
? (grifou-se)
O Superior Tribunal de Justiça, no REsp 1.001.779/DF (TEMA 239), julgado segundo o rito dos recursos repetitivos, assentou que ?
A Súmula 343, do Supremo Tribunal Federal, cristalizou o entendimento de que não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais. A ação rescisória resta cabível, se, à época do julgamento cessara a divergência, hipótese em que o julgado divergente, ao revés de afrontar a jurisprudência, viola a lei que confere fundamento jurídico ao pedido?.
Assim, ?É firme a orientação deste Superior Tribunal a violação deve ser direta, evidente, que ressaia da análise do aresto rescindendo, e se, diversamente, o julgado rescindendo elege uma dentre as interpretações cabíveis, ainda que não seja a...

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