Acórdão nº 70085706919 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Quarto Grupo de Câmaras Criminais, 24-03-2023

Data de Julgamento24 Março 2023
Tribunal de OrigemTribunal de Justiça do RS
Classe processualRevisão Criminal
Número do processo70085706919
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoQuarto Grupo de Câmaras Criminais

PODER JUDICIÁRIO


@ (PROCESSO ELETRÔNICO)

LFM

Nº 70085706919 (Nº CNJ: 0020180-61.2022.8.21.7000)

2022/Crime


REVISÃO CRIMINAL.
estupro de vulnerável.

1. A revisão criminal tem lugar quando: (I) a sentença condenatória contrariar texto expresso de lei ou a prova dos autos; (II) a condenação se basear em prova comprovadamente falsa; (III) surgirem novas provas para absolvição ou diminuição da pena; (IV) existir nulidade.

2. A revisão criminal não é instrumento para reavaliação do acervo probatório dos autos sem que seja apresentada prova nova apta a determinar o reexame da condenação.

3. Eventuais nulidades existentes na fase primitiva e durante o cursivo processual devem ser suscitadas no momento oportuno, sob pena de preclusão, nos termos do artigo 571 do CPP.

4. A condenação, por si só, não é apta a indicar desídia na atuação dos anteriores patronos. Hipótese de incidência do previsto na Súmula n. 523 do STF.
5. Acórdão condenatório apoiado em elementos colhidos na fase inquisitorial, posteriormente corroborados em juízo, não estando caracterizado julgamento contrário à evidência dos autos.

6. Dosimetria da pena. Continuidade delitiva que está lastreada no conjunto probatório existente nos autos.

REVISÃO CRIMINAL JULGADA IMPROCEDENTE.
UNÂNIME.
Revisão Criminal


Quarto Grupo Criminal

Nº 70085706919 (Nº CNJ: 0020180-61.2022.8.21.7000)


Comarca de Canoas

A.R.S.M.

.
.
REQUERENTE

M.P.R.

.
.
REQUERIDO


ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Desembargadores integrantes do Quarto Grupo Criminal do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em julgar improcedente o pedido revisional.


Custas na forma da lei.


Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Des.ª Naele Ochoa Piazzeta (Presidente) e Des.ª Isabel de Borba Lucas, Des.ª Glaucia Dipp Dreher, Des.
Volcir Antonio Casal.

Porto Alegre, 24 de março de 2023.


DES. LEANDRO FIGUEIRA MARTINS,

Relator.


RELATÓRIO

Des. Leandro Figueira Martins (RELATOR)

A. R. S. M. ingressou com REVISÃO CRIMINAL (artigo 621 do Código de Processo Penal ?
CPP), considerando condenação na ação penal n. 008/2.15.0005679-3.

No caso, adoto o relatório da decisão que apreciou a liminar:

?
A. R. S. M. ajuizou REVISÃO CRIMINAL. Em síntese, mencionou que foi condenado pelo crime do artigo 217-A, § 1º, na forma do artigo 71, ambos do CP, aplicando-se pena de 9 anos e 4 meses de reclusão, regime inicial fechado. Fazendo relato sobre o andamento processual, alegou que o ?prejuízo resta inequivocadamente caracterizado na sentença condenatória, a qual foi baseada exclusivamente no laudo de fls. 25/31 dos autos, bem como no depoimento da vítima, atos estes realizados na fase policial, sem direito ao exercício do princípio constitucional do contraditório e da ampla defesa, que sequer teve oportunidade de formular quesitos à perícia, tampouco questionar a vítima e testemunhas de defesa? (fl. 5 da petição inicial).

Asseverou que, mesmo registrado na sentença ?
que a vítima não fora ouvida em juízo pela dificuldade na comunicação em razão de sua deficiência mental, em nenhum momento durante a instrução foi designado profissional para interpretar e acompanhar a vítima, que por diversas vezes modificou a narrativa dos fatos, e ainda assim, inequivocadamente, reconheceu a continuidade delitiva fundamentando que ?(...) o delito descrito foi perpetrado por algumas vezes, porém sem comprovação de quantas, nas mesmas circunstâncias de lugar e modus operandi(...)? (fl. 6 da petição inicial).

Referiu, ainda, que, ?
quanto ao suposto número de vezes que o crime foi praticado, ao contrário do entendimento a quo, deve beneficiar o réu, nos termos do princípio do in dubio pro reo? (fl. 6 da petição inicial), motivo pelo qual estava configurada a nulidade absoluta do processo, nos termos do artigo 564, inciso III, letra ?d?, e inciso IV, do CPP.

Sustentou, também, que o autor ?
remanesceu sem defesa adequada e como decorrência direta da desídia da defesa técnica, sobreveio a condenação do réu mesmo com todas as nulidades ora citadas, restando evidente que o defensor contratado bem como o dativo, comprometeram, de forma irremediável o deslinde do feito? (fl. 8 da petição inicial).

Disse, por fim, ser ?
imperiosa a anulação da sentença e acolhimento das nulidades apontadas, também por ausência de defesa, cumprindo seja renovado o ato de oitiva da vítima com intérprete competente, bem como oitiva das testemunhas da defesa com a presença do Ministério Público, oportunizando-se ao revisionando com a garantia do contraditório e ampla defesa, além da designação de laudo pericial de avaliação psíquica oportunizando ao réu apresentação de quesitos e eventuais impugnações? (fl. 8 da petição inicial).

Pediu, então, em liminar, a suspensão dos efeitos da condenação até o julgamento da ação e, no mérito, a procedência da revisão criminal, para que:

?
b) seja conhecida bem como provida a presente ação de revisão criminal, para o especial efeito de anular-se a sentença, inclusive, o acórdão que a ratificou, tendo por fundamento as nulidades referidas, bem como a ausência de defesa técnica, determinando-se, por conseguinte, seja designado profissional competente para o acompanhamento e interpretação da vítima, bem como renovada a avaliação psíquica da vítima e seu depoimento, assim como o das testemunhas de defesa, assegurando-se ao réu o direito de formular quesitos e inquirir a vítima e testemunhas de defesa, objetivando a aplicação do princípio do contraditório e da ampla defesa;

c) Sucessivamente, caso não seja este o entendimento de V. Exa., requer seja excluída da condenação a continuidade delitiva, uma vez em que não é possível precisar quantas vezes o crime foi praticado, tratando-se de suposições?
(fl. 9 da petição inicial).?

Indeferida a liminar, a Procuradoria de Justiça lançou parecer, manifestando-se pela improcedência da ação revisional.


É o relatório.

VOTOS

Des. Leandro Figueira Martins (RELATOR)

A denominada revisão criminal pode ser manejada por réu definitivamente condenado, ?
mediante observância de hipóteses de cabimento taxativamente previstas no ordenamento jurídico e que traduzam situações efetivamente graves que, em tese, possam autorizar a excepcional desconstituição da coisa julgada material?
.

Assim, segundo o Código de Processo Penal ?
CPP (artigos 621 e 626), o instrumento pode ser utilizado quando: (I) a sentença condenatória contrariar texto expresso de lei ou a prova dos autos; (II) a condenação se basear em prova comprovadamente falsa; (III) surgirem novas provas para absolvição ou para diminuição da pena; (IV) existir nulidade
.


A revisão criminal, portanto, não pode servir como uma nova via recursal, a fim de rediscutir a matéria debatida nos autos da ação penal em primeira ou segunda instâncias.

E, na espécie, embora seja caso de conhecimento da ação revisional, a pretensão, no mérito, não se mostra exitosa, mostrando-se impositiva a improcedência.

Com efeito, na hipótese em tela, o ora autor, inicialmente, foi condenado como incurso nas sanções do artigo 217-A, § 1º, ?
por mais de uma vez?, na forma do artigo 71, ambos do CP, à pena de 09 (nove) anos e 04 (quatro) meses de reclusão, a ser cumprida em regime inicial fechado (sentença ? ação penal 008/2.15.0005679-0, fls. 175/179 dos autos originais).

Na Apelação Criminal n. 70083605238 interposta, à unanimidade, foi negado provimento ao recurso defensivo pela Colenda 8ª Câmara Criminal deste Tribunal de Justiça/RS, em julgamento realizado na data de 28 de outubro de 2020, conforme ementa que segue (fls.
234/239 dos autos originários):

?
APELAÇÃO. CRIME CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. ESTUPRO DE VULNERÁVEL. VÍTIMA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA MENTAL E AUDITIVA. DECRETO CONDENATÓRIO. PROVA SUFICIENTE. DOSIMETRIA DA PENA.

- MANUTENÇÃO DO DECRETO CONDENATÓRIO.
As provas existentes no caderno processual são suficientes para o julgamento de procedência do pedido condenatório deduzido na denúncia. Materialidade e autoria suficientemente demonstradas pela prova produzida. Em se tratando da figura típica de estupro de vulnerável, é irrelevante a inexistência de auto de exame de corpo de delito atestando sinais da sua ocorrência. Na hipótese, a lesada, a despeito de suas limitações, sempre que ouvida, noticiou ter sido estuprada pelo réu em mais de uma oportunidade, e expressou as dores físicas e psicológicas decorrentes dos abusos sexuais suportados. E a sua narrativa encontrou amparo nos depoimentos de sua genitora, de sua irmã gêmea e demais elementos de prova nas conclusões da avaliação psíquica constante nos autos. Versão defensiva fraca e isolada nos autos.

- PALAVRA DA VÍTIMA.
VALOR PROBANTE. O depoimento da vítima adquire extraordinário valor probatório em se tratando de crimes contra a liberdade sexual. Conforme tranquilo entendimento da jurisprudência pátria, a ?palavra da vítima, em sede de crime de estupro ou atentado violento ao pudor, em regra, é elemento de convicção de alta importância, levando-se em conta que estes crimes, geralmente, não há testemunhas ou deixam vestígios? (HC 135.972/SP, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 03/11/2009, DJe 07/12/2009).

Apelo desprovido? (Apelação Criminal n. 70083605238, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Dálvio Leite Dias Teixeira, Julgado em: 28-10-2020)
O trânsito em julgado da condenação aconteceu no dia 17/08/2021 (fl. 279 dos autos originários).

O ora autor, no caso, alegou a existência de nulidade absoluta, uma vez que não possibilitado à defesa exercesse o contraditório na etapa primitiva quando da confecção do laudo pericial e da inquirição da vítima e das testemunhas, bem assim porque deficiente a defesa, motivo pelo qual postulou, inicialmente, a desconstituição da sentença condenatória, com a reabertura da instrução criminal, inclusive com nova realização de perícia e inquirição da ofendida.


Todavia, olvida a pretensão que a
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