Acórdão nº 71010279578 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Turma Recursal da Fazenda Pública, 25-02-2022

Data de Julgamento25 Fevereiro 2022
Tribunal de OrigemTurmas Recursais
Classe processualRecurso Inominado
Número do processo71010279578
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Turma Recursal da Fazenda Pública

PODER JUDICIÁRIO




DHD

Nº 71010279578 (Nº CNJ: 0044507-21.2021.8.21.9000)

2021/Cível


RECURSO INOMINADO.
SEGUNDA TURMA RECURSAL DA FAZENDA PÚBLICA. SERVIDOR PÚBLICO DO MAGISTÉRIO. MUNICÍPIO DE CERRITO. TERÇO DE FÉRIAS SOBRE 45 DIAS. INCLUSÃO DAS HORAS EXTRAS NA BASE DE CÁLCULO DAS FÉRIAS E DA GRATIFICAÇÃO NATALINA.

1. O Município de Cerrito não realiza o pagamento do terço constitucional sobre a integralidade do período de férias a que faz jus o servidor (45 dias), limitando o pagamento do referido adicional ao período de 30 dias. A limitação imposta pelo Município está em desacordo com o disposto no art. 7º, inciso XVII da Constituição Federal, que assegura ao servidor o direito de perceber o acréscimo de 1/3 na remuneração de suas férias, sem limitá-lo a determinado teto. Aliás, o Tribunal Pleno do TJRS discutiu amplamente a questão quando do julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade nº 70011465416, oportunidade em que declarou a inconstitucionalidade de norma disposta no Estatuto e Plano de Carreira do Magistério Público Estadual, a qual limitava o pagamento do terço constitucional de férias ao período de 30 dias. Assim, o terço constitucional é devido sobre o total das férias usufruídas pelos professores (45 dias). A condenação do ente público nesse sentido também deve atingir as parcelas vincendas, conforme requerido na inicial.

2. Os art. 108 e 83 da Lei Municipal nº 308/2001, determinam, respectivamente, que as férias e a gratificação natalina devem ser calculadas de acordo com a remuneração do servidor. Por seu turno, o art. 64 da mesma Lei, dispõe que: Remuneração é o vencimento acrescido das vantagens permanentes, estabelecidas em Lei. Contudo, as horas extras não compõem a remuneração do servidor, pois não se caracterizam como vantagens de caráter permanente. Por consequência, nos termos da legislação municipal em debate, as horas extras não devem integrar a base de cálculo das férias e da gratificação natalina dos servidores.

3. Em relação aos juros de mora, deve ser observado o julgado no Recurso Extraordinário nº 870.947 (Tema 810), incidindo o índice aplicado à caderneta de poupança.
SENTENÇA REFORMADA EM PARTE.
RECURSO INOMINADO DO MUNICÍPIO DESPROVIDO. RECURSO DA AUTORA PARCIALMENTE PROVIDO.
Recurso Inominado


Segunda Turma Recursal da Fazenda Pública

Nº 71010279578 (Nº CNJ: 0044507-21.2021.8.21.9000)


Comarca de Pedro Osório

FABIANE TAVARES LUCAS


RECORRENTE/RECORRIDO

MUNICIPIO DE CERRITO


RECORRIDO/RECORRENTE

MINISTERIO PUBLICO


INTERESSADO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Juízes de Direito integrantes da Segunda Turma Recursal da Fazenda Pública dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso da autora e negar provimento ao recurso do réu.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores Dr. José Luiz John dos Santos (Presidente) e Dra.
Quelen Van Caneghan.

Porto Alegre, 23 de fevereiro de 2022.


DR. DANIEL HENRIQUE DUMMER,

Relator.


RELATÓRIO

Cuida-se de demanda proposta por FABIANE TAVARES LUCAS servidora do quadro do magistério do MUNICÍPIO DE CERRITO, na qual pretende: (i) o recebimento do terço constitucional de férias sobre o período de 45 dias efetivamente gozado, e não apenas sobre o período de 30 dias e; (ii) a inclusão das horas extras na base de cálculo do terço de férias e gratificação natalina.

O pedido foi julgado parcialmente procedente, nos seguintes termos:

Ante o exposto, com arrimo no art. 487, inciso I, do CPC, julgo PARCIALMENTE PROCEDENTE a demanda ajuizada por Fabiane Tavares Lucas em face do Município de Cerrito, para o fim de declarar o devido pagamento do terço constitucional de férias sobre 45 dias, durante o período de setembro de 2014 até 2019, em atenção a prescrição quinquenal, acrescidos de correção monetária, incidindo a contar do vencimento de cada prestação, pelo IPCA-E, índice aplicável a partir de 26/03/2015.


A autora interpôs recurso inominado (fls.
354/365), alegando que a sentença reconheceu o direito ao terço constitucional sobre 45 dias de férias, no período compreendido entre 2014 e 2019, mas não decidiu a respeito das parcelas vincendas. Sustentou que as férias devem pagas de acordo com sua remuneração, assim como a gratificação natalina, que deve corresponder à remuneração de dezembro, razão pela qual as horas extras devem compor a base de cálculo de tais verbas. Por fim, ponderou que a decisão recorrida não fixou juros de mora sobre as parcelas que compõe a condenação. Postulou a reforma da sentença.

Por sua vez, o Município de Cerrito recorreu (fls.
368/372), argumentando, em síntese, que o terço de férias é devido apenas por 30 dias, conforme art. 28 da Lei 651/2009. Invocou o princípio da legalidade e a necessidade de observância dos limites de gastos com pessoal. Requereu o acolhimento do recurso e a improcedência da ação.

As partes apresentaram contrarrazões.


O Ministério Público deixou de intervir.


VOTOS

Dr. Daniel Henrique Dummer (RELATOR)

Defiro a gratuidade judiciária à autora, considerando sua remuneração (fl. 104).


Preenchidos os requisitos de admissibilidade, conheço dos recursos.

Tenho que somente o recurso da autora deve ser provido, em parte.


Explico.

I - TERÇO DE FÉRIAS

O direito à percepção da remuneração do período de férias acrescido de um terço decorre de expressa previsão legal contida no inciso XVII do art. 7º da Constituição Federal, in verbis:

?
Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

{...}

XVII - gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal;?
.

O Município tem concedido aos professores em exercício de regência de classe o direito de gozo de 45 dias de férias anuais, nos termos do art. 28 da Lei Municipal nº 651/2009:
Art. 28 ?
O profissional da Educação que estiver em sala de aula gozará, anualmente 45 dias de férias remuneradas e os demais integrantes do Magistério, 30 dias de férias remuneradas conforme Resolução do Conselho Nacional da Educação n.º 03, de 08 de outubro de 1997, porém com adicional de um terço apenas sobre trinta dias.

Parágrafo único ?
As férias dos profissionais da Educação coincidirão com o período de recesso escolar.

Assim, o recorrido não realiza o pagamento do terço constitucional sobre a integralidade do período de férias gozado (45 dias), limitando o acréscimo de 1/3 a 30 dias de férias.


A toda evidência, essa limitação afronta a ordem constitucional, sobretudo porque o inciso XVII do art. 7º da Constituição Federal não estabelece qualquer limitação ao pagamento do adicional de um terço de férias, assegurando o direito ao recebimento do referido adicional por todo o período de férias efetivamente gozado pelo trabalhador.


Outrossim, o próprio art. 108 do Regime Jurídico Único preconiza que o ?
O servidor perceberá durante as férias a remuneração integral, acrescida de 1/3 (um terço).?. Logo, a legislação municipal também não limita o pagamento da remuneração das férias e do adicional de 1/3 ao período de 30 dias. Assim, se a Administração efetua o pagamento integral da remuneração durante todo período de férias gozadas pelo servidor, não pode aplicar interpretação diferente apenas em relação ao terço constitucional.

Importa destacar que o Pleno do TJRS discutiu amplamente essa questão quando do julgamento do Incidente de Inconstitucionalidade nº 70011465416, oportunidade em que restou proclamada a inconstitucionalidade da regra disposta no Estatuto e Plano de Carreira do Magistério Público Estadual, que limitava o pagamento do terço constitucional de férias a 30 dias.


Dessa forma, adoto o entendimento firmado pelas Turmas Recursais Fazendárias em ações análogas:
Ementa: RECURSO INOMINADO.
SERVIDOR PÚBLICO. MUNICÍPIO DE BENTO GONÇALVES. PROFESSOR. FÉRIAS. INCIDÊNCIA DO TERÇO CONSTITUCIONAL SOBRE TODO O PERÍODO EFETIVAMENTE GOZADO. POSSIBILIDADE. PREVISÃO LEGAL. Nos termos do art. 7º, XVII, c/c com art. 39, § 3º, ambos da Constituição Federal, é garantido aos servidores o direito ao gozo de férias anuais remuneradas com, pelo menos, um terço a mais do que o salário normal. No âmbito do...

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