Acórdão nº 71010332658 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Segunda Turma Recursal Cível, 23-03-2022

Data de Julgamento23 Março 2022
Tribunal de OrigemTurmas Recursais
Classe processualRecurso Inominado
Número do processo71010332658
Tipo de documentoAcórdão
ÓrgãoSegunda Turma Recursal Cível

PODER JUDICIÁRIO


@ (PROCESSO ELETRÔNICO)

EMCF

Nº 71010332658 (Nº CNJ: 0000432-57.2022.8.21.9000)

2022/Cível


RECURSO INOMINADO.
CONSUMIDOR. ?AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C pedido de indenização por danos morais?. COMPRA DE APARELHO CELULAR ? iPHONE SE. PRODUTO COMERCIALIZADO SEM O RESPECTIVO adaptador (CARREGADOR) DE ENERGIA. ITEM ESSENCIAL E IMPRESCINDÍVEL PARA O FUNCIONAMENTO DO aparelho. CONSUMIDOR OBRIGADO A ADQUIRIR O bem SEPARADAMENTE. inadmissibilidade. PRáTICA ABUSIVA da empresa ré, VEDADA PELO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO. DEVER DE RESTITUIR O VALOR ADIMPLIDO PELO Autor. DANOS MORAIS NÃO CONFIGURADOs, ausente comprovação de abalo a atributos da personalidade do DEMANDANTE. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.

RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.
UNÂNIME.
Recurso Inominado


Segunda Turma Recursal Cível

Nº 71010332658 (Nº CNJ: 0000432-57.2022.8.21.9000)


Comarca de Porto Alegre

MAURICIO CARLOS VARGAS


RECORRENTE

APPLE COMPUTER BRASIL LTDA (APPLE)


RECORRIDO


ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.


Acordam os Juízes de Direito integrantes da Segunda Turma Recursal Cível dos Juizados Especiais Cíveis do Estado do Rio Grande do Sul, à unanimidade, em dar parcial provimento ao recurso.

Participaram do julgamento, além da signatária, os eminentes Senhores Dr. José Vinícius Andrade Jappur (Presidente) e Dr.ª Ana Claudia Cachapuz Silva Raabe.


Porto Alegre, 23 de março de 2022.


DR.ª ELAINE MARIA CANTO DA FONSECA,

Relatora.


RELATÓRIO

MAURICIO CARLOS VARGAS recorre da sentença das fls.
127/130, que julgou improcedentes os pedidos formulados nos autos da ?ação de obrigação de fazer c/c pedido de indenização por danos morais? ajuizada em face de APPLE COMPUTER BRASIL LTDA (APPLE).
Em razões (fls. 136/144), sustenta o autor, em apertada síntese, que a remoção dos acessórios da caixa não alcançou nenhum ganho ambiental, ?pois os carregadores continuam sendo vendidos separadamente?. Refere se tratar de venda casada, pois, ainda que não fornecido quando adquirido o aparelho celular, se faz necessário sua aquisição, para regularmente utilizar o telefone, sendo que ?os preços dos smartphones não diminuíram, e o consumidor que não possui um carregador velho em casa, é obrigado a comprar outro?. Argumenta, também, além da venda casada, haver uma transferência indireta do risco da atividade ao consumidor, sendo que os cabos fornecidos pela empresa na caixa, são do tipo USB-C, com entrada divergente da maioria dos cabos e computadores disponíveis no mercado. Postula, assim, a restituição do valor adimplido pela aquisição de carregador compatível com o cabo da caixa, além da condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.

Com contrarrazões às fls.
152/192, vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.
VOTOS

Dr.ª Elaine Maria Canto da Fonseca (RELATORA)

Eminentes Colegas.


Inicialmente, afasto a impugnação ao benefício da gratuidade judiciária apresentado nas contrarrazões, pois não logrou demonstrar a ré, minimamente, que o autor tenha condições de arcar com o ônus da sucumbência.


Assim sendo, atendidos os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso.

Cuida-se de ação de obrigação de fazer c/c indenizatória por danos morais, na qual alega o autor, em síntese, ter adquirido um iPhone SE, Red, 64GB, em 19/05/2021, pelo valor de R$ 2.918,83.
Contudo, quando da entrega do produto, foi surpreendido pela ausência do adaptador de energia e fones de ouvido. Refere tratar-se de venda casada, pois impõe ao consumidor a obrigação da compra do adaptador de energia direto da fabricante, ?uma vez que a ré não garante que carregadores de terceiros não será usado como recusa para eventual reparo do produto durante a garantia legal ou contratual, caracterizando, portanto, venda casada?, o que fere o disposto no art. 39 do CDC. Alega que o cabo para o carregamento do celular, cuja especificidade é característica da empresa Apple, não se adapta a uma tomada ou ao computador, pois vem com entrada USB-C, diversa da maioria dos adaptadores disponíveis no mercado (USB-A), razão pela qual postula a restituição do valor adimplido pelo carregador, além da condenação da ré ao pagamento de indenização por danos morais.

Em contestação, a empresa ré manifesta que ?
removeu da caixa dos iPhones SE apenas o adaptador de energia e o fone de ouvido, permanecendo o cabo USB-C para Lightning, informação essa que foi repassada aos consumidores?. Justifica que esses itens foram removidos ?com a finalidade de ajudar a atingir a meta de impacto climático zero em todos os produtos e na cadeia de suprimentos até 2030. Como há bilhões de adaptadores de energia no mundo, os novos geralmente não são utilizados?. Argumenta ainda que, com o cabo USB-C para Lightning, incluído na caixa do produto do autor, ele poderá conectar o celular com iPad ou iPod, com conector Lightning ao Mac ou em qualquer outro computador/notebook, tablet com porta USB-C para recarregar e sincronizá-los, sendo descabida a pretendida restituição do valor pago e danos morais.
A sentença julgou improcedentes os pedidos do autor, entendendo que a ré comprovou que ?
o adaptador de energia e fone de ouvido foram removidos com a finalidade de ajudar a atingir a meta de impacto climático zero em todos os produtos e na cadeia de suprimentos até 2030?. Ainda, que a empresa demonstrou que no seu site há informações claras de que o adaptador de energia e o fone de ouvido não estão inclusos, respeitando o dever de informação.

Inconformado, o autor recorre, manifestando ?
que embora a finalidade seja honrada, a requerida não comprova nenhum ganho ambiental, pois os carregadores continuam sendo vendidos separadamente. O único ganho que se nota, são nas finanças da empresa, pois com o carregador fora da caixa, facilita a logística, por exemplo, possibilitando transportar mais aparelhos?, sendo que a venda separada do carregador condiciona o consumidor à compra de adaptador de alimentação, consistindo em venda casada e postulando, assim, a procedência da ação.
Pois bem.

Inicialmente, dispõe o art. 39, do Código de Defesa do Consumidor, ser vedado ao fornecedor de produtos ou serviços, condicionar o fornecimento de produto ou de serviço a outro produto ou serviço.


Nesse sentido, o caso dos autos caracteriza ?
venda casada?. Isso porque a aquisição de aparelho celular (fls. 22/27), sem o fornecimento de produto essencial a sua regular utilização ? adaptador para carregamento, impõe ao consumidor a obrigatoriedade de adquirir o produto separadamente, sendo prática vedada pelo Código de Defesa do Consumidor.

Segundo Flávio Tartuce e Daniel Amorim Assumpção Neves:

?
Veda-se que o fornecedor ou prestador submeta um produto ou serviço a outro produto ou serviço, visando um efeito caroneiro ou oportunista para venda de novos bens, ampliando-se o sentido da vedação, conclui-se que é venda...

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