Para além do tempo de emprego: o sentido do trabalho no processo de aposentadoria

AutorBetina Magalhães Bitencourt - Shalimar Gallon - Mariana Klein Batista - Valmiria Carolina Piccinini
CargoMestre e Doutoranda em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul ? UFRGS. End.: Rua Washington Luiz, 855/422, Centro, Porto Alegre ? RS. CEP: 90010-460 ? Brasil - Mestre e Doutoranda em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul ? UFRGS. End.: Rua Washington Luiz, 855/422, Centro, Porto Alegre ? RS. CEP: 900...
Páginas30-57
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FQK
Para Além do Tempo de Emprego: o sentido do
trabalho no processo de aposentadoria
Betina Magalhães Bitencourt1
Shalimar Gallon2
Mariana Klein Batista3
Valmiria Carolina Piccinini4
Resumo
O trabalho é um meio essencial para a integração social e a autorrealização do indivíduo.
Assim, observa-se que o momento da aposentadoria pode representar mudanças no
sentido do trabalho. Essa transição pode ser encarada de modo positivo por aqueles
que estão preparados para ela, entretanto, pode configurar-se em um período de
incertezas e promotor de uma visão negativa dos dias que estão por vir. Dessa maneira,
buscou-se analisar qual o sentido que o trabalho tem para os aposentados. O estudo
consiste em uma pesquisa qualitativa com profissionais que estão se preparando para
a aposentadoria e com aposentados vinculados à Fundação de uma empresa do Rio
Grande do Sul. A coleta de dados foi realizada por meio de entrevistas, nas quais se
buscou identificar quais as expectativas destas pessoas perante essa nova fase da vida.
Buscou-se verificar como eles enfrentam essa ruptura, já que não há mais o trabalho
para se identificar e criar laços sociais ligados a ele. Os entrevistados apresentaram
reações positivas em relação à aposentadoria. Alguns entrevistados, porém, expressaram
a necessidade de continuar atuantes no mercado de trabalho. Outro fator de satisfação
apurado na análise das entrevistas foi a preparação para essa nova fase promovida
pela empresa.
Palavras-chave: Aposentadoria. Centralidade do Trabalho. Sentido do Trabalho.
1 Mestre e Doutoranda em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. End.: Rua Washington Luiz,
855/422, Centro, Porto Alegre – RS. CEP: 90010-460 – Brasil. E-mail: betina_mb@yahoo.com.br.
2 Mestre e Doutoranda em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. End.: Rua Washington Luiz,
855/422, Centro, Porto Alegre – RS. CEP: 90010-460 – Brasil. E-mail: shalimargallon@hotmail.com.
3 Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. Administradora do Nós Coworking. End.: Av.
Cristóvão Colombo, 545, prédio 02, 5° andar, Floresta, Porto Alegre – RS. CEP: 90560-900 – Brasil. E-mail: marianakleinb@gmail.com.
4 Doutora em Economia do Trabalho e da Produção pela Universidade Pierre Mendes France UPMF – Grenoble II. Professora
Associada da Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS. End.: Rua Washington Luiz, 855/422, Centro, Porto Alegre – RS.
CEP: 90010-460 – Brasil. E-mail: vpiccinini@ea.ufrgs.br.
Artigo recebido em: 25/02/2011. Aceito em: 27/07/2011. Membro do Corpo Editorial Científico responsável pelo processo editorial:
Carlos Ricardo Rossetto.
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1 Introdução
O trabalho vem sofrendo mudanças no decorrer dos tempos, pois de
atividade reservada aos participantes de camadas pobres da população, pas-
sou a atividade possível e necessária para aqueles em idade produtiva e com
disposição física e mental para ele. Na esteira das mudanças sofridas pela so-
ciedade, as formas de trabalho passaram por modificações, chegando ao que
hoje se conhecem por trabalhos formais, informais e precários (ANTUNES,
2005). Em virtude destas mudanças, torna-se foco de discussão identificar qual
a importância do trabalho na vida dos indivíduos. E o que se percebe, segundo
Enriquez (1999), é que é possível realizar o trabalho de maneiras variadas e
apresentar diferentes significados, mas que ainda tem papel fundamental na
constituição do indivíduo e da sua socialização (ENRIQUEZ, 1999).
Com as inúmeras transformações e formas diversas de trabalho en-
contradas na atual sociedade brasileira, alguns autores argumentam que o
trabalho pode estar caminhando para um fim. No entanto, para Sorj (2000,
p. 2) o trabalho “[...] continua a ser um dos mais importantes determinantes
das condições de vida das pessoas”. Antunes (2005, p. 26) lembra ainda que
[...] da General Motors à Microsoft, da Benetton à Ford, da
Toyota ao McDonald’s, o mundo produtivo e de serviços ain-
da carece de uma dada forma de trabalho, seja ele material,
produtivo ou imaterial.
Já Méda (1996) considera que vivemos em busca de uma abundância
que não conseguimos atingir, mas para a qual trabalhamos na tentativa de che-
gar o mais perto possível, e que outras atividades (políticas, sociais, culturais)
podem ocupar o lugar que antes era do trabalho, dependendo da ocupação,
idade, legislação de um país.
Mesmo o trabalho tendo um papel central na vida dos indivíduos, após
um determinado tempo, chega o momento da aposentadoria, benefício este
que dá o direito de parar de contribuir com a Previdência e começar a receber
seu benefício. Mas muitos permanecem trabalhando porque a aposentadoria
não é suficiente para sua subsistência ou por não verem motivo para parar de
trabalhar. Até por que na legislação brasileira que regulamenta os direitos da-
queles com mais de 60 anos de idade é previsto também que os mesmos não
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podem ser discriminados em processos de seleção para emprego ou concursos,
ou seja, prevê o direito à volta ao trabalho mesmo após a aposentadoria.
Diante dessas constatações e dos questionamentos acerca da importância
do trabalho na vida daqueles que se aposentam, observa-se o trabalho como
fator importante para a constituição dos indivíduos, para a criação e manuten-
ção de laços sociais e para a manutenção da saúde mental (BASTOS, 1995;
ENRIQUEZ, 1999; MORIN, 2001; DEJOURS, 2008). Desse modo, essa pesquisa
tem o intuito de analisar de que forma eles estão encarando a aposentadoria e
qual o sentido que o trabalho tem nas suas vidas. Para tanto foram realizadas
entrevistas semiestruturadas com futuros e atuais aposentados de uma empresa
de economia mista do estado do Rio Grande do Sul. A organização foi escolhida
por desenvolver um Programa de Preparação para a Aposentadoria (PPA) que
está atrelado ao funcionamento do fundo de pensão para complementação da
aposentadoria dos funcionários.
A seguir será apresentado o panorama do processo de aposentadoria
no contexto brasileiro, seguido pela apresentação dos conceitos de sentido,
significado e centralidade do trabalho. Na sequência serão apresentados os
resultados e a análise das entrevistas, seguidos pelas considerações finais.
2 Panorama da Aposentadoria no Brasil
Após anos trabalhando durante oito horas diárias ou mais, chega o
momento da aposentadoria por Tempo de Serviço ou por Idade. O benefício
previsto em lei pelo Estado brasileiro assegura o direito a receber mensalmen-
te um determinado valor em forma de gratificação, sendo que aqueles que a
recebem deveriam fazer uso da mesma para subsistir, sem precisar continuar a
desempenhar atividades profissionais. São contemplados com a aposentadoria
os trabalhadores urbanos a partir de 60 anos de idade (no caso das mulheres) e
de 65 anos de idade (no caso dos homens), sendo que as trabalhadoras rurais
têm direito a se aposentar aos 55 anos e os homens aos 60 anos (MINISTÉRIO
DA PREVIDÊNCIA SOCIAL, 2009a). Outra opção para quem deseja se apo-
sentar é optar pela Aposentadoria por Tempo de Contribuição ao Ministério
de Previdência Social, que prevê 35 anos de contribuição do trabalhador e
30 anos de contribuição da trabalhadora (MINISTÉRIO DA PREVIDÊNCIA
SOCIAL, 2009b).
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Em outubro de 2003 entrou em vigor o Estatuto do Idoso, que regula-
menta, entre outras questões, aquelas ligadas à aposentadoria e ao trabalho
dos aposentados. De acordo com a lei, é responsabilidade do poder público
promover programas de preparação para a aposentadoria, fornecendo esse aten-
dimento um ano antes de o trabalhador se aposentar. Da mesma forma, prevê
que os aposentados e idosos não podem ser discriminados ao buscar trabalho,
e assegura-lhes o direito de trabalhar, desde que dentro de suas possibilidades
físicas e psicológicas e aproveitando suas potencialidades (BRASIL, 2009).
De acordo com dados do IBGE (2009a), o Brasil é um país que passa,
atualmente, por um processo de envelhecimento da população. Uma das razões
dessa mudança na demografia nacional é a alteração ocorrida nas famílias na
segunda metade do Século XX. Por volta da década de 1940 se observou uma
diminuição nas taxas de mortalidade, acompanhada por um declínio das taxas
de natalidade, possivelmente, decorrente das melhores condições de saúde da
população.
Considera-se como Idoso aquele indivíduo que tem 60 anos de idade ou
mais. Em 2006 havia aproximadamente 19 milhões de idosos no Brasil (IBGE,
2009a), sendo que para os homens a expectativa de vida chega, em média,
19,3 anos após os 60 anos, e para as mulheres 22,4 anos. Já os dados de 2008
indicam que o número de idosos aumentou para cerca de 21 milhões, e que
a maior concentração de idosos está nos estados do Rio de Janeiro, em que
14,9% da população é composta por idosos, e do Rio Grande do Sul, em que
chega a 13,5% (IBGE, 2009b).
No que diz respeito ao seu padrão de vida, aproximadamente 11% deles
tinha rendimento inferior a ½ salário mínimo no ano de 2008. Mesmo assim,
aproximadamente 23% eram apontados como pessoas de referência no domicí-
lio ou na família, o que indica a importância econômica e social dos mesmos na
sociedade. Estima-se, ainda, que em 2008 em torno de 85% dos idosos estavam
aposentados no Brasil (IBGE, 2009b). Em dados anteriores, o IBGE (2002)
apresentou resultados de que 62,4% dos idosos eram responsáveis pelos seus
domicílios, o que representava cerca de 20% do total dos domicílios no país.
Como ainda são considerados provedores em uma grande parte das famí-
lias brasileiras, os aposentados podem optar por ter uma atividade remunerada
mesmo após a aposentadoria. Na literatura anglo-saxônica esse fenômeno é
conhecido como bridge employment, ou seja, o ato de continuar trabalhando
mesmo após a aposentadoria. Nesta categoria de trabalho estão incluídas di-
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ferentes formas de atividade, que podem ser em tempo integral, meio período
ou trabalho temporário (SHULTZ, 2003, apud ZHAN et al., 2009). Os autores
indicam que as principais razões para que o aposentado continue a trabalhar
são a pressão financeira e a boa condição de saúde, que lhe dá condições para
se engajar novamente no mercado de trabalho (ZHAN et al., 2009). Indicam,
também, que em um estudo realizado nos Estados Unidos com mais de 12
mil aposentados entre 51 e 61 anos de idade os aposentados que realizam o
bridge employment apresentam menores chances de terem doenças graves e
um menor declínio de capacidade de realização de atividades diárias, sendo
que a saúde mental também se apresentou protegida naqueles aposentados
que deram continuidade às suas atividades profissionais (ZHAN et al., 2009).
Em pesquisa realizada na região metropolitana de Curitiba, no estado
do Paraná, em 2003, com 895 aposentados, constatou-se que 17% deles tra-
balhavam e que somente cerca de 6% do total de entrevistados gostariam de
estar trabalhando (FARIA, 2004). Isso pode ser um indicador de que, como
mencionado anteriormente, muitos aposentados trabalham por necessidade,
principalmente, seja em função de questões financeiras, seja para aproveitarem
sua condição física.
Pimenta et al. (2008) realizaram estudo com aposentados para avaliar
índices de qualidade de vida. Nos resultados, alguns dados chamam a atenção,
como o fato de que os aposentados com mais idade apresentaram índices de
qualidade de vida mais altos. Também foi ressaltado que aqueles que man-
têm ocupação profissional após a aposentadoria foram os que apresentaram
os melhores índices de qualidade de vida, independentemente do tempo de
aposentadoria.
Atchley (1971; 1976; 1984; 1993 apud REITZES et al., 1996) definiu
algumas características e particularidades do processo de aposentadoria. Se-
gundo o autor, a aposentadoria envolve não apenas a perda do papel profis-
sional, mas relaciona-se também com direitos considerados culturais, como o
de ter aporte financeiro para que possa gerenciar seu tempo e sua vida. Outra
peculiaridade do processo de aposentadoria estaria relacionada ao período
de tempo que inicia na pré-aposentadoria e se estende até o fim da vida do
indivíduo. Finalmente, a aposentadoria é distinta na forma que acontece e
nas consequências que apresenta, pois essas podem variar de acordo com o
passado do aposentado, suas condições de saúde prévias ao processo e as
circunstâncias envolvendo a aposentadoria em si.
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Assim, as mudanças em como se percebe a aposentadoria são significati-
vas. Se no passado aposentar-se representava deixar de trabalhar, atualmente, é
crescente o número de aposentados que se mantém em atividade, mesmo que
em meio-período, tanto na busca de complementação para a aposentadoria
quanto por prazer em manter-se trabalhando (FRANÇA, 2009). Frente a esses
dados procura-se saber o sentido que pessoas em processo de aposentadoria
ou já aposentadas atribuem ao trabalho.
3 Sentido e Centralidade do Trabalho
Para entender o sentido do trabalho busca-se, primeiramente, compreen-
der o que é trabalho para os indivíduos. Para Dejours (2008), o trabalho tem
um caráter utilitário e também se apresenta como a afirmação da identidade
do indivíduo por meio das atribuições individuais inseridas pelo mesmo na
realização da tarefa. De acordo com Enriquez (1999), o trabalho é constituinte
do ser humano. O trabalho também pode ser analisado como forma de iden-
tidade dos indivíduos, o qual define a personalidade dos trabalhadores e as
remodela, estabilizando suas personalidades e seus desejos, colocando-os na
realidade e possibilitando que se instaure a temporalidade na qual o indivíduo
se desenvolve (ENRIQUEZ, 1999).
Embora o trabalho tenha um papel central na vida das pessoas e que
esse auxilie na formação da sua identidade, discute-se hoje que esse esteja
passando por uma reconfiguração de conceito. Isso está relacionado à flexibi-
lização, à informalização e à precarização do trabalho, entre outros fatores que
vêm surgindo com as novas formas da organização do mesmo (LEITE, 2008).
Alguns pesquisadores, como Kovács (2002), Toledo (2000) e Antunes
(2002), observam que, por mais que possam emergir outras formas de orga-
nização, o trabalho não deixará de ser central na vida do indivíduo, pois ele
pode assumir diversos sentidos ou até mesmo significados. Segundo o modelo
de Hackman e Oldham (1975), um trabalho que tem sentido é importante, útil
e legítimo para aquele que o realiza e é influenciado por: (i) a variedade das
tarefas; (ii) permitir a realização de algo do começo ao fim, com um resultado
tangível, identificável; (iii) ter um impacto significativo sobre o bem-estar ou
sobre o trabalho de outras pessoas, seja na sua organização, seja no ambiente
social; (iv) a autonomia; e (v) o feedback.
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O sentido do trabalho, de acordo com as pesquisas do Meaning of Work
International Research Team – MOW (1987) é definido pelo significado (no nível
individual, coletivo e social do trabalho), pela utilidade da tarefa executada para
a organização a qual pertence, a autorrealização e a satisfação, o sentimento de
desenvolvimento e evolução pessoal e profissional e a liberdade e autonomia
para a execução das tarefas. Dentro desse contexto, Morin (2001), que baseou
seus estudos nas pesquisas do MOW (1987), compreende que o sentido do
trabalho é composto pelo significado, pela orientação e pela coerência do tra-
balho. O significado corresponde às representações que o sujeito tem de sua
atividade, assim como o valor que lhe atribui, a orientação é o que o indivíduo
busca no trabalho e o que direciona suas ações e a coerência é o equilíbrio que
o trabalhador espera de sua relação com o trabalho. Portanto, entende-se que
um trabalho com sentido é aquele que realiza, satisfaz e estimula o indivíduo
para o desempenho de suas tarefas.
Em uma pesquisa com estudantes de administração, Morin (2001) ob-
servou que trabalho é um meio de emancipação. Nesse estudo, os fatores que
influenciam no trabalho são o salário, as atividades que possibilitam desenvolver
o potencial e fortalecer a identidade dos indivíduos, as relações construídas no
trabalho, os resultados obtidos que permitem às pessoas darem sua contribuição
à sociedade e um sentido à sua existência. Nessa pesquisa, a autora questio-
nou administradores que trabalham na área de recursos humanos sobre o que
eles mais sentiriam falta se parassem de trabalhar. As respostas se referiam ao
fato de sentir falta de algo para fazer, ser produtivo, sentir-se útil, ter dignidade
pessoal, manter as relações com os outros, sentimento de fazer parte de um
grupo e o salário.
Apesar do grupo de respondentes ser diferente, há uma similaridade nas
respostas, tanto do grupo que procura encontrar sentido no trabalho, como
dos que falaram do que mais sentiria falta se parassem de trabalhar. Por fim,
conclui-se que um trabalho que tem sentido é o trabalho que é feito de maneira
eficiente e leva a alguma coisa, é intrinsecamente satisfatório, moralmente acei-
tável, fonte de experiências de relações humanas satisfatórias, um trabalho que
mantém ocupado e garante a segurança e a autonomia (MORIN, 2001). Nesse
último fator foi ressaltado que, embora o salário seja associado a elementos
de prestígio, a autora destaca que nesse estudo ele remete aos elementos de
segurança e de independência.
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Nessa pesquisa, foi levantado que um trabalho com sentido é uma ati-
vidade programada, que estrutura o tempo, dando sentido aos períodos de
atividade e sem atividade (folgas, finais de semana, férias). Enriquez (1999)
corrobora com esse argumento quando ressalta que o trabalho permite instaurar
a temporalidade. Quando não se tem temporalidade, não se reconhece mais
o indivíduo, pois não se sabe mais o que se tem para fazer, pois as atividades
simplesmente perdem o sentido.
Piccinini et al. (2005), em pesquisa com profissionais de Recursos Huma-
nos que faziam curso de formação continuada, apresentam três dimensões para
classificar o trabalho e seus sentidos: a individual, a organizacional e a social.
Na dimensão individual, o trabalho engloba valores morais (éticos) da pessoa,
é prazeroso, possibilita valorização, desenvolvimento e crescimento, a pessoa
sabe com que objetivo o mesmo está sendo realizado e acredita naquilo que
está fazendo. O fator financeiro é referido como complementar e não essencial
para que o trabalho faça sentido. Na dimensão organizacional, são relacionados
fatores ligados à utilidade, organização do trabalho e relações interpessoais no
ambiente de trabalho. A existência de desafios na execução da atividade é um
aspecto importante, pois a partir do momento em que a tarefa se torna rotineira,
burocrática, operacional e incapaz de instigar o trabalhador, o trabalho deixa
de ter sentido para o indivíduo. Ainda na dimensão organizacional, para que
um trabalho tenha sentido, ele deve ser realizado em um ambiente agradável,
que proporcione relações construtivas. Na dimensão social, o trabalho com
sentido deve ser capaz de contribuir e ser útil para a sociedade.
Para Bastos (1995) encontrar sentido para o trabalho proporciona a
construção da identidade pessoal e social do indivíduo por meio das tarefas
que executa, possibilitando que se identifique com aquilo que realiza. Percebe-
-se, assim, a importância que o emprego tem na vida do indivíduo e como a
sua realização está relacionada com o sentido que o trabalho tem para cada
pessoa. Desse mesmo modo, salienta-se que além de fazer parte da construção
da identidade, o trabalho contribui para dar sentido à vida da pessoa. Uma
vida dotada de sentido fora do trabalho provém de uma vida cheia de sentido
dentro do trabalho (ANTUNES, 2000).
Dessa maneira, ao analisar o sentido que o trabalho tem na vida da
pessoa, também pode se perceber o quão central ele é na vida dos indivíduos.
Assim, a centralidade do trabalho refere-se ao grau de importância conferido
ao trabalho durante a vida. Além disso, essa importância pode diferir entre as
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fases da vida do trabalhador, a chamada centralidade relativa do trabalho. Essa
centralidade é influenciada por cada ciclo e mede a relação do trabalho com
outros aspectos importantes da vida dos indivíduos. Assim, é normal que a mes-
ma pessoa dedique-se ao trabalho de maneira diferente durante cada etapa da
sua vida profissional, podendo ser movido pela necessidade ou, simplesmente,
pelo apreço à atividade exercida (MOW, 1987; TOLFO; PICCININI, 2007).
No entanto, como consequência das inúmeras transformações que o
mundo do trabalho vem sofrendo, as relações de trabalho acabam sendo con-
duzidas de maneira diferente. Essas são vivenciadas por uma geração de tra-
balhadores marcada por inseguranças, pelo efêmero e pelas descontinuidades,
acarretando uma série de mudanças no conceito da centralidade do trabalho
na vida das pessoas. Mas isso não quer dizer que o trabalho tenha perdido sua
centralidade perante essa nova geração, visto que o trabalho também tem o
sentido de sobrevivência para a grande maioria desta geração. (TELLES, 2006;
TOMIZAKI, 2006 apud LEITE, 2008).
Ainda, pesquisas como a de D’Acri (2003), comprovam que mesmo
em atividades consideradas insalubres, como na fabricação do setor têxtil de
amianto, os trabalhadores conseguem vislumbrar um sentido no seu trabalho.
E, consequentemente, o ofício também pode tornar-se central na vida dos
indivíduos, a partir do momento em que representa a garantia da sua sobrevi-
vência. Mais ainda se a atividade representar uma referência na definição da
identidade social do trabalhador e que, na sociedade salarial, remete não só
a um sentido de subsistência, mas de acesso à educação, à cultura e ao status
social (HIRATA; PRÉTECEILLE, 2002).
Contudo, acompanhando os estudos que remetem a uma centralidade
cada vez maior do trabalho na vida dos trabalhadores, há autores que apre-
sentam novas concepções sobre o trabalho. Segundo Gorz (1995, p. 16), não
se vive mais em uma sociedade de produtores, pois
[...] o trabalho não é mais o principal cimento social, nem o
principal fator de socialização, nem a ocupação principal de
cada um, nem a principal fonte de riqueza e de bem-estar, nem
o sentido e o centro de nossas vidas.
Afirma que não há uma centralidade do trabalho remunerado, pois este
não representa mais a fonte principal de identidade e sentido na vida das
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pessoas. Offe (1989), por sua vez, destaca três aspectos que corroboram com
essas ideias: a heterogeneidade das formas de trabalho, o declínio da “ética
do trabalho” e as mudanças da importância do trabalho na vida de cada pes-
soa, provocadas pelos constantes deslocamentos ocupacionais no decorrer da
carreira profissional.
Antunes (2002) opõe-se a esses argumentos e afirma que não se pode
concluir que há uma perda na centralidade do trabalho no universo de uma
sociedade produtora. Mesmo que haja uma tendência a uma maior intelec-
tualização do trabalho fabril ou um desenvolvimento do trabalho qualificado,
tendo como consequência uma subproletarização dos trabalhadores, não há
uma perda da centralidade da categoria trabalho na sociedade contemporânea.
A redução do tempo de trabalho, bem como a diminuição do trabalho
manual e o incremento do trabalho intelectual afirmam a lei do valor ao se
considerar a centralidade do trabalho. Portanto, o que acontece é que o trabalho
não perde importância, mas o significado do que é trabalhar é que se modifica.
Essa modificação ocorre quando os limites entre trabalho e não-trabalho se
tornam difusos, com o aumento da flexibilidade nas relações de trabalho e do
individualismo entre as pessoas (TOLEDO; HERNANDEZ, 2000; ANTUNES,
2002). Devido às discussões acerca da centralidade do trabalho e da importância
do mesmo para a constituição psíquica das pessoas, cabe visualizar os efeitos
da aposentadoria para o trabalhador. A aposentadoria seria o momento em
que se deixa de trabalhar cotidianamente, com horários pré-fixados, recebendo
salário por isso, o que pode trazer desgaste na vida do indivíduo.
Alvarenga et al. (2008) apontam alguns fatores que podem ser causadores
de uma reação negativa à aposentadoria, como a perda do vínculo social que
havia sido constituído em torno das relações profissionais e a diminuição da
renda, que levam a uma mudança de estilo de vida. Porém, o ponto principal
apontado pelas autoras como promotor de negatividade seria a falta de planeja-
mento para aquele momento de transição. Já Reitzes et al. (1996) indicam que
as reações negativas acontecem mais comumente naqueles grupos de aposen-
tados que já traziam históricos de depressão ou problemas de baixa autoestima.
Tendo por base a discussão já apresentada, nesta pesquisa busca-se
verificar quais são os possíveis efeitos da aposentadoria para um grupo de
trabalhadores aposentados ou em via de aposentar-se. Na sequência será
apresentada a pesquisa conduzida nesse sentido.
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4 Características da Pesquisa
O trabalho realizado é de caráter qualitativo, que busca por meio de depoi-
mentos dos entrevistados analisar o lado subjetivo da aposentadoria e transformar
em dados relevantes (DEMO, 2000). Os dados foram coletados por meio de um
roteiro de entrevistas semiestruturado e baseado no referencial teórico abordado.
As entrevistas possibilitam uma maior interação entre entrevistador-entrevistado,
pois permitem ao entrevistador compreender e capturar a perspectiva dos entre-
vistados. As entrevistas foram gravadas com a permissão dos entrevistados para
posterior transcrição. Foi utilizada a análise de conteúdo com o intuito de descobrir,
predizer e ir além das transparências dos dados (BARDIN, 2004).
A pesquisa foi realizada em uma empresa de economia mista, fundada
em 1966 da qual o Estado do Rio Grande do Sul é o acionista controlador. Foi
feita a escolha por essa organização pelo fato dela ter um programa estrutu-
rado de Preparação para Aposentadoria, que ocorre anualmente desde o ano
de 1984 e é organizado pela área de Serviço Social da empresa em parceria
com a Fundação da mesma, que tem como objetivo administrar os Planos de
Previdência dos funcionários, visando garantir o pagamento de benefícios aos
mesmos. Hoje esta Fundação auxilia aproximadamente 17 mil pessoas, entre
participantes e dependentes. Já a organização, conta, atualmente, com cerca
de cinco mil funcionários, sendo que a maioria tem grau de formação médio
ou superior. A entrada na empresa se dá por meio de concurso público e,
conforme informações das organizadoras do evento, os funcionários tendem a
permanecer na empresa por décadas, sendo que boa parte deles tem nela seu
primeiro e único emprego, deixando a empresa apenas quando se aposentam.
A empresa pesquisada apresenta algumas características particulares, dentre
as quais uma política muito forte e exigente no tocante ao cumprimento dos
horários de trabalho, e a estabilidade para seus funcionários.
A coleta de dados foi realizada em um evento promovido pela empresa,
no período de 14 a 18 de dezembro de 2009, na cidade de Porto Alegre. Esse
evento reuniu 45 participantes, entre funcionários e acompanhantes, de todo o
estado do Rio Grande do Sul e teve o intuito de esclarecer as dúvidas sobre a
aposentadoria, auxiliar no preparo dos trabalhadores para enfrentar o período
de mudanças e promover a conscientização a respeito da aposentadoria em
seus aspectos técnicos e pessoais. Cabe enfatizar que os entrevistados fazem
parte de um caso específico de uma empresa que possibilita estabilidade para
os seus funcionários, além de possuir um fundo de pensão que permite que
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recebam complementação da aposentadoria, permitindo que mantenham o
mesmo padrão de vida de quando estavam na ativa.
Em um primeiro momento, foram realizadas entrevistas exploratórias com
duas funcionárias que fazem parte da organização do evento a fim de esclarecer
o seu funcionamento e a sua programação. Em relação aos aposentados, eles
foram divididos em três grupos: (i) Grupo 1: pessoas que estão prestes a se
aposentar; (ii) Grupo 2: pessoas que estão aposentadas há pouco tempo (até
3 anos); e (iii) Grupo 3: pessoas que estão aposentadas há mais tempo (de 3
anos em diante), conforme mostra o Quadro 1. Essa distinção de tempo ocorreu
em função de que, passados três anos de aposentadoria, o público em questão
já teria vivenciado as mudanças decorrentes da maturidade do processo e teria
se estabilizado nessa nova etapa da vida. Como o evento permite a participação
do Grupo 1 e 2, os entrevistados foram escolhidos de forma aleatória, conforme
demonstravam disponibilidade para responder as perguntas. Em relação aos en-
trevistados do último grupo, apesar de poderem participar do evento, não foram
localizados participantes aposentados há mais de três anos. Assim, buscaram-se
indicações com os participantes de aposentados que preenchessem os requisitos
e pudessem participar da pesquisa. Foi realizado contato por telefone explicando
o objetivo da pesquisa e a razão da indicação para a entrevista, sendo que as
três primeiras pessoas indicadas aceitaram participar da pesquisa e, assim, as
entrevistas foram realizadas, duas no evento e uma na residência do entrevistado.
Entrevistado Faixa Etária Sexo Situação Grupo
Entrevistado A Entre 60 e 65 anos Masculino Não aposentado – Falta 1 mês
para se aposentar. Grupo 1
Entrevistado B Entre 55 e 60 anos Masculino Não aposentado – Faltam 6
meses para se aposentar. Grupo 1
Entrevistado C Entre 50 e 55 anos Feminino Não aposentada – Falta 1 mês
para se aposentar. Grupo 1
Entrevistado D Entre 50 e 55 anos Feminino Aposentada – Há 1 mês. Grupo 2
Entrevistado E Entre 60 e 65 anos Feminino
Aposentada – Há 11 meses
aposentada pelo INSS. Falta
um mês para se desligar das
atividades profissionais na
empresa.
Grupo 2
Entrevistado F Entre 60 e 65 anos Feminino Aposentada – Há 6 anos. Grupo 3
Entrevistado G Entre 55 e 60 anos Feminino Aposentada – Há 3 anos. Grupo 3
Entrevistado H Entre 65 e 70 anos Masculino Aposentado – Há 9 anos. Grupo 3
Quadro 1: Perfil dos entrevistados
Fonte: Elaborado pelas autoras deste artigo
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No total foram entrevistados oito funcionários aposentados ou em pro-
cesso de aposentadoria. Além disso, as duas organizadoras do evento que
auxiliaram na organização do programa elucidaram questionamentos das
pesquisadoras e disponibilizaram material da empresa e do programa.
5 Análise dos Resultados
A análise dos resultados será apresentada pelos blocos que nortearam
esse estudo: (i) caracterização do programa de aposentadoria acompanhado;
(ii) aposentadoria; (iii) sentido, significado e centralidade do trabalho.
5.1 Caracterização do Programa de Aposentadoria
O Programa de Preparação para Aposentadoria (PPA) da organização
estudada caracteriza-se como um curso de capacitação destinado aos funcio-
nários que estão se aposentando ou pretendem fazê-lo. Esses profissionais
podem levar consigo um acompanhante, pois o objetivo é também integrar
a família neste processo de aposentadoria. O curso é realizado anualmente
e é organizado pelo serviço social da Fundação da empresa pesquisada. Os
funcionários são convidados para participar do evento por meio de um co-
municado na intranet da empresa, disponibilizado pela Superintendência de
Recursos Humanos da mesma. Eles precisam efetuar uma inscrição e, após a
seleção, os escolhidos são convocados a comparecer ao evento. Essa seleção
se dá pela limitação de vagas no local do evento e tem como critério o tempo
que falta para a aposentadoria do funcionário (o mais próximo, até dois anos).
No PPA, os participantes têm acesso aos mais variados conteúdos, dis-
tribuídos em uma semana com intensa programação, tais como: palestras com
médico geriatra sobre os aspectos médicos do envelhecimento, com economista
sobre finanças pessoais, nutricionista que trata sobre nutrição e qualidade de
vida, com administradora que aborda as possibilidades de realização de trabalho
voluntário, com educador físico, terapeuta familiar entre outros profissionais
destinados a prover informações relevantes sobre essa nova fase da vida dos
futuros aposentados e refletir sobre a mesma.
Além disso, há uma programação recreativa e cultural, como passeios,
apresentação teatral e um filme que trata sobre a questão da aposentadoria.
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Também é feita uma visita à sede da Fundação, para que sejam feitos os cál-
culos e dada uma orientação individual sobre as vantagens e desvantagens de
solicitar a aposentadoria em determinada época.
Um dos aspectos positivos do evento é a sua gratuidade, incluindo trans-
porte, hospedagem, alimentação e a possibilidade de levar um acompanhante
(esposa, marido ou companheiro/a) para participar das atividades juntamente
com os demais funcionários, também com todos os custos pagos pela instituição.
Outro aspecto positivo advém da participação do companheiro do funcionário
que entra em contato durante o curso com a importância do apoio familiar.
As assistentes sociais responsáveis pelo evento apontam que a rede de apoio criada
pela família neste momento possibilita enfrentar as mudanças que estão por vir
de forma mais tranquila e positiva, já que as mesmas podem trazer um momento
de ansiedade para o recém-aposentado. Aponta-se ainda como aspecto positivo
o fato de que são convidados a participar do PPA todos os funcionários indepen-
dentemente de cargo e/ou ocupação na empresa. Dentre os aspectos negativos, é
possível citar o fato de que há um limite de vagas para participantes, imposto pela
disponibilidade de quartos no hotel escolhido para o evento, podendo ocorrer de
alguns não conseguirem participar do mesmo. Além disso, pode ocorrer de que às
vezes o evento não tenha um grande alcance, pois ele não tem caráter obrigatório,
sendo assim, o número de interessados pode variar bastante.
5.2 Aposentadoria
Em relação à aposentadoria, os entrevistados consideram que é somente
mais uma etapa da vida e eles têm grandes expectativas em relação a esse novo
momento. Além disso, é enfatizado, tanto por eles quanto pelas organizadoras
do programa de preparação, que eles são muito novos e que devem, agora,
vivenciar o que não tinham tido oportunidade antes, mostrando que enquanto
eles trabalhavam não tiveram a oportunidade de realizar outras atividades.
Eu não vejo assim que se aposentar é morrer [...] eu vou partir
para uma outra fase aposentada, mas em atividade em outras
coisas: minha família, minha casa, meus amigos. Tenho outras
coisas para curtir (Entrevistada E).
Eu imaginava mais ou menos o que eu tô passando, tô num
período de transição, que eu esperava mesmo... e projetos, de
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viajar, viajar com meus amigos, encontrar minhas amigas...
porque isso aí é vida, é uma oportunidade, eu acho. Porque
se eu estivesse trabalhando eu não ia poder fazer isso (Entre-
vistada D).
Olha, aposentadoria é uma parte da vida e é uma parte feliz
(Entrevistada G).
Apesar dos aposentados não terem sido questionados a respeito da im-
portância do evento que estava sendo realizado, do programa de preparação
e do fundo de pensão, todos, em algum momento da entrevista, abordavam
como o programa e o evento, em específico, ajudaram na sua aposentado-
ria Esse tipo de preparação é o que Atchley (1971; 1976; 1984; 1993 apud
REITZES et al., 1996) refere quando explica que deve existir uma preparação
para a aposentadoria. Além disso, foi ressaltada a importância das pessoas
se planejarem para tal e que isso seja pensado desde o momento em que se
escolhe a profissão na juventude.
Eu aconselhei todos os colegas que eu podia a fazer a prepara-
ção... se tu não tem nada preparado é complicado, né? Tu tem
que ter um projeto, tem que ter tuas coisas (Entrevistada G).
Quando eu me aposentar já tenho projetos. Faz três anos que
eu me planejei para a minha aposentadoria [...] Eu já estou
saindo, estou pronto, estou tranquilo. Totalmente. Quando eu
completei 50 anos [...] Aí eu fui ver com a família o que eu
podia fazer. Ah vou montar uma imobiliária na praia. O que
eu não quero é voltar a bater ponto. [...] Eu fui fazer o curso
do CRECI5, fiz outro curso imobiliário e agora estou vendo
outro curso (Entrevistado B).
Se não tivesse a complementação da Fundação não teria como
ficar sem trabalhar (Entrevistada G).
Hoje eu sou melhor remunerada porque eu paguei antes,
então foi tudo planejado [...] tenho colegas que não pagaram
a Fundação e aí hoje estão só com o INSS6 (Entrevistada F).
5 Conselho Regional dos Corretores de Imóveis.
6 Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) é uma autarquia do Governo Federal do Brasil que tem como objetivo reconhecer e
conceder direitos aos seus segurados. A renda transferida pela Previdência Social é utilizada para substituir a renda do trabalhador
contribuinte, quando ele perde a capacidade de trabalho, seja pela doença, invalidez, idade avançada, morte e desemprego involuntário,
ou mesmo a maternidade e a reclusão. Disponível em: .br/index.php>. Acesso em: 1º out. 2010.
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Embora França (2009) destaque o crescimento do número de aposen-
tados que se mantêm em atividade, alguns dos resultados dessa pesquisa vão
de encontro a essa informação. O que pode ser observado é que os entrevis-
tados recebem, em sua maioria, um valor elevado de aposentadoria, o que
pode estar relacionado ao fato de uma parcela deles não pretender continuar
trabalhando. Entretanto, a necessidade que esses têm de fazer atividades que
preencham o tempo livre é notável. O que foi observado é que eles têm vários
projetos e através deles continuarão a desenvolver atividades, nas quais buscam
reconhecimento, laços sociais e ocupação para o tempo vazio. Assim, se pode
perceber que a dificuldade de “ficar parado” é grande, por isso eles buscam em
outras atividades preencher o tempo livre que antes era destinado ao trabalho
remunerado. Percebe-se que o trabalho, além da remuneração, tem grande
importância no cotidiano das pessoas e quando elas se aposentam existe uma
necessidade de encontrar outras atividades.
Vale ressaltar que o entrevistado com menor renda (em torno de dois mil
reais por mês) pretende continuar trabalhando, embora tenha relatado que isso
se deve ao fato de “não conseguir ficar parado”. Além disso, ele observou que
pensa no futuro dos filhos que ainda tem que fazer faculdade, o que pode ser
um dos motivos para continuar exercendo um trabalho remunerado e não outras
atividades, como trabalhos manuais, aulas de tênis, viagens, como os outros
entrevistados. Assim, percebe-se que a remuneração que a pessoa vai receber
na aposentadoria pode influenciar na escolha de continuar ou não trabalhando.
A gente não para em casa, nem eu e nem ela [a sogra de 93
anos, que também faz trabalhos manuais], porque a gente tá
sempre envolvida com esse trabalho manual, criando, fazendo
coisas bonitas. Então é um outro enfoque, mas é uma ativi-
dade, é um trabalho que gratifica porque tu faz coisas bonitas
(Entrevistada G).
A separação foi uma coisa doída, assim como a aposentadoria
[...] aí eu fui pra academia, comecei a dançar, comecei a tocar
piano de novo [...] entrei num coral [...] tenho pintura, caminho
[...] fui atender um asilo [...] eu sou uma pessoa muito ativa...
e esse último ano eu tinha serviço [laudos para empresa] [...]
eu me casei de novo, os filhos voltaram... então agora em
outubro que eu parei e tive pela primeira vez férias [...] e aí
pensei ‘ah, que bom, férias, aposentada’ [...] mas agora, que
eu tô fazendo 61 anos (Entrevistada F).
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Eu tive que esperar um pouquinho porque eu me aposentei
primeiro, a minha esposa se aposentou depois. Eu fiquei meio
dependente, eu não podia fazer grandes coisas porque tinha
que esperar ela. Ela trabalhava bastante [...] eu ia pra acade-
mia, a tarde ficava muito no computador, vendo vídeos, saía
ia pro clube, jogar tênis. Na época eu não sabia jogar tênis,
aí fui para academia para entrar em forma e depois aprendi
a jogar. Lá eu tenho a parceria com o pessoal do tênis e cada
vez aumenta mais (Entrevistado H).
Dessa forma, compreende-se que a aposentadoria é mais uma etapa da
vida e que há grandes expectativas em relação a esse novo momento. Essas
expectativas referem-se a viagens, cursos, e momentos de lazer com a família,
os quais podem estar relacionados à necessidade de se ter outra ocupação na
sua vida, algo que possa preencher a lacuna e o tempo que o emprego deixou.
Observou-se a importância de programas de preparação para aposentaria,
assim, também como o fundo de pensão para complementar a renda. Além
disso, foi ressaltada a importância das pessoas de se planejarem para a aposen-
tadoria, o que pode amenizar as dificuldades encontradas nessa nova etapa.
5.3 Sentido do Trabalho
Conforme as definições acerca de trabalho dadas por Dejours (2008),
Méda (1996) e Enriquez (1999), o trabalho, além de seu caráter utilitário, tem
também caráter de integração social e desenvolvimento da identidade. Nas
entrevistas, observou-se que o trabalho tem as mesmas configurações citadas
pelos autores, como sendo algo fundamental para a vida e constituição do
sujeito e dos laços sociais.
Trabalho é vida, né? É vida... eu acho o trabalho muito im-
portante, o dinheiro é muito importante porque é a sobrevi-
vência. O que seria de nós sem o dinheiro? Porque ele é que
proporciona o bem-estar todo pra nós. Mas o trabalho é muito
mais do que o dinheiro, pelo lado... o trabalho é que deixa a
pessoa... como é que eu posso te dizer? Eu acho que o valor
da pessoa é o valor pelo trabalho (Entrevistada D).
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Trabalho, a gente trabalha na empresa, trabalha em casa. Todo
serviço é trabalho (Entrevistada E).
O trabalho é integração, coleguismo, amizade (Entrevistado B).
O sentido do trabalho, de acordo com Hackman e Oldham (1975), MOW
(1987) e Morin (2001), passa pelos níveis individual, coletivo e social do tra-
balho. Segundo os autores para ter sentido o trabalho precisa trazer satisfação,
autorrealização, ter impactos positivos na vida das pessoas, precisa trazer auto-
nomia, entre outras características. Os entrevistados, em sua maioria, citaram
a satisfação, autonomia e a autorrealização como fatores importantes para o
sentido do trabalho.
Ele é importante porque além de trazer satisfação, ele dá aquele
senso de utilidade pra tua vida. E ele gera todo um círculo de
amizades, de pessoas, de trabalho e outros correlatos que te
fazem ter uma boa qualidade de vida (Entrevistado A).
Trabalho te dá autonomia, autoestima, satisfação... enfim,
complementa a pessoa, né? [...] Além de ter uma ocupação,
de tu te relacionar com as outras pessoas (Entrevistada C).
Em relação ao fator financeiro do trabalho, Piccinini et al. (2005) apontam
em sua pesquisa que ele não traz sentido ao trabalho, e é sim um fator com-
plementar. Durante as entrevistas, entretanto, o fator financeiro foi relembrado
diversas vezes, seja para indicar que a aposentadoria é satisfatória devido à
possibilidade de não ter obrigação de trabalhar mais, pois o fundo de pensão
assegura a renda anterior, seja para indicar que a primeira finalidade do tra-
balho seria o salário e que as outras características seriam complementares ao
fator financeiro. Nota-se, portanto, que a ausência da necessidade financeira
libertaria do emprego, mas o trabalho continuaria a fazer parte da vida dessas
pessoas. Além disso, os resultados mostraram que o trabalho é importante por
também estar ligado ao status das pessoas (HIRATA; PRÉTECEILLE, 2002) e
à independência financeira (MORIN, 2001).
Eu trabalho primeiro... claro, na verdade quando a gente é
criança diz: ‘eu vou ser isso, eu vou ser aquilo’, pensando
naquilo que for dar a maior renda. Só que por trás de uma
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renda tu preenche uma série de outras coisas que a gente não
se dá conta, então tu preenche teu tempo, tu te satisfaz, tu vai
atingindo os teus objetivos e vai crescendo até tu atingir algum
status dentro da tua vida (Entrevistado A)
O trabalho é importante porque além de gerar uma renda,
ele preenche aqueles vazios... tem que saber que tu tá pre-
enchendo uma série de vazios, tu tem amizades, uma série
de outras coisas que o trabalho te dá além de tu ganhar teu
salário (Entrevistado A).
Do ponto de vista material, ele te dá subsistência, e também
qualidade de vida [...] e a autoestima (Entrevistada F).
O sentimento de utilidade gerado pelo trabalho foi apontado pelos en-
trevistados como algo importante também para a construção do sentido do
trabalho, de forma condizente àquilo tratado por Hackman e Oldham (1975),
MOW (1987), Morin (2001) e Piccinini et al. (2005).
É realização, satisfação pessoal, prazer em trabalhar, e pro-
duzir... para que o resultado ele traga uma diferença para a
minha empresa, pra mim, e pra família e até pra sociedade
(Entrevistado A).
De acordo com o que foi apresentado pelos estudos do MOW (1987)
de Hackman e Oldham (1975), Morin (2001), Piccinini et al. (2005), Hirata e
Préteceille (2002), Dejours (2008), Méda (1996) e Enriquez (1999), observou-se
que o trabalho é visto como promotor dos laços sociais e, assim, promotor da
constituição do indivíduo. Nas falas dos entrevistados ficou claro que a autorre-
alização, a satisfação, o alcance dos objetivos entre outras características fazem
do trabalho uma atividade considerada de fundamental importância para esse
grupo de trabalhadores e aposentados.
Diversos autores discorrem a respeito do papel do trabalho na vida e
se este seria central para a constituição pessoal dos indivíduos (MOW, 1987;
TOLFO: PICCININI, 2007; D’ACRI, 2003; HIRATA: PRÉTECEILLE, 2002). De
forma contrária, há aqueles que indicam que a reconfiguração das formas de
trabalho leva ao deslocamento da centralidade do trabalho e que esse trabalho
não seria mais tão fundamental para os indivíduos (GORZ, 1995; OFFE, 1989).
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No entanto, as entrevistas mostraram que o trabalho tem um papel considerado
importante para os trabalhadores daquela organização.
O trabalho pra mim é assim, fundamental [...] o trabalho é
tudo (Entrevistada F).
O trabalho realiza a gente. Eu não imagino a vida sem trabalho
(Entrevistada G).
Porque no trabalho... eu sou uma pessoa muito apegada, adoro
os meus colegas, adoro. A minha vida foi ali. Principalmente
porque eu tive a felicidade de ter muito tempo dentro de uma
empresa. Então aquilo ali é uma segunda família da gente
mesmo, é uma extensão da casa da gente, onde tu passa a
maior parte do tempo. Embora tu nunca procure separar uma
coisa da outra, de problemas e outras coisas, tu cria amizades
grandes com pessoas que convivem contigo, que estão ali... tu
cria muitos colegas e muitos amigos (Entrevistada D).
Pra mim, ele [o trabalho] era coisa mais importante que tinha...
pra realização, pra autoestima, pra início de vida [...] era tão
importante que só depois que eu consegui minha independên-
cia financeira que eu consegui me realizar com o sexo oposto
(Entrevistada F).
É interessante observar que, apesar dos entrevistados enfatizarem a neces-
sidade e importância de trabalhar, tanto pela necessidade financeira como pela
necessidade de convívio social, muitos se sentem aliviados por não precisarem
mais trabalhar. Isso pode estar relacionado a certa resistência à obrigatoriedade
de trabalhar com horários controlados, o que trouxe para eles uma vontade e
uma tranquilidade ainda maior de chegar à aposentadoria.
Na realidade ele [o trabalho] sempre foi colocado bem à
frente assim, né, de preocupação, de cumprir os compromis-
sos e tal... porque tudo isso dava satisfação e porque é uma
coisa que eu gosto de fazer, né... então ele foi colocado... teve
uma prioridade... e é tanto isso que eu tenho vontade de me
aposentar... porque chegou um momento assim, que assim o
horário é rígido, né? [...] então eu deixei de fazer muita coisa,
inclusive de cuidar de mim [...] então agora é o momento que
eu quero pensar nisso (Entrevistada C).
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Eu quando venho trabalhar fico louco pra chegar no trabalho,
aí a gente fica lá no trabalho... e seis pras cinco eu saio do
trabalho e fico louco pra chegar em casa (Entrevistado A).
Hoje eu não uso relógio, estão todos na gaveta (Entrevistada F).
Também foi observado que, apesar de destacarem o quanto vão sen-
tir falta do que o trabalho proporciona, estão muito felizes e/ou com muitas
expectativas. É ressaltado que existe vida fora do trabalho e momentos que
proporcionem satisfação.
O meu centro de vida já tá fora da empresa. Tá na família e
nos filhos. (Entrevistado A)
Eu vou parar de trabalhar na empresa, mas eu não vou parar
de viver a minha vida normal. (Entrevistada E)
Eu aceitei a condição de aposentado e gosto muito dela. (...)
eu não acho nada como se eu tivesse uma missão para fazer.
A missão hoje é fazer aquilo que eu gosto... é jogar, eu jogo
tênis... é fazer nada, jogar tênis e conviver com meus amigos.
(Entrevistado H)
Assim, por meio das entrevistas realizadas pôde-se observar aquilo que
MOW (1987), Tolfo e Piccinini (2007), D’acri (2003), Hirata e Préteceille (2002)
haviam descrito em seus trabalhos anteriores sobre o quanto o trabalho é central
na vida do indivíduo. Foi possível, também, realizar uma comparação com a
realidade desse grupo com pesquisas realizadas em contextos internacionais. Da
mesma forma, corrobora-se a visão de Toledo e Hernandez (2000) e Antunes
(2002) de que apesar das mudanças nas formas de trabalho, a importância do
mesmo nas vidas das pessoas permanece.
Por fim, percebe-se que a aposentadoria é encarada com naturalidade e
está sendo vista como positiva pelos entrevistados. Nessa fase, os indivíduos
encontram tempo para fazer coisas que não faziam antes e estão sempre em
busca de atividades para preencherem a lacuna que o trabalho deixou. Assim,
percebe-se que o trabalho tem grande importância na vida das pessoas, seja
pelo fator financeiro, satisfação, autonomia, autorrealização, laços sociais e cons-
tituição do sujeito. Isso remete ao fato de que as pessoas sentem que precisam
estar envolvidas com alguma atividade para se sentirem úteis ou se sentirem
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parte de um grupo. Também se percebe que os entrevistados que possuem uma
boa remuneração não pensam em continuar trabalhando para complementar
a renda, mas buscam atividades para não ficarem completamente inativos e
continuarem fazendo parte de grupos sociais.
6 Considerações Finais
A partir da pesquisa realizada pode-se considerar que a aposentadoria
representa um momento de bastante expectativa e satisfação para os entre-
vistados. Essa é considerada como mais uma etapa da vida, em que aquilo
que não puderam realizar enquanto trabalhavam, agora será concretizado.
Nas entrevistas, observou-se que o trabalho tem as mesmas configurações
desenhadas por pesquisas anteriores (MORIN, 2001; PICCININI et al., 2005)
em relação às dimensões individuais, sociais e organizacionais. É importante
ressaltar que, embora os entrevistados pertençam a um grupo específico de
análise – trabalhadores de uma empresa pública, grande maioria com curso su-
perior completo, com bons salários em comparação ao salário mínimo brasileiro,
entre outras características peculiares – eles citaram a satisfação, autonomia e
a autorrealização como fatores importantes para o sentido do trabalho.
As entrevistas mostraram que o trabalho representa um papel importante
para os trabalhadores daquela organização. Entretanto eles consideram que
chegou o momento de “curtir a vida” e que os laços sociais e reconhecimento
que o trabalho proporcionava podem – e devem ser substituídos por outros
afazeres. Com o fim do período de trabalho, pode haver uma perda de identi-
dade, o aposentado pode sentir que sua vida está vazia, podendo até incorrer
em vícios e problemas psicológicos (ALVARENGA et al., 2008; REITZES et al.,
1996). Essa perda se daria devido à falta de planejamento para essa etapa e
ao afastamento do trabalhador do grupo ao qual pertenceu durante um longo
período de tempo, já que um dos componentes importantes do trabalho diz
respeito ao contato social, capaz de trazer satisfação e contribuir na composi-
ção da identidade do trabalhador. No entanto, observou-se nas entrevistas que
eventualmente o grupo social do ambiente profissional é substituído por outros
grupos sociais, como aqueles formados em atividades de artesanato, trabalho
voluntário ou esporte. O indivíduo, portanto, não deixa de se socializar, apenas
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transfere sua presença de um ambiente controlado por horários e outras normas
para um onde não imperam essas obrigações.
Vale notar que os trabalhadores e aposentados entrevistados fazem parte
de um grupo específico e com características bastante singulares, já que traba-
lham ou trabalharam em uma empresa, na qual além de estabilidade, dispõem
de um fundo de pensão que complementa o valor pago como aposentadoria
mensalmente pelo INSS. Dessa maneira, encaram o período da aposentadoria
como algo prazeroso, que pode trazer possibilidades de novas atividades, sejam
elas profissionais ou não. Também é importante observar que os entrevistados
não demonstraram ter passado por problemas deste tipo na aposentadoria,
embora eles soubessem de amigos de dentro da empresa e de outras empresas
que ficaram doentes por não saber lidar bem com este momento.
Outro aspecto a ser apontado é o Programa de Preparação para a Apo-
sentadoria, no qual se discutem as pressões do processo de aposentadoria e
há a participação dos respectivos companheiros que passarão pelo processo
juntamente com o aposentado, para que eles também sejam agentes de pro-
moção do bem-estar e apoio no momento da transição para a aposentadoria.
O direito à preparação para a aposentadoria é previsto em lei como função
federal, estadual ou municipal, ou seja, todos os trabalhadores deveriam ter
acesso a tal preparo. O programa promovido pela empresa em questão neste
trabalho pode ser considerado um tanto peculiar, já que poucas são as empresas
que oferecem cursos para preparar os trabalhadores para esta nova etapa da
vida. Essa pode ser uma das razões pelas quais os entrevistados apresentam
visão positiva acerca do período de aposentadoria e se sentem preparados
para os momentos em que não terão mais atividades profissionais nas quais
encontravam reconhecimento e realização pessoal. Nos relatos das entrevistas
percebe-se que eles reconhecem que o período em que trabalharam foi provei-
toso, que fizeram o melhor que podiam e que a aposentadoria é o momento
merecido de descanso.
Dessa forma, compreende-se que o sentido que o trabalho tem é muito
amplo e diverso para os indivíduos. Ele pode se manifestar de várias formas,
que dependerão da organização em que a pessoa se encontra, dos colegas, das
relações que são construídas, da família, da etapa da vida em que se encontra,
de fatores financeiros, entre outros aspectos. Assim, tem-se a centralidade do
trabalho como algo que difere, primeiramente, de acordo com a fase da vida
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de cada trabalhador, além de ser relacionada com o sentido que a pessoa dá
ao seu trabalho.
Considerando o aumento da expectativa de vida da população brasilei-
ra, as organizações poderão ter bons resultados se tiverem a preocupação de
ajudar na preparação para essa nova etapa, apesar de a lei prever a respon-
sabilidade da preparação para os poderes públicos. Entretanto, ao se preparar
um curso ou programa de preparação para a aposentadoria é importante ter
em mente que não se pode simplesmente copiar modelos de outras empresas
sem considerar o contexto da mesma e de seus trabalhadores. Além disso, o
cuidado na adaptação para a realidade das organizações e dos indivíduos
que as compõe pode trazer índices maiores de sucesso e diminuir os possíveis
problemas enfrentados pelos trabalhadores que se aposentam.
Por fim, percebe-se que um fator que pode ser mais explorado em pes-
quisas futuras é o papel que o resultado financeiro do trabalho tem na vida
dos trabalhadores e na sua percepção em relação ao trabalho. Também a
importância de fazer essa pesquisa em outras organizações até mesmo para
verificar se existem pessoas que tem dificuldade de enfrentar a aposentadoria
e acabam tendo desajustes que podem ter repercussões físicas e emocionais no
aposentado, pois, conforme já mencionado, a empresa pesquisada tem uma
preparação para aposentadoria e fundo de pensão, o que pode amenizar os
problemas dessa etapa da vida, mas seria interessante pesquisar em empresas
que não tem esse apoio e observar como os funcionários lidam com essa nova
fase da vida.
Agradecimentos
Agradecemos a Sra. Rosana Pozzobon, que permitiu esta pesquisa na
Organização estudada, convidando-nos para participar do Evento menciona-
do e colaborando com a pesquisa por meio do fornecimento de dados e da
indicação de entrevistados.
A todos os entrevistados, que se mostraram muito solícitos no desenvol-
vimento deste estudo.
Ao CNPq e à CAPES, pelo auxílio financeiro.
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Beyond Working Time: the sense of work in the
process of retirement
Abstract
This work of theoretical nature investigates the contributions of the history of science to
the production of scientific knowledge in the field of management and organizational
studies. It was found in the study that the theories concerning the management and
organizational studies are fallible and remain subject to a ongoing improvement or
replacement. So, one should accept the idea of the need of constant transformation
and improvement of knowledge. Became evident that the studies in administration and
organizations witnessed a change of paradigm when classical school of management
was questioned and added of new paradigms. In that way, that field of studies has
become pluralistic, with conflicts among paradigms and average science, the questions
concerning their research methodologies not being different at all. In this context, the
history of science can present important lessons in showing that scientific revolution was
not accepted peacefully, but by means of tough discussions and apparent contradictions.
Several authors sought an approach between Social Ciences and Natural. Thus, the
joint use of qualitative and quantitative methodologies is more and more present in
management and organizational research granting a greater legitimacy to the different
manners of approaching the theme. The debates about which is the best approach
remain, in spite of a greater dialogue between these two chains of methodological
thought being happening in the latest decades.
Key words: Qualitative methodology. Quantitative methodology. Administra-
tion. Organizational studies. History of science.
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