Amicus Curiae - A democratização do debate nos processos de controle da constitucionalidade

AutorProf. Edgard Silveira Bueno Filho
CargoAdvogado. Professor e Mestre em Direito Constitucional na PUC-SP, Juiz aposentado do TRF 3ª Região, Ex-Presidente da Associação dos Juízes Federais - AJUFE; Procurador do Estado em São Paulo.
Páginas1-9

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"Controlar a constitucionalidade de ato normativo significa impedir a subsistência da eficácia de norma contrária à Constituição"1. Em outras palavras, isso significa negar eficácia a um ato normativo produzido, em regra, por algum órgão ou autoridade com representação popular (Congresso Nacional, para hipóteses de leis, emendas constitucionais e resoluções, ou o Executivo, para os decretos regulamentares). Daí a relevância jurídica e política dessa competência entregue ao Supremo Tribunal Federal. É, portanto, sobre essa ótica que iremos tratar do tema. Antes disso, convém relembrar alguns conceitos sobre o tema. Vamos a eles.

O fato de a Constituição ter prevalência sobre as demais normas, além de permitir o controle da produção das normas inferiores, implica a necessidade de zelar pela sua preservação.

A preservação da norma superior constitui-se em obrigação dos entes políticos federativos, consoante se observa do art. 23 da Constituição. Mas, não exclusiva. Com efeito é dever de todo e qualquer cidadão velar pela sua guarda, com o objetivo de preservar os direitos e garantias nela estipulados. Com efeito, o estatuto maior tem por objetivo, dentre outros, é claro, garantir Page 2 direitos e liberdades. Assim, é necessário o esforço de todos para preservar a Constituição íntegra.

A atividade de controle da constituicionalidade só é possível nos Estados, como o Brasil, nos quais há a supremacia da Constituição, sendo a lei maior o fundamento de validade de todas as demais.

Dentre nós, esta importantíssima tarefa é entregue ao Poder Judiciário, que exercita o controle repressivo por duas vias: a direta e a indireta.

O controle da constitucionalidade pela via de ação não é acessível a todos. Deveras, o ataque da lei em tese ou o seu controle em abstrato só pode ser exercido por certas pessoas designadas pelo art. 103, da Constituição.

Desse modo, aos particulares resta a busca do controle pela via de exceção, diante de um caso concreto e de forma incidental. A decisão judicial, no entanto, restringe-se, apenas, a solucionar uma lide instaurada. É que a declaração não se constitui em objetivo do processo, pois o pedido da parte é livrar-se de uma ação ou omissão estatal praticada em arrepio à norma constitucional.

I - Da Assistência

Nessas causas regidas pela lei processual civil, é admitida a presença de terceiros. Deveras, qualquer um, por ato espontâneo ou por provocação de uma das partes, e desde que demonstre ter interesse jurídico na obtenção de uma sentença favorável a uma das partes, pode intervir na causa como assistente (art. 50, do C.P.C.). A posição do assistente, portanto, é coadjuvar uma das partes para que ela obtenha vitória no processo.

O interesse de que fala a lei há de ser jurídico e não pode ser meramente econômico. Mas não se confunde com a tutela de seu direito subjetivo, pois não é parte no processo. Interessa-lhe, no entanto, influir positivamente na relação jurídica sob exame, para que a decisão a ser formada o favoreça. Bem por isso, o Supremo Tribunal Federal anota que é a partir dessa constatação que se pode aferir da existência ou não de interesse jurídico do assistente (RTJ 132/652).

Desse modo, no âmbito da via de exceção, a atividade de controle da constitucionalidade pode ter a participação de pessoas interessadas na defesa de direitos, garantias e liberdades que lhe sejam caras, por meio da assistência. Participação, porém, dependente da demonstração de interesse jurídico na causa.

II - Da intervenção na ação direta de inconstitucionalidade e naação declaratória de constitucionalidade

No âmbito da via direta de controle, a presença do assistente era possível até 1985, quando o Supremo Tribunal Federal editou a Emenda Regimental nº 2 de 1985.

Como sabemos, o controle da constitucionalidade na via de ação é exercido pela Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) e pela Ação Direta Page 3 de Constitucionalidade (ADC). Essas duas demandas só podem ser deflagradas por pessoas designadas pelo art. 103 da Constituição do Brasil.

Embora esse rol de pessoas tenha sido muito ampliado em relação ao sistema constitucional anterior (antes de 1988 só o Procurador Geral da Republica podia faze-lo), o fato é que só aquelas partes têm o direito de acesso à jurisdição constitucional. Com isso, a discussão, diga-se de passagem, da maior relevância, que se instala a respeito da validade ou invalidade de determinado ato normativo, fica restrita aos argumentos que o proponente e demais partes cuja participação no processo foi determinada pela Constituição, trazem à causa.

Assim, o acesso limitado à jurisdição constitucional restringindo o debate, pela sua gravidade, era preocupante.

Com efeito, a propositura tanto da ADIN quanto da ADC só se justificam diante da existência de sérias controvérsias sobre a adequação do ato normativo ao texto constitucional. E havendo dúvida sobre a constitucionalidade é necessário, para garantir a segurança jurídica e a coerência do sistema, a solução do conflito.

Pois bem. Se é assim, ou seja, se determinado ato normativo provoca dúvidas quanto a esse importante aspecto de sua validade, a ponto de justificar a movimentação das pessoas constitucionalmente designadas para exercer o processo de controle, nada melhor do que esmiuçá-lo, de forma exaustiva, de modo a se obter uma decisão a mais segura e completa possível.

Em outras palavras, o que se quer dizer é que a decisão proferida na atividade de controle da constitucionalidade deve ter sido precedida de exame exaustivo do ato normativo suspeito, de forma a mostrar aos jurisdicionados a sua conformidade ou desconformidade com a Constituição, espancando toda e qualquer dúvida suscitada.

Não é por outra razão que o grande juiz norte-americano e presidente da Suprema Corte num dos períodos mais férteis da...

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