Anagé - Vara cível

Data de publicação05 Janeiro 2022
Número da edição3011
SeçãoCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE ANAGÉ
SENTENÇA

8000139-70.2020.8.05.0009 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Anagé
Autor: Gerson Amorim Da Silva
Advogado: Mateus Rodrigues Matos (OAB:BA17571)
Reu: Companhia De Eletricidade Do Estado Da Bahia Coelba
Advogado: Paulo Abbehusen Junior (OAB:BA28568)
Advogado: Denner De Barros E Mascarenhas Barbosa (OAB:BA60908)

Sentença:

Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer cumulada com Indenização por Danos Morais, com pedido liminar, ajuizada por Gerson Amorim da Silva contra Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia – COELBA.

Alega o autor que reside na zona rural do município de Caraíbas, mais especificamente na Fazenda Periperi, não possuindo fornecimento de energia elétrica, mesmo estando a sua residência a apenas 450 metros da rede de energia elétrica de propriedade da ré.

Prossegue afirmando que já procurou inúmeras vezes a demandada para solicitar a instalação da rede elétrica, conforme expediente nº 90001194041, mas sem êxito, tendo a ré se limitado a fornecer um painel solar para o autor, que, segundo este, tem potência bastante precária.

Por fim, narra que, em junho de 2019, a demandada realizou a obra de extensão da rede elétrica e exigiu que o demandante construísse um padrão na entrada da residência, no entanto, mesmo tendo a autora cumprido a exigência, a Coelba, até o momento, não procedeu ao fornecimento de energia elétrica em sua residência.

Decisão indeferindo a tutela antecipada requerida (ID 65997632).

Em sede de Contestação, a Acionada aduz que se faz necessário que os interessados comprovem sua qualidade de beneficiários, por meio de um procedimento próprio que passa pela deliberação do Comitê Gestor Estadual de Universalização.

Defende-se, ainda, afirmando que, conforme definido na Resolução Homologatória 2285, de 2017, a realização das obras de rede e efetiva ligação de energia na região em que reside o autor será feita até o fim do ano de 2021.

Suscitou preliminar de incompetência dos juizados especiais em face da necessidade de prova pericial.

O autor, em réplica, rebateu a preliminar suscitada e ratificou os termos e pedidos da petição inicial.

Intimadas, as partes manifestaram o desinteresse na produção de outras provas.

É o relatório. Decido.

DO JULGAMENTO ANTECIPADO DA LIDE


Diante do material probatório já juntado nos presentes autos, observo ser desnecessária a produção de outras provas, tendo as partes concordado com tal afirmação no momento em que manifestaram o desinteresse na produção de provas.


Assim, com escopo no artigo 355, I, do CPC, passo ao julgamento antecipado da lide.

PRELIMINAR DE INCOMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL

Alega a ré a incompetência do juizado especial cível para análise da matéria, visto que necessitaria de prova pericial.

No entanto, a preliminar aqui debatida deve ser rejeitada por dois motivos.

O primeiro deles é que, em decisão de ID 68630718, restou decidido que o procedimento adotado nestes autos é o comum, razão pela qual não há que se falar em impossibilidade de produção de prova pericial, ainda que complexa fosse.

O segundo motivo é que, ainda que fosse adotado o procedimento da Lei nº 9.099/95 - o que não é o caso -, as partes, devidamente intimadas, informaram que não possuíam mais provas a produzir (IDs 89029400 e 91517073), restando preclusa, portanto, a produção de prova pericial.

Diante disso, REJEITO a preliminar.

Passa-se, então, à análise do mérito.

MÉRITO

DO FORNECIMENTO DE ENERGIA ELÉTRICA

Inicialmente, salutar pontuar que o serviço de fornecimento de energia elétrica é essencial ao cidadão, de tal sorte que o Governo Federal, objetivando a universalização desse serviço, expediu o Decreto n.º 7.520/2011, instituindo o Programa Nacional de Universalização do Acesso e Uso da Energia Elétrica (conhecido como “LUZ PARA TODOS”), com o escopo de fornecer energia elétrica para todas as propriedades rurais.

Embora não se desconheça a existência de entraves burocráticos e operacionais para a sua execução, estes devem ser arcados pela Ré, uma vez que são inerentes à atividade empresarial por ela exercida.

Ainda, embora a Resolução Homologatória n.º 2.285, de 08/08/2017, mencione que a previsão de obra de energia elétrica para Caraíbas é 2021, a Acionada não apresentou qualquer projeto ou mesmo o orçamento para conclusão, o que redunda em enorme prejuízo para a parte Autora. Ademais, sucessivas resoluções homologatórias com modificação dos prazos para universalização da eletrificação rural foram e vêm sendo editadas pela concessionária, sem que haja notificação dos beneficiários/consumidores.

Assim, em que pese a tese de defesa apresentada pela empresa Requerida, destaco que a instalação de energia elétrica deve ser atendida, pois não há óbice escusável, uma vez que se trata de serviço essencial.

Além do mais, nota-se que, embora se esteja em novembro de 2021 – faltando menos de 2 (dois) meses para o fim do ano, portanto -, não há qualquer notícia nos autos sobre o início do fornecimento de energia elétrica na casa do autor, o que gera indícios suficientes de que o prazo alegado pela ré em sua contestação não será cumprido.

De mais a mais, quando a Ré alega que está aguardando a liberação do Comitê Gestor do Governo Federal, não sendo sua a responsabilidade pela demora em atender ao pleito da parte Autora, carece de razão, já que não trouxe ao bojo dos autos quaisquer documentos que comprovem a existência de processo sobre a instalação do programa na localidade da parte Autora.

Diante desse cenário, o demandante permanece sem a prestação de serviço de energia elétrica, fato que não pode persistir, considerando que se trata de de bem essencial, compreendendo o mínimo para a sobrevivência digna e segurança da população, sem a qual há dificuldade no desenvolvimento do ser, sendo considerada pelo art. 10, Lei nº 7783/1989 como serviço essencial.

Sobre o fornecimento de serviços essenciais e a necessidade de observância da proteção da dignidade da pessoa humana, vale citar a lição de Monica Spezia Justen (in “A Noção de Serviço Público no Direito Europeu”, p. 231/232):

“O reconhecimento e o respeito ao acesso aos serviços de interesse geral implicam a proteção à dignidade da pessoa humana na medida em que a obrigação de garantir serviços universais está vinculada ao suprimento de necessidades vitais do ser humano. Algumas dessas necessidades demandam bens econômicos tais como a energia elétrica, a comunicação (telecomunicações e internet, mais modernamente) e o transporte. As necessidades vitais podem ser supridas pela garantia ao serviço mínimo, a que todos os cidadãos podem ter acesso. Ou seja, a dignidade da pessoa humana está sendo respeitada quando assegurado está o serviço universal.”

Ressalta-se que, embora seja a detentora de todas as informações técnicas essenciais relativas à prestação dos serviços de energia elétrica, a parte Requerida não trouxe aos autos quaisquer elementos concretos probatórios aptos a justificar o motivo da demora para atender a demanda do consumidor, deixando, portanto, de demonstrar a existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito da parte Autora, nos termos do artigo 373, II, do Código de Processo Civil.

Assim, demonstrada a injustificada demora no(a) fornecimento/ligação de energia elétrica, é devida a condenação da concessionária à obrigação de fazer consistente na finalização da extensão da rede elétrica até a residência do autor e a interconexão com o padrão de entrada de sua residência.

DO DANO MORAL

Na espécie, o dano moral não exige prova, porque se considera hipótese de dano in re ipsa, traduzindo a ideia de que os fatos falam por si.

Quanto ao valor, muito embora a jurisprudência não tenha firmado um método único para aferi-lo, nota-se que o E. Superior Tribunal de Justiça vem adotando o sistema bifásico, de modo que, na primeira fase, deve o magistrado analisar o quantum fixado pela jurisprudência em casos semelhantes e, na segunda fase, as peculiaridades do caso concreto.

Nesta esteira, entendo como razoável e proporcional o montante requerido pela parte autora, no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais).

DISPOSITIVO

Diante do exposto, além do mais que dos autos consta, JULGO PROCEDENTES OS PEDIDOS, extinguindo o feito com julgamento do mérito (art. 487, I, CPC), com fundamento no art. 84, § 4º, do Código de Defesa do Consumidor, c/c o art. 300, do Código de Processo Civil, para:

a) DETERMINAR que a Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia – COELBA finalize a extensão da rede elétrica até a residência do autor e a interconexão com o padrão de entrada da residência deste, no prazo de 30 (trinta) dias; e

b) CONDENAR a Companhia de Eletricidade do Estado da Bahia – COELBA a pagar à parte Autora a quantia correspondente à R$ 5.000,00 (cinco mil reais), a título de danos morais, corrigidos monetariamente pelo INPC/IBGE, a contar da data do arbitramento, a teor da Súmula 362 do STJ, e juros de mora a contar da citação, nos termos do artigo 405 do Código Civil.

Diante da presença do...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT