Análise de conjuntura em atos: a crise brasileira em contexto viral

Páginas193-211
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 46, n. 252, p. 193-211, jan./abr., 2021 | ISSN 2447-861X |
doi>: http://dx.doi.org/10.25247/2447-861X.2021.n252.p193-211
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ANÁLISE DE CONJUNTURA EM ATOS: A CRISE BRASILEIRA EM
CONTEXTO VIRAL
Documento CEAS
Equipe CEAS
Esse texto esboça a compreensão do Centro de Estudos e Ação Social (CEAS) sobre a
conjuntura brasileira no primeiro semestre de 2021, sob o ponto de vista da sua equipe. Para
alinhavar esta análise, discutir-se-á quatro aspectos centrais do contexto nacional. Em cada
um dos aspectos abordados, aqui chamados de Atos, busca-se perceber as interconexões
presentes nas dinâmicas internas e externas ao país, assim como os elos existentes entre os
acontecimentos conjunturais e seu processo de produção histórico-estrutural.
O primeiro ato discute o significado socioeconômico da crise atual e suas
consequências políticas, aí destacando o desemprego e a desindustrialização do país. O
segundo ato abord a o caminho histórico da crise brasileira, enfocando o processo do golpe
de 2016 e suas articulações com a crise estrutural do capital, desde 2008, quando estourou a
crise financeira mundial, até o presente. No ato seguinte, o recorte é fe ito sobre a pandemia
de covid-19, em meio à agudização desta crise, destacando os impactos de viés político-
ideológico na condução da crise sanitária feita pelo atu al bloco de poder à frente do Estado
brasileiro.
No quarto e último ato, desenhamos os cenários e possíveis desdobramentos da crise
atual, em termos econômicos e sociais, em meio ao caos sanitário e à proximidade das
eleições presidenciais de 2022, enfocando as opções políticas, táticas e estratégicas das
classes dominantes e dos coletivos sociais, com destaque para os desafios dos movimentos
sociais das classes trabalhadoras e do bloco de poder bolsonarista.
Centro de Estudos e Ação Social. Para atender às demandas dos Movimentos Sociais, o Ceas se organiza em
equipes de assessoria (Rural, Urbana e Documentação/Memória) e coedita a revista Cadernos do Ceas com a
UCSal (BA) e a Unicap (PE). E-mail: coordenacao@ceas.com.br
Cadernos do CEAS, Salvador/Recife, v. 46, n. 252, p. 193-211, jan./abr., 2021.
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Análise de conjuntura em atos: a crise brasileira em contexto viral | Equipe CEAS
Para realizar os objetivos mencionados, mobilizamos alguns conceitos e noções
presentes no debate sociológico e na ciência política atuais, com destaque para os conceitos
de “necropolítica” lógica de destruição capitalista”, “ estado de exceção, lógica suicid ária
do estado fascista”, dentre outros.
Por fim, relembramos que uma análise de conju ntura, necessariamente, parte de um
ponto de vista e de um lugar de observação. No nosso caso, ponto e lugar se confundem,
posto que miramos a conjuntura a partir dos espaços de convivência e luta dos mov imentos
sociais, rurais e urbanos, e formulamos nossa compreensão em diálogo com esses coletivos,
tendo como referências suas necessidades e objetivos. Enfim, a lógica que orienta esta visão
da conjuntura procura se conectar com os interesses dos trabalhadores, dos grupos sociais
oprimidos e explorados da sociedade brasileira.
Ato 1 O significado socioeconômico da crise e suas consequências políticas
Ao longo da história, o capitalismo se desenvolveu em ciclos de crescimento seguidos
por crise. Nas últimas décadas, os períodos de crescimento econômico tornaram-se mais
curtos e os de crise mais longos, com poucas exceções regionais. A razão básica desse
percurso do capital é a sua forma de desenvolvimento, concentrando a riqueza e a renda, de
um lado, e, de outro, a pobreza e carência generalizadas, e assim ampliando a desigualdade
social, a violência, enfim, a morte lenta ou violenta e suas formas variadas.
A natureza do capital, portanto, é destrutiva. Se não regulado pelo Estado, em
determinada correlação de forças sociais, com políticas redistributivas concretas, o sistema
agrava todas as desigualdades possíveis e concentra a produção e a renda ao absurdo, como,
aliás, assistimos hoje, q uando um 1% (um por cento) da população mundial controla 99%
(noventa e nove por cento) da riqueza produzida por toda a humanidade. Ou, no caso do
Brasil, onde 1% dos proprietários cont rolam cerca de 50% da área rural do país e do total da
renda socialmente produzida (CREDIT SUISSE, 2021). Não só isso, para sair da crise, o
sistema adota a eliminação do capital mais frágil, vencido no jogo de mercado, promovendo
a destr uição ou a queima dos capitais mais fracos e , com eles, dos empregos e rendas de
muitas pessoas, especialmente as mais pobres. Desse processo resulta a crescente
monopolização dos setores produtivos em mãos dos capitais vencedores, os monopólios.

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