Araci - Vara cível

Data de publicação19 Julho 2022
Número da edição3139
SeçãoCADERNO 3 - ENTRÂNCIA INTERMEDIÁRIA
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
V DOS FEITOS DE REL DE CONS CIV E COMERCIAIS DE ARACI
INTIMAÇÃO

8001110-40.2020.8.05.0014 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Araci
Autor: Augusta Santos Da Cruz
Advogado: Elido Ernesto Reyes Junior (OAB:BA15506)
Reu: Bradesco Vida E Previdencia S.a.
Advogado: Fernando Augusto De Faria Corbo (OAB:BA25560-A)

Intimação:

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

COMARCA DE ARACI - JURISDIÇÃO PLENA


Processo nº 8001110-40.2020.8.05.0014

Ação: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436)

Autor: AUGUSTA SANTOS DA CRUZ

Réu: BRADESCO VIDA E PREVIDENCIA S.A.


SENTENÇA


Vistos etc.

Relatório dispensado, por força do art. 38 da Lei n. 9.099/1995.

Trata-se de ação movida por AUGUSTA SANTOS DA CRUZ, na qual requer a declaração de inexistência de débito, indenização por danos materiais e morais, tendo em vista que está sendo debitado da sua conta bancária taxa denominada “BRADESCO VIDA E PREVIDENCIA””

Em contestação a Acionada assever ausência de ato ilícito, bem como refuta a pretensão indenizatória.

É o que importa circunstanciar. DECIDO.

Indefiro o pedido de designação de audiência de instrução, tendo em vista que os documentos apresentados pelas partes são suficientes para dirimir a questão aqui discutida.

Estando o feito em ordem, presentes as condições da ação e os pressupostos processuais, bem como inexistindo preliminares pelas partes ou cognoscíveis de ofício, passo à análise do mérito propriamente dito.

DO MÉRITO

De início, ressalta-se que o feito se submete à disciplina jurídica estabelecida no Código de Defesa do Consumidor, por estarem presentes os elementos que caracterizam a relação consumerista.

A(s) questão(ões) controversa(s) do processo cinge(m)-se à verificação da existência e validade de vínculo contratual entre as partes, que legitime as cobranças efetuadas, bem como à aferição da presença dos requisitos para responsabilização civil do réu.

Isso porque a parte autora alega que tem sido cobrada indevidamente por descontos não autorizados, referentes a tarifas denominadas “BRADESCO VIDA E PREVIDENCIA”.

A parte apresentou indícios suficientes de que não realizou nenhuma contratação junto à parte requerida. De outra banda, todavia, a parte ré não produziu nenhuma prova capaz de contraditar e refutar as informações constantes no processo, conforme ônus que lhe é imposto pelo art. 373, II, do Código de Processo Civil, o(a) demandante não se desincumbiu do ônus probatório imposto pelo art. 373, II, do CPC, haja vista que não apresentou nenhum fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito do autor.

Diante do exposto, ausente prova de que a parte consumidora efetivamente contratou tos serviços/produtos objeto deste feito, necessário se faz reconhecer a falha na prestação do serviço pelo fornecedor, tornando-se ilícita a cobrança realizada.

Nesse sentido, não havendo prova da contratação, impõe-se a declaração de inexistência de débito, nos termos pleiteados na inicial.

No caso em tela, verifico que estão presentes os requisitos no que se refere ao dano material informado, atestando a necessidade de devolução em dobro dos valores descontados indevidamente, uma vez que tal cobrança viola a boa fé objetiva que deve nortear as relações jurídicas dessa natureza. Nesse sentido, preconiza o art. 42, parágrafo único, do CDC:

Art. 42. Na cobrança de débitos, o consumidor inadimplente não será exposto a ridículo, nem será submetido a qualquer tipo de constrangimento ou ameaça.

Parágrafo único. O consumidor cobrado em quantia indevida tem direito à repetição do indébito, por valor igual ao dobro do que pagou em excesso, acrescido de correção monetária e juros legais, salvo hipótese de engano justificável.

O entendimento pacificado recentemente no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, em sede de recurso repetitivo, no bojo do processo EAREsp 676.608/RS, é de que, para fins de devolução em dobro, não se exige demonstração inequívoca da existência de má fé do fornecedor, bastando prova de que a cobrança indevida contrariou a boa fé objetiva exigida pelo ordenamento jurídico brasileiro. É o caso dos autos:

1. A restituição em dobro do indébito (parágrafo único do artigo 42 do CDC) independe da natureza do elemento volitivo do fornecedor que cobrou valor indevido, revelando-se cabível quando a cobrança indevida consubstanciar conduta contrária à boa-fé objetiva.

Portanto, quanto ao pedido de indenização por danos materiais, compreendo que procede a pretensão autoral, haja vista a existência de conduta, prejuízo e nexo causal, bem como inexistindo causa de exclusão da responsabilidade, devendo a parte requerida devolver, em dobro, todos os valores cobrados irregularmente da parte autora, devidamente corrigidos.

No que tange ao dano moral, sabe-se que a doutrina e a jurisprudência majoritárias se alinham no sentido de que o prejuízo imaterial é uma decorrência natural (lógica) da própria violação do direito da personalidade ou da prática do ato ilícito, caracterizando-se in re ipsa, ou seja, nas palavras do festejado Sérgio Cavalieri Filho: “deriva inexoravelmente do próprio fato ofensivo, de modo que, provada a ofensa... está demonstrado o dano moral” (Programa de Responsabilidade Civil. 5ª ed. São Paulo: Editora Malheiros. 2003. p. 99).

Dando a conotação aberta que a proteção da condição humana merece (e portanto fugindo de um rol de direitos da personalidade propriamente dito), numa perspectiva civil-constitucional, Maria Celina Bodin de Moraes vai além, afirmando que o dano moral refere-se à violação da cláusula geral de tutela da pessoa humana, seja causando-lhe um prejuízo material, seja violando um direito extrapatrimonial, enfim, praticando em relação a sua dignidade qualquer mal evidente ou perturbação, ainda que não reconhecido como parte de alguma categoria jurídica ( MORAES, Maria Celina Bodin de. Danos a pessoa humana: uma leitura civil constitucional dos danos morais. São Paulo: Renovar, 2003, p. 185)

Mas, também pelo viés punitivo, e da prevenção de danos, a repercussão da conduta da ré merece ser sancionada.

Perceba-se que o “paradigma reparatório”, calcado na teoria de que a função da responsabilidade civil é, exclusivamente, a de reparar o dano, tem-se mostrado ineficaz em diversas situações conflituosas, nas quais ou a reparação do dano é impossível, ou não constitui resposta jurídica satisfatória, como se dá, por exemplo, quando o ofensor obtém benefício econômico com o ato ilícito praticado, mesmo depois de pagas as indenizações pertinentes, de natureza reparatória e/ou compensatória; ou quando o ofensor se mostra indiferente à sanção reparatória, vista, então, como um preço que ele se propõe a pagar para cometer o ilícito ou persistir na sua prática.

Essa “crise” do paradigma reparatório leva o operador do direito a buscar a superação do modelo tradicional, a qual não se traduz no abandono da ideia de reparação, mas no redimensionamento da responsabilidade civil, que, para atender aos modernos e complexos conflitos sociais, deve exercer várias funções.

Ao lado da tradicional função de reparação pecuniária do prejuízo, outras funções foram idealizadas para a responsabilidade civil. Assim, avulta, atualmente, a noção de uma responsabilidade civil que desempenhe a função de prevenção de danos, forte na ideia de que mais vale prevenir do que remediar.

Conforme salienta Ramón Daniel Pizarro, tanto do ponto de vista da vítima quanto do possível responsável, a prevenção do dano é sempre preferível à sua reparação. O tema assume especial relevo em matéria de danos causados como consequência de uma lesão a direitos personalíssimos, como a intimidade, a honra ou a imagem.

Do mesmo modo, cresce a ideia, em países de tradição romanística, de uma função punitiva da responsabilidade civil. A indenização punitiva surge como instrumento jurídico construído a partir do princípio da dignidade humana, com a finalidade de proteger essa dignidade em suas variadas representações.

A ideia de conferir o caráter de pena à indenização do dano moral pode ser justificada pela necessidade de proteção da dignidade da pessoa e dos direitos da personalidade, sobretudo em situações especiais, nas quais não haja outro instrumento que atenda adequadamente a essa finalidade, respondendo, outrossim, a um imperativo ético que deve permear todo o ordenamento jurídico.

Essa ideia da indenização punitiva é coerente com os princípios que informam o nosso Direito e constitui um mecanismo consistente e apto à consecução dos fins para ele almejados. Nessa senda, para o STJ , é importante sancionar o ofensor e satisfazer a vítima (Resp 575023/RS), albergando,assim, o caráter misto da indenização.

Desse modo, o valor da reparação e punição deve observar a situação econômica das partes envolvidas, a gravidade do dano e o tríplice escopo da reparação: indenizatório, punitivo e pedagógico, evitando enriquecimento ilícito, por um lado, e desestimulando a reiteração da prática ilícita, por outro.

DISPOSITIVO

Ante o exposto, rejeitadas as preliminares, CONFIRMO A LIMINAR do id n. 106955486 e julgo PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos autorais, extinguindo o feito com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do CPC, para:

a) declarar a inexistência de débito junto à requerida, no que se refere ao objeto deste feito;

b) condenar a parte ré à devolução, em dobro, dos valores indevidamente debitados da conta bancária da parte autora, em virtude do objeto deste processo, devendo os valores serem atualizados segundo o IPCA desde a data de cada desembolso até a data do efetivo pagamento (Súmula 43...

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