Belmonte - Vara crime, j�ri, execu��es penais, inf�ncia e juventude

Data de publicação17 Julho 2023
Número da edição3373
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA CRIMINAL DE BELMONTE
SENTENÇA

8000431-42.2022.8.05.0023 Ação Penal - Procedimento Ordinário
Jurisdição: Belmonte
Reu: Tanure Cavalcante Teles
Advogado: Matheus Reis De Franca (OAB:BA72776)
Advogado: Gutemberg Souza Passos Filho (OAB:BA52017)
Autor: Ministério Público Do Estado Da Bahia

Sentença:

RELATÓRIO

O representante do MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DA BAHIA com ofício nesta Comarca ofereceu DENÚNCIA em face de TANURE CAVALCANTE TELES, já qualificado nos autos, imputando-lhe a prática do delito capitulado no artigo 312, §1° do CPB, c/c artigo 69 do mesmo diploma.

Narra a peça acusatória que entre os meses de maio e junho de 2022, mais precisamente aos fins de semana, por 03 (três) ocasiões na Delegacia de Belmonte, situada no bairro Ponta de Areia nesta cidade, o denunciado acima qualificado subtraiu para si, em proveito próprio, bens móveis armazenados em armário localizado no cartório da unidade policial, valendo-se da facilidade que o exercício da função de “carcereiro” naquela unidade policial lhe conferia.

Assim, o Ministério Público denunciou o acusado ELMO SANTOS como incurso no artigo 312, §1° do CPB, c/c artigo 69 do mesmo diploma, no dia 06 de julho de 2022, sendo a mesma recebida no dia 25 de julho de 2022, e preso preventivamente em 09 de junho de 2022.

Foi apresentada defesa prévia no id 233855219.

Em despacho id 295358832, fora designada audiência de instrução e julgamento para o dia 18 de maio de 2023.

Em audiência de instrução criminal id 388463460, foram colhidos os depoimentos das testemunhas e por fim fora o réu interrogado.

Alegações finais pelo Ministério Público em id 392723438, onde pede pela condenação do acusado, ao justo sancionamento penal previsto no 312, §1° do CPB, c/c artigo 69 do mesmo diploma.

Pela defesa em id 395115468, onde requer a aplicação da pena base no mínimo legal, o reconhecimento da atenuante da confissão espontânea, a aplicação da causa de diminuição do arrependimento posterior, o reconhecimento do crime continuado como espécie de concurso de crimes, a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou, subsidiariamente, seja fixado o regime aberto, o direito de recorrer em liberdade.


É sucinto o relatório. Decido.


FUNDAMENTAÇÃO

Trata-se de ação penal pública incondicionada ajuizada pelo Ministério Público do Estado da Bahia, em que se busca apurar a responsabilidade criminal do réu pela prática do crime narrado na denúncia.

Registre-se, de início, que processo transcorreu normalmente, não havendo irregularidades ou nulidades a serem sanadas. Ademais, não se vislumbram quaisquer questões preliminares ou prejudiciais suscitadas pelas partes ou cognoscíveis de ofício.

Deste modo, presentes os pressupostos processuais e as condições de admissibilidade da pretensão acusatória, passo ao exame do mérito.

Para que se possa cogitar em condenação no âmbito criminal, os fatos descritos na denúncia devem necessariamente corresponder a um tipo penal previsto em lei incriminadora vigente à época da conduta imputada.

Além disso, a acusação deve comprovar, mediante provas robustas colhidas na esfera judicial, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa, os critérios de autoria e materialidade, para todos os crimes apontados na denúncia.

A materialidade restou comprovada pelas provas testemunhais colhidas, bem como pela confissão do réu.

A autoria é igualmente inconteste, recaindo de forma inarredável sobre o réu.

Vejamos.

Em sede judicial, através de videoconferência no id 388463460, a testemunha EPC CARMEM LUCIA MASCARENHS DOS SANTOS disse:

“... no começo do mês de junho de 2022 eu recebi os laudos vindos do DPT, juntamente com algumas armas... como estava atendendo ao público não pude manusear os laudos e guardei no armário de ferro que tenho no cartório, tranquei a porta do armário e deixei em “standby”, aguardando o momento que eu pudesse então manusear o laudo e etiquetar as armas, que não foi possível fazer isso nem no dia posterior, nem no final de semana, na segunda feira também atendi o público e não pude, e quando chegou na terça feira, eu abri o armário, destranquei ele com certa dificuldade, mas consegui abri-lo, quando eu abri, os laudos estavam em cima, e a arma que eu tinha colocado não estava, ela tinha sumido... todos esses dias o cartório estava trancado, eu abria com a chave, e esse armário também estava trancado, ou seja, ele conseguiu abrir a porta do cartório, abrir o armário de ferro, subtrair as armas e depois trancar tudo de novo e sair do cartório, de maneira que eu nem percebesse... na terça feira mesmo eu entrei em contato com a coordenadoria e fui lá, fiz a ocorrência e pedi uma investigação, pra descobrir quem é que teria entrado lá... ai a suspeita caiu para cima dele e do outro carcereiro, que poderia ter ficado no final de semana... quando chegou alguns dias depois o coordenador da equipe pegou ele com a dita pistola, foi pego em flagrante, e ai eu vim saber que foi ele que estava com as armas...”

Em sede judicial, através de videoconferência no id 388463460, o réu TANURE CAVALCANTE TELES disse:

“... realmente aconteceu esses fatos... foram 05 armas... a 380 estava usando comigo, por estar sofrendo diversas ameaças em Belmonte de facção criminosa, e as outras foram comercializadas... três vezes... a primeira vez eu usei um chaveiro para fazer o serviço, para abrir a primeira porta e um armário de ferro... pela segunda vez foi ele também e pela terceira vez eu já abri sozinho, pois na verdade aquela fechadura já estava gasta, com problemas...”

Pois bem. Encerrada a instrução, conclui-se que o conjunto probatório é firme e seguro em apontar que o réu, de fato, foi o autor do crime descrito na denúncia.

Restou comprovado que o réu trabalha como carcereiro, e encontrava-se lotado na “Delegacia Municipal de Belmonte”, e aproveitando-se de sua condição de servidor e das facilidades proporcionadas pelo cargo público, subtraiu as armas descritas acima, que encontravam-se armazenadas no armário da Delegacia.

Nesse sentido, observa-se a confissão espontânea e integral do réu, que confessou ter subtraído as armas em questão, em proveito próprio, valendo-se das facilidades que lhe proporciona a qualidade de funcionário.

Some-se a isso o relato da testemunha, que atestou a ocorrência do crime, de forma segura e sem contradições.

O artigo 312, §1º, do Código Penal, assim dispõe sobre o crime de peculato impróprio:

“Art. 312 - Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de que tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio: Pena - reclusão, de dois a doze anos, e multa.

§ 1º - Aplica-se a mesma pena, se o funcionário público, embora não tendo a posse do dinheiro, valor ou bem, o subtrai, ou concorre para que seja subtraído, em proveito próprio ou alheio, valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário”.

Registre-se que o pressuposto material do crime de peculato é justamente a posse da coisa pela administração pública. A lei é cristalina em exigir que tal posse deva ser em razão do cargo. Portanto, é imprescindível a relação de causa e efeito entre ela (posse) e este (cargo).

Não é, portanto, pelo simples fato de ser funcionário público que o sujeito deve automaticamente responder pelo crime de peculato. A finalidade da lei é outra.

Somente estará caracterizado o crime de peculato quando o sujeito comete a apropriação, o desvio ou a subtração em razão das facilidades proporcionadas pelo seu cargo.

O Código Penal, no seu § 1º do seu art. 312 apresenta uma modalidade de peculato que se distância da similitude com a apropriação indébita. O crime se assemelha ao furto, razão pela qual é chamado de peculato furto, ou peculato impróprio.

Trata-se de crime funcional impróprio: ausente à condição de funcionário público, desaparece o peculato, mas subsiste intacto o delito de furto (CP, art. 155).

Ademais, o tipo penal contém dois núcleos: “subtrair” e “concorrer” para a subtração.

No caso dos autos (peculato-furto) o verbo “subtrair” consiste na conduta em inverter o título de posse, ou seja, retirar algo de quem tinha a sua posse.

Ao contrário do que se verifica nas figuras do caput do art. 312 do Código Penal, o sujeito não tem a posse da coisa móvel pública ou particular, mas a sua posição de funcionário público lhe proporciona uma posição favorável para a subtração dela. Assim, o funcionário público é o executor direto da subtração.

Além disso, o art. 312, § 1º, do Código Penal contém um elemento normativo, representado pela expressão “valendo-se de facilidade que lhe proporciona a qualidade de funcionário”. A facilidade mencionada pelo texto legal é qualquer circunstância fática propicia à pratica do delito, tal como a liberdade para ingresso ou permanência na repartição ou local em que estava a coisa subtraída ou a menor vigilância dos bens no tocante aos funcionários públicos em geral.

Nesse sentido, o bem móvel não se encontra sob a posse do agente, mas sua posição funcional torna mais simples e segura a subtração.

Conclui-se que, na...

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