Camaçari - 2ª vara da fazenda pública

Data de publicação06 Maio 2022
Gazette Issue3091
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª V DE FAZENDA PUBLICA DE CAMAÇARI
SENTENÇA

8168083-24.2020.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Camaçari
Autor: Maria Do Carmo Santos Lima
Advogado: Marciana Santos Lima (OAB:BA46477)
Reu: Estado Da Bahia
Reu: Municipio De Camacari

Sentença:

COMARCA DE CAMAÇARI

2ª Vara da da Fazenda Pública de Camaçari.

Cento Administrativo de Camaçari, 5ª andar do Fórum de Camaçari, Centro Administrativo - CEP 42800-000

Fone: (71) 3621-8714

SENTENÇA


PROCESSO Nº: 8168083-24.2020.8.05.0001
AUTOR: MARIA DO CARMO SANTOS LIMA
REU: ESTADO DA BAHIA, MUNICIPIO DE CAMACARI
ASSUNTO/ CLASSE PROCESSUAL: [Fornecimento de medicamentos]

Vistos, etc.

Trata-se de ação sob o procedimento comum, inicialmente distribuída para o Plantão Judiciário Unificado de Primeiro Grau, com pedido de tutela provisória de urgência, ajuizada por MARIA DO CARMO SANTOS LIMA, qualificada nos autos, por intermédio de advogado regularmente constituído (ID 87590297), em face do ESTADO DA BAHIA e do MUNICÍPIO DE CAMAÇARI, objetivando a disponibilização do(s) medicamento(s) BORTEZOMIBE, tudo conforme dosagem prescrita em relatório médico em anexo objetivando promover sua submissão ao procedimento de quimioterapia.

2. Sustenta a parte autora, em síntese, que seria paciente oncológico (Mieloma Múltiplo, ISS 2, CID 10 C90) desde 2012, apresentando sangramento e fortes dores, tendo-lhe sido prescrito o medicamento em questão para tratamento de sua enfermidade. Relata que a enfermidade vinha em remissão e acompanhamento regular; porém, há seis meses teriam começado a aparecer alterações nos exames com o aparecimento de recidiva da doença. Apesar disso, os demandados não teriam viabilizado o referido fornecimento, necessário à amenização de seu quadro.

Juntou documentos.

3. A medida de urgência foi parcialmente deferida no ID 87619421 pela magistrada plantonista então oficiante, sendo os autos posteriormente remetidos para este Juízo, mediante redistribuição.

No ID 88751337, foi concedida à parte autora o benefício da gratuidade judiciária.

4. Citados os réus:

4.1. O ESTADO DA BAHIA apresentou contestação no ID 88893025 e juntou documentos. Nela, rechaçou a pretensão da parte autora arguindo a ausência de negativa ao fornecimento do fármaco requerido, o qual estaria incluso na lista RENAME do SUS e com disponibilidade no Hospital Santa Isabel. Aduz que a demandante não teria procurado a SESAB, tendo ciência da necessidade da autora pelo medicamento com o presente feito, fato esse desautorizaria sua condenação em honorários, por ausência de sucumbência.

O ESTADO DA BAHIA acostou aos autos nova contestação e documentos no ID 89433634.

4.2. O MUNICÍPIO DE CAMAÇARI apresentou contestação no ID 74601066 e juntou documentos. Nela, preliminarmente, arguiu sua ilegitimidade passiva, bem como a falta de interesse de agir da parte autora. No mérito, arguiu que o ESTADO DA BAHIA teria reconhecido o direito da parte autora com o fornecimento do medicamento indicado na exordial, não havendo responsabilidade de sua parte.

Réplica no ID 93146163.

5. Chamadas as partes para especificação de provas, a parte autora e o MUNICÍPIO DE CAMAÇARI informaram nos IIDD 93936906 e 95363563 que não tinham interesse na produção de outras provas; já o ESTADO DA BAHIA deixou transcorrer o prazo sem resposta conforme certidão ID 95366394.

Nos IIDD 97286223 e 122060123, a parte autora requereu a juntada de relatório médico.

No ID 105907928, sob o fundamento de que os elementos de convicção necessários ao deslinde do feito se encontram carreados aos autos, foram os pedidos de produção de prova pericial e testemunhal indeferidos.

É a síntese do necessário.

Decido.

6. Preliminarmente, como se verifica dos autos, é de se destacar que o ESTADO DA BAHIA apresentou 02 (duas) peças defensivas (IIDD 88893025 e 89433634). Ora, a apresentação de peças de defesa está sujeita à regra de preclusão consumativa (perda da faculdade ou poder processual em razão de seu exercício anterior). Sobre o tema, leio a lição de FREDIE DIDIER JR. (in Curso de Direito Processual Civil, V. 01 – Introdução ao Direito Processual Civil, Parte Geral e Processo de Conhecimento, 17ª Edição, Editora JusPodivm, Salvador, 2015. Págs.424):

A preclusão consumativa consiste na perda de faculdade/poder processual em razão dessa faculdade ou esse poder já ter sido exercido, pouco importa se bem ou mal. Já se praticou o ato processual pretendido, não sendo possível corrigi-lo, melhorá-lo ou repeti-lo. A consumação do exercício do poder o extingue.

Essa preclusão decorre da ideia de que não se deve repetir ato processual já praticado, encontrando fundamento normativo, para as partes, no art. 200 do CPC, que se refere à produção de efeitos imediatos com a prática de atos processuais pela parte, exaurindo-se o exercício do respectivo poder.

É o que ocorre, por exemplo, quando a parte oferece sua contestação ou interpõe seu recurso de apelação no quinto dia do prazo (que é de quinze dias), mas esquece de deduzir um argumento importante; como já exerceu e consumou seu direito de recorrer, não pode, nos dez dias restantes do prazo, corrigir, melhorar ou repetir a contestação/recurso.”

Assim o sendo, tendo o ESTADO DA BAHIA apresentado duas peças de bloqueio, forte no art. 200 do C.P.C., é de se considerar que a possibilidade de apresentação da menos antiga já estaria corroída pela preclusão consumativa, de modo que deve a peça mais recente (ID 89433634) ser desconsiderada. Neste sentido:

“EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA - DUAS CONTESTAÇÕES APRESENTADAS - DESCONSIDERAÇÃO DA SEGUNDA - PRECLUSÃO CONSUMATIVA - RENOVAÇÃO DAS ALEGAÇÕES NA APELAÇÃO - INOVAÇÃO RECURSAL - NÃO CONHECIMENTO PARCIAL DO RECURSO - INSTRUMENTO DE CONFISSÃO DE DÍVIDA FIRMADO POR ÊX-CÔNJUGE EM FAVOR DO OUTRO - COMPETÊNCIA DO JUÍZO CÍVEL

- Havendo duas contestações apresentadas no processo, apenas a primeira deve ser considerada, por força de preclusão consumativa, na qual esbarra a tentativa do réu de levar à apreciação da instância recursal as alegações deduzidas na segunda contestação.

- O fato de o divórcio entre as partes ter tramitado perante determinado juízo de Vara de Família não torna este competente para ação de cobrança fundada em instrumento de confissão de dívida firmado por um dos ex-cônjuges em favor do outro.” (TJMG, Apelação Cível 1.0024.14.239753-8/001, Décima Oitava Câmara Cível, relator o Desembargador Fernando Lins, “D.J.-e” de 14.3.2019 – negritos ausentes dos originais).

Assim o sendo, deixo de conhecer a peça ID 89433634.

7. Deixo de apreciar as preliminares de ilegitimidade passiva e de carência de ação por falta de interesse de agir arguidas pelo MUNICÍPIO DE CAMAÇARI tendo em vista que as questões nelas veiculadas se confundem com o mérito da demanda e, como tais, serão devidamente enfrentadas.

8. Em relação ao mérito da demanda, da análise dos autos, tenho que a medida de urgência antes concedida pelo magistrado plantonista merece ser ratificada, conformando-se a procedência do pedido formulado.

De fato, consoante documentos ID 67575301, a parte autora foi diagnosticada com mieloma múltiplo (CID C90) desde 2012, vindo em remissão e acompanhamento regular em consultório sendo que, há seis meses, cursa com aumento do componente monoclonal e dores ósseas, com piora progressiva, necessitando de fazer uso da medicação em debate. Da mesma forma, o medicamento em questão lhe foi prescrito por profissional médico. Por igual, o referido documento informa, também, que a medicação fora incorporada pelo Ministério da Saúde para tratamento da enfermidade que padece a autora; entretanto, não possuiria o código APAC para os novos casos, não podendo a demandante aguardar trâmites burocráticos em razão da progressão da doença.

8.1. Está na Constituição Federal (negritos ausentes dos originais):

“Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

(...)

III - a dignidade da pessoa humana;

(...)Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.”

8.2. A obrigação do(s) réu(s) em assegurar tratamento de saúde adequado ao autor – e, por consequência, a(s) sua(s) legitimidade(s) passiva(s) - está assentada, uma vez que, na forma da Lei n.º 8.080/90, União, Estados, municípios e Distrito Federal são solidariamente responsáveis por garantir acesso e tratamento de saúde aos cidadãos brasileiros e estrangeiros residentes. Neste sentido, trago à colação o entendimento do eg. Superior Tribunal de Justiça, como se verifica do julgado a seguir ementado:

ADMINISTRATIVO. SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE (SUS). FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA DOS ENTES FEDERATIVOS. RECURSO QUE NÃO LOGRA INFIRMAR OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO AGRAVADA.

1. Sendo o Sistema Único de Saúde (SUS) composto pela União, Estados-Membros, Distrito Federal e Municípios, impõe-se o reconhecimento da responsabilidade solidária dos aludidos entes federativos, de modo que qualquer um deles tem legitimidade para figurar no pólo passivo das...

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