Camaçari - 2ª vara da fazenda pública

Data de publicação14 Janeiro 2020
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição2539
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª V DE FAZENDA PUBLICA DE CAMAÇARI
DECISÃO

8020875-53.2019.8.05.0039 Petição Cível
Jurisdição: Camaçari
Requerente: Claudomiro Gomes Do Nascimento
Advogado: Roberto Fernandes Guimaraes (OAB:0154427/SP)
Requerido: Estado De Sao Paulo
Requerido: Pdt Pharma Industria E Comercio De Produtos Farmaceuticos Ltda - Epp

Decisão:

COMARCA DE CAMAÇARI

2ª Vara da da Fazenda Pública de Camaçari.

Cento Administrativo de Camaçari, 5ª andar do Fórum de Camaçari, Centro Administrativo - CEP 42800-000

Fone: (71) 3621-8714

DECISÃO


PROCESSO Nº: 8020875-53.2019.8.05.0039
AUTOR: CLAUDOMIRO GOMES DO NASCIMENTO
RÉU: ESTADO DE SAO PAULO, PDT PHARMA INDUSTRIA E COMERCIO DE PRODUTOS FARMACEUTICOS LTDA - EPP
ASSUNTO/ CLASSE PROCESSUAL: [ASSISTÊNCIA SOCIAL]

Vistos.


Trata-se de ação, sob o rito comum com pedido de tutela provisória de caráter antecedente, ajuizada por CLAUDOMIRO GOMES DO NASCIMENTO, qualificado nos autos, por intermédio de advogado regularmente constituído (ID 37990117), em face da PDT Pharma Indústria e Comercio de Produtos Farmaceuticos Ltda - EPP e da FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO – FESP, objetivando sejam os réus compelidos a fornecer, onerosamente, o medicamento denominado “fosfoetanolamina sintética", também conhecido como pílula do câncer, para tratamento de tumor em si diagnosticado.


Juntou documentos.


Autos conclusos em 09.01.2020.


2. Concedo à parte autora os benefícios da gratuidade judiciária, na forma dos arts. 98 e seguintes do Código de Processo Civil.


3. Da análise dos autos, verifico a existência de questão preliminar de natureza constitucional presente no caso dos autos.


À luz das regras constitucionais acerca da formação e alcance da federação brasileira (art. 1º, caput) e respectiva autonomia dos entes federados, falece este Juízo (e, na verdade, ao Tribunal de Justiça do Estado da Bahia) competência para processar e julgar o presente feito. Isto porque, em um de seus pólos (no caso o passivo) figura pessoa jurídica de direito público interno diverso de seu âmbito de jurisdição (a saber: a FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO – FESP).


Isto pois, conforme interpretação sistemática dos arts. 18, 25, § 1º, e 125 da Constituição, a atuação das justiças estaduais limita-se ao território da respectiva unidade federativa (Estado ou Distrito Federal). De fato, submeter um estado federado ou município à Justiça de outra unidade ou do Distrito Federal implica nítida afronta à autonomia política do ente público e o fato do judiciário ser uno e nacional não afasta a distribuição de competência definida pela Constituição. Assim, se mostra irrazoável e atentatório ao espírito da autonomia federativa submeter um ente político às decisões de um Tribunal alheio à sua esfera normativa (sendo certo que, na forma do art. 125 da C.F., a organização de suas respectivas Justiças são um direitos dos entes federados e uma manifestação indispensável de sua autonomia).


É certo que o art. 52, parágrafo único, do Código de Processo Civil estabelece que “Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado.”. Entretanto, porque a definição de competência de jurisdição constitui matéria reservada à Constituição Federal, não está o legislador ordinário autorizado a subverter o delineamento constitucional da jurisdição, fundado no pacto federativo.


Nestes termos, como possibilidade única de preservar sua conformidade constitucional e, consequentemente, sua eficácia, o art. 52, parágrafo único, do Código de Processo Civil deve se sujeitar a interpretação restritiva, de modo a alcançar apenas ações intentadas por demandantes que tenham domicílio na própria Unidade Federativa acionada.


Neste sentido:


“DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO PROCESSUAL CIVIL. INCOMPETÊNCIA DOS JUIZADOS DA FAZENDA PÚBLICA. RÉU UNIDADE FEDERATIVA DIVERSA.

1 - Na forma do art. 46 da Lei 9.099/1995, a ementa serve de acórdão. Recurso próprio, regular e tempestivo.

2 - Preliminar. Efeito translativo dos recurso. Preliminar de incompetência suscitado na contestação. Ação proposta em face de outra Unidade Federativa. A permissão para o autor da demanda em face de Estado ou do DF ajuizar a ação no seu domicílio, nos termos do art. 52 Parágrafo único, CPC/2015, deve ser interpretada restritivamente, de modo a abarcar apenas as ações intentadas pelos demandantes que tenham domicílio no âmbito da própria Unidade Federativa demandada, sob pena de afronta à autonomia política do ente público, submetendo-o à Justiça de outro Estado-membro ou Distrito Federal. A competência jurisdicional residual reservada aos Estados e ao Distrito Federal é corolário da autonomia dos entes políticos, cujo exercício deve ser exclusivo em face uns dos outros, não sendo razoável submeter outro ente político às decisões tomadas por Tribunal alheio à sua esfera normativa. As normas processuais que tratam de competência devem se harmonizar com as normas de organização judiciária dos Estados e do Distrito Federal, que não só estabelecem a estrutura do Poder Judiciário de cada ente político, como fixa o âmbito de competência de sua atuação. Nesse quadro, consoante o que estabelece o art. 26 da Lei 11.697/2008 (Lei de Organização Judiciária do DF), o art. 2º c/c art. 5º, inciso II da Lei 12.153/2009, e o art. 1º da Resolução 7 do TDFT, de 5 de Abril de 2010, que dispõe sobre a criação dos Juizados Especiais da Fazenda Pública da Justiça do DF, os Juizados Especiais da Fazenda Pública do Distrito Federal são incompetentes para processar e julgar a demanda proposta em face do Estado do Rio Grande do Sul. Preliminar de incompetência dos Juizados Especiais da Fazenda Pública pronunciada de ofício. Processo extinto sem apreciação do mérito, na forma do art. 51, inciso I, da Lei n. 9.099/1995.

3 - Recurso conhecido. Incompetência dos Juizados da Fazenda Pública pronunciada de ofício.” (TJDFT, Recurso Inominado 07488312820178070016, Primeira Turma Recursal dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais do DF, relator o Juiz Ainston Henrique de Sousa, “D.J.-e” de 21.01.2019 – negritos ausentes dos originais).


É fato que a questão está entregue à apreciação do Supremo Tribunal Federal, no bojo da ADI 5492, estando, ainda, pendente de solução definitiva (e sem qualquer pronunciamento cautelar, em face da adoção do rito previsto no art. 12 da Lei n.º 9.868/99). Entretanto, já conta a mesma com pronunciamento da Procuradoria-Geral da República, da lavra do então Procurador-geral, Rodrigo Janot, também no sentido da necessidade de se conferir interpretação conforme ao já referido art. 52, parágrafo único, do C.P.C. Senão, confira-se:


“2.2. ARTS. 52, PARÁGRAFO ÚNICO, E 46, § 5º

Os arts. 52, parágrafo único, e 46, § 5 o , versam sobre definição de competência em causas que envolvam a Fazenda Pública:

Art. 46. A ação fundada em direito pessoal ou em direito real sobre bens móveis será proposta, em regra, no foro de domicílio do réu. […]

§ 5o A execução fiscal será proposta no foro de domicílio do réu, no de sua residência ou no do lugar onde for encontrado.

Art. 52. É competente o foro de domicílio do réu para as causas em que seja autor Estado ou o Distrito Federal.

Parágrafo único. Se Estado ou o Distrito Federal for o demandado, a ação poderá ser proposta no foro de domicílio do autor, no de ocorrência do ato ou fato que originou a demanda, no de situação da coisa ou na capital do respectivo ente federado. […]

O Governador do Estado do Rio de Janeiro alega que os dispositivos ofendem a garantia do contraditório participativo, porquanto prejudicam a defesa dos entes públicos. Afirma que as procuradorias estaduais não possuem estrutura nacional, como a Advocacia-Geral da União. Aduz que os dispositivos afrontam o poder de auto-organização dos Estados para disciplinar a Justiça estadual, provocarão empecilhos à gestão de precatórios e serão aplicados de maneira abusiva.

O art. 46, § 5 o , ao estipular que a execução fiscal será proposta no foro do domicílio do réu, admite interpretação no sentido de que um estado pode promover execução fiscal em outro estado da Federação. A redação do art. 52, parágrafo único, permite interpretação no sentido de que estados e Distrito Federal podem ser demandados em outro ente federado.

Essas interpretações não se coadunam com a Constituição da República.

Os dispositivos foram inspirados no art. 109,§§ 1 o e 2o , da Constituição da República, que versam sobre a competência da Justiça Federal:

Art. 109. […] § 1o As causas em que a União for autora serão aforadas na seção judiciária onde tiver domicílio a outra parte. § 2o As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.

Por outro lado, a Justiça Estadual é objeto de disciplina nos arts. 125 e 126 da Constituição da República. O art. 125, caput, atribui aos Estados competência para organização de sua justiça, de acordo com os princípios estabelecidos na ordem constitucional, e o § 1 o determina que “a competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça”.

O fato de o Judiciário ser uno e nacional não afasta a distribuição de competência estabelecida na Constituição da República. Nas palavras de JOSÉ AFONSO DA SILVA, a tese adotada pela ordem constitucional é da jurisdição nacional e...

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