Capital - 1ª vara do sistema dos juizados especiais da fazenda pública

Data de publicação04 Março 2022
Número da edição3050
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA
SENTENÇA

8026089-08.2020.8.05.0001 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Livia Barros Rodrigues
Advogado: Jadyr De Oliveira Barros (OAB:BA2812)
Reu: Municipio De Salvador

Sentença:

Vistos.

Trata-se de AÇÃO JUDICIAL em que figuram as partes acima nominadas e devidamente qualificadas nos autos.

Em síntese, a Autora relata que é proprietária de imóvel localizados na cidade de Salvador, motivo pelo qual são contribuintes do Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU e da Taxa de Coleta, Remoção e Destinação de Resíduos Sólidos Domiciliares – TRSD.

Informa que o artigo 4º da Lei 8.473/2013 estabeleceu diferentes limites anuais de aumento do IPTU/TRSD, denominado sistema de “travas”, para os contribuintes proprietários de imóveis de mesmo valor venal, mas com uso e/ou área distinta, os quais seriam executados a partir do exercício de 2014.

Afirma que foi surpreendida com o aumento exorbitante dos valores do IPTU/TRSD do exercício de 2020, em percentual aproximadamente 200%, equivalente a uma majoração de quase 3 vezes o valor cobrado no ano anterior, além de muito superior ao limite de 1,35%.

Requere, assim, a decretação da nulidade da Notificação Fiscal de Lançamento referente aos imóveis de inscrição imobiliária nº 642.587-9, nº 642.751-0, nº 642.305-1 e nº 642.301-9.

Subsidiariamente, pede que não seja submetida à cobrança abusiva dos créditos tributários de IPTU/TRSD do exercício de 2020 e seguintes, relativo ao imóvel de Inscrição Imobiliária nº 642.721-9.

Sucessivamente, pleiteia a restituição dos valores do IPTU/TRSD pagos a maior.

Citado, o Município de Salvador apresentou contestação.

Audiência de conciliação dispensada.

Voltaram os autos conclusos.

É o breve relatório. Decido.

Trata a controvérsia acerca da existência de vício na legislação que impôs aos contribuintes o pagamento de valores relativos ao Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana – IPTU, de acordo com os novos critérios estabelecidos pelas Leis Municipais nº 8.421/2013, nº 8.464/2013, nº 8.473/2013 e nº 8.474/2014.

Como é sabido, o ordenamento jurídico pátrio estabelece a competência tributária dos Municípios para instituir o IPTU, destinado a tributar a propriedade predial e territorial urbana, conforme a dicção do inciso I do art. 156 da Constituição Federal de 1988:

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

I - propriedade predial e territorial urbana;

[…]

Neste passo, o diploma constitucional atribuiu à lei complementar a definição das normas gerais de direito tributário, dentre elas, a determinação dos fatos geradores dos impostos previstos em seu texto, conforme se infere do art. 146, inciso III, alínea “a”, da Constituição Federal de 1988, que dispõe:

Art. 146. Cabe à lei complementar:

[…]

III - estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre:

a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

[…]

Assim, o Código Tributário Nacional, em seu art. 32, estabelece que o IPTU é devido quando houver a propriedade, domínio útil ou a posse de bem imóvel, nos seguintes termos:

Art. 32. O imposto, de competência dos Municípios, sobre a propriedade predial e territorial urbana tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

No mesmo sentido, a Lei Municipal nº 7.186/2006 – Código Tributário e de Rendas do Município do Salvador – prevê o fato gerador do IPTU, informando no seu art. 60 as suas hipóteses de ocorrência:

Art. 60. O Imposto sobre a Propriedade Predial e Territorial Urbana IPTU tem como fato gerador a propriedade, o domínio útil ou a posse de bem imóvel, por natureza ou por acessão física, como definido na lei civil, localizado na zona urbana do Município.

Neste rumo, o Tribunal Pleno da Egrégia Corte de Justiça do Estado da Bahia julgou, parcialmente, procedentes os pedidos formulados nas ADIs nº 0002526-37.2014.8.05.0000 e 0002398-17.2014.8.05.0000, das quais, em sede de controle de constitucionalidade das Leis Municipais nº 8.464/2013 e nº 8.474/2013, constou a emenda:

AÇÕES DIRETAS DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEIS N. 8.464/2013 E N. 8.473/2013 DO MUNICÍPIO DO SALVADOR. NOVA METODOLOGIA DE CÁLCULO DO IMPOSTO SOBRE A PROPRIEDADE PREDIAL E TERRITORIAL URBANA – IPTU. ALEGAÇÃO DE VÍCIOS FORMAIS E MATERIAIS. REVOGAÇÃO DE DISPOSITIVOS APÓS O INÍCIO DO JULGAMENTO. PERDA DO OBJETO NÃO VERIFICADA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO AO ART. 64 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DA BAHIA. NÃO IDENTIFICADA INCONSTITUCIONALIDADE NA ANÁLISE ABSTRATA DA PLANTA GENÉRICA DE VALORES. NÃO DETECTADA CONTRARIEDADE AOS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DA LEGALIDADE, DA ANTERIORIDADE NONAGESIMAL E DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA. IMPOSSIBILIDADE DE EXTENSÃO DE BENEFÍCIO FISCAL PELO JUDICIÁRIO. INVIABILIDADE DE MODIFICAÇÃO DAS TRAVAS LEGAIS. INCONSTITUCIONALIDADE PARCIAL DO ART. 1º DA LEI N. 8.464/2013 EXCLUSIVAMENTE NO QUE CONCERNE ÀS ALÍQUOTAS DE 4% E DE 5% PREVISTAS NA "TABELA PROGRESSIVA – TERRENOS". VEDAÇÃO AO CONFISCO. ART. 149 DA CONSTITUIÇÃO DO ESTADO DA BAHIA. ART. 150, INCISO IV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. TRIBUNAL COMPOSTO POR SESSENTA DESEMBARGADORES. QUORUM CONSTITUÍDO POR QUARENTA E OITO DESEMBARGADORES. DOZE VOTOS PELA PROCEDÊNCIA PARCIAL NOS TERMOS DO VOTO DO RELATOR. VINTE E TRÊS VOTOS PELA PROCEDÊNCIA PARCIAL NOS TERMOS DO VOTO DO REDATOR DO ACÓRDÃO. TREZE VOTOS PELA IMPROCEDÊNCIA DAS AÇÕES. ART. 97 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ART. 23 DA LEI N. 9.868/1999. CONSENSO DA MAIORIA ABSOLUTA NÃO ALCANÇADO.

1. A entrada em vigor das Leis Municipais n. 9.279/2017 e n. 9.306/2017 quando já iniciado o julgamento das ações diretas de inconstitucionalidade não afeta o seu juízo de admissibilidade, impondo-se o prosseguimento da análise do mérito das ações. Precedentes do STF.

2. Não é possível exigir-se a participação popular para a edição de qualquer lei municipal, sob pena de restar inviabilizada a atividade legislativa. Assim resta ausente, portanto, a apontada violação ao art. 64 da Constituição do Estado da Bahia in casu, inexistindo nos autos qualquer elemento apto a demonstrar afronta ao devido processo legal legislativo.

3. A análise abstrata da nova Planta Genérica de Valores não revela vício de inconstitucionalidade. No caso sob apreciação, a municipalidade atuou de maneira adequada, buscando a alteração da base de cálculo e, por conseguinte, a majoração do tributo por meio da edição de lei, em estrita observância da previsão constitucional. Desse modo, não se constata exorbitância entre a majoração do imposto, em virtude das alterações legais impugnadas, e o poder aquisitivo dos contribuintes.

4. As travas previstas no art. 4º da Lei n. 8.473/2013 constituem benefício fiscal, sendo vedado ao Judiciário proceder à sua extensão. Precedentes do STF e do STJ.

5. No caso concreto, todos os elementos necessários à definição da obrigação tributária estavam devidamente previstos em lei, em sentido formal; nada era delegado ao Poder Executivo. O CTN estabelece o fato gerador, o sujeito passivo e base de cálculo; as leis municipais impugnadas cuidam de definir o valor venal (que é a base de cálculo do tributo, conforme o CTN), as alíquotas e sua progressividade.

6. De fato, a propriedade urbana deve atender à sua função social e o IPTU é constitucionalmente reconhecido como importante instrumento para este fim, permitindo-se a sua progressividade com este propósito. Não se olvida que, nesse sentido, as alíquotas incidentes sobre imóveis não edificados devem ser superiores às dos demais, entretanto, não se pode permitir a extrapolação do limite definido pelos princípios constitucionais da proporcionalidade, da razoabilidade e da vedação ao confisco, sob pena de inconstitucionalidade. A análise comparativa da lei soteropolitana e dos diplomas municipais das demais capitais brasileiras evidencia flagrante distorção a exigir a atuação do Judiciário.

7. Nessa conjuntura, impõe-se o reconhecimento da inconstitucionalidade das alíquotas de 4% e 5% revistas na Tabela Progressiva – Terrenos do Anexo Único da Lei n. 8.464/2013, indicada no art. 1º do referido diploma, por violação ao art. 149 da Constituição do Estado da Bahia e aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade, assim como da vedação ao confisco, previsto no art. 150, inciso IV, da Constituição Federal, justificando-se, no exercício de 2014, o cálculo do IPTU relativo aos imóveis não edificados enquadrados na quarta e na quinta faixas de valores mediante a incidência do percentual de 3% sobre o valor venal.

8. Ações conhecidas à unanimidade de votos. No mérito, computados doze votos pela procedência parcial nos termos do voto do relator originário, vinte e três votos pela procedência parcial nos termos do voto do redator do acórdão e treze pela improcedência das ações, não foi atingido o quórum exigido pelo art. 97 da Constituição...

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