Capital - 1ª vara do sistema dos juizados especiais da fazenda pública

Data de publicação29 Julho 2022
Número da edição3147
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
1ª V DO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA
SENTENÇA

8025515-48.2021.8.05.0001 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Requerente: Anderson Souza Da Silva
Advogado: Marcio Jose Magalhaes Costa (OAB:BA43156)
Reu: Estado Da Bahia

Sentença:


Vistos.

Trata-se de AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS

MATERIAIS MORAIS COM PEDIDO LIMINAR em que figuram as partes acima nominadas e devidamente qualificadas nos autos.

Em síntese, a parte autora, policial militar, afirma que, em decorrência de sua vinculação ao Regime Próprio de Previdência Oficial (RPPS), o Estado da Bahia tem adotado expediente ilícito ao promover a incidência da Contribuição Previdenciária Oficial (FUNPREV) sobre o valor referente a verbas não incorporáveis aos proventos de aposentadoria.

Sendo assim, busca a tutela jurisdicional para que seja declarada a inexistência da relação jurídico tributária quanto à incidência da contribuição previdenciária sobre as verbas remuneratórias e indenizatórias não incorporáveis à aposentadoria, como o adicional noturno, as horas extraordinárias, o auxílio-alimentação, um terço de férias e verbas indenizatórias.

Sucessivamente, pede a devolução dos valores pagos a título de contribuição previdenciária sobre as referidas verbas, respeitada a prescrição quinquenal.

Citado, o réu apresentou contestação.

Audiência de conciliação dispensada.

Voltaram os autos conclusos.

É o breve relatório. Decido.

DA PRELIMINAR

Deixo de analisar a questão preliminar de impugnação a gratuidade de justiça haja vista que o acesso ao Juizado Especial, em primeiro grau de jurisdição, independe do pagamento de custas, taxas ou despesas, nos termos do Art. 54 da Lei 9099/95.

DO MÉRITO

Cinge-se o objeto litigioso à análise da suposta indevida incidência da contribuição previdenciária sobre parcelas não incorporáveis aos proventos de inatividade.

A princípio, faz-se necessário registrar que, após nova reflexão sobre o tema, chega-se a entendimento diverso daquele até então alcançado, notadamente, diante do necessário prestígio à segurança jurídica, tendo em vista o atual posicionamento do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria.

Como é cediço, o ordenamento jurídico pátrio estabelece que a Administração Pública encontra-se afeta, entre outros, ao princípio da legalidade, que representa a obrigação da Administração de agir de acordo com os ditames legais, previsto nos artigos 37 da Constituição Federal e 3º da Lei Estadual 12.209/2011, a saber:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

[…]

Art. 3º - A Administração Pública obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, celeridade, razoabilidade, proporcionalidade, motivação, devido processo legal e ampla defesa, segurança jurídica, oficialidade, verdade material, gratuidade e, quando cabível, da instrumentalidade das formas.

Neste sentido, convém ressaltar a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello ao discorrer sobre o princípio da legalidade, in verbis:

É, em suma: a consagração da ideia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.

[…]

Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as tendências (inclusive minoritárias) do corpo social –, garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral[1].

Neste eito, relativamente ao servidor policial militar, faz-se necessário destacar que a Lei Estadual nº 11.357/2009, em seu art. 71, destacou as parcelas pecuniárias que não são objeto da contribuição previdenciária. Transcreve-se esses enunciados normativos:

Art. 71 - Não integram a base de cálculo das contribuições dos segurados e do Estado, para os efeitos desta Lei:

I - ajuda de custo;

II - diárias;

III - indenização de transporte;

IV - auxílio-moradia;

V - auxílio-transporte;

VI - auxílio-alimentação;

VII – (revogado);

VIII - adicional de férias;

IX - abono de permanência;

X - salário-família;

XI - outras parcelas de natureza indenizatória previstas em lei.

Desta forma, afigura-se a impossibilidade de incidência da contribuição sobre o auxílio-alimentação, o adicional de férias e demais verbas de natureza indenizatória, por exemplo.

Outrossim, também devem ser excluídas da incidência de contribuição previdenciária as parcelas remuneratórias que não são incorporáveis aos proventos de aposentadoria.

A Constituição Federal dispõe em seu art. 40, §§3º e 12, bem como, em seu art. 201, §11:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo.

[…]

§ 3º Para o cálculo dos proventos de aposentadoria, por ocasião da sua concessão, serão consideradas as remunerações utilizadas como base para as contribuições do servidor aos regimes de previdência de que tratam este artigo e o art. 201, na forma da lei.

[…]

§ 12 - Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.

Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:

[…]

§ 11. Os ganhos habituais do empregado, a qualquer título, serão incorporados ao salário para efeito de contribuição previdenciária e conseqüente repercussão em benefícios, nos casos e na forma da lei.

Depreende-se, portanto, de tais dispositivos, que somente devem figurar como base de cálculo da contribuição previdenciária as remunerações/ganhos habituais que tenham “repercussão em benefícios”.

Desse modo, estão excluídas as verbas que não se incorporam à aposentadoria do servidor, como é o caso do adicional por prestação de serviço extraordinário e adicional noturno.

Como se sabe, o adicional por prestação de serviço extraordinário consiste em acréscimo remuneratório de 50% sobre o valor da hora normal de trabalho, na forma do art. 108 da Lei Estadual nº 7.990/2001, inspirado no teor do art. 7º, inciso XVI, da Constituição Federal, aplicável aos servidores públicos por força do art. 39, §3º, da CF/1988.

Segundo se infere de tais enunciados normativos, o seu caráter remuneratório é flagrante:

Art. 108 - O serviço extraordinário será remunerado com acréscimo de 50% (cinqüenta por cento) em relação à hora normal de trabalho, incidindo sobre o soldo e a gratificação de atividade policial ou outra que a substitua, na forma disciplinada em regulamento.

Parágrafo único - Somente será permitida a realização de serviço extraordinário para atender situações excepcionais e temporárias, respeitado o limite máximo de duas horas diárias, podendo ser elevado este limite nas atividades que não comportem interrupção.

Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

[…]

XVI - remuneração do serviço extraordinário superior, no mínimo, em cinqüenta por cento à do normal;

[…]

Por seu turno, consoante os termos da Lei Estadual nº 7.990/2001, o policial militar faz jus, de acordo com as condições e limitações legais e regulamentares, ao adicional noturno, o qual objetiva remunerar o serviço prestado entre 22 horas de um dia e cinco horas do dia seguinte, conforme o art. 109 Estatuto dos Policiais Militares, que dispõe:

Art. 109 - O serviço noturno, prestado em horário compreendido entre vinte e duas horas de um dia e cinco do dia seguinte, terá o valor-hora acrescido de cinqüenta por cento sobre o soldo na forma da regulamentação correspondente.

Parágrafo único - Tratando-se de serviço extraordinário, o acréscimo a que se refere este artigo incidirá sobre a remuneração prevista no artigo anterior.

Como se sabe, o adicional por prestação de serviço extraordinário e o adicional noturno consistem em vantagens pecuniárias de caráter propter laborem, vale dizer, benefícios remuneratórios cujo recebimento está atrelado ao exercício efetivo de determinada atividade em condições específicas.

Assim, a percepção destas gratificações possui caráter transitório e restrito ao período em que existentes os motivos que justificam a sua percepção. Logo, em regra, não se incorporam aos proventos de inatividade do servidor público, salvo por liberalidade do legislador.

Neste passo,...

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