Capital - 15ª vara de relações de consumo

Data de publicação13 Novembro 2020
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição2738
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
15ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8053292-76.2019.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Luiz Carlos Dos Santos Da Silva
Advogado: Catucha Oliveira Pacheco (OAB:0025215/BA)
Réu: Banco Pan S.a
Advogado: Roberta Beatriz Do Nascimento (OAB:0046617/BA)

Sentença:

Vistos, etc.

LUIZ CARLOS DOS SANTOS DA SILVA, devidamente qualificado nos autos, por conduto de advogado legalmente constituído, intentou a presente AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO, com pedido de tutela de urgência, em face de BANCO PAN S/A, também qualificado nos autos, aduzindo, para o acolhimento do pedido, os fatos e fundamentos jurídicos articulados no ID n° 36594550.

Alega a parte autora que o contrato firmado entre as partes possui cláusulas abusivas referentes à taxa de juros remuneratórios; à comissão de permanência; à taxa de abertura de crédito; e às tarifas bancárias e serviços de terceiros, pelo que requer a revisão das referidas cláusulas contratuais, o afastamento da mora contratual e a repetição do indébito.

Como tutela de urgência, requer a manutenção da posse do bem, com autorização de depósito judicial das parcelas no valor incontroverso, bem assim a retirada ou abstenção de inclusão de seu nome em órgãos restritivos de crédito, além de determinação para que a acionada proceda à exibição do contrato.

Coligiu aos autos procuração (ID n° 36594609) e documentos.

Proferida decisão concessiva da gratuidade da justiça à parte autora e invertendo-se o ônus da prova, ID n° 36598265, oportunidade em que o Juízo reservou-se a apreciar a tutela de urgência após a formação do contraditório.

Devidamente citada (ID n° 37555760), a parte acionada apresentou contestação ID n° 40638400, acompanhada dos documentos, suscitando, preliminarmente, a inépcia da inicial e impugnando a gratuidade da justiça. No mérito, aduz, em síntese, a legalidade das cláusulas pactuadas e pugna pela improcedência do pedido.

Decisão, ID n° 58399493, intimando as partes para se manifestarem sobre o interesse de realizar audiência de conciliação por meio virtual; e na hipótese de expressa concordância de todos os litigantes sobre a ausência de interesse na realização da audiência por videoconferência (art. 334, §4º, inciso I, do CPC), intimar a requerente para apresentar réplica.

Petição da parte ré, ID n° 59144333, informando não possuir interesse na realização da audiência por videoconferência.

Petição da parte autora, ID n° 60551586, informando não possuir interesse na realização da audiência por videoconferência.

Réplica ID n° 63729777, refutando as razões de defesa da ré de forma conjunta e reiterando os pedidos constantes da inicial.

Anunciado o julgamento antecipado da lide (ID n° 64514006), sem insurgência das partes, foram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório. Decido.

Procederei, nos termos do art. 355, I, do CPC, ao julgamento antecipado da lide, observada a existência de material probatório suficiente para o exame do mérito da causa.

Antes de analisar a questão de mérito, passo à apreciação das preliminares arguídas pelo acionado. Senão, vejamos:


DA PRELIMINAR DE INÉPCIA EM RAZÃO DE NÃO CUMPRIMENTO DO ART. 330, § 2º, DO CPC.

Merece rejeição a preliminar de inépcia em razão do não cumprimento do art. 330, § 2º, do CPC, uma vez que a parte autora informa na inicial as obrigações controvertidas e os valores incontroversos, tanto que junta planilha de cálculos, com as referidas informações, ID n° 36594788. Assim, rejeito a presente preliminar.

DA PRELIMINAR DE IMPUGNAÇÃO À GRATUIDADE DA JUSTIÇA.

Oferta o acionado, como preliminar de contestação, impugnação à gratuidade da justiça concedida à parte autora, sustentando que não houve comprovação da condição de miserabilidade da parte acionante, que revelou ter plena condição de arcar com as custas processuais devidas. Pede, assim, a revogação do benefício.

O acionado/impugnante, porém, não tem razão quando sustenta as condições financeiras da parte autora para arcar com as custas do processo, pois não apresentou qualquer prova de suas alegações.

Ademais, constata-se que a parte autora, qualificado como motorista e residente em bairro popular da cidade, adquiriu através de financiamento, um veículo popular, para pagamento em prestações, o que nos faz crer que não ostenta aparentemente condição econômica para suportar as custas do processo.

Por outro lado, não houve provas para fundamentar as alegações do impugnante e por isso resta demonstrada a existência dos requisitos necessários e essenciais à concessão da gratuidade impugnada.

Pelo exposto, rejeito a preliminar de impugnação à justiça gratuita.


Ultrapassadas as preliminares suscitadas, passo ao exame do meritum causae.

DO MÉRITO:

Pretende a parte autora a revisão de contrato de financiamento para aquisição de veículo firmado com a parte acionada, sustentando a abusividade de cláusulas contratuais.

O Código de Defesa do Consumidor é aplicável aos negócios jurídicos firmados entre as instituições financeiras e os usuários de seus produtos e serviços, por força do art. 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor.

CDC - Art. 3° - Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.

(....)

§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.

Tal entendimento foi consolidado na Súmula 297 do STJ: “O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras".

Assim, impõe-se o reconhecimento de que sempre é possível a revisão de cláusulas ilegais e/ou abusivas em contratos bancários, nos termos do art. 166, do Código Civil, e do art. 51, IV, do Código de Defesa do Consumidor.

CC - Art. 166. É nulo o negócio jurídico quando:

I - celebrado por pessoa absolutamente incapaz;

II - for ilícito, impossível ou indeterminável o seu objeto;

III - o motivo determinante, comum a ambas as partes, for ilícito;

IV - não revestir a forma prescrita em lei;

V - for preterida alguma solenidade que a lei considere essencial para a sua validade;

VI - tiver por objetivo fraudar lei imperativa;

VII - a lei taxativamente o declarar nulo, ou proibir-lhe a prática, sem cominar sanção.

CDC – Art. 51 - São nulas de pleno direito, entre outras, as cláusulas contratuais relativas ao fornecimento de produtos e serviços que:

(...)

IV - estabeleçam obrigações consideradas iníquas, abusivas, que coloquem o consumidor em desvantagem exagerada, ou sejam incompatíveis com a boa-fé ou a eqüidade;

O cerne da questão repousa sobre o exame da suposta violação das normas do Código de Defesa do Consumidor, precipuamente a caracterização da excessiva onerosidade dos encargos impostos unilateralmente pela instituição financeira, em relação: à taxa de juros remuneratórios; à comissão de permanência; à taxa de abertura de crédito; e às tarifas bancárias e serviços de terceiros, pelo que requer a revisão das referidas cláusulas contratuais, o afastamento da mora contratual, e a repetição do indébito, conforme pedidos constantes do rol de pedido da inicial, que delimitam a matéria a ser julgada.

O exame da demanda à luz dos princípios e dispositivos do CDC, aplicável às instituições financeiras (súmula 297, do STJ), o caráter público e de interesse social das normas de proteção ao consumidor, estabelecido no art.1º, e a relativização do princípio do pacta sunt servanda, possibilitam a intervenção do Judiciário nos contratos, para deles excluir as cláusulas abusivas e contrárias ao princípio da boa-fé, afastando aquelas que imponham excessiva onerosidade ou exagerada vantagem ao credor, restabelecendo, em última análise, o equilíbrio contratual e financeiro do negócio jurídico.

Deduz-se, da análise da petição inicial e documentos, e pela aplicação das regras ordinárias de experiência, que fora firmado, entre as partes, contrato de financiamento, para aquisição do veículo descrito na inicial, em NOVEMBRO DE 2017, conforme contrato de ID n° 40638437.

DA TAXA DE JUROS REMUNERATÓRIOS.

O STF, através de entendimento sumulado (Súmula 596), afastou a incidência da Lei de Usura às operações realizadas pelo Sistema Financeiro Nacional, in verbis: "As disposições do Decreto 22.626 de 1933 não se aplicam às taxas de juros e aos outros encargos cobrados nas operações realizadas por instituições públicas ou privadas, que integram o sistema financeiro nacional".

A discussão acerca da limitação da taxa de juros remuneratórios ao percentual de 12% a.a, por seu turno, foi afastada com a edição da Súmula vinculante n.07, do STF, nos seguintes termos: "A norma do §3º do artigo 192 da constituição, revogada pela emenda constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei...

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