Capital - 16ª vara de relações de consumo

Data de publicação27 Abril 2022
Gazette Issue3084
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
16ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8122144-84.2021.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Roberto Dos Santos Rodrigues
Advogado: Leonardo Rodrigues Pimentel (OAB:BA27067)
Advogado: Antonio Leonardo Souza Rosa (OAB:BA28166)
Reu: Banco Bmg Sa
Advogado: Fernando Moreira Drummond Teixeira (OAB:MG108112)
Advogado: Flavia Almeida Moura Di Latella (OAB:MG109730)

Sentença:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA
Comarca de Salvador
16ª Vara de Relações de Consumo

Rua do Tingui, s/n, Campo da Pólvora, Fórum Prof. Orlando Gomes - 3º andar, Nazaré - CEP 40040-380, Fone: 33206980, Salvador-BA

E-mail: salvador16vrconsumo@tjba.jus.br



Processo nº: 8122144-84.2021.8.05.0001

Classe - Assunto: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) - [Defeito, nulidade ou anulação, Indenização por Dano Moral, Indenização por Dano Material]

AUTOR: ROBERTO DOS SANTOS RODRIGUES

REU: BANCO BMG SA



SENTENÇA



Vistos, etc.

Trata-se de ação anulatória de contrato de cartão de crédito com reserva de margem consignável, cumulada com pedido de indenização por dano moral e tutela antecipada, ajuizada por Roberto dos Santos Rodrigues, em face de Banco BMG S.A., alegando que é beneficiário da previdência social e foi surpreendido com desconto no valor de R$ 113,95 que, mesmo após anos, não foram interrompidos.

Aduz que nunca teve a intenção de realizar contrato de reserva de margem consignável (RMC) no cartão de crédito com o Acionado, tendo acreditado que havia realizado um empréstimo consignado tradicional.

Salienta que, o que se discute na presente demanda não é a veracidade do contrato, cujo desconto foi iniciado em 17/02/2017, mas sim a existência de vício de consentimento em razão do dolo e, por isso, a contratação seria fraudulenta.

Diante do exposto, a Autora requer a concessão de medida antecipatória de tutela, a fim de compelir o Acionado para que ocorra suspensão imediata dos descontos mensais do valor de R$ 113,95, sob pena de multa diária, no mérito, além da confirmação desta medida, requerer a restituição em dobro de todos os valores que somam o montante de R$ 6.267,25, inclusive as vencidas/debitadas no curso do processo e de indenização a título de dano moral, no valor de R$20.000,00.

Carreou documentos – Id 152410957, 152410959, 152410960, 152410962, 152410963 e 152410964.

Devidamente citada a Acionada apresentou Contestação (Id 160443430), impugnando o benefício da gratuidade de justiça. Veiculou, a seguir, prejudicial de decadência e defendeu a modalidade contratada, bem como apontou ocorrência de prescrição do pedido da Acionante.

No mérito, explicou do que se trata o produto abordado, ou seja, que o objeto da lide se tratava de reserva de margem consignável (RMC) firmado em 11/11/2015, onde o cliente poderia, a qualquer momento, quitar as dívidas em aberto e encerrar com a cobrança mensal. Ademais, salienta que a contratação do produto foi legítima e o produto foi apresentado de forma fácil e que permitiu à parte autora, imediatamente, identificá-lo da forma correta, sendo plenamente válido o contrato.

Ao final, requer, acaso não acolhida as preliminares suscitadas, a improcedência do pedido autoral.

Carreou documentos – Id 160443430, 160443431, 160443432, 160443433, 160443434, 160443435, 160443436, 160443437, 160443438/, 160443439, 160443440, 160443441, 160443442, 160443443, 160443444, 160443445, 160443448, 160443450, 160443451, 160443452, 160443453, e 160443455.

Réplica (Id 180325011).

Instadas as partes a especificarem as provas que pretendiam produzir (Id 181184855), o Acionado (Id 182610121) reiterou a legalidade da operação de empréstimo consignado existente entre as partes, bem como pugnou pela total improcedência da ação; de seu turno, a parte autora (Id 184191225) informou que a presente demanda não versa sobre a realização ou não do empréstimo, mas sim quanto ao vício de consentimento na contratação, pugnando assim pelo julgamento antecipado.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

DECIDO.

No que tange a impugnação à gratuidade deferida ao acionante, não assiste razão à impugnante.

De acordo com o disposto no art. 5º, LXXIV, da Constituição Federal, o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos financeiros, o que abrange, logicamente, a gratuidade de justiça, consoante entendimento fixado no julgamento dos leading cases pelo Plenário do Superior Tribunal Federal de nºs - RE 249003 ED/RS, RE 249277 ED/RS E RE 284729 AgR/MG -, relatados pelo Ministro Edson Fachin (REsp 1584130/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 07/06/2016, DJe 17/08/2016).

No mesmo sentido caminha o Código de Processo Civil, que, a seu turno, garante que tanto a pessoa natural, como a pessoa jurídica, possuem o direito à gratuidade judiciária, sejam brasileiras ou estrangeiras, residentes e/ou domiciliadas ou não no Brasil, conforme seu art. 98.

O §3º, do art. 99, do Código de Processo Civil, dispõe que "presume-se verdadeira a alegação de insuficiência deduzida exclusivamente por pessoa natural".

Por sua vez, o §2º, também do referido dispositivo legal, prevê: "§ 2o O juiz somente poderá indeferir o pedido se houver nos autos elementos que evidenciem a falta dos pressupostos legais para a concessão de gratuidade, devendo, antes de indeferir o pedido, determinar à parte a comprovação do preenchimento dos referidos pressupostos." (Destacamos).

A esse respeito, Fredie Didier Jr e Rafael Alexandria de Oliveira lecionam:

"A simples afirmação da pessoa natural se presume verdadeira. Trata-se de presunção legal juris tantum (presunção relativa). Quer isso dizer que, em linha de princípio, não precisa a pessoa natural produzir prova do conteúdo de sua afirmação. Se ela goza de boa saúde financeira, que o prove a parte contrária. Barbosa Moreira conceitua a presunção juris tantum como o substrato fático que a lei estabelece como verdade até prova em contrária. O fato é havido como verdadeiro, até que se prove o contrário." (in "Benefício da Justiça Gratuita", Salvador: Ed. JusPodivm, 2016, p. 67 - Destacamos).

Elpídio Donizetti acrescenta:

"Em síntese, tratando-se de pedido requerido por pessoa física, descabe a exigência de comprovação da situação da insuficiência de recursos, salvo quando o juiz evidenciar, por meio da análise dos autos, elementos que demonstrem a falta dos pressupostos legais para concessão da gratuidade. Nessa hipótese, o juiz deverá oportunizar a manifestação da parte, a quem caberá comprovar a insuficiência." (in "Novo Código de Processo Civil Comentado", 2ª Ed., São Paulo: Atlas, 2017, pp. 92/93).

Isso significa que, havendo a pessoa natural postulante à aludida benesse alegado se encontrar em situação de hipossuficiência financeira, o benefício deve ser deferido, salvo na hipótese de existirem indícios que infirmem ou criem dúvidas acerca da veracidade de tal declaração, circunstância na qual a parte Requerente deverá ser intimada para comprovar que, de fato, não é capaz de suportar os encargos processuais sem o prejuízo do sustento próprio e o de sua família, tudo conforme disciplina o art. 99, do CPC/2015.

Em outras palavras, em tese, aquele que almeja ser amparado pela Assistência Judiciária não possui o ônus de evidenciar que faz jus ao benefício, uma vez que a presunção juris tantum é suficiente para a sua concessão.

Essa conclusão decorre, inclusive, do disposto no inciso IV, do art. 374, do CPC/2015, que prescreve que a parte não precisa provar os fatos "em cujo favor milita presunção legal de existência ou de veracidade".

Aliás, como bem assinalado por Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Nery, "basta a simples alegação do interessado para que o juiz possa conceder-lhe a assistência. Essa alegação constitui presunção juris tantum de que o interessado é necessitado." (in Código de Processo Civil comentado. São Paulo: Revista Dos Tribunais, 2002. p. 1494 - Destacamos).

Na espécie, não vislumbro nenhum indício nos autos que indique a capacidade do acionante para arcar com as custas e despesas processuais, remanescendo, portanto, a presunção de veracidade da Declaração de Hipossuficiência colacionada.

Portanto, por não haver a impugnante se desincumbido do ônus probatório, rejeito a impugnação apresentada.

A Acionada suscitou, ainda, a decadência como prejudicial de mérito.

A decadência é hipótese de extinção do direito, em face da inércia do seu titular, quando a eficácia desse direito estava originalmente subordinada ao exercício dentro de determinado prazo, que se esgotou, sem o respectivo exercício.

Segundo Francisco Amaral, decadência é a perda do direito potestativo pela inércia do seu titular no período determinado em lei. Seu objeto são os direitos potestativos de qualquer espécie, disponíveis ou indisponíveis, direitos que conferem ao respectivo titular o poder de inuir ou determinar mudanças na esfera jurídica de outrem, por ato unilateral, sem que haja dever correspondente, apenas uma sujeição.

Este autor, em seu livro, cita a teoria do jurista José Carlos Moreira Alves:

“Com efeito, ocorre a decadência quando um direito potestativo não é exercido, extrajudicialmente ou judicialmente (nos casos em que a lei – como sucede em matéria de anulação, desquite etc. – exige que o direito de anular, o direito de desquitar-se só possa ser exercido em Juízo, ao contrário, por exemplo, do direito de resgate, na retrovenda, que se exerce extrajudicialmente), dentro do prazo para exercê-lo, o que provoca a decadência desse direito potestativo”. (AMARAL, Francisco. Direito civil: introdução, p. 561).

O Código Civil...

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