Capital - 17ª vara de relações de consumo

Data de publicação03 Novembro 2020
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição2730
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
17ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8081452-14.2019.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Renato Aparecido Medreiros Firmiano
Advogado: Maria Luane Santos Cruz (OAB:0058577/BA)
Réu: Banco Bradesco Cartoes S.a.
Advogado: Carlos Eduardo Cavalcante Ramos (OAB:0037489/BA)

Sentença:

Vistos, etc.

RENATO APARECIDO MEDREIROS FIRMIANO ingressou em Juízo com a presente AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS contra BRADESCO CARTÕES, todos devidamente qualificados nos autos e, após requerer os benefícios da gratuidade judiciária, aduziu, em suma, que ao tentar realizar operação financeira no comércio local, foi surpreendido com a informação de que seu nome havia sido negativado.

Afirmou que desconhece o referido débito, haja vista não ter contraído dívidas com o réu. Informou que foi abordada por um representante credenciado da acionada, tendo este ofertado a possibilidade de aquisição de cartão de crédito. Diante das vantagens oferecidas, aderiu à proposta, submetendo-se aos procedimentos necessários para concretização do negócio jurídico proposto, porém, nunca utilizou o cartão ofertado pela ré.

Do exposto, requereu o autor a concessão de provimento liminar e a condenação do réu à indenização por danos morais no importe de R$ 49.900,00 (quarenta e nove mil e novecentos reais), além das custas e honorários.

Instruída a exordial com documentos.

Gratuidade deferida, foi designada audiência de conciliação e houve a inversão do ônus da prova, ID 42242419.

Devidamente citado, o réu contestou o feito, ID 56182680. Preliminarmente alegou falta de interesse de agir. No mérito, defendeu a inexistência de conduta ilícita ou prática abusiva, uma vez que a parte autora contratou cartão administrado pela empresa ré, sendo titular do cartão de crédito Elo Múltiplo, com final 9209, em 01/12/2015, pagamento via débito automático, atualmente com status cancelado porinadimplência desde 23/08/2016.

Asseverou que o autor utilizou o cartão, com utilização do cartão de chip e senha e efetuou pagamentos.

Pugnou pelo acolhimento da preliminar, caso contrário, pela improcedência da ação ora contestada. Em caso de condenação, requer que a indenização seja arbitrada dentro dos moldes da razoabilidade e proporcionalidade.

Juntou documentos.

Réplica de ID 61204907, requereu o julgamento antecipado da lide.

As partes foram intimadas para se manifestarem sobre a produção de novas provas, ID 61219173.

A parte ré, ID 67920337, requereu o julgamento antecipado da lide, a parte autora não se manifestou, conforme certidão de ID 67973380.

Vieram os autos conclusos.

RELATADOS. DECIDO.

Tendo em vista que as partes não manifestaram interesse na produção de provas, declaro o julgamento antecipado da lide, com fulcro no art. 355, I do NCPC.

O Código de Processo Civil, em seu art. 334, § 4º, I menciona que a audiência de conciliação não será realizada se ambas as partes manifestarem desinteresse nesta assentada. Tal fato ocorreu no caso em análise, haja vista as partes requereram o julgamento antecipado da lide. Diante do exposto, deixo de redesignar a audiência de conciliação.

Indefiro a preliminar por falta de interesse de agir, na medida em que a ação proposta pelo autor visa indenização em razão de negativação que entende ser indevida, cuja pretensão é resistida pelo réu, configurado está o interesse de agir do requerente, tal a razão por que REJEITO esta preliminar.

Impende destacar, inicialmente, que a relação travada entre autor e réu é consumerista, protegida pelas normas constantes no CDC. Desta forma, tratando-se de relações de consumo, a responsabilidade civil é objetiva, respondendo o prestador do serviço pelos prejuízos causados ao consumidor, independente da existência de culpa (art. 6º, VI e VII do CDC). Nas relações do consumidor regulamentada pela Lei nº 8.078/90, a prova da culpa é plenamente descartável, sendo suficiente a existência do dano efetivo ao ofendido. Colhe-se:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

Tais artigos visam, como as demais normas previstas no Código Consumerista, proteger, de forma privilegiada, a parte mais fraca da relação de consumo, visando evitar, claramente, abusos dos comerciantes e fabricantes, ou prestadores de serviços, estes visivelmente mais fortes em relação àqueles.

Vislumbra-se, portanto, que a Lei 8078/90 no tocante à Responsabilidade Civil adotou a teoria da responsabilidade objetiva e a teoria do risco, respondendo o fornecedor de produtos e serviços pelos danos causados, em razão da atividade que realizam, independentemente de culpa.

A responsabilidade civil objetiva é constituída de três pressupostos: conduta humana (ação ou omissão), dano e nexo de causalidade.

Para Maria Helena Diniz (2003, pag. 37), conduta humana é "o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, (...) que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado". Afirma ainda que a ação ou omissão que gera a responsabilidade civil pode ser ilícita ou lícita e que a "responsabilidade decorrente de ato ilícito baseia-se na idéia de culpa, e a responsabilidade sem culpa funda-se no risco, (...) principalmente ante a insuficiência da culpa para solucionar todos os danos". E continua sua lição afirmando que o comportamento pode ser comissivo ou omissivo, sendo que a "comissão vem a ser a prática de um ato que não se deveria efetivar, e a omissão, a não-observância de um dever de agir ou da prática de certo ato que deveria realizar-se."

Já Sílvio de Salvo Venosa (2003, pag. 39) ao definir nexo de causalidade diz que "O conceito de nexo causal, nexo etimológico ou relação de causalidade deriva das leis naturais. É o liame que une a conduta do agente ao dano. É por meio do exame da relação causal que concluímos quem foi o causador do dano. Trata-se de elemento indispensável. A responsabilidade objetiva dispensa a culpa, mas nunca dispensará o nexo causal. Se a vítima, que experimentou um dano, não identificar o nexo causal que leva o ato danoso ao responsável, não há como ser ressarcida".

No caso em tela, informa o requerente que seu nome foi inserido nos órgãos de proteção ao crédito pela requerida ilicitamente, haja vista não ter contraído o referido débito.

Bem, é cediço que cabe ao autor a prova dos fatos constitutivos do seu direito (art. 373, I do NCPC) e, mesmo se tratando de relação de consumo com a possibilidade de inversão do ônus probatório não há exclusão dessa regra processual, devendo ao menos ser observados os indícios mínimos do que se alega na exordial.

Nos autos, os documentos apresentados pela requerida apontam, diversamente do quanto alegado na exordial, haver relação jurídica entre as partes, haja vista, as faturas do cartão de crédito juntadas no ID 56182680 e ID 56182734, referentes ao ano de 2015 e 2016, demonstram que a requerente efetuou inúmeras compras, em diferentes estabelecimentos, inclusive parceladas. Ademais, o acionante afirmou na inicial, ter preenchido proposta de cartão de crédito da parte ré, apenas negando sua utilização, ou seja, reconheceu da relação jurídica.

Somado a isto, os dados pessoais do autor coincidem com os informados nas telas sistêmicas do requerido, corroborando, mais uma vez, relação jurídica entre as partes.

Por fim, sacramentando a inverdade das alegações do autor, o cartão foi solicitado em 01/02/2015 (ID 56182680), possui várias compras realizadas e faturas pagas, mas somente 2019 é que se alega o total desconhecimento de determinado débito contraído através de compra presencial mediante senha pessoal. Observa-se que o requerente não fez qualquer contestação da compra que resultou no débito negativado, muito menos pretendeu o imediato cancelamento do cartão. Apenas se valeu da presente demanda para tentar fazer crer que desde fevereiro de 2015 um estelionatário utiliza seu cartão, paga as faturas e a que não quitou gerou a negativação objeto desta demanda.

Ora, é evidente que se fosse uma ação praticada por estelionatário não iria realizar pagamento de compras efetuadas, muito menos esperar quatro longos anos da aquisição do cartão de crédito, para ter início a ação delitiva.

Vale ressaltar que as telas de sistema coligidas na peça contestatória, malgrado tenham sido produzidas unilateralmente, possuem informações que se harmonizam ao conjunto probatório nos autos, possuindo assim força probante para evidenciar os fatos defendidos pelo réu.

Neste entendimento, anote-se a nossa jurisprudência:


AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITOS C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS APLICAÇÃO DO CDC – TELAS DO SISTEMA ELETRÔNICO COM AS INFORMAÇÕES DOS SERVIÇOS PRESTADOS AO CONSUMIDOR – DÉBITO EXIGÍVEL NEGATIVAÇÃO DEVIDA DO NOME DO AUTOR EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO...

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