Capital - 19ª vara de relações de consumo

Data de publicação03 Agosto 2021
Número da edição2913
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
19ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8087319-85.2019.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Tiago Da Cruz De Miranda
Advogado: Debora Maria Salvador Araujo (OAB:0029555/BA)
Reu: Banco Bradescard S.a.
Advogado: Larissa Sento Sé Rossi (OAB:0016330/BA)

Sentença:

Vistos,

Trata-se de ação declaratória de inexistência de débito cumulada com indenização por danos morais e pedido de tutela provisória de urgência proposta por TIAGO DA CRUZ MIRANDA, devidamente qualificado nos autos, em face do BANCO BRADESCARD S.A.

Narra o autor, na petição inicial (ID 42575807), que ao tentar realizar operação financeira, descobriu apontamento creditício informando que seu nome estava negativado pela empresa Ré. Houve a inclusão de seu nome nos cadastros de inadimplentes, no dia 15/10/2018, por conta do valor de R$ 466,12 (quatrocentos e sessenta e seis reais e doze centavos). Alega não ter contraído as dívidas ora inscritas.

Em face disso, faz, em síntese, os seguintes pedidos: 1) concessão de medida liminar e do benefício da gratuidade da justiça; 2) citação da Ré, na pessoa dos seus respectivos representantes legais, para contestar a presente; 3) dispensa de audiência prévia; 04) a Ré condenada em indenização por danos morais no valor de 50 salários mínimos; 5) julgue a total procedência da ação, declarando a abusividade e a inexigibilidade da cobrança; 6) seja declarada a inversão do ônus da prova; 6) a condenação da parte Ré ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.

Indeferido o pedido de tutela antecipada de urgência e concedida a assistência judiciária gratuita (ID 42691744).

Na contestação (ID 65574214), a acionada sustenta, preliminarmente, a ausência de interesse processual por inexistência de pretensão resistida e a inépcia da petição inicial. No mérito, requer a improcedência dos pedidos com a condenação da parte autora ao pagamento da verba de sucumbência e da multa por litigância de má-fé. E, em face do princípio da eventualidade, caso haja a procedência da ação, requer que eventual condenação a título de danos morais seja arbitrada em valores módicos e que atendam aos princípios da razoabilidade e proporcionalidade.

A parte autora não apresentou réplica.

Não foi obtida a conciliação entre as partes.

Não houve requerimento de outras provas.

É o relatório. Decido.

FUNDAMENTAÇÃO

O julgamento antecipado da lide se faz autorizado com base no artigo 355, inciso I, do CPC, eis que a questão de mérito é unicamente de direito, não sendo necessária a produção de outras provas.

Antes de adentrar ao mérito, analisa-se as questões preliminares.

DA AUSÊNCIA DE PRETENSÃO RESISTIDA

Alega o demandado carência da ação por falta de interesse de agir, sob o argumento de que não se desincumbiu a parte autora de provar o alegado, bem como, de comprovar que tentou solucionar o caso, não havendo qualquer registro de reclamação formalizada junto à Ré.

Contudo, a preliminar apresentada deve ser afastada, pois, de acordo com o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal, o qual consagra o Princípio da Inafastabilidade da Jurisdição, o exaurimento da via administrativa, não é condição para ingresso na via judicial e a simples apresentação da contestação negando os pedidos formulados pela autora já demonstra resistência ao pedido. Nessa linha:

AGRAVO DE INSTRUMENTO – AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER, REPETIÇÃO DE INDÉBITO E REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS E MATERIAIS - AUSÊNCIA DE INTERESSE DE AGIR – DESNECESSIDADE DE ESGOTAMENTO DA VIA ADMINISTRATIVA PARA PROPOSITURA DA LIDE - GARANTIA DE ACESSO À JUSTIÇA – RECURSO PROVIDO. Segundo o princípio constitucional da garantia de acesso à Justiça, o esgotamento da via administrativa não é requisito para o ajuizamento de demanda judicial, sendo descabido a exigência da demonstração da pretensão resistida. (TJ-MT - AI: 10117244020198110000 MT, Relator: SEBASTIAO BARBOSA FARIAS, Data de Julgamento: 28/01/2020, Primeira Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 03/02/2020).

Ante o exposto, deixo de acolher a preliminar.

DA INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL

O réu aduz que a parte Requerente descumpriu a determinação contida no Ofício Circular nº 25/2017 – COJE-BA, a qual determina que para realização da audiência se faz imprescindível a conferência de documentos nos autos, tais como cópias digitalizadas do CPF e comprovante de residência da parte autora. Posto que o autor não juntou aos autos o comprovante de residência.

O art. 319, inc. II, do CPC, aponta que a petição inicial deverá indicar o domicílio e a residência do autor e do réu, não dispondo acerca da necessidade de comprovante de residência.

DIREITO CIVIL. APELAÇÃO EM AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER/NÃO FAZER. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. EXIGÊNCIA DE COMPROVANTE DE ENDEREÇO. DOCUMENTO NÃO ESSENCIAL À PROPOSITURA DA AÇÃO (ART. 319, § 2º DO CPC/15). AUSÊNCIA DE EXIGÊNCIA LEGAL. EXCESSO DE FORMALISMO. SENTENÇA ANULADA DE OFÍCIO. RECURSO APELATÓRIO CONHECIDO E PROVIDO. RETOMADA DO PROCESSAMENTO DA AÇÃO REVISIONAL NO PRIMEIRO GRAU. 1. Trata-se de recurso de Apelação interposto em face da sentença de fls. 43/44, que, nos autos da AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER/NÃO FAZER, ajuizada por PATRICK JOSEPH DOYLE, em desfavor de MÔNICA LIMA CRISÓSTOMO E DONAL HAYES, indeferiu a inicial, julgando-a inepta pela não apresentação do comprovante de residência, apesar da intimação do autor para emendar a inicial, com fundamentação no art. 321 e § único c/c art. 485, I e art. 330, IV do CPC/15, extinguindo a ação sem resolução do mérito. 2. O cerne da controvérsia gira em torno da essencialidade do comprovante de residência que ensejou o indeferimento da incial e a consequente extinção da ação sem resolução do mérito. 3. Sabe-se que os requisitos da petição inicial estão taxativamente previstos em lei, notadamente nos artigos 319 e 320 do CPC/15 e, pela simples leitura da legislação, verifica-se que é inexigível a juntada de comprovante de residência em nome da parte autora como condição ao processamento da petição inicial, bastando a indicação de seu endereço, declaração esta com presunção relativa de veracidade. 4. Assim, constata-se ser o comprovante de residência documento não essencial para a propositura da demanda. Ressalte-se que o demandante, no caso, apresentou declaração de residência, à fl. 52. 5. APELO CONHECIDO E PROVIDO. SENTENÇA DE INDEFERIMENTO DA INICIAL ANULADA. RETORNO DOS AUTOS À ORIGEM PARA REGULAR PROCESSAMENTO DA AÇÃO REVISIONAL. (...). (TJ-CE - APL: 01162914820178060001 CE 0116291-48.2017.8.06.0001, Relator: MARIA VILAUBA FAUSTO LOPES, Data de Julgamento: 12/02/2020, 3ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 12/02/2020).

Além disso, como bem aponta o réu, o dito comprovante é necessário para a realização da audiência, que no presente caso foi cancelada no dia 08/07/2020.

Por esses fundamentos não acolho a preliminar e passo a decidir o mérito da ação.

MÉRITO

A ação deve ser julgada à luz do Código de Defesa do Consumidor (CDC), uma vez que há relação de consumo entre as partes, que firmaram contrato de adesão, conforme documentos juntados aos autos, sendo de cunho objetivo a responsabilidade da parte ré pelos defeitos relativos à prestação do serviço, com exceção de quando é provada a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros (art. 14, § 3º, inc. I, do CDC).

Em decorrência da vulnerabilidade existente entre os sujeitos que figuram a relação consumerista e do objetivo de facilitar a defesa de direitos, o legislador estabeleceu no art. 6º, inc. VIII, do CDC, a possibilidade de inversão do ônus da prova ao fornecedor, a critério do juiz, quando verificar a verossimilhança da alegação ou quando a parte for hipossuficiente.

Como aponta Sérgio Cavalieri Filho, o ônus da prova é de quem alega, como determina o art. 373 do CPC, incumbência do autor, no entanto, “tal proposição é compreensível quando se está diante de partes em igualdade de condições e quando a causa verse sobre direitos disponíveis, o que não ocorre nas hipóteses subsumidas à legislação consumerista” (CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de direito do consumidor. – 5. ed. – São Paulo: Atlas, 2019. p. 132).

No caso em discussão, é verificado o cumprimento dos requisitos legais, uma vez que a parte autora figura como parte hipossuficiente da relação, conforme decisão interlocutória (ID 42691744) que concede o benefício da justiça gratuita em decorrência da carência de recursos, bem como juntou aos autos documento (ID 42575878) que se apresenta como prova que permite um juízo de probabilidade sobre o objeto discutido.

Acrescenta-se que em ações negativas, como é a presente, não recai sobre o autor o ônus de provar a inexistência de relação jurídica, cuja impossibilidade é denominada nessas ações de “prova diabólica”. Esse é o posicionado pela presente Tribunal:

EMENTA RECURSO INOMINADO. CONSUMIDOR. ALEGAÇÃO AUTORAL DE COBRANÇA E NEGATIVAÇÃO INDEVIDAS. DEFESA PAUTADA NA OCORRÊNCIA DE CESSÃO DE CRÉDITO PELO CREDOR ORIGINÁRIO ¿IBI. SENTENÇA QUE JULGOU...

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