Capital - 19ª vara de relações de consumo

Data de publicação10 Fevereiro 2023
Gazette Issue3274
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
19ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

0545160-80.2017.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Interessado: Jair Barbosa Meneses
Advogado: Vanivaldo De Santana Jesus (OAB:BA46973)
Interessado: Renault Do Brasil S.a
Advogado: Fernando Abagge Benghi (OAB:BA37476)
Interessado: Brune Veiculos Ltda - Me
Advogado: Marcio Medeiros Bastos (OAB:BA23675)

Sentença:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA
Comarca de Salvador
19ª Vara de Relação de Consumo

Rua do Tingui, s/n, - Fórum Prof. Orlando Gomes - 2º andar - CEP: 40.040-900
Campo da Pólvora - Salvador/BA


SENTENÇA
Processo nº: 0545160-80.2017.8.05.0001
Classe - Assunto: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7)
Requerente INTERESSADO: JAIR BARBOSA MENESES
Requerido(a) INTERESSADO: RENAULT DO BRASIL S.A, BRUNE VEICULOS LTDA - ME


Trata-se de ação de fazer com indenização por danos morais c/c lucros cessantes e restituição de valores com pedido de liminar proposta por Jair Barbosa Meneses em face de Renault do Brasil S/A, todos devidamente qualificados.


I RELATÓRIO


A parte autora narra, na petição inicial às fls. 1/18, que adquiriu veículo Renault, modelo novo master minibus, ano de fabricação/modelo 2016/2017, em 17/02/2017, o qual, com menos de 30 (trinta) dias, apresentou barulhos na troca de marcha e rangidos na parte do fundo do carro, emitido a ordem de serviços de número 142084, com a finalidade de consertar e tentar sanar os problemas apresentados, na data de 18/04/2017.


Aduz que os problemas persistiram, tendo solicitado a troca da caixa de marcha, mas o pedido foi negado. Em razão da atividade de motorista desempenhada e da continuidade dos problemas, viu-se obrigado a locar outro veículo compatível com transportes de crianças e demais passageiros.


Diante do exposto, pede, em síntese, o julgamento procedente da demanda para condenar os réu, de forma solidária, ao pagamento de indenização no valor de R$ 30.000,00 (trinta mil reais) a título de danos morais; condenação da parte reclamada ao pagamento de indenização de R$ 15.000,00 a título de lucros cessantes; concessão de medida liminar em caráter de urgência para substituírem urgentemente a caixa de marcha do veículo do autor ou a troca imediata do veículo ou a devolução do capital atualizado monetariamente; condenação das reclamadas para o pagamento no valor de R$ 6.750,00 (seis mil, setecentos e cinquenta reais) a título de locação do veículo.


A peça foi instruída pelos documentos às fl. 19/31.


Decisão interlocutória, às fls. 42/43, intima a parte reclamada para se manifestar acerca do pedido de tutela de urgência formulado; inverte o ônus da prova diante da hipossuficiência técnica da parte autora.


Manifestação das reclamadas às fls. 50/63.


A parte ré Renault do Brasil S.A. apresentou Contestação, às fls. 65/76, acompanhada de documentos às fls. 77/114. Argumenta que o veículo em questão passou por conserto, o qual sanou por completo os barulhos e rangidos reclamados pela parte autora. Além disso, defende que a pretensão de substituição da caixa de marchas por outra nova é desarrazoada, uma vez que o equipamento estava em pleno estado de utilização.


Termo de audiência às fls. 115/116.


A ré Brune Veículos acostou Contestação às fls. 117/134. Em sede preliminar, impugna o benefício da assistência judiciária, alega a ilegitimidade passiva e a ausência de requisitos para inversão do ônus da prova em razão da inaplicabilidade do CDC. No mérito, argumenta que a parte autora fora atendida sem qualquer empecilho e o veículo reparado no prazo de lei, sem qualquer custo, mediante autorização do fabricante. Além disso, acrescenta que, caso haja reconhecimento de vício na fabricação do veículo, não há responsabilidade pelos supostos vícios de fabricação do produto adquirido, uma vez que não participou desse processo. Diante disso, requer o acolhimento das preliminares suscitadas e, não o sendo, pugna pela improcedência da ação.


Decisão interlocutória, às fls. 135/136, indefere a liminar requerida; faculta às partes a possibilidade de apontar questões de fato e de direito que entendam pertinentes ao julgamento da lide.


Réplica apresentada pela parte autora às fls. 141/145.


Decisão interlocutória, às fls. 147/151, indefere as preliminares de impugnação à assistência judiciária gratuita, ilegitimidade passiva e inaplicabilidade do CDC; defere a produção de prova pericial requerida.


Os quesitos a serem respondidos pelo perito foram apresentados pelas partes às fls. 157/167.


Laudo pericial às fls.191/198.


Manifestações das partes sobre o laudo pericial às fls. 202/216.


Decisão interlocutória, à fl. 221, afasta impugnação da parte autora acerca do laudo pericial; indefere a realização de nova perícia; expede alvará em favor do perito; determina o retorno dos autos como conclusos para sentença.


Os autos retornaram conclusos.


É o breve relatório.


Fundamento. Decido.


II FUNDAMENTAÇÃO


Obedecidos e observados todos os requisitos processuais, encontram-se os autos prontos à entrega da prestação jurisdicional.


Inexiste prefacial que desafia o pronunciamento de forma destacada, passo à análise do mérito da demanda.


A relação jurídica firmada entre as partes possui natureza consumerista, visto que se mostram presentes os elementos subjetivos e objetivos previstos nos arts. e do CDC. Por conseguinte, a presente demanda deve ser compreendida a partir das normas de ordem pública e interesse social do Código de Defesa do Consumidor e do microssistema consumerista como um todo.

Destaca-se que, dentro desse universo, a responsabilidade é de cunho objetivo, nos termos do art. 14, caput, do CDC, necessitando-se tão somente a apresentação da ocorrência do fato, do dano e do nexo causal, sem análise da culpa. Previsão afastada na hipótese de defeito inexistente e culpa exclusiva do consumidor ou de terceiros, segundo o §3º do mesmo diploma normativo.

Como bem apontado pelo Min. Gilmar Mendes no voto proferido para o paradigmático Recurso Extraordinário (RE) 828.040, nos casos de responsabilidade objetiva, em demanda judicial, incumbe tão somente provar a existência do dano, do ato ilícito e do nexo de causalidade.


O sistema protetivo enunciado pela legislação consumerista conferiu a inversão do ônus da prova, o qual busca facilitar ao consumidor a defesa de seus direitos em face de danos causados por fornecedor. Nesse sentido, o ônus da prova configura direito básico do consumidor, disposto no art. 6º, inc. VIII, do CDC, que pode ser pleiteado no processo civil, a critério do juiz, quando for verossímil a alegação ou quando o consumidor for hipossuficiente.


A hipossuficiência técnica da autora justifica a inversão do ônus da prova, conforme decisão interlocutória às fls. 42/43. No entanto, salienta-se que a mera inversão não é capaz de gerar, para este fato, a capacidade para constituição do direito alegado pela parte autora, pois é indispensável que ela apresente a verossimilhança mínima de suas alegações.


Em razão da inversão do ônus da prova, cabe ao réu, assim, demonstrar a ausência de defeito na prestação de serviço ou a existência de excludente de nexo de causalidade entre o fato jurídico descrito e o dano experimentado pela parte autora.


Vencidos esses apontamentos iniciais. Prossigo.


A presente ação objetiva reparação por danos morais e materiais desencadeados por suposto defeito no veículo adquirido. Pois bem.


Em primeiro lugar, afere-se pelos documentos acostados aos autos e pelas alegações das partes que, de fato, houve a aquisição do veículo pela parte autora, bem como a realização de reparo no período de garantia.


Acerca da alegada continuidade dos defeitos no veículo e a possível existência de vício na fabricação, a prova pericial merece destaque, uma vez que se destina a dirimir dúvidas sobre a existência ou não dos fatos alegados pela parte autora. Destaca-se que o laudo foi elaborado por perito nomeado pelo juízo, imparcial, e com conhecimentos específicos no assunto em debate.


No que tange à prova produzida, o perito aduz que o veículo estava em bom estado de conservação no dia da inspeção, inexistindo informações ou indícios do veículo ter sofrido algum tipo de colisão.


Sobre o funcionamento, em teste dinâmico do veículo por tráfego em ruas planas e com aclives e declives acentuados, aponta que foram realizados testes de desempenho, frenagem, estabilidade, direção e troca de marchas, não se manifestando os reclames apontados na inicial.


Esclarece que “(...) pequenos ruídos são normais durante o funcionamento de uma transmissão manual, devido ao atrito e ao esforço atuante entre os componentes internos da transmissão e também da forma que o condutor aciona o pedal da embreagem para efetuar a troca das marchas”.


Desse modo, percebe-se que não existe prova do alegado vício de fabricação do veículo, não tendo como se falar em conduta ilícita da requerida, nem ao menos nexo causal entre esta e os supostos danos suportados pela parte autora, de sorte que não há o dever de reparar a que alude a legislação consumerista.


Não identificado o ato ilícito, restam prejudicados os demais pedidos de reparação pleiteados. Por todo o exposto, não há outro caminho senão o de reconhecer a improcedência da ação.


III DISPOSITIVO


Do exposto, declaro extinto o presente feito, com resolução do mérito, na forma do inciso I do art. 487 do CPC, ao passo em que JULGO IMPROCEDENTE a ação.


Por força do princípio da sucumbência, condeno a parte demandante ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios que ora fixo, na conformidade do art. 85 do CPC, em 10%...

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