Capital - 2ª vara do sistema dos juizados especiais da fazenda pública

Data de publicação15 Junho 2021
Número da edição2881
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª V DO SISTEMA DOS JUIZADOS ESPECIAIS DA FAZENDA PÚBLICA
SENTENÇA

8015592-66.2019.8.05.0001 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Edlene Nascimento Dos Reis
Advogado: Ilka De Oliveira Lima Rodrigues (OAB:0012177/BA)
Reu: Estado Da Bahia

Sentença:

Poder Judiciário - Fórum Regional do Imbuí

2ª Vara do Sistema dos Juizados Especiais da Fazenda Pública, sala 103

Rua Padre Cassimiro Quiroga, Loteamento Rio das Pedras, Qd.01, Imbuí – CEP: 41.720-400

Fax (71) 3372-7361 email: ssa-2vsje-fazenda@tjba.jus.br


Processo nº 8015592-66.2019.8.05.0001

Classe - Assunto: PROCEDIMENTO DO JUIZADO ESPECIAL CÍVEL (436) - [Abono de Permanência]

AUTOR: EDLENE NASCIMENTO DOS REIS

RÉU: ESTADO DA BAHIA

SENTENÇA

EDLENE NASCIMENTO DOS REIS ajuizou AÇÃO ORDINÁRIA em face do ESTADO DA BAHIA, na qual alega, resumidamente, que Réu efetua descontos em seu contracheque em valor superior a 30% (trinta por cento) dos seus proventos de pensão, em razão de empréstimos consignados por ela contraídos.

Sendo assim, busca a tutela jurisdicional para que seja declarado sem efeito todo e qualquer desconto que ultrapasse 30% dos seus proventos de pensão.

Citado, o Réu ofertou contestação.

Apresentada Réplica.

Dispensada a audiência de conciliação.

Voltaram os autos conclusos.

É o breve relatório. Decido.

DAS PRELIMINARES

O Estado da Bahia alega a preliminar de ilegitimidade passiva, pois apenas realiza os descontos, não tendo dado causa a eles.

Tal preliminar não merece prosperar, pois o Estado possui relação jurídica com o fato objeto da lide, tendo em vista que efetua os descontos contestados pela Autora, ainda que não tenha participado a relação jurídica anterior que ensejou tais descontos.

Ademais, neste feito, atentando-se para as disposições do Código de Processo Civil, deve-se destacar o surgimento da norma processual fundamental designada de princípio da primazia da decisão de mérito, o qual preconiza que o órgão jurisdicional deve priorizar o proferimento de decisões que resolvam, definitivamente, o objeto litigioso.

Destarte, manifesta-se como expressão deste princípio a previsão contida no art. 488 do Código de Processo Civil, segundo o qual se dispensa eventual extinção do feito quando a decisão for favorável àquele que se beneficiaria com a sentença terminativa. Eis a dicção do aludido dispositivo:

Art. 488. Desde que possível, o juiz resolverá o mérito sempre que a decisão for favorável à parte a quem aproveitaria eventual pronunciamento nos termos do art. 485.

Ademais, as condições da ação, dentre elas o interesse de agir, devem ser aferidas a luz da teoria da asserção, que preceitua que as condições da ação devem ser analisadas através das alegações trazidas na exordial. Não se constatando de plano a ausência das condições da ação, encerrada a produção de provas, caso se constate que não assiste razão ao Autor em suas alegações, é caso de improcedência do pedido e não de carência de ação.

A teoria da asserção é adotada pacificamente pela jurisprudência pátria, inclusive pelo Superior Tribunal de Justiça, como se infere do seguinte julgado:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS MOVIDA POR ASSOCIADO EM FACE DO PRESIDENTE DO CLUBE POR EXTRAPOLAÇÃO DE PODERES. LEGITIMIDADE PASSIVA. TEORIA DA ASSERÇÃO. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. Em conformidade com o entendimento desta Corte Superior, segundo a teoria da asserção, as condições da ação, entre elas a legitimidade passiva, devem ser aferidas a partir das afirmações deduzidas na petição inicial.

2. No caso dos autos, não se discute uma conduta regular do ora agravante enquanto Presidente do clube, mas sim uma conduta que teria extrapolado os poderes a ele atribuídos, de modo que a comprovação do direito do autor à indenização pleiteada, em razão de eventual irregularidade e abuso dos atos praticados pelo recorrente, diz respeito ao mérito da causa, e não à sua legitimidade ativa.

3. Agravo interno a que se nega provimento. (STJ - AgInt no AREsp: 1710782 SP 2020/0134110-0, Relator: Ministro RAUL ARAÚJO, Data de Julgamento: 08/03/2021, T4 - QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 26/03/2021)

Analisando a petição inicial, constata-se que as alegações da parte Autora possuem uma coerência lógica, configurando, à luz da teoria da asserção, a legitimidade passiva do Estado da Bahia, o que não significa, ressalte-se, que a Demandante faz jus ao direito pleiteado.

Assim, no caso em lume, caso a parte Autora não produza provas que comprovem o fato constitutivo do seu direito, os pedidos devem ser julgados improcedentes, não havendo que se falar em extinção do processo sem resolução do mérito.

Por fim, o Réu arguiu a preliminar de inépcia da inicial, alegando a ausência do pedido, além de afirmar que da narrativa dos fatos não decorre logicamente uma conclusão.

Todavia, não assiste razão ao Réu, pois a parte Autora formulou o pedido para que “declarada sem efeito todo e qualquer desconto que ultrapasse 30% do vencimento da pensionista, porque se trata de pensão alimentar, e não pode ser impenhorável, assim como disposto no art. 833, inciso IV que diz que ...”, não havendo que se falar em ausência de pedido.

Outrossim, existe uma conclusão lógica entre os fatos narrados e a conclusão, tendo em vista que o pedido da Autora foi embasado nas alegações de que o Réu vem efetuando descontos sobre os seus proventos de pensão acima de 30%, em razão dos empréstimos consignados por ela contraídos, o que violaria o mínimo existencial e a dignidade da pessoa humana.

Ante o exposto, rejeito as preliminares e passo à análise do mérito.

DO MÉRITO

Cinge-se a presente demanda a respeito da insurgência da Autora em face de supostos descontos excessivos ilegalmente perpetrados pelo Réu, relativos à empréstimos consignados por ela celebrados com instituições financeiras.

Como é cediço, o ordenamento jurídico pátrio estabelece que a Administração Pública encontra-se afeta, entre outros, ao princípio da legalidade, que representa a obrigação da Administração de agir de acordo com os ditames legais, previsto nos artigos 37 da Constituição Federal e 3º da Lei Estadual 12.209/2011, a saber:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: […]

Art. 3º - A Administração Pública obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência, celeridade, razoabilidade, proporcionalidade, motivação, devido processo legal e ampla defesa, segurança jurídica, oficialidade, verdade material, gratuidade e, quando cabível, da instrumentalidade das formas.

Neste sentido, convém ressaltar a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello ao discorrer sobre o princípio da legalidade, in verbis:

É, em suma: a consagração da ideia de que a Administração Pública só pode ser exercida na conformidade da lei e que, de conseguinte, a atividade administrativa é atividade sublegal, infralegal, consistente na expedição de comandos complementares à lei.

[…]

Pretende-se através da norma geral, abstrata e por isso mesmo impessoal, a lei, editada, pois, pelo Poder Legislativo – que é o colégio representativo de todas as tendências (inclusive minoritárias) do corpo social –, garantir que a atuação do Executivo nada mais seja senão a concretização desta vontade geral (BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Curso de Direito Administrativo: Malheiros, 2008, p. 97).

No caso em tratativa, constata-se da narrativa fática e dos documentos acostados que o Estado da Bahia não tem responsabilidade pelos débitos contraídos pela Demandante perante as instituições financeiras, cabendo ao ente federativo na relação apenas transferir a importância contratada ao credor, mediante autorização do servidor público contratante do empréstimo.

Assim, a responsabilidade pelos supostos descontos excessivos a título de empréstimo consignado seria das instituições financeiras que celebraram os contratos com a Demandante, cabendo a esta buscar a revisão dos contratos em face daquelas.

Dessa forma, a Acionante não logrou provar conduta ilegal cometida pelo Réu, não se desincumbindo do ônus probatório estabelecido no art. 373, I do CPC, nos seguintes termos:

Art. 373. O ônus da prova incumbe:

I - ao autor, quanto ao fato constitutivo do seu direito;

[…]

Desse modo, não procede o pedido formulado pela Autora, tendo em vista que os descontos supostamente excessivos advêm de contratos firmados pela Autora com instituições financeiras e não são originados por conduta ilícita do Réu.

Ante o exposto, JULGO IMPROCEDENTE O PEDIDO DA EXORDIAL e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do Art. 487, I, do NCPC.

Defiro o benefício da gratuidade da justiça.

O acesso ao Juizado Especial independerá, em primeiro grau de jurisdição, do pagamento de custas, taxas ou despesas, bem como a sentença de primeiro grau não condenará o vencido nas custas processuais e honorários de advogado, ressalvados os casos de litigância de má-fé, com esteio nos arts. 54 e 55, da Lei N.º 9.099/95.

Após certificado o prazo recursal, arquivem-se os presentes autos.

Intimem-se.

SALVADOR, 7 de junho de 2021.

ANGELA BACELLAR BATISTA

Juíza de Direito

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