Capital - 2ª vara de relações de consumo

Data de publicação31 Maio 2021
Gazette Issue2872
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8149057-40.2020.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Jamile Guimaraes Silva
Advogado: Jose Leonam Santos Cruz (OAB:0059355/BA)
Reu: Cred - System Administradora De Cartoes De Credito Ltda
Advogado: Luciana Martins De Amorim Amaral Soares (OAB:0026571/PE)

Sentença:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

2ª Vara de Relações de Consumo - Salvador

1º Cartório Integrado das Varas de Relações de Consumo de Salvador

Rua do Tingui, s/n, Campo da Pólvora, Fórum Prof. Orlando Gomes, 1º Andar, Nazaré, Salvador - Bahia. CEP 40.040-380.

salvador2vrconsumo@tjba.jus.br / 1cartoriointegrado@tjba.jus.br


Processo n. 8149057-40.2020.8.05.0001

AUTOR: JAMILE GUIMARAES SILVA

REU: CRED - SYSTEM ADMINISTRADORA DE CARTOES DE CREDITO LTDA

AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZATÓRIA. RELAÇÃO CONSUMO. APLICAÇÃO DO CDC. CONTRATO COM INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. SUPOSTA EXISTÊNCIA DE MORA. AUSENTE MANIFESTAÇÃO VONTADE. DEFEITO NA PRESTAÇÃO DE SERVIÇO. TEORIA DO RISCO. AUSENTE PROVA QUE AFASTE A TESE AUTORAL. INSCRIÇÃO INDEVIDA EM ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO (RESTRIÇÃO) AO CRÉDITO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. SÚMULA 479 DO STJ. DANO MORAL IN RE IPSA. PROCEDÊNCIA DOS PEDIDOS.

JAMILE GUIMARAES SILVA, devidamente qualificada na peça vestibular, ajuizou a presente AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA em face de CRED - SYSTEM ADMINISTRADORA DE CARTOES DE CREDITO LTDA, instituição financeira também qualificada na exordial, sob os fundamentos de fato e de direito a seguir relatados.

Narra, a parte autora, que ao tentar realizar uma operação financeira em uma instituição financeira da comarca foi surpreendida com a notícia de que o seu nome estaria inserido nos cadastros de proteção ao crédito, por suposta dívida contraída junto à Ré, como consta comprovado nos autos pelo documento de ID.85951898.

Salienta, a parte suplicante, que desconhece o débito do objeto da negativação, sendo que nunca teria contratado nenhum serviço com esta, de modo que a sua negativação se constituía indevida. Além do mais alega que não recebeu qualquer notificação do SPC nem tampouco do SERASA, informando-o acerca da abertura de cadastro negativo em seu nome

Requer, ao fim, seja julgada procedente a presente ação, declarando a inexistência do débito que deu origem a negativação indevida, bem como pleiteia pela condenação da requerida em danos morais; e determinar a inversão do ônus da prova, em razão da hipossuficiência da Autora em relação ao réu e sua vulnerabilidade.

A autora requereu ainda o benefício da gratuidade de justiça, por não dispor de meios econômicos para custear as despesas processuais, sendo desprovida de recursos.

Com a inicial, houve produção de prova documental.

Foi proferida decisão pelo MM Juizo, concedendo liminar, para que a acionada, em 24 (vinte e quatro) horas, determinasse/realizasse a exclusão do nome da autora dos cadastros restritivos de crédito (SPC, SERASA, etc) sob pena de multa diária, para o caso de descumprimento da determinação judicial, bem como determinou-se a inversão do ônus probandi ID.86258068.

Devidamente citada, a parte ré colacionou aos autos a contestação, alegando, em síntese, que não realizou inscrição irregular, apenas teria manejado um exercício regular do seu direito, haja vista que o autor estaria em mora com a instituição demandada ID.94382572.

Aduziu, a parte requerida, que o pedido autoral estaria em total dissonância com o ordenamento jurídico pátrio, entendendo que não existe dano moral no caso narrado pela mesma, pois só esta cumprindo com sua obrigação existente.

Impugna, a parte Ré, o quantum indenizatório requerido pela parte autora, aduzindo que o valor deveria estar em consonância com os critérios de razoabilidade e proporcionalidade, com o intuito de evitar o enriquecimento ilícito, entendimento que afirma ser do STJ.

Alegou, ainda, a insuficiência probatória da exordial, bem como a impossibilidade jurídica de se inverter o ônus da prova.

Neste ínterim, devidamente citada a parte requerida apresentou réplica presente no ID.100466212, arguiu que as alegações não merecem prosperar, vez que as telas sistêmicas juntadas em sede de contestação, não dispõe de qualquer respaldo jurídico, visto que foram produzidas de forma unilateral, bem como extraídas do sistema operacional interno da acionada, não possuindo o condão de dirimir a presente contenda.

Juntamente com a alegação de que, não pré existe documento legal que corrobore para origem do débito e por conseguinte a negativação.

Por fim reitera pelo julgamento da lide e total procedência dos pedidos.

É o relatório, tudo examinado, passo a decidir:

Encontram-se preenchidos os pressupostos processuais e atendidas as condições da ação, não havendo outras preliminares a serem enfrentadas, o que habilita o feito à apreciação do mérito.

Despicienda a dilação probatória, considerando as peculiaridades do vertente caso. Conquanto as questões constantes da demanda envolvam matérias de direito e de fato, não há necessidade de produção de prova em audiência, o que autoriza o julgamento antecipado da lide, na forma do Art. 355, I do CPC.

MÉRITO:

Dispõe o Art. 6º, VI, do CDC, que é direito básico do consumidor a efetiva prevenção e reparação dos danos morais e materiais. Regra esta a densificar o direito fundamental estampado no Art. 5º, X, da CRFB/88.

Tratando do direito básico do consumidor à efetiva prevenção e reparação dos danos, leciona Sergio Cavalieri Filho, in Programa de Direito do Consumidor, 3 ed, São Paulo: Atlas, 2011, p. 104:

Para garantir ao consumidor efetiva prevenção e reparação de danos, o CDC implantou um moderno e avançado sistema de responsabilidade civil (...). Estabeleceu responsabilidade objetiva (independentemente de culpa) para o fornecedor de produtos e serviços (arts. 12 – 20, do CDC), responsabilidade esta que tem por fundamento os princípios da prevenção (arts. 8, 9 e 10, do CDC), da informação (arts. 8, 9, 10, 12 e 14, do CDC) e da segurança (arts. 12, § 1º, e 14, § 1º, do CDC). A indenização, que deve ser integral, abarca danos materiais e morais, individuais, coletivos e difusos (art. 81, I e II, do CDC).

Sobre o tema da responsabilidade objetiva calha menção a lição do mestre Carlos Roberto Gonçalves, in Responsabilidade Civil, 12 ed, São Paulo: Saraiva, 2010, p. 39:

A responsabilidade objetiva funda-se num princípio de equidade, existente desde o direito romano: aquele que lucra com uma situação deve responder pelo risco ou pelas desvantagens dela resultantes (ubi emolumentum, ibi onus; ubi commoda, ibi incommoda). Quem aufere os cômodos (ou lucros) deve suportar os incômodos (ou riscos).

No direito moderno, a teoria da responsabilidade objetiva apresenta-se sob duas faces: a teoria do risco e a teoria do dano objetivo.

Pela última, desde que exista um dano, deve ser ressarcido, independentemente da ideia de culpa. Uma e outra consagram, em última análise, a responsabilidade sem culpa, a responsabilidade objetiva, Conforme assinala Ripert, mencionado por Washington de Barros Monteiro, a tendência atual do direito manifesta-se no sentido de substituir a ideia da responsabilidade pela ideia da reparação, a ideia da culpa pela ideia de risco, a responsabilidade subjetiva pela responsabilidade objetiva.

Neste mesmo quadrante, tem-se, ainda de forma mais singular, perfeita aplicação as regras contidas no caput e § 3º, do Art. 14, do CDC, senão vejamos:

Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.

(...)

§3º O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando provar:

I - que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;

II - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Servindo-se desses marcos orientadores, passamos a análise do vertente caso.

PLANOS DA EXISTÊNCIA E VALIDADE DO NEGÓCIO JURÍDICO:

Todo e qualquer negócio jurídico deverá transpassar necessariamente pelo plano da existência. Ressaltando, que os planos posteriores, da validade e da eficácia, são dependentes do mesmo, visto que sem a existência do contrato, este sequer poderá ser válido e/ou eficaz, não restando-o assim, formado.

Atina-se neste caso concreto, para os pressupostos de um negócio jurídico, fazendo um breve recorte ao requisito do consentimento, também compreendido como vontade, ou como o animus de concretizar o negócio jurídico, o qual não deve ser presumido.

No vertente caso, a parte autora afirma, categoricamente, que não teria contratado o serviço junto a Instituição ré e que, por tal razão, a negativação de seu nome seria indevida.

De forma contundente, a parte suplicante afirma sua irresignação e discorre que teria suplicado da demandada que comprovasse e demonstrasse, a existência de qualquer negócio jurídico e de fato que pudesse justificar ou dar azo a existência de débito. Entrementes, percebe-se que a organização requerida não acostou aos autos prova que ateste a contratação de qualquer serviço pela parte autora junto a Ré, levando-se a concluir que fora alvo de um estelionatário, argumentação não aceita pela demandada.

Todos os elementos contidos nos autos levam à dicção inquestionável da inexistência do contrato, pois ainda que restasse comprovado a alegação de existência de relação jurídica não há qualquer prova de que a parte acionante solicitara...

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