Capital - 2ª vara de relações de consumo

Data de publicação14 Maio 2020
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição2616
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
2ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
DECISÃO

8049609-31.2019.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Neridal De Souza Pastor
Advogado: Ana Paula Guimaraes Borges (OAB:0025258/BA)
Réu: Bv Financeira Sa Credito Financiamento E Investimento
Advogado: Joao Francisco Alves Rosa (OAB:0017023/BA)

Decisão:

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA

2ª Vara de Relações de Consumo - Salvador

1º Cartório Integrado das Varas de Relações de Consumo de Salvador

Rua do Tingui, s/n, Campo da Pólvora, Fórum Prof. Orlando Gomes, 1º Andar, Nazaré, Salvador - Bahia. CEP 40.040-380.

salvador2vrconsumo@tjba.jus.br / 1cartoriointegrado@tjba.jus.br

Processo n. 8049609-31.2019.8.05.0001


AUTOR: NERIDAL DE SOUZA PASTOR

RÉU: BV FINANCEIRA SA CREDITO FINANCIAMENTO E INVESTIMENTO

Instrumento com força de

MANDADO/CARTA DE CITAÇÃO E INTIMAÇÃO

(Arts. 188 e 277 do CPC)


AÇÃO REVISIONAL. PEDIDO ANTECIPAÇÃO TUTELA. CONTRATO DE MÚTUO/ EMPRÉSTIMO/ FINANCIAMENTO OU ARRENDAMENTO MERCANTIL. APLICAÇÃO DO CDC. RELAÇÃO DE CONSUMO. DETERMINAÇÃO DE ABSTENÇÃO DE ATOS DE COBRANÇA E CONSTRIÇÃO. NÃO INSERÇÃO OU EXCLUSÃO DE DADOS DE CADASTRO DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. GARANTIA DA POSSE AO FIDUCIANTE/ARRENDATÁRIO. CONSIGNAÇÃO DO INCONTROVERSO. AFASTAMENTO DA MORA. COGNIÇÃO SUMÁRIA. DEFERIDA LIMINAR.


NERIDAL DE SOUZA PASTOR, devidamente qualificado(a) na exordial, por seu advogado, ingressou em juízo com a presente AÇÃO REVISIONAL COM PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA, em face de BV FINANCEIRA S/A, instituição(ões) financeira(s) qualificada(s) nos autos, aduzindo em apertada síntese o que segue:

Alega, a parte autora, que teria adquirido e financiado o veículo descrito na exordial, mediante contrato de mútuo, havendo a alienação fiduciária do bem (ou arrendamento mercantil).

Noticia sobre as especifidades da operação bancária, a exemplo do valor contratado, números de parcelas, taxas de juros e demais encargos, assim como discorre sobre montante pago. Traz à colação planilha de cálculo onde estaria evidenciada e demonstrada vantagem exagerada auferida pela instituição-ré.

Salienta que o negócio jurídico foi formalizado por meio de instrumento padronizado, com cláusulas impressas e sem o destaque necessário para as cláusulas que limitam o direito do consumidor, sendo o documento de lavra exclusiva do(s) acionado(s), sem ter tido a parte consumidora qualquer chance de lê-lo ou muito menos discuti-lo.

Argumenta sobre a ocorrência de onerosidade excessiva, exorbitância das taxas de juros, prática de anatocismo (capitalização dos juros), ilegalidade e cumulação de cobrança de comissão de permanência, dentre outras irregularidades.

Pontifica que as cláusulas contratuais são abusivas e ofendem a ordem jurídica, quer na boa-fé, na ordem pública, quer nos bons costumes.

Pugna pela revisão das clausulas contratuais atacadas e suplica pela concessão de medidas de urgência para lhe garantir a posse do bem, a consignação dos valores considerados incontroversos e de óbice de inclusão ou permanência em cadastro de restrição de crédito.

É o que se apresenta, passo a decidir.

Dispõe o legislador pátrio no CPC/2015:

Art. 300. A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

(...)

§ 2º. A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia. (original sem destaques)

No mesmo diapasão, estatuem o §§ 3º e 4º, do art. 84, do CDC:

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

(...)

§ 3° Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

§ 4° O juiz poderá, na hipótese do § 3° ou na sentença, impor multa diária ao réu, independentemente de pedido do autor, se for suficiente ou compatível com a obrigação, fixando prazo razoável para o cumprimento do preceito.

O julgador, no âmbito de análise das medidas de urgência, encontra-se premido pelo fator tempo, devendo se contentar com cognição sumária, pois a cognição exauriente, associada ao tempo fisiológico próprio do processo, poderia levar à completa ineficácia de futura decisão.

Exsurge dos autos, prima facie, que os documentos carreados corroboram as alegações contidas na inicial, deixando evidenciada a existência da compra e venda do automóvel especificado, do contrato de mútuo noticiado e da alienação fiduciária (ou arrendamento mercantil).

Logo, estando o contrato sub judice, necessário se faz a obstacularização da instituição credora em inserir o nome e dados pessoais da requerente nos órgãos de proteção ao crédito e para impedir ou sustar eventual protesto de título, pois esses fatos, irrefragavelmente, criam embaraços a vida contemporânea, onde o crédito significa, maior parte das vezes, a única forma possível do consumidor acessar alguns bens, inclusive aqueles indispensáveis para atender necessidades primárias.

Para assegurar o resultado prático equivalente, no caso dos autos, é imperioso concluir, a priori, que a manutenção da posse do bem com o autor deflui da posse direta que já usufrui como corolário do próprio contrato alienatório. Por isso, razão assiste ao autor quanto à manutenção da posse do bem consigo.

No que pertine à postulação de consignação do valor considerado incontroverso, discriminado nas peças que integram a exordial, a pretensão encontra amparo na legislação, mormente no quanto estampado no art. 330, §§ 2º e 3º, do atual CPC, estando assim vazado o dispositivo em comento:

Art. 330. A petição inicial será indeferida quando:

(...)

§ 2º. Nas ações que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens, o autor terá de, sob pena de inépcia, discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito.

§ 3º. Na hipótese do § 2º, o valor incontroverso deverá a ser pago no tempo e modo contratados.

Com efeito, as medidas de urgência suplicadas de garantia da posse e de óbice a inclusão de dados pessoais em cadastro restritivo ao crédito ou de atos de protestos de títulos e de consignação de valores incontroversos, mostram-se, satisfatoriamente, justificadas porquanto presentes os requisitos previstos para a concessão da tutela de urgência antecipada e, ou provimento de natureza cautelar, uma vez que há nos autos a fumaça do bom direito (fumus boni iuris), bem como se destaca a relevância do fundamento da demanda e a plausibilidade do direito invocado pela parte, e, também por estar estampado o perigo da demora (periculum in mora), representado no receio de ineficácia do provimento final e no risco de danos irreparáveis.

Diante do exposto, além do mais que dos autos consta, com fundamento nos arts. 300 e 330 do CPC/2015, c/c os arts. 4º, 6º e 84, §§ 3º e 4º do CDC, DEFIRO AS MEDIDAS DE URGÊNCIA PLEITEADAS, para: i) determinar que a(s) instituição(ões) ré(s) se abstenha(m) de protestar os títulos oriundos do negócio jurídico vergastado e/ou incluir o nome e dados pessoais do(a)(s) autor(a)(es) em cadastro de restrição, v.g. SERASA e SPC, ou acaso já incluídos nome(s) e dados, para que proceda a exclusão no prazo de 48 horas, sob pena de multa diária no valor de R$ 1.000,00 (um mil reais), limitada até o valor atribuído à causa pelo demandante; ii) garantir a posse do bem a(o) autor(a), até ulterior deliberação, sob pena de multa, no tocante a esta tutela inibitória, consistente no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais), por evento de turbação ou esbulho à posse deferida, além de multa diária de R$ 1.000,00 (um mil reais), em caso de continuidade de turbação e esbulho, igualmente limitada ao valor atribuído à presente causa.

Todavia, ficam condicionadas as medidas de urgência concedidas aos depósitos/consignação das parcelas vencidas no prazo de 10 (dez) dias e as vincendas no tempo e modo previstos no negócio jurídico, devendo-se observar neste quadrante os valores incontroversos.

Expeça-se mandado de manutenção de posse em favor do(a) autor(a), bem como, para maior efetividade desta decisão e obedecendo-se ao princípio da cooperação, oficiem-se os órgãos responsáveis pelos cadastros de restrição ao crédito, para, imediata exclusão dos dados pessoais do(a) acionante. Destacando-se que tal postura não exime a instituição ré do cumprimento do quanto aqui determinado e dos efeitos de eventual inércia (v.g. multa coercitiva).

DEFIRO A GRATUIDADE JUDICIÁRIA, o que faço com espeque nos Arts. 98 e 99 do CPC, c/c a Lei n.º 1060/50, arrimado nas declarações do autor e sob a égide da presunção legal que milita em seu favor.

INVERSÃO DO ONUS DA PROVA: Preconiza o legislador constituinte que a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social observado dentre outros princípios o concernente a defesa do consumidor. Assim como estabelece na lex legum entre os direitos e garantias fundamentais, vide Art. 5º, Inc. XXXII, que o estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor. O ordenamento pátrio tem a disciplinar as questões que envolvem a relação de consumo a Lei 8078/90, denominada Código de defesa do Consumidor. Disciplina a norma infraconstitucional mencionada...

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