Capital - 20ª vara de relações de consumo

Data de publicação04 Outubro 2021
Gazette Issue2954
SectionCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
20ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8104021-72.2020.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Lua Souza Oliveira
Advogado: Monique Lino Dos Santos (OAB:0037000/BA)
Reu: Apple Computer Brasil Ltda
Advogado: Joao Augusto Sousa Muniz (OAB:203012A/SP)
Reu: Global Distribuicao De Bens De Consumo Ltda.
Advogado: Jacques Antunes Soares (OAB:0075751/RS)

Sentença:

PROCESSO: 8104021-72.2020.8.05.0001

CLASSE: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7)

ASSUNTO: [Indenização por Dano Moral, Inclusão Indevida em Cadastro de Inadimplentes]

AUTOR: LUA SOUZA OLIVEIRA

REU: APPLE COMPUTER BRASIL LTDA, GLOBAL DISTRIBUICAO DE BENS DE CONSUMO LTDA.



SENTENÇA


Vistos.

LUA SOUZA OLIVEIRA ingressou em Juízo com a presente AÇÃO DE INDENIZAÇÃO contra APPLE COMPUTER BRASIL LTDA E GLOBAL DISTRIBUIÇÃO DE BENS DE CONSUMO LTDA (LOJA IPLACE), todos devidamente qualificados nos autos, após requerer assistência judiciária gratuita, aduziu que adquiriu em Portugal no dia 22/05/2019 um Iphone XS no valor de R$5.281,92 (cinco mil, duzentos e oitenta e um reais e noventa e dois centavos).

Informa que no dia 24/02/2020 estava brincando na piscina infantil com seu primo e deixou o aparelho celular cair, contudo, de imediato retirou-o da água, mas ainda assim parou de funcionar.

Relata que levou a uma assistência três dias depois e foi comunicado acerca da exclusão da cobertura por ter sido constatado a exposição do aparelho a uma substância liquida.

Requer, a condenação dos réus a devolução do valor pago, além de indenização pelos danos morais, bem como custas e honorários.

Instruiu a exordial com documentos.

Decisão de ID 74773906, inverteu o ônus da prova.

Regularmente citado, o 1º réu APPLE COMPUTER contestou o feito no ID 79297660, oportunidade em que alegou a exposição do produto à água, além da capacidade de resistência estabelecida pelo fabricante, condição esta apta a excluir a garantia concedida ao adquirente. Rechaçou o dano moral e pugnou pela inteira improcedência dos pedidos da exordial em todos os seus termos.

O requerido instruiu sua peça contestatória com documentos.

O 2º acionado GLOBAL DISTRIBUIÇÃO contestou o feito no ID 79565639, oportunidade em que também arguiu a preliminar de ilegitimidade passiva. No mérito, aduziu também a comprovação de causa excludente de cobertura contratual consistente na exposição prolongada do produto a substância líquida. Pugna pela inteira improcedência dos pedidos da exordial em todos os seus termos.

Documentos anexados à contestação.

Réplica de ID 80285827.

Decisão de ID 97846108, declarou o julgamento antecipado da lide.

RELATADOS. DECIDO.

Em preliminar, arguiu a 2ª ré a sua ilegitimidade passiva, a qual refuto porque tendo ela recebido o aparelho para reparos e apresentado o laudo embasador da recusa de cobertura da garantia pela fabricante, insere-se, por consequência, na cadeia de consumo, consoante preconiza a teoria da asserção e, portanto, deve figurar no polo passiva da demanda indenizatória.

Nesse sentido, é o entendimento dominante:

APELAÇÃO. AÇÃO DE RESSARCIMENTO C.C. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. Pretensão deduzida com fundamento em vício de produto consistente em aparelho celular. Sentença de extinção, por ilegitimidade passiva da assistência técnica corré, e parcial procedência quanto à vendedora e fabricante, restrita ao acolhimento do pedido de restituição do valor pago. Insurgência do autor, pugnando pelo reconhecimento da legitimidade passiva da assistência técnica corré e pagamento de indenização por danos morais. Trânsito em julgado quanto à restituição do valor pago pelo bem. Legitimidade passiva da assistência técnica corré reconhecida, por ter recebido o aparelho para reparos, inserindo-se assim na cadeia de fornecimento, conforme preconiza a teoria da asserção. Hipótese de imposição ex vi legis do ônus probatório quanto à inexistência do defeito do produto ao fornecedor. Rés que demonstraram o saneamento dos vícios, bem assim o mau uso do aparelho pelo autor por meio de relatórios técnicos, em evidente cooperação com a elucidação dos fatos. Oportunidade de produção probatória implicitamente desprezada pelo autor. Inobservância do ônus probatório em relação à desqualificação da prova apresentada pelas rés. Inexistência de danos morais passíveis de indenização, mantida a condenação ao ressarcimento da quantia, vedada a reformatio in pejus. Restituição devidamente condicionada à entrega do aparelho. Sentença mantida, com observação. Recurso desprovido, com observação.(TJ-SP - AC: 10068455920188260597 SP 1006845-59.2018.8.26.0597, Relator: Airton Pinheiro de Castro, Data de Julgamento: 30/09/2020, 29ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 30/09/2020)

No mérito, impende destacar, inicialmente, que a relação travada entre autor e réu é consumerista, protegida pelas normas constantes no CDC. Desta forma, tratando-se de relações de consumo, a responsabilidade civil é objetiva, respondendo o fornecedor do produto pelos vicios nele apresentados causados, respondendo por eles, independentemente de culpa (art. 6º, VI e VII do CDC). Nas relações do consumidor regulamentada pela Lei nº 8.078/90, a prova da culpa é plenamente descartável, sendo suficiente a existência do dano efetivo ao ofendido. Colhe-se:

Art. 12. O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

Tais artigos visam, como as demais normas previstas no Código Consumerista, proteger, de forma privilegiada, a parte mais fraca da relação de consumo, visando evitar, claramente, abusos dos comerciantes e fabricantes, ou prestadores de serviços, estes visivelmente mais fortes em relação àqueles.

Vislumbra-se, portanto, que a Lei 8078/90 no tocante à Responsabilidade Civil adotou a teoria da responsabilidade objetiva e a teoria do risco, respondendo o fornecedor de produtos e serviços pelos danos causados, em razão da atividade que realizam, independentemente de culpa.

Ainda segundo a legislação consumeristas, o produto é defeituoso:

§ 1º - O produto é defeituoso quando não oferece a segurança que dele legitimamente se espera, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:

I - sua apresentação;

II - o uso e os riscos que razoavelmente dele se esperam;

III - a época em que foi colocado em circulação.

Logo, para que esteja caracterizada a responsabilidade do fornecedor basta que o consumidor comprove a existência de algumas das situações descritas no dispositivo acima, as quais são potencialmente capazes de desqualificar a segurança depositada no bem adquirido.

Contudo, o Código de Defesa do Consumidor, no intuito de dirimir qualquer discussão mais acalorada, cuidou de estabelecer as causas excludente de responsabilização do fabricante e do fornecedor do produto, seja em razão da situação que não configura defeito, seja em razão de outras circunstâncias. Vejamos:

§ 2º - O produto não é considerado defeituoso pelo fato de outro de melhor qualidade ter sido colocado no mercado.

§ 3º - O fabricante, o construtor, o produtor ou importador só não será responsabilizado quando provar:

I - que não colocou o produto no mercado;

II - que embora haja colocado o produto no mercado, o defeito inexiste;

III - a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.

Com efeito, o fabricante ou fornecedor do produto deverá provar a ocorrência de quaisquer das excludentes legais para que não tenha o dever de ressarcir os danos experimentados pelo consumidor.

Em contestação, as empresas-Rés arguiram em sua defesa que a recusa da garantia foi legítima porque amparada na excludente de contato do aparelho celular com substância líquida além do limite estabelecido pelo fabricante para configurar a resistência à água.

Conforme já salientado alhures, as relações de consumo são baseadas na responsabilidade objetiva do fornecedor e produtor dos produtos e serviço e, sendo assim, para configurar o dever de indenizar basta apenas a prova do defeito do produto, do dano e do nexo de causalidade entre aquele e este.

Esmiuçando o caderno processual, os documentos anexados pelo autor, precipuamente as especificações do aparelho celular adquirido (ID 74669079), qual seja, IPHONE XS, colhidas do próprio site da fabricante https://www.apple.com/br/, a Apple apresenta o iPhone XS como resistente à água, classificado como IP68, segundo a norma IEC 60529 (profundidade máxima de dois metros por até 30 minutos). Essa informação, vale registrar, foi colocada em destaque nas especificações do produto. A ressalva de que danos decorrentes do contato com líquidos não estão incluídos na garantia foi colocada em notas de rodapé da página e em letras minúsculas.

Sobreleva realçar que o produto não vem acompanhado de manual e, para o seu acesso, o comprador deve baixá-lo no site. Lado oposto, o efeito da publicidade do aparelho celular nos meios de comunicação, é justamente a resistência do Iphone XS ao contato com água e imersão, o que é corroborado pelo vídeo colacionado pela autora, nos IDs 74669084 e 746690990.

Nesse cotejo, está evidenciado que a propaganda foi capaz de induzir a erro o consumidor, a respeito da qualidade e/ou propriedades do produto adquirido, de modo que se configura abusiva a exclusão da garantia.

É importante ainda esclarecer que as requeridas não...

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