Capital - 3ª vara de relações de consumo

Data de publicação14 Outubro 2020
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição2718
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
3ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8066874-12.2020.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Emanuela Nunes Freire
Advogado: Emanuela Nunes Freire (OAB:0037129/BA)
Réu: Representação Central Unimed Nacional
Advogado: Antonio Eduardo Goncalves De Rueda (OAB:0016983/PE)

Sentença:

Vistos etc,


EMANUELA NUNES FREIRE , qualificada nos autos, através de seu advogado legalmente habilitado nos autos, propôs AÇÃO OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C DANOS MORAIS, face daREPRESENTAÇÃO CENTRAL UNIMED NACIONAL , alegando que por ordem médica foi pedida a realização de um exame para verificação da ocorrência de glaucoma, contudo quando solicitada a devida autorização ela foi negada pela ré, vindo ela a pagar pelo mesmo e que isso se constitui em dano moral. Requereu a citação do suplicado e a procedência dos pedidos.

O suplicado contestou o feito, onde afirma que o exame solicitado não foi autorizado, porque ele não está na lista da ANS, não sendo utilizado para o diagnóstico da doença indicada no relatório médido. Afirmou que não houve qualquer dano material e moral a ser indenizado e requereu a improcedência dos pedidos da exordial.


A autora apresentou réplica, ratificando os termos da inicial.


Não havendo necessidade de produção de prova testemunhal, passo a julgar antecipadamente a lide.


É o Relatório.


Contrato:


O plano de saúde é uma avença, onde o contratante tem o direito de usufruir de assistência médica em rede própria e/ou credenciada da empresa operadora, mediante pagamento de uma prestação em dinheiro. Caso o contratante necessite de qualquer serviço, previsto no contrato ou em legislação própria, a empresa contratada deverá prestá-lo por meio de sua rede credenciada, sem nenhum ônus financeiro (além da mensalidade) para o consumidor, de acordo com as coberturas e abrangências de seu contrato.


Sendo assim, o direito que surge do contrato de plano de saúde é um direito que resulta do mútuo consenso entre o prestador de serviço de saúde e o contratante, os quais estabelecem direitos e obrigações recíprocas e consensuais.


Observe-se que o contrato de seguro firmado pelo autor e pela requerida é perfeito, pois possui as características jurídicas elementares de contrato desta espécie:


a- é um contrato bilateral, uma vez que gerou obrigações para o segurado e o segurador;


b- é um contrato formal, pois foi feito por escrito para gerar a obrigação e devidamente assinado;


c- é um contrato de adesão, porque ele foi formado com a aceitação do segurado aos termos fixados pela seguradora, sem que houvesse discussão sobre as cláusulas previamente estabelecidas;


d- é um contrato oneroso, porque trouxe prestações e contraprestações, em razão do seu caráter patrimonial, vez que o segurado pagava o prêmio mensal, estando a seguradora obrigada a pagar a indenização, caso ocorresse o risco assumido;


e- é um contrato aleatório, porque houve previsão do risco, que foi assumido pelo segurador, devendo arcar com as despesas médicas e hospitalares acaso seja necessário;


f- é um contrato de boa fé, vez que há uma previsão de que os contratantes foram leais e sinceros em suas declarações, quando firmaram o contrato.


Ademais, note-se que o contrato foi celebrado por partes capazes, envolvendo objeto lícito e obedecendo à forma não proibida por lei. Desta forma, constata-se que o contrato firmado pelas partes é legal e deve ser respeitado pelas mesmas.


Cobertura contratual:


O tratamento solicitado por profissional médico para garantir a saúde da requerente é para verificação da existência ou não de glaucoma, doença prevista no contrato firmado entre as partes.

A ré sustenta a licitude de sua conduta ao argumento de que não há obrigação contratual e nem legal para a autorização do supramencionado tratamento estando ele fora do rol de procedimentos obrigatórios da ANS.

Registro, porém, que o rol de exames e procedimentos considerados obrigatórios pela ANS tem caráter exemplificativo, conforme entendimento já sedimentado pelo STJ:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. PLANO DE SAÚDE. 1. NEGATIVA DE COBERTURA A PROCEDIMENTO CIRÚRGICO SUBSCRITO PELO MÉDICO. EXCLUSÃO CONTRATUAL EXPRESSA E AUSÊNCIA DE PREVISÃO NO ROL DA ANS.

CIRCUNSTÂNCIAS QUE NÃO SE MOSTRAM SUFICIENTES A AFASTAR A OBRIGAÇÃO DE COBERTURA DO PROCEDIMENTO PELO PROFISSIONAL DE SAÚDE. 2. ROL EXEMPLIFICATIVO DA ANS E URGÊNCIA EVIDENCIADA. SÚMULAS 7 E 83/STJ.

3. AGRAVO IMPROVIDO.

1. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, ainda que admitida a possibilidade de o contrato de plano de saúde conter cláusulas limitativas dos direitos do consumidor, revela-se abusiva a que exclui o custeio dos meios e materiais necessários ao melhor desempenho do tratamento de doença coberta pelo plano.

1.1. Ademais, é inadmissível a recusa do plano de saúde em cobrir tratamento médico voltado à cura de doença coberta pelo contrato sob o argumento de não constar da lista de procedimentos da ANS, pois este rol é exemplificativo, impondo-se uma interpretação mais favorável ao consumidor.

2. Por derradeiro, que a recusa indevida pela operadora de plano de saúde à cobertura de tratamento médico emergencial ou de urgência constitui dano moral presumido, como na hipótese em apreço, não havendo que se falar em mero inadimplemento contratual. Súmula 83/STJ.

3. Agravo interno a que se nega provimento.

(AgInt no AREsp 1553980/MS, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/12/2019, DJe 12/12/2019)

Há nos autos relatório médico que fundamenta a necessidade do exame para verificação da existência ou não de glaucoma da autora, ou seja, a doença a ser tratada tem cobertura contratual e portanto deve ser disponibilizado pelo plano de saúde todos os meios de diagnóstico e tratamento solicitados por médicos , já que somente eles podem atestar a necessidade ou não do quanto requerido.

Danos Morais

No que tange ao pedido de danos morais, entendo que a negativa indevida/abusiva de cobertura ao beneficiário do Plano de Saúde constitui ato ilícito capaz de causar ao lesado dano extrapatrimonial, cuja prova prescinde de demonstração cabal (dano in re ipsa). Nesse viés:

PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL.RECURSO MANEJADO SOB A ÉGIDE DO NCPC. PLANO DE SAÚDE. EXCLUSÃO DE COBERTURA. ABUSIVIDADE. CONFIGURADA. PRECEDENTES. DANO MORAL CABIMENTO. QUANTUM DA INDENIZAÇÃO. REVISÃO. IMPOSSIBILIDADE.

PRETENSÃO RECURSAL QUE ENVOLVE O REEXAME DE PROVAS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA Nº 7 DO STJ. RECURSO MANIFESTAMENTE INADMISSÍVEL. INCIDÊNCIA DA MULTA DO ART. 1.021, § 4º, DO NCPC. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO, COM IMPOSIÇÃO DE MULTA. 1. Aplica-se o NCPC a este julgamento ante os termos do Enunciado Administrativo nº 3, aprovado pelo Plenário do STJ na sessão de 9/3/2016: Aos recursos interpostos com fundamento no CPC/2015 (relativos a decisões publicadas a partir de 18 de março de 2016) serão exigidos os requisitos de admissibilidade recursal na forma do novo CPC.

2. Revela-se abusiva a recusa de custeio do medicamento prescrito pelo médico responsável pelo tratamento do beneficiário, ainda que ministrado em ambiente domiciliar. Precedentes.

3. A alteração das conclusões do acórdão recorrido exige reapreciação do acervo fático-probatório da demanda, o que configura óbice da Súmula nº 7 do STJ.

4. Em virtude do não provimento do presente recurso, e da anterior advertência em relação a aplicabilidade do NCPC, incide ao caso a multa prevista no art. 1.021, § 4º, do NCPC, no percentual de 3% sobre o valor atualizado da causa, ficando a interposição de qualquer outro recurso condicionada ao depósito da respectiva quantia, nos termos do § 5º daquele artigo de lei.

(AgInt no AREsp 1285474/DF, Rel. Ministro MOURA RIBEIRO, TERCEIRA TURMA, julgado em 08/10/2018, DJe 10/10/2018)

Como a negativa da ré fora desprovida de qualquer fundamentação contratual e legal (Ordenamento Jurídico) ela praticou ato ilícito e deve indenizar a autora pelo dano moral causado.

Como não há critérios objetivos para a quantificação do valor a ser arbitrado a título de danos, a Doutrina e Jurisprudência observam certos parâmetros, tais como, as peculiaridades do caso concreto (como, por exemplo, o período sem o tratamento adequado), a capacidade econômica das partes, a extensão do dano e o caráter pedagógico e reparatório da medida, devendo-se agir com base na prudência e na moderação.

Conclusão

Ante os fatos aqui explicitados e tudo mais que dos autos constam, , julgo procedente em parte os pedidos constantes da inicial, condenando a ré a devolver os valores dispendidos pela consumidora, devidamente corrigido a contar da data do pagamento com juros de mora de 1% ao mês a contar da citação válida e no pagamento de danos morais no valor de R$ 5.000,00.

Condeno a ré no recolhimento das custas processuais e no pagamento dos honorários advocatícios, estes fixados em 10% do valor da condenação.

Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com a consequente baixa no PJE.


Publique-se. Registre-se. Intimem-se.





SALVADOR , 7 de outubro de...

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