Capital - 5ª vara de relações de consumo

Data de publicação10 Fevereiro 2021
Gazette Issue2797
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
5ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8070147-96.2020.8.05.0001 Tutela Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Requerente: M. L. M. D. S. R. C. C. M. L. M. D. S.
Advogado: Ruy Sergio Nonato Marques (OAB:0004800/BA)
Requerido: F. B. P. D. D. C.
Advogado: Pedro Henrique De Morais Ferreira (OAB:0033825/BA)
Advogado: Sara Vieira Lima Saraceno (OAB:0019487/BA)
Advogado: Gaspare Saraceno (OAB:0003371/BA)

Sentença:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

COMARCA DE SALVADOR-BA

5ª Vara de Relações de Consumo - 1º Cartório Integrado

Rua do Tingui, s/n, Campo da Pólvora, Fórum Prof. Orlando Gomes - 1º andar, Nazare - CEP 40040-380, Fone: 3320-6684, Salvador-BA - E-mail: 5vrconsumo@tjba.jus.br

SENTENÇA

PROCESSO Nº: 8070147-96.2020.8.05.0001

CLASSE-ASSUNTO: [Obrigações] TUTELA CÍVEL (12233)

AUTOR: REQUERENTE: MARIA LUIZA MARQUES DE SOUZA

RÉU: REQUERIDO: FUNDACAO BAHIANA PARA DESENVOLVIMENTO DAS CIENCIAS

I. RELATÓRIO

MARIA LUIZA MARQUES DE SOUZA apresentou embargos de declaração em face da sentença de id 79342014, que julgou improcedentes os pedidos formulados na inicial.

Afirma que há vícios na sentença, posto que a magistrada sentenciante equivocou-se na afirmação de que restou incontroversa a inadimplência da autora, sobre parcelas atinentes as semestralidades 2019.2 e 2020.1, bem como parcelamento de semestres anteriores. Relata que não existia débito anterior, tão-somente o relativo ao semestre 2020.1. Ademais, afirma que é uma conduta habitual da embargada renegociar débitos, no entanto, por conta da pandemia, não conseguiu contato com a instituição, necessitando recorrer ao Judiciário. Pugna pelo acolhimento dos presentes embargos, com atribuição de efeito modificativo ao decisum.

A Ré apresentou resposta aos referidos embargos, pugnando pela manutenção da sentença.

É o relatório. DECIDO.

II. FUNDAMENTAÇÃO

Como sabido, o atual art. 1.022, do NCPC, ampliou a possibilidade de interposição de Embargos de Declaração para acrescentar mais uma forma de manejo dessa via recursal, que já era amplamente aceita pela jurisprudência pátria, a correção de erro material.

O cerne da questão tramita ao redor da efetivação da matrícula da aluna, que tentou parcelar seu débito, mas, por conta da pandemia, não conseguiu contato com a instituição.

Compulsando os autos, verifica-se que a tutela provisória fora cumprida, inclusive tendo a parte autora cumprido com o que fora acordado, qual seja o parcelamento do débito.

Pois bem.

Da leitura atenta da sentença, verifica-se que, de fato, houve acolhimento de premissa equivocada, consistente na existência de débitos da autora perante a instituição, a impedir a confirmação da tutela.

No entanto, bem analisada a documentação, verifica-se que, em verdade, não existia débito preexistente, bem como a autora apenas queria parcelar o semestre 2020.1, a fim de que conseguisse se matricular no semestre posterior, tendo em vista que a comunicação com a instituição restou dificultada por conta da pandemia.

Desta forma, o caso é de acolhimento dos presentes embargos para sanar o equívoco/erro material apontado.

Nesse sentido, vale transcrever alguns artigos da Lei nº 9.870/1999, que dispõe sobre o valor total das unidades escolares e dá outras providências:

Art. 5o Os alunos já matriculados, salvo quando inadimplentes, terão direito à renovação das matrículas, observado o calendário escolar da instituição, o regimento da escola ou cláusula contratual.

Art. 6o São proibidas a suspensão de provas escolares, a retenção de documentos escolares ou a aplicação de quaisquer outras penalidades pedagógicas por motivo de inadimplemento, sujeitando-se o contratante, no que couber, às sanções legais e administrativas, compatíveis com o Código de Defesa do Consumidor, e com os arts. 177 e 1.092 do Código Civil Brasileiro, caso a inadimplência perdure por mais de noventa dias.

§ 1o O desligamento do aluno por inadimplência somente poderá ocorrer ao final do ano letivo ou, no ensino superior, ao final do semestre letivo quando a instituição adotar o regime didático semestral

Diante do exposto, conclui-se que a supracitada norma tem o condão de dar efetividade ao direito à educação garantido na Carta Magna nos artigos 6º e 205, dada a falta de proporcionalidade e razoabilidade da conduta que, pautada por razões patrimoniais, obsta a continuidade de disciplinas em curso letivos.

Nesse sentindo, segue entendimento jurisprudencial:

EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURNÇA - INDEFERIMENTO DE RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA - INICIADO O SEMESTRE LETIVO - ILEGALIDADE - VIOLAÇÃO DO DIREITO À EDUCAÇÃO - LEI 9.870 DE 1999. 1. A negativação da realização de matrícula em semestre seguinte de curso superior decorrente de inadimplência viola o direito líquido e certo do aluno à educação quando comprovadas a renegociação da dívida e a frequência normal às aulas, aos trabalhos e às provas ministrados no semestre letivo. 2. Nos termos do § 1º do art. 6º da Lei 9.870 de 1999, o desligamento do aluno por inadimplência somente ocorrerá "ao final do ano letivo ou, no ensino superior, ao final do semestre letivo quando a instituição adotar o regime didático semestral". 3. Sentença confirmada para manter a segurança.(TJ-MG - Remessa Necessária-Cv: 10000200240364001 MG, Relator: Shirley Fenzi Bertão, Data de Julgamento: 27/05/2020, Data de Publicação: 28/05/2020)

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. REEXAME NECESSÁRIO. ENSINO SUPERIOR - MATRÍCULA - NEGATIVA - ALUNO QUE RENEGOCIOU A DÍVIDA E FREQUENTOU NORMALMENTE O CURSO - CONCESSÃO DA SEGURANÇA - DIREITO LÍQUIDO E CERTO COMPROVADOS - MANUTENÇÃO.

- A negativa de realização de matrícula em semestre seguinte de curso superior decorrente de inadimplência e extemporaneidade viola o direito líquido e certo do aluno à educação quando comprovados o pagamento do débito e a frequência normal às aulas, aos trabalhos e às provas ministrados. (TJMG - Remessa Necessária-Cv 1.0480.11.013760-5/001, Relator (a): Des.(a) Pedro Bernardes , 9ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/03/2018, publicação da sumula em 05/04/2018)

EMENTA: REEXAME NECESSÁRIO - MANDADO DE SEGURANÇA - RENOVAÇÃO DE MATRÍCULA EM INSTITUIÇÃO DE ENSINO SUPERIOR - NEGATIVA - INADIMPLÊNCIA - REGULARIZAÇÃO FORA DO PRAZO - FREQUÊNCIA NO CURSO - DIREITO À RENOVAÇÃO. É inequívoco o direito e líquido e certo do impetrante à renovação da matrícula em instituição de curso superior, considerando que o impetrante não efetuou a renovação da matrícula no prazo estipulado pela instituição de ensino por circunstâncias alheias à sua vontade, e, mesmo após a negativação de renovação continuou frequentando regularmente as aulas. Assim, imperioso o reconhecimento da ilegalidade do ato do impetrado, sob pena de violação do direito constitucional de acesso à educação. (TJMG - Remessa Necessária-Cv 1.0480.15.009751-1/001, Relator (a): Des.(a) Alberto Henrique , 13ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 30/11/2017, publicação da sumula em 13/12/2017)

Nesse contexto, é cediço que, tratando-se de relação de consumo, demonstrada a verossimilhança das alegações autorais ou sua hipossuficiência, o ônus da prova incumbe ao fornecedor dos serviços quanto à inverdade da afirmação da consumidora (artigo 6º, VIII, da Lei 8.078/90), bem como em relação à alegação de existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado pela parte autora (art. 373, II do CPC/2015).

Perlustrando os autos, verifica-se a autora buscou o Judiciário com o intuito de parcelar o débito e assim vem cumprindo o que fora acordado, não estando inadimplente e, consequentemente, cumprindo o requisito para matrícula.

Destarte, tendo em vista que a aluna/autora não está inadimplente, uma vez que pretendia renegociar a dívida do semestre, requisito necessário à renovação da sua matrícula, o que o fez, cumprindo com o que fora determinado na tutela antecipada, entendo que a instituição deve efetivar a matrícula da mesma no 9º semestre.


III. DISPOSITIVO

Ante o exposto e tendo em vista tudo o que dos autos consta, ACOLHO OS PRESENTES EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, com atribuição de efeito modificativo ao julgado, para declarar que a parte dispositiva da sentença passa a ter a seguinte redação:

Ex Positis, e do que mais dos autos consta com fulcro no artigo 93, IX, da Constituição Federal c/c o artigo 487 I do Código de Processo Civil JULGO PROCEDENTES os pedidos formulados na exordial, confirmando a tutela concedida, para determinar que a ré proceda à efetivação da matrícula da autora no 9º semestre do curso de odontologia (2020.2), garantindo sua frequência, participação nas aulas teóricas e/ou práticas e nas avaliações, provas e exames aplicados à turma a que pertence.

Condeno ainda a Ré ao pagamento de custas processuais e honorários advocatícios os quais arbitro em R$ 500,00 por apreciação equitativa (REsp 1696390/SP), quantia que se afigura razoável e proporcionar para remunerar os patronos do réu de forma condigna, com as diretrizes do art. 85, §§ 2º, do CPC e aplicação analógica do quanto consta no §8º do aludido dispositivo legal.

Após o trânsito em julgado, arquivem-se os autos com a consequente baixa no sistema.

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.



Publique-se. Intimem-se. Transitado em julgado, aguarde-se a iniciativa da parte interessada.

SALVADOR,26 de janeiro de 2021.


BELª RITA DE CÁSSIA RAMOS DE CARVALHO

JUÍZA DE DIREITO TITULAR

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