Capital - 5ª vara de relações de consumo

Data de publicação05 Julho 2021
Número da edição2892
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
5ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8159840-91.2020.8.05.0001 Petição Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Requerente: Claudio Lameira
Advogado: Carlos Alexandre Muricy Da Silva (OAB:0042365/BA)
Requerido: Gpb Clube De Beneficios
Advogado: Renato De Assis Pinheiro (OAB:0108900/MG)

Sentença:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

5ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR


PROCESSO N. 8159840-91.2020.8.05.0001

REQUERENTE: CLAUDIO LAMEIRA

Advogado(s) do reclamante: CARLOS ALEXANDRE MURICY DA SILVA

REQUERIDO: GPB CLUBE DE BENEFICIOS

Advogado(s) do reclamado: RENATO DE ASSIS PINHEIRO


SENTENÇA


Vistos e examinados.

CLAUDIO LAMERA opôs a presente ação contra GOL PLUS PROTEÇÃO VEICULAR, conforme fatos e fundamentos expostos na inicial.

Relata o autor que é proprietário do veículo motocicleta HONDA, modelo XRE 300 RALLY ABS, ano 2019/2019, placa policial PLW-5175, adquirido no dia 05/09/2019, pelo valor de R$ 21.390,00.

Destaca que em 05/05/2020 o veículo foi emprestado a um amigo para resolver uma questão pessoal, sendo que foi interceptado por dois meliantes, quando transitava na Rodovia CIA/AEROPORTO, nas proximidades da CEASA, os quais estavam armados, e, sob grave ameaça, roubaram a motocicleta.

Informa que abriu solicitação de pagamento do seguro, perante a ré, enviando a documentação, recebendo posterior negativa, pois, segundo alegações da parte ré, a parte autora não possui CNH que permita conduzir motocicleta, além de ter alegado que a parte autora teria omitido tal informação quando da contratação do seguro de proteção veicular.

Requereu a condenação da ré ao pagamento do prêmio correspondente ao valor de tabela FIPE, de R$19.047,00, referente ao valor do veículo, bem como indenização por danos morais em R$30.000,00.

Gratuidade de acesso à justiça deferida conforme id nº 86348047.

Devidamente citada, a ré apresentou contestação no id nº 98274231. Aduz o réu, preliminarmente, a ausência de relação de consumo, devido a se tratar de mutualismo entre associados e associação. No mérito, aduz que a indenização foi negada em razão de se constatar que o associado não possuía habilitação para conduzir motocicleta. Subsidiariamente, requer ainda o desconto em 20% do valor da indenização, pelo fato do veículo ser utilizado como mototáxi. Nega dano moral a ser indenizado.

O autor manifestou-se no id nº 102812638, ratificando as argumentações iniciais.

Instadas a informar interesse probatório, houve requerimento pelo julgamento antecipado.

É o breve relatório. Passo a decisão.

O feito admite o julgamento antecipado, de acordo com o disposto do art. 355, I, do CPC, não havendo prova a produzir, já que a documentação juntada aos autos é suficiente ao conhecimento da matéria. Por esta razão, encontrando-se o processo apto a receber a resolução do mérito no estado em que se encontra, passo à sua análise.

A ré pretende afastar a relação de consumo.

O Contrato de Seguro é aquele pelo qual uma das partes se obriga para com a outra, mediante o pagamento de determinado valor, a proceder à indenização pelos prejuízos resultantes de riscos futuros e predeterminados (Código Civil, arts. 757 e 760).

A requerida é pessoa jurídica constituída na forma de associação, oferecendo aos associados a reparação de danos em seus veículos, havendo similaridade com as atividades praticadas pelas seguradoras, embora tecnicamente haja divergência em suas operações.

Com efeito, quando as Associações exercem atividades no mercado consumerista, a título oneroso, não será a natureza jurídica delas que excluirá a aplicação das regras de proteção aos Consumidores, pois os critérios para a caracterização dos fornecedores, previstos no transcrito art. 3º, do CDC, são objetivos.

A respeito já se pronunciou o Superior Tribunal de Justiça:

"CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. ENTIDADE SEM FINS LUCRATIVOS. PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS MÉDICOS, HOSPITALARES, ODONTOLÓGICOS E JURÍDICOS AOS ASSOCIADOS. RELAÇÃO DE CONSUMO CARACTERIZADA. APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. RECURSO ESPECIAL. PLANO DE SAÚDE. RECUSA DE TRATAMENTO. DANO MORAL. OCORRÊNCIA. VALOR ARBITRADO MODERADAMENTE. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO. 1. O STJ já decidiu ser irrelevante o fato de a recorrida ser uma entidade sem fins lucrativos, de caráter beneficente e filantrópico, se desempenha atividade no mercado mediante remuneração, para que seja considerada prestadora de serviços regida pelo CDC. (...)."

(AgRg no Ag 1215680/MA, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 25/09/2012, DJe 03/10/2012).

No mesmo sentido ainda:

"AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO. ASSOCIAÇÃO. APLICAÇÃO DO CDC. EVENTO NÃO COBERTO PELO CONTRATO. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. DEVER DE INDENIZAR. INEXISTÊNCIA. Aplica-se ao caso o Código de Defesa do Consumidor, já que a ré, no caso concreto, a despeito de ser uma associação, enquadra-se na definição de prestadora de serviços ao autor, que efetuava pagamentos mensais a troco de proteção a seu veículo. (...)

(TJMG - Apelação Cível 1.0702.11.061204-2/001, Relator (a): Des.(a) Wagner Wilson , 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 27/01/2016, publicação da sumula em 05/02/2016)

PROGRAMA DE PROTEÇÃO AUTOMOTIVA - ASCOBOM - CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR - APLICABILIDADE. A natureza da pessoa jurídica que presta serviços de natureza securitária - associação sem fins lucrativos -, não elide a existência de relação de consumo e, destarte, a aplicação das normas protetivas do Código de Defesa do Consumidor".

(TJMG - Apelação Cível 1.0024.08.280600-1/003, Relator (a): Des.(a) Estêvão Lucchesi, 14ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 04/10/2018, publicação da sumula em 16/10/2018)

Desse modo, deve-se considerar que as associações de proteção veicular estão enquadradas no conceito de fornecedor descrito no art. 3º, § 2º, do CDC, em suas relações com seus associados.

Passo a análise do mérito.

É cediço que, tratando-se de relação de consumo, demonstrada a verossimilhança das alegações autorais ou sua hipossuficiência, o ônus da prova incumbe ao fornecedor dos serviços quanto à inverdade da afirmação da consumidora (artigo 6º, VIII, da Lei 8.078/90), bem como em relação à alegação de existência de fato impeditivo, modificativo ou extintivo do direito alegado pela parte autora (art. 373, II do CPC/2015).

Compulsando os autos verifica-se que o autor contratou os serviços da Ré, com cobertura de conserto do veículo ou indenização, em caso de perda total, incluindo roubo.

A contratação e a subtração do veículo restam incontestes, sendo a negativa da requerida apoiada em descumprimento contratual, pelo autor, por não ser habilitado para condução do veículo.

Entretanto, o fato do segurado não possuir CNH, embora se trate de infração administrativa, não é óbice, por si só, ao pagamento da indenização securitária, sem que haja demonstração de que tal circunstância aumentou e/ou influenciou nos riscos do sinistro que gerou o pleito indenizatório junto à seguradora.

Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SEGURO DE VIDA. ACIDENTE. AUSÊNCIA DE HABILITAÇÃO PARA DIRIGIR ADICIONADA A OUTRAS CAUSAS. AGRAVAMENTO DO RISCO RECONHECIDO PELAS INSTÂNCIAS ORDINÁRIAS. EXISTÊNCIA DE CLÁUSULA CONTRATUAL EXCLUINDO A COBERTURA. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO NÃO PROVIDO. 1. É pacífico no Superior Tribunal de Justiça que a ausência de habilitação para dirigir não configura, por si só, o agravamento intencional do risco por parte do segurado, apto a afastar a obrigação de indenizar da seguradora. 2. In casu, quando adicionada a outros fatores, a falta de habilitação para conduzir motocicleta pode ser utilizada como fundamento para justificar o afastamento de cobertura securitária. 3. Para afastar a cobertura securitária, a Corte de origem, além do fato do condutor não possuir habilitação para conduzir motocicleta, considerou: i) que o caminhão trafegava corretamente na preferencial; ii) que o condutor perdeu o controle da motocicleta e invadiu a pista contrária, colidindo frontalmente com o caminhão; iii) que o contrato de seguro coletivo afastava o pagamento do benefício no caso de condução de veículo sem a devida habilitação. 4. Desse modo, observa-se que a revisão dos fundamentos que ensejaram esse entendimento exigiria a alteração das premissas fático-probatórias estabelecidas pelo acórdão recorrido, com o revolvimento das provas carreadas aos autos, o que é vedado em sede de recurso especial, nos termos do enunciado da Súmula 7 do STJ. 5. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1420275/SC, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 18/06/2019, DJe 25/06/2019)

No presente caso, não se trata de acidente com perda ou avaria no bem, mas de roubo, situação em que a qualificação do motorista (habilitado ou não) se mostra indiferente para a sua ocorrência.

Ademais, conforme informa o autor, corroborado pela certidão de ocorrência policial, no momento do sinistro, a motocicleta era conduzida por condutor habilitado – id nº 86331853.

Registro ainda que incumbia à seguradora no momento da contratação verificar a idoneidade das informações prestadas pelo segurado, prova que, no caso, seria facilmente obtida com a exigência de cópia da habilitação. No entanto, optou a seguradora por só exigir o documento quando da ocorrência de sinistro e análise de pleito indenizatório.

Portanto, devida a condenação da ré para cumprir o contrato de seguro, com o pagamento de indenização ao autor, conforme contratado.

Conforme documento trazido pela parte autora no id nº 86332134, referente ao valor da tabela FIPE...

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