Capital - 5ª vara de relações de consumo

Data de publicação02 Julho 2020
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
Número da edição2646
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
5ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
DECISÃO

8018344-11.2019.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Reginaldo Conceicao Da Silva
Advogado: Renilda Magalhaes Dos Santos (OAB:0043929/BA)
Réu: Banco Yamaha Motor Do Brasil S.a.
Advogado: Fabio Rivelli (OAB:0034908/BA)

Decisão:

PODER JUDICIÁRIO DO ESTADO DA BAHIA

COMARCA DE SALVADOR-BA

5ª Vara de Relações de Consumo - 1º Cartório Integrado

Rua do Tingui, s/n, Campo da Pólvora, Fórum Prof. Orlando Gomes - 1º andar, Nazare - CEP 40040-380, Fone: 3320-6684, Salvador-BA - E-mail: 5vrconsumo@tjba.jus.br

PROCESSO nº : 8018344-11.2019.8.05.0001

Classe-Assunto: PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL (7) - [Contratos Bancários, Interpretação / Revisão de Contrato]

AUTOR: REGINALDO CONCEICAO DA SILVA

RÉU: BANCO YAMAHA MOTOR DO BRASIL S.A.

Cuida-se de Ação Revisional de Contrato, ajuizada por REGINALDO CONCEICAO DA SILVA, devidamente qualificado na inicial, em face do BANCO YAMAHA MOTOR DO BRASIL S.A., também qualificado, sustentando a abusividade dos encargos contratuais constantes de contrato de financiamento de veículo, de modo que requer a declaração de nulidade das cláusulas contratuais, com fixação do quantum debeatur.

Pleiteia a concessão de tutela de urgência para que: a) que o réu seja impedido de anotar os seus dados nos cadastros de proteção ao crédito ou proceda à sua exclusão, caso já o tenha feito; b) seja deferido o depósito judicial mensal da quantia incontroversa; c) seja autorizada a sua manutenção na posse do veículo.

Com a inicial, vieram documentos.

Vieram-me os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

De início, defiro, provisoriamente, o benefício da gratuidade de justiça pleiteado pelo autor.

Dispõe o art. 300 do Código de Processo Civil que a tutela de urgência será concedida “quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.”. Especificamente quanto à relação de consumo, estabelece o Código de Defesa do Consumidor:

Art. 84. Na ação que tenha por objeto o cumprimento da obrigação de fazer ou não fazer, o juiz concederá a tutela específica da obrigação ou determinará providências que assegurem o resultado prático equivalente ao do adimplemento.

§ 3º Sendo relevante o fundamento da demanda e havendo justificado receio de ineficácia do provimento final, é lícito ao juiz conceder a tutela liminarmente ou após justificação prévia, citado o réu.

A respeito das demandas que tenham por objeto a revisão de obrigação decorrente de empréstimo, de financiamento ou de alienação de bens , prevê o §2º, do art. 330, do NCPC, que o autor terá que discriminar na petição inicial, dentre as obrigações contratuais, aquelas que pretende controverter, além de quantificar o valor incontroverso do débito, sob pena de indeferimento por inépcia.

O §3º, do referido dispositivo legal, por sua vez, estabelece que "o valor incontroverso deverá continuar a ser pago no tempo e modo contratados".

Verifica-se que, além das exigências contidas do art. 319 do NCPC, deverá o demandante atentar-se para os requisitos específicos estabelecidos nos dispositivos supramencionados, os quais são decorrência lógica da necessidade de individualização do pedido.

Não é suficiente, pois, que o autor formule o pedido de revisão dos valores inerentes ao contrato, sendo imprescindível que especifique a obrigação que deseja debater, bem como o quantum incontroverso, uma vez que esse deverá continuar a ser pago no tempo e modo contratados no curso do feito.

Ressalte-se que a Corte Superior já havia firmado esse posicionamento em julgamento de recurso repetitivo:


AGRAVO REGIMENTAL. AGRAVO EM RECURSO ESP. DIREITO PROCESSUAL CIVIL E BANCÁRIO. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS DE CONTRATO BANCÁRIO. INCIDENTE DE PROCESSO REPETITIVO. JUROS REMUNERATÓRIOS. CONFIGURAÇÃO DA MORA. JUROS MORATÓRIOS. INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES. DISPOSIÇÕES DE OFÍCIO. (...) ORIENTAÇÃO 4 - INSCRIÇÃO/MANUTENÇÃO EM CADASTRO DE INADIMPLENTES a) A abstenção da inscrição/manutenção em cadastro de inadimplentes, requerida em antecipação de tutela e/ou medida cautelar, somente será deferida se, cumulativamente: i) a ação for fundada em questionamento integral ou parcial do débito; ii) houver demonstração de que a cobrança indevida se funda na aparência do bom direito e em jurisprudência consolidada do STF ou STJ; iii) houver depósito da parcela incontroversa ou for prestada a caução fixada conforme o prudente arbítrio do juiz ; b) A inscrição/manutenção do nome do devedor em cadastro de inadimplentes decidida na sentença ou no acórdão observará o que for decidido no mérito do processo. Caracterizada a mora, correta a inscrição/manutenção. (...)'. (REsp n. 1.061.530/RS, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/3/2009)ECIAL. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO. TUTELA ANTECIPADA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 7/STJ. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. IMPROVIMENTO.

Infere-se da leitura do § 3º, do art. 330 do NCPC, que o simples ajuizamento da ação revisional não tem o condão de suspender a exigibilidade do valores incontroversos (Súmula 380 do STJ), os quais devem ser pagos diretamente ao demandado, na forma prevista no instrumento contratual (ou seja, por meio de boleto, depósito, débito em conta etc.), e nos prazos de vencimento previstos no contrato.

A consignação dos valores em juízo, feita por conta e risco do devedor, não afasta a caracterização da mora e não impede a inclusão do seu nome nos cadastros de inadimplentes, nem tampouco a eventual concessão de liminar de busca e apreensão do bem em sede própria (TJ-SP, AI: 20208161320168260000 SP, 24ª Câmara de Direito Privado, Relator Des. Walter Barone,j. 07/07/2016, Dje 07/07/2016).

Na hipótese dos autos, verifico que não há plausibilidade no direito invocado pelo autor, a autorizar a concessão da medida pretendida em sede de cognição sumária.

Acerca da taxa de juros, o Superior Tribunal de Justiça firmou a tese de que "as instituições financeiras não se sujeitam à limitação dos juros remuneratórios estipulada na Lei de Usura (Decreto 22.626/33)" e editou a Súmula 382, que esclarece "a estipulação de juros remuneratórios superiores a 12% ao ano, por si só, não indica abusividade".

Nada obsta, porém, que se averigue, no caso concreto, se há a incidência de encargos abusivos capaz de colocar o consumidor em desvantagem exagerada.

Nesse aspecto, seria permitida, diante das peculiaridades do caso e da situação de excepcionalidade, a revisão do contrato pelo magistrado. (Tema 27).

Também restaram sumulados os seguintes entendimentos: a) "é permitida a capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano em contratos celebrados após 31.3.2000, data da publicação da Medida Provisória n. 1.963-17/2000 (em vigor como MP 2.170-36/2001), desde que expressamente pactuada" (Súmula 539 do STJ); b) "A previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada" (Súmula 541 do STJ).

No caso, o contrato objeto da lide não consta dos autos, o que inviabiliza a análise acerca dos encargos contratuais incidentes e sua possível abusividade.

Por fim, o autor não indicou na inicial a taxa média do Banco Central para o financiamento contratado.

Nesse sentido, entendo que a análise acerca da abusividade da taxa de juros aplicada e demais encargos demanda a instauração da dialética processual, mediante a oportunização do contraditório e regular instrução probatória.

Saliente-se que não tem sustentação o pedido de depósito do montante incontroverso ou da quantia contratada.

De um lado, constata-se a existência de perigo inverso, pois, se autorizado o depósito tão somente da importância incontroversa, haverá risco de posterior inadimplência do devedor.

De outro, vislumbra-se que, mantido o contrato, com o pagamento das parcelas diretamente ao banco, naturalmente não haverá a inclusão do nome do devedor fiduciante nos órgãos de proteção ao crédito, mostrando-se inócuo o requerimento de tutela de urgência.

É que, acaso reconhecida, ao final, a procedência do pleito autoral, a instituição financeira, que é dotada de alto poder econômico, tem condições de propiciar a restituição das quantias eventualmente pagas a maior, o que não se verifica em sentido contrário.

É preciso esclarecer que o deferimento de tutela de urgência em casos como o posto aos autos tem se mostrado contraproducente, uma vez que as teses descritas acima vem sendo consideradas na sentença, o que determina, muitas vezes, a revogação da tutela de urgência com expedição de alvará para o réu diante dos valores depositados em juízo desde o deferimento da medida, mobilizando servidores, juiz e a instituição financeira guardiã do depósito.

Em outras palavras, consigno que a concessão da tutela, nesses casos, encarece o Judiciário e tumultua o processo, eis que demanda a expedição de alvarás em diversas oportunidades no curso do feito, maior cautela do magistrado na liberação de quantias, inclusive após a sentença, além de dificultar o próprio procedimento interno de controle e apuração promovido pela instituição bancária, sem contar as inúmeras petições que são juntadas aos autos comunicando o depósito de valores.

Sendo assim, INDEFIRO A TUTELA DE URGÊNCIA pleiteada.

Tendo em vista a situação de vulnerabilidade do consumidor, autorizo a inversão do ônus da prova, nos termos do art. 6º, VIII, do CDC, para determinar que o réu apresente o contrato assinado pelas...

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