Capital - 7ª vara de relações de consumo

Data de publicação22 Setembro 2021
Número da edição2946
SeçãoCADERNO 2 - ENTRÂNCIA FINAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
7ª VARA DE RELAÇÕES DE CONSUMO DA COMARCA DE SALVADOR
SENTENÇA

8049331-93.2020.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Simone De Oliveira Cruz Dos Santos
Advogado: Maria Luane Santos Cruz (OAB:0058577/BA)
Reu: Banco Bradescard S.a.
Advogado: Fernando Augusto De Faria Corbo (OAB:0025560/BA)
Advogado: Jose Antonio Martins (OAB:0031341/BA)

Sentença:

Vistos, etc...

SIMONE DE OLIVEIRA CRUZ DOS SANTOS, já qualificada nos autos, através de advogada devidamente constituída, propôs AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO c/c INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS, com PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA, contra BANCO BRADESCARD S/A, também qualificado na exordial, aduzindo, em síntese, o que se segue.

Relatou a parte demandante que, ao tentar realizar uma operação financeira em estabelecimento comercial desta cidade, teve sua proposta negada em virtude da existência de anotações restritivas de crédito em seu nome.

Informou, também, que, após realizar consulta de seu CPF perante órgão de proteção ao crédito, foi surpreendida com a notícia de existência de uma anotação promovida pela empresa ré referente a uma suposta dívida a si pertencente.

Todavia, aduziu a demandante jamais haver contraído dívidas com o banco acionado.

Relatou, ainda, haver sido abordada por prepostos da instituição ré, obrigada a assinar alguns papéis, todavia nunca teria usado o cartão de crédito ofertado.

Ressaltou a postulante que, em decorrência do ocorrido, sofreu constrangimento indevido, ficando impedida de efetuar transações bancárias, o que lhe causou transtornos financeiros e psicológicos.

Em face do exposto, requereu a concessão de tutela antecipada, para que fosse determinada a retirada de seu nome e CPF do cadastro dos maus pagadores, pugnando em sede definitiva pela procedência da demanda com a declaração de inexistência da dívida e condenação do acionado ao pagamento de danos morais em valor a ser arbitrado por este juízo.

Em decisão inaugural, foram concedidos à autora os benefícios inerentes à assistência judiciária gratuita, tendo este juízo indeferido o pleito antecipatório.

Devidamente citada, a instituição demandada apresentou contestação, arguindo, em sede de mérito, a efetiva existência da relação jurídica que ensejou a negativação decorrente de cartão de crédito de titularidade da demandante, bem como a licitude desta em virtude da existência de débito em nome da autora.

Alegou, ainda, a existência de transações regulares no mencionado cartão de crédito, tanto relacionadas a compras diversas, como também pagamentos mensais efetuados pela autora, pugnando, ao final, pela improcedência da demanda.

A parte ré ainda promoveu a juntada de documentos relacionados à avença firmada entre as partes, nos quais consta inclusive a assinatura da demandante, bem como a cópia do RG.

Intimada para manifestar-se sobre a peça contestatória e documentos, a parte autora apresentou réplica, reiterando pela inexistência do débito.

É o relatório. Decido.

Trata-se de hipótese de julgamento antecipado da lide, sendo desnecessária a produção de prova em audiência, face à ocorrência da hipótese prevista no art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil.

Destarte, inexiste qualquer vício decorrente do julgamento antecipado da lide, pois desnecessária qualquer produção de provas já que o mérito da causa depende de análise estritamente jurídica.

Nesse sentido, o pretório excelso já decidiu que "...o julgamento antecipado da lide, quando a questão proposta é exclusivamente de direito, não viola o princípio constitucional da ampla defesa e do contraditório...".

O E. Superior Tribunal de Justiça, na mesma direção, já decidiu que "...constantes dos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente a controvérsia...".

Adentrando ao meritum causae, propriamente dito, constato tratar-se de pretensão formulada pela parte autora no intuito de declarar a inexistência de uma dívida por ela não reconhecida.

Inicialmente, importante salientar que, nas ações declaratórias negativas, em virtude de sua essência, no que concerne ao ônus da prova, a responsabilidade na comprovação do fato constitutivo do direito do autor recai sobre o réu, uma vez que, no plano fático, dificilmente a parte autora lograria êxito em demonstrar que determinada relação jurídica não ocorreu.

Sobre o tema, confiram-se os ensinamentos do i. doutrinador Celso Agrícola Barbi:

"...Com a ação declaratória negativa, verificou-se que nem sempre o autor afirma ter um direito, porque nela, pelo contrário, o autor não afirma direito algum, e apenas pretende que se declare a inexistência de um direito do réu. Assim, a distribuição do ônus da prova não pode ter como referência a posição processual de autor ou de réu, mas sim, a natureza do fato jurídico colocado pela parte como base de sua alegação.

Desse modo, na ação declaratória negativa da existência de um débito, o autor não tem o ônus de provar a inexistência do fato constitutivo do aludido débito. O réu, pretenso credor, é que deverá provar esse fato. Ao autor, nesse caso, incumbirá provar o fato impeditivo, modificativo ou extintivo do mesmo débito, que porventura tenha alegado na inicial..." (Comentários ao Código de Processo Civil, Ed. Forense, 1998, vol. I, pág.80)

No mesmo sentido, leciona José Rubens Costa:

"...Em princípio, nas ações declaratórias negativas, da inexistência de relação jurídica ou de falsidade de documento, o ônus da prova do fato constitutivo não pode ser atribuído ao autor, o que seria um contra-senso, uma vez que a causa de pedir é justamente não haver o fato constitutivo... Assim, nas declaratórias negativas ao réu é que se incumbe provar a existência da relação jurídica..." (Tratado do Processo de Conhecimento, Ed. Juarez de Oliveira, 2003, pág.723)

E, desse ônus de prova, verifico que, satisfatoriamente, se desincumbiu a demandada.

In casu, o que se extrai do contexto probatório dos autos é que, ao revés do quanto alegado pela parte autora, as partes litigantes mantinham relação jurídica, sendo a demandante titular de cartão de crédito emitido do banco acionado e tendo firmado instrumento contratual com a instituição financeira, no qual constam todos os dados da acionante, inclusive sua assinatura.

Ressalte-se que a instituição bancária ré, além de ter apresentado a proposta de adesão firmada pela autora, juntou cópias do RG e CPF desta, todos no ID 72625460.

Destaque-se, ainda, que a documentação acostada pela ré demonstrou a existência de movimentações cotidianas tais como pagamento e compras que comprovam o uso efetivo utilização regular do cartão de crédito descaracterizando a alegação de fraude sugerida na exordial.

Em suma, a parte requerida produziu a prova que se espera de uma empresa que presta serviços de sua natureza. Constata-se que a ré tomou todas as cautelas possíveis e necessárias para evitar a ocorrência de fraude na contratação, bem como apresentou faturas de consumo relacionadas ao contrato.

Percebe-se que a demandada cumpriu com seu ônus probatório (artigo 373, inciso II do CPC), trazendo fatos e documentos, o que confere verossimilhança à tese de que as partes mantiveram uma relação contratual, restando comprovada a origem da dívida.

Nesse sentido já vem decidindo a jurisprudência pátria:

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. DÉBITO ORIGINÁRIO DE DÍVIDA CONTRAÍDA POR CARTÃO DE CRÉDITO. CONSUMIDORA QUE UTILIZOU O CARTÃO POR DIVERSOS MESES. PAGAMENTO DE VÁRIAS FATURAS. DESCARACTERIZAÇÃO DA POSSÍVEL FRAUDE. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA E DA INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. NÃO CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO DEVER DE INDENIZAR. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 186 E 927 DO CÓDIGO CIVIL. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. PRECEDENTES. - A obrigação de indenizar assenta-se na demonstração do fato ilícito, da existência do dano efetivo, do nexo de causalidade entre ambos e, ainda, quando subjetiva, da culpa ou dolo, pressupostos que, se não demonstrados, afastam a responsabilidade civil; - Não caracterizada a ilicitude da conduta, resta afastado o dever de indenizar. (TJ-RN - AC: 20160112696 RN, Relator: Desembargador João Rebouças., Data de Julgamento: 04/10/2016, 3ª Câmara Cível)

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÍVIDA C/C REPARAÇÃO POR DANOS MORAIS. DÉBITO ORIGINÁRIO DE DÍVIDA CONTRAÍDA POR CARTÃO DE CRÉDITO. CONSUMIDOR QUE UTILIZOU O CARTÃO POR DIVERSOS MESES. PAGAMENTO DE VÁRIAS FATURAS. DESCARACTERIZAÇÃO DA POSSÍVEL FRAUDE. LEGITIMIDADE DA COBRANÇA E DA INSCRIÇÃO NOS ÓRGÃOS DE PROTEÇÃO AO CRÉDITO. NÃO CONFIGURAÇÃO DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS AO DEVER DE INDENIZAR. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 186 E 927 DO CÓDIGO CIVIL. CONHECIMENTO E PROVIMENTO DO RECURSO. RECURSO ADESIVO PREJUDICADO. PRECEDENTES. - A obrigação de indenizar assenta-se na demonstração do fato ilícito, da existência do dano efetivo, do nexo de causalidade entre ambos e, ainda, quando...

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