Capital - 9� vara c�vel e comercial

Data de publicação13 Julho 2023
Número da edição3371
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
9ª V CÍVEL E COMERCIAL DE SALVADOR
INTIMAÇÃO

8063912-45.2022.8.05.0001 Procedimento Comum Cível
Jurisdição: Salvador - Região Metropolitana
Autor: Maria Bernadete Silva Dos Anjos Andrade
Advogado: Leonardo Coelho Mendes (OAB:BA27496)
Reu: Cassi-caixa De Assistencia Dos Funcionários Do Banco Do Brasil
Advogado: Rodrigo De Sa Queiroga (OAB:DF16625)

Intimação:

Vistos etc.

Trata-se de ação de obrigação de fazer cumulada com indenização por danos morais, proposta por MARIA BERNADETE SILVA DOS ANJOS ANDRADE em face da CASSI-CAIXA DE ASSISTÊNCIA DOS FUNCIONÁRIOS DO BANCO DO BRASIL, todos devidamente qualificados na inicial, em que a autora informa ser beneficiária do plano de saúde oferecido pela ré, cuja mensalidade e cotas de coparticipação são descontadas diretamente em seu contracheque.

Sustenta a autora que tem 67 anos e foi diagnosticada com câncer de pulmão e linfonodos desde dezembro de 2020, tendo iniciado tratamento com quimioterapia, radioterapia e imunoterapia.

Afirma que os exames posteriores indicaram a progressão da doença na fossa supraclavicular direita e no sistema nervoso central, configurando, pois, metástase do câncer no cérebro.

Em razão da gravidade do seu quadro clínico, o médico oncologista que a acompanhava entendeu pela necessidade de radiocirurgia por Gamma Knife, todavia, não obstante ter formulado requerimento junto à demandada para cobertura do referido procedimento cirúrgico, o plano de saúde não respondeu.

Aduz a autora que necessita, similarmente, de tratamento medicamentoso com o fármaco osimertinibe. Segundo informa, este seria o tratamento mais adequado, além de ter sido recomendado pelo oncologista que a acompanhava. Protocolou pedido administrativo visando à obtenção do fármaco, o que foi negado pela demandada.

Por essas razões, requer, liminarmente, que seja obrigada a ré a custear a realização do procedimento de RADIOCIRURGIA POR GAMMA KNIFE e exames exigíveis a esse procedimento de maneira imediata, junto ao Instituto de Neurologia de Curitiba (INC); a fornecer, a cada 25 dias, 1 caixa contendo 30 comprimidos do medicamento osimertinibe, enquanto houver prescrição médica para tanto, e que seja a ré condenada a ressarcir-lhe os valores despendidos no tratamento em questão, sob pena de multa diária no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). No mérito, que seja confirmada a liminar, declarando-se a obrigação da ré no custeio do tratamento de que precisa, bem como indenização por danos morais (id.198786807).

A inicial veio instruída com os documentos de id.198788709 e seguintes.

Concedi, em parte, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, na qual obriguei a acionada a custear, via sistema de reembolso - respeitados os limites estabelecidos contratualmente - o tratamento de que ela, autora, necessitava, a ser realizado no estabelecimento médico de id. 198788717, bem como a fornecer à autora, no prazo de 3 dias, o fármaco osimerinibe, em quantos ciclos necessários fossem ao tratamento de que ela necessitava (id.199655676).

A parte interpôs embargos de declaração (id. 20114891), contra a decisão que concedeu em parte a liminar (id. 201114891).

Em id. 201729312, a ré informa o cumprimento da medida deferida.

A ré apresentou contestação (id. 205826911), acompanhada dos documentos de id. 205826912 e id. 205826913, na qual impugnou o valor da causa e afirmou o fiel cumprimento da medida liminar determinada. No mérito, sustentou a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor ao caso em virtude da natureza jurídica da CASSI. Aduziu que, em se tratando de uma associação sem fins lucrativos, não há desequilíbrio contratual entre as partes ou na norma que restringe a cobertura, pois tal fato estaria amparado no tratamento legal diferenciado que a associação possui. Alegou, ainda, que em decorrência das restrições legais e regulamentares de sua atuação, esta não se encontraria no mercado de consumo, razão pela qual sustentou a inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor.

Afirmou que o custeio integral dos pedidos é superior ao limite previsto na tabela geral do auxílio, violando o contrato de plano de saúde pactuado entre as partes, e ainda, que o medicamento osimertinibe apenas possui fornecimento obrigatório em casos de tratamento de primeira linha de pacientes com câncer de pulmão de não pequenas células, o que, segundo afirma, não se amolda ao caso da autora.

Ao final, afirmou a inexistência de fatos ensejadores de reparação por dano moral e pugnou pela improcedência dos pedidos.

Houve réplica (id. 215559592).

Instadas a manifestar interesse na produção de outras provas (id. 217483838), a parte ré pugnou pela expedição de ofício à ANS para esclarecimento de informações; enquanto a parte autora requereu o julgamento antecipado da lide.

Em decisão de id. 2217483838, rejeitei os embargos de declaração interpostos, indeferi o pedido de expedição de ofício e anunciei o julgamento do processo no estado em que se encontra.

É O RELATÓRIO. DECIDO.

Passo, de logo, à análise da única preliminar suscitada pela ré, de incorreção do valor da causa.

Atinente ao valor atribuído à causa, sorte não é reservada à ré, uma vez que fora atribuído valor correspondente ao conteúdo patrimonial em discussão, sendo correto, pois, conferir à causa valor proporcional ao proveito econômico perseguido pela autora, situação que vislumbro no caso ora em análise, uma vez que, pelo que se extrai do acervo dos autos, o proveito econômico a ser obtido na demanda contempla o custeio de tratamento médico, o fornecimento de medicação auxiliar, bem como a indenização pelo dano moral que alega ter sofrido.

Nesse contexto, afigura-se razoável o valor ora atribuído à causa, de R$105.000,00 (cento e cinco mil reais) com a observação de que tal valor corresponde ao montante total do proveito econômico perseguido pela parte autora. REJEITO-A, pois.

No mérito, duas, em resumo, são as questões controvertidas entre as partes: se a ré está obrigada a custear o tratamento médico (fornecimento do fármaco e custeio da radiocirurgia) de que necessita a autora, e se a negativa de cobertura foi capaz de ocasionar-lhe danos morais a serem indenizados.

Do acervo probatório acostado aos autos, vislumbro que a autora é beneficiária do plano de saúde oferecido pela ré e, conforme relatórios e exames de id. 198788717, foi diagnosticada com adenocarcinoma de pulmão (adenocarcinoma de não pequenas células, CID C34), com inúmeras lesões de caráter metastático, as quais acarretaram lesões secundárias no encéfalo (id. 198788720).

Em virtude da gravidade do seu quadro clínico, com risco das patologias evoluírem com complicações neurais, foi-lhe indicada a realização do tratamento RADIOCIRURGIA POR GAMMA KNIFE descrito no relatório de id. 198788717, em caráter emergencial.

Não obstante a obtenção do medicamento ser fundamental para preservar a saúde da beneficiária, bem com a realização do tratamento, a demandante ficou impedida de se submeter ao medicamento em virtude de negativa da ré, o que só fora autorizado após a concessão da tutela de urgência (id. 199655676).

Nesse contexto, não pairam dúvidas quanto às complicações existentes no quadro clínico da autora, sendo inconteste que o medicamento e tratamento por ela buscados e prescritos por indicação médica, visam à preservação da sua saúde e da sua vida, diante do risco de evolução das patologias e de complicações neurais.

Nesse sentido de proteção à vida humana, assim determinou a Lei 9.656/98: “Art. 35-C. É obrigatória a cobertura do atendimento nos casos: (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009): I - de emergência, como tal definidos os que implicarem risco imediato de vida ou de lesões irreparáveis para o paciente, caracterizado em declaração do médico assistente; (Redação dada pela Lei nº 11.935, de 2009); (...).”

Ressalte-se que ao Estado-Juiz não cabe discutir e nem discordar da autoridade médica, quando por ela determinado este ou aquele procedimento, com a melhor opção para o portador da patologia.

Registro, ainda, o relevante conteúdo social envolvido no contrato de plano de saúde, de modo a se conceder à autora, parte mais vulnerável na relação jurídica, efetiva proteção aos seus direitos e a obtenção de efetividade dos serviços contratados, que, em última análise, têm por escopo a preservação da saúde e integridade física do contratante.

Na hipótese em comento, a assertiva da ré de que não há previsão contratual, e de que sequer constam do rol de procedimentos da ANS o tratamento e o medicamento indicados pelo profissional médico que assiste a autora não devem prosperar. Com efeito, não cabe à operadora do plano de saúde a escolha da técnica e materiais necessários ao ato cirúrgico, incumbência do médico que acompanha o paciente.

Concluo, por esses motivos, que, no caso em exame, a negativa de manutenção do tratamento, mesmo após envio de relatório à ré, mostrou-se ilegítima, tendo em vista que o tratamento indicado era fundamental para assegurar a saúde e a qualidade de vida da beneficiária do plano de saúde, evitando lesões irreversíveis e a progressão das enfermidades que lhe acometia.

Suficientemente demonstrada, portanto, a ilicitude da recusa de cobertura no caso...

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