Capítulo 1 - Premissas fundamentais

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Capítulo 1
PREMISSAS FUNDAMENTAIS
1.1 Vida, informação e interação com o meio. 1.2 Instinto. 1.3 Cog-
nição, linguagem e racionalidade. 1.4 Ser humano, valores morais e
Direito. 1.5 Conhecimento e inteligência articial.
1.1 VIDA, INFORMAÇÃO E INTERAÇÃO COM O MEIO
Os seres vivos têm mecanismos que permitem a interação das
partes que os compõem, entre si e com o ambiente ao seu redor. Isso
pressupõe a possibilidade de a certos estímulos corresponderem
determinadas reações. Procurar luz, água ou alimentos e evitar tempe-
raturas extremas são os exemplos mais evidentes de comportamentos
destinados a aumentar as chances de sobrevivência do organismo, e
que pressupõem uma relação das partes que integram o organismo
entre si, e do conjunto por elas formado com o ambiente circundante.
Para que essa interação ocorra, logicamente, ao ser vivo é preciso
conhecer a situação das partes que o compõem e esse ambiente no
qual está situado, tornando possível a tomada de posição diante dele.
Não há como se evitar o calor extremo se não se está de algum modo
informado da temperatura ambiente e do limite a partir do qual ela
passa a ser perigosa à manutenção da vida, por exemplo, assim como
não se pode buscar alimento se não se sabe que o organismo está
precisando dele, e onde ele pode ser encontrado.
A palavra conhecer, por enquanto, está sendo propositalmente
usada em uma acepção muito ampla. É nesse sentido que se diz que
uma bactéria sabe quando está sendo atacada e conhece meios para
enfrentar a ameaça; o sentido é semelhante quando se cogita de um
carro – que sabe estar com pouco combustível e acende uma luz no
painel para informar isso ao motorista –, ou do computador – que
sabe que a impressora está com pouca tinta e o informa ao usuário
por meio de um aviso na área de trabalho. Inexiste, evidentemente,
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DIREITO E SUA CIÊNCIA • Hugo de Brito MacHado Segundo
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consciência, há apenas mecanismos que permitem a reação adequada
a determinado estímulo,1 ou, por outras palavras, que emprestam
consequências às informações obtidas.
No que tange aos seres vivos, nesse nível mais elementar, in-
formações são registradas,2 armazenadas e transmitidas por meio
do código genético, no qual se acham as instruções em torno do
funcionamento do organismo e de como deve ocorrer sua interação
com o meio que o circunda. É no DNA que se acham registradas as
instruções sobre como o organismo deve ser construído e posto em
funcionamento, tudo decorrência de milhões de anos de seleção
natural.
Vale recordar, aqui, noções básicas de biologia, em função das
quais se sabe, v.g., que se as bactérias de determinada espécie têm
diferentes graus de resistência ao calor, e o ambiente no qual vivem
se torna mais quente, gradualmente aquelas com maior resistência
ao calor terão mais chances de sobreviver e de gerar descendência
igualmente mais resistente, dando-se o inverso com as menos resis-
tentes. Ao longo de um signif‌icativo número de gerações, todas as
bactérias sobreviventes serão mais resistentes ao calor, tornando-se
aptas a melhor enfrentá-lo. Essa é a razão pela qual os organismos
parecem tão bem adaptados ao meio em que vivem, tendo os ursos
polares cor semelhante à da neve que os rodeia e bastante gordura e
pelos para se protegerem do frio, e as raposas do deserto cor amare-
lada, semelhante à da areia abundante em seu meio, além de grandes
orelhas por meio das quais dissipam o calor de seu corpo, apenas
para citar dois exemplos.
1. Por adequada, no caso de objetos como carros, computadores, máquinas etc., enten-
de-se aquela desejada por quem os projetou. A consequência dada pelo sistema ao
estímulo é adequada no sentido de que é aquela pretendida pelo criador do sistema.
Em relação aos seres vivos, naturalmente, por adequada compreende-se aquela reação
que incrementa as chances de sobrevivência e reprodução do indivíduo que a adota, e
que por isso mesmo é naturalmente selecionada, em meio a muitas outras que condu-
ziam a consequências inadequadas ou inócuas à sobrevivência e por isso mesmo não
são naturalmente selecionadas. Conf‌ira-se, a propósito: Richard Dawkins. O maior
Espetáculo da Terra: as evidências da evolução. Trad. Laura Teixeira Motta, São Paulo,
Companhia das Letras, 2009, p. 50 e ss.
2. Cf. Adam Rutherford. Criação: a origem da vida/o futuro da vida. Trad. Maria Luiza X.
de A. Borges, Rio de Janeiro, Zahar, 2014, passim. Para uma abordagem do assunto no
âmbito da Epistemologia Jurídica, veja-se: Enrique R. Aftalión, José Vilanova, Julio
Raffo. Introducción al Derecho. Buenos Aires, Abeledo-Perrot, 2004, p. 41-47.
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