Casa de escravo na paisagem mineira: textos e imagens

AutorJuliana Prestes Ribeiro de Faria - Marco Antônio Penido Rezende
CargoAnalista de gestão, proteção e restauro no Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e Artístico de Minas Gerais. Professora do curso de especialização Lato Sensu da União de Ensino Superior de Minas Gerais (UESMIG) - Professor Adjunto na Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Páginas233-249
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Revista Esboços, Florianópolis, v. 18, n. 26, p. 233-249, dez. 2011.
DOI: 10.5007/2175-7976.2011v18n26p233
CASA DE ESCRAVO NA PAISAGEM MINEIRA:
TEXTOS E IMAGENS
Juliana Prestes Ribeiro de Faria*
Marco Antônio Penido Rezende**
Resumo: Neste artigo trataremos da arquitetura africana produzida pelos escravos
em Minas Gerais. Este tema será abordado na perspectiva da presença das moradias
escravas na composição da paisagem mineira, através dos relatos de viagem que
descrevem a vista destas habitações nas fazendas, nos arredores de povoados, arraiais e
vilas, assim como nos assentamentos de empresas mineradoras, e da mesma forma nas
pinturas dos artistas-viajantes que visitaram estas regiões. Estes aspectos se completam
e demonstram o rico espectro que envolve a gênese e formação da arquitetura popular
mineira e as contribuições africanas inerentes a este desenvolvimento.
Palavras-chave:
escrava.
Abstract: The article proposes to treat the african architecture produced by slaves
at Minas Gerais. This will be discussed in the perspective of the slave habitation
presence in the composition of Minas Gerais landscape through travels writings that
describes the view of these habitations in farms, surrounding the village and in the
houses’ settlement of the mining industry, and in the same way on the painting of
travelling artists that visited those regions. These aspects complement each other and
demonstrated the rich spectrum that involves the genesis and formation of Minas
Gerais popular architecture and the african contributions inherent to this development.
Keywords: Minas Gerais landscape. Travels writing. Iconography. Slave habitation.
* Analista de gestão, proteção e restauro no Instituto Estadual do Patrimônio Histórico e
Artístico de Minas Gerais. Professora do curso de especialização Lato Sensu da União de
Ensino Superior de Minas Gerais (UESMIG). E-mail: juliana.prestes.faria@hotmail.com
** Professor Adjunto na Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais
(UFMG). E-mail: marco.penido.rezende@hotmail.com
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Revista Esboços, Florianópolis, v. 18, n. 26, p. 233-249, dez. 2011.
O trabalho escravo se constituiu como uma condição inerente ao
desenvolvimento da economia e ao processo de colonização do Brasil. O
negro era caracterizado como “os pés e as mãos” do senhor, fosse no trabalho
doméstico, nas lavouras, nos engenhos, nas minas, os escravos tinham se
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Do mesmo modo se atribui à mão afro-brasileira a construção do
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por escravos e forros e custeada tanto pelas autoridades régias e camarárias
quanto pelas associações religiosas leigas como pela população civil. Os
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e serventes estiveram presentes nas obras públicas do Brasil colônia, eram
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fazerem uso das mãos em seu trabalho.
Por ganharem a vida com o esforço braçal, esses homens eram maculados
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os colocava em posição de inferioridade.2
trabalhos manuais não eram realizados pelos portugueses, pois eram vistos
por estes como mais degradantes do que mendigar ou roubar. Este fato torna-
se evidente quando analisamos uma passagem da carta do governador do Rio
de Janeiro à coroa, em 1726, onde ele ressalta que o trabalho nas minas só se
fará possível com o emprego de mão-de-obra escrava “porque fazem serviço
mais vigorozo, como porque os brancos, e Reynois, ainda que sejão criados
com a enxada na mão, em pondo os pés no Brazil, nem hum quer trabalhar”.3
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trabalho manual privava-os do mesmo, o que nos leva a concluir que as intensas
atividades construtivas urbanas só poderiam estar assentadas decisivamente no
uso da mão-de-obra escrava. Além da presença no campo da execução de obras
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popular, que corresponderia à construção do Brasil rural e urbano, mas na
esfera civil. Sinteticamente tem-se que a análise da participação escrava na
atividade construtora de todo o período colonial aponta-nos para o fato de que
esta esteve presente desde a construção dos primeiros ranchos até a instituição
de nossa arquitetura erudita.
O marco diferencial desta presença escrava nos canteiros de obras se
estabelece justamente no nível de participação e, por conseguinte na escala
de autonomia atribuída a esta mão-de-obra, já que nas obras públicas e de
particulares a condição de impressão dos seus misteres construtivos seria
inferior àquela utilizada na construção da sua própria moradia. Isso se deve ao
fato de que a maioria dos projetos construtivos e ornamentais era desenvolvida
em Portugal, sendo as plantas previamente fornecidas, assim como os materiais

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