Conde - Vara c�vel

Data de publicação23 Agosto 2022
Número da edição3162
SeçãoCADERNO 4 - ENTRÂNCIA INICIAL
PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA
VARA DOS FEITOS RELATIVOS ÀS RELAÇÕES DE CONSUMO, CÍVEIS E COMERCIAIS DE CONDE
SENTENÇA

8000203-09.2020.8.05.0065 Procedimento Do Juizado Especial Cível
Jurisdição: Conde
Autor: Antonio Barbosa Filho
Advogado: Juca Almeida Formigli Serra (OAB:BA50318)
Reu: Companhia De Eletricidade Do Estado Da Bahia Coelba

Sentença:

Como se sabe, nos termos do art. 38 da Lei 9.099/95, “Art. 38. A sentença mencionará os elementos de convicção do Juiz, com breve resumo dos fatos relevantes ocorridos em audiência, dispensado o relatório.”.

De todo modo, entendo oportuno ressaltar o que se segue.

Cuida-se de ação judicial proposta por AUTOR: ANTONIO BARBOSA FILHO

em face de REU: COMPANHIA DE ELETRICIDADE DO ESTADO DA BAHIA COELBA

A parte autora afirmou que " O Autor utiliza os serviços da Ré através do contrato de nº 7002027172, conforme depreendese da fatura ora acostada aos autos. A parte Autora possui um projeto de produção de sementes e mudas de coco anão e híbrido no interior da Bahia, no município do Conde. O projeto se chama TECNOCOCO (www.tecnococo.com.br) e consiste na produção de coqueiros mais resistentes, e por isso superiores, uma vez que estes são padronizados geneticamente, priorizando o alto padrão de qualidade com polinização artificial e trabalho artesanal, sendo as plantas adaptadas e com maiores estabilidades e uniformidades de produção em diferentes ambientes, tolerantes ou resistentes a pragas e a estresse ambiental. Conforme dito acima, as mudas e sementes produzidas pelo projeto do Autor passam pelo processo de polinização artificial, tal processo consiste em extrair o pólen da flor de um coqueiro gigante, beneficiá-lo (utilizam-se os processos de secagem ao ar livre, secagem em estufa, abertura das flores e armazenamento em freezer) e, após o beneficiamento, polinizar um coqueiro anão, conforme detalhadamente explicado no documento “ETAPAS PROCESSO HIBRIDAÇÃO”, ora acostado aos autos. Conforme demonstrado anteriormente, o Autor necessita demasiadamente da energia elétrica em seu projeto, seja para manter funcionando a estufa e o freezer, que contém o pólen (elemento mais importante do projeto do Autor), seja para irrigar as sementes e mudas, já que a irrigação também é automatizada, conforme, inclusive, menção existente na conta de luz ora anexada aos autos. No dia 07/02/2019, logo ao acordar, o Autor verificou que havia faltado energia na fazenda na qual se encontra seu projeto, estando com o pagamento de todas as faturas em dia. Desesperado, pelos motivos expostos acima, com receio de perder seu pólen e suas sementes e mudas, o mesmo entrou em contato com a COELBA, gerando a reclamação nº 21599 e o protocolo nº 2108253590, não tendo recebido nenhum retorno efetivo. Os dias se passaram e a falta de energia perdurou até o dia 11/02/2019, tendo o Autor tentado DIVERSAS vezes resolver a situação com a COELBA, sem qualquer êxito, resultando suas ligações na reclamação de nº 77533.[...] Diante da falta de energia, que durou 04 (quatro) dias, a parte Autora perdeu 300 (trezentos) gramas de pólen, conforme fotografia ora acostada aos autos, em virtude do não funcionamento do freezer e da estufa, e 2.000 (duas mil) mudas, sendo 1000 (mil) de coqueiro híbrido e 1000 (mil) de coqueiro anão, em razão da ausência de irrigação e do clima absurdamente quente dessa época do ano.” (sic).

Nos pedidos, pugnou por " a) A indenizar o Autor a título de danos materiais no montante de R$ 41.000,00 (quarenta e um mil reais), devidamente corrigido e atualizado; b) A indenizar o Autor a título de danos morais, em valor a ser arbitrado por Vossa Excelência com base nos princípios da razoabilidade e proporcionalidade, com incidência de juros de 1% (um por cento) ao mês, acrescido de correção monetária;" (sic)

Na audiência de conciliação a parte ré esteve ausente. A parte autora pugnou pela decretação da revelia.

DA REVELIA.

Decreto a revelia da ré que, apesar de devidamente citada, não se fez presente em audiência de conciliação, assim como não apresentou contestação. Por todo o exposto, reputo verdadeiros os fatos narrados pelo autor.

DO MÉRITO.

E, no meritum causae, entendo que razão assiste à parte autora.

De logo, destaco que a relação jurídica em exame se enquadra no conceito de relação de consumo, regulada pela Lei n.º 8078/90, norma de ordem pública, cogente e de interesse social, sendo a parte ré fornecedora de serviços e a parte autora consumidora, na forma dos artigos e do CDC.

O Código de Defesa do Consumidor tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito a sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria de sua qualidade de vida, bem como a transparência e a harmonia das relações de consumo, consoante dispõe o art. 4º da Lei nº. 8078/90.

O sistema adotado pelo Código de Defesa e Proteção do Consumidor consagra uma série de princípios, dentre os quais o da confiança, como dever anexo aos contratos de consumo, além da função social do contrato, que o transforma de simples instrumento jurídico para realização dos legítimos interesses do consumidor.

Outrossim, o próprio dispositivo do Art. 14 do Código do Consumidor regulamenta a responsabilidade objetiva de maneira clara e a documentação trazida pela parte Autora faz prova contundente de suas assertivas quanto à lesão ao seu direito.

Friso que tratando-se de relação de consumo, entendo aplicável ao caso a inversão do ônus da prova em favor do Consumidor, parte hipossuficiente e em evidente posição de desvantagem técnica em relação à concessionária, a quem cabia provar os fatos impeditivos, modificativos ou extintivos do direito Autoral.

No caso sub judice a requerida não contestou e nem apresentou nenhuma prova, restando apenas a análise dentro das provas apresentadas aos autos pelo Autor.

Uma vez que deferida a revelia, entendo incontroverso que ocorreu interrupção no fornecimento de energia ao Autor durante quatro dias, de maneira indevida. Friso que o demandante cita em sua exordial números de protocolos de reclamações quanto a interrupção do serviço.

O art. 6º, §3º da Lei n. 8.987/95 permite a descontinuidade do serviço público, através da interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações e quando houver inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade, vejamos:

Art. 6º Toda concessão ou permissão pressupõe a prestação de serviço adequado ao pleno atendimento dos usuários, conforme estabelecido nesta Lei, nas normas pertinentes e no respectivo contrato.

(...)

§3º Não se caracteriza como descontinuidade do serviço a sua interrupção em situação de emergência ou após prévio aviso, quando:

I - motivada por razões de ordem técnica ou de segurança das instalações;

II - por inadimplemento do usuário, considerado o interesse da coletividade.

Em se tratando de serviço público de fornecimento de energia elétrica, a suspensão por inadimplemento será precedida de prévia notificação ao usuário, de forma escrita, específica e com entrega comprovada ou, alternativamente, impressa em destaque na fatura, com antecedência mínima de 15 (quinze) dias, conforme art. 173, inciso I, alínea “b”, da Resolução Normativa Aneel n.º 414/2010, que assim dispõe:

Art. 173. Para a notificação de suspensão do fornecimento à unidade consumidora, prevista na seção III deste Capítulo, a distribuidora deve observar as seguintes condições:

I – a notificação seja escrita, específica e com entrega comprovada ou, alternativamente, impressa em destaque na própria fatura, com antecedência mínima de:

(...)

b) 15 (quinze) dias, nos casos de inadimplemento.

Sendo assim, é nítido que a interrupção indevida do fornecimento de energia sem nenhuma motivação técnica nem prévio aviso é medida ilegal, e que deve ser reprimida por este Juízo.

Sem a prova de motivo apto a justificar a interrupção dos serviços , não há como se legitimar o ato, razão pela qual a indenização é medida que se impõe.

Há de se concluir, portanto, que a ré não se desincumbiu do ônus que lhe cabia, notadamente em razão do disposto no art. 6, VIII, do CDC, pelo que deve ser responsabilizada por isso.

DANO MORAL.

Quanto à existência de danos morais, imperioso o acolhimento parcial dos pleitos autorais.

Os fatos aqui narrados constituem crassa falha na prestação de serviço, além de evidenciar a total desorganização da ré.

No caso sub examine, é de se ver que a situação extrapola o que poderia ser razoavelmente tolerado, desviando a empresa ré para o campo do evidente desrespeito e descaso para com o consumidor.



De mais a mais, considerando as peculiaridades do caso vertente, constato que a injusta interrupção do fornecimento de energia durante quatro dias extrapolou o mero dissabor dos problemas cotidianos, sendo necessário o dever de indenizar.



Em relação ao quantum indenizatório sopeso as seguintes variantes, que são balizadas pelos princípios da proporcionalidade e razoabilidade, com o escopo de que o ressarcimento da lesão ao patrimônio moral da parte...

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